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terça-feira, 14 de janeiro de 2014

Saudades dos tempos que nunca viveu.

Saudades dos tempos que nunca viveu.

Era um desses cidadãos que não devem nada a ninguém, nem aos bancos. Nem se lembrava mais do ultimo automóvel que possuíra, embora sempre tenha achado que era o automóvel que o possuía a ele, tais os cuidados, as multas, as vistorias, os emplacamentos, as revisões, as lavagens, os abastecimentos. Cooperara com o Estado e a sociedade, e agora só andava em transportes públicos. Em nome do progresso aceitara de bom grado que autoridades de diversos países lhe vasculhassem suas comunicações pela Internet, por telefone, para controlar o terrorismo, e de modo geral nem se incomodara que espalhassem câmaras por todos os lados da cidade, das cidades do mundo, Começaram a instalar para controlar o crime, depois passaram a usar para controlar os cidadãos. É sempre assim. Descobriram o controle da energia atômica e fizeram bombas depois. É uma questão de "princípios".  

Era um desses cidadãos que acham que em nome da segurança, do conforto, da lei, da Ordem e do Progresso, sempre de olho nas gerações futuras e no bem estar do planeta, tudo valia a pena se a alma não era pequena. Nem se preocupou muito quando foi chamado a uma repartição do Imposto de Renda para se “explicar”: Havia um recibo médico no valor de $ 200 Cred, a moeda internacional, mas as câmaras de controle do governo mostravam que nesse dia nem tinha saído de casa. A multa para esses casos era enorme, por envolver formação de quadrilha, falsidade ideológica, furto premeditado do erário público, enfim, se a multa de 10.000 Creds não fosse paga em 30 dias, poderia ser preso, sua identidade cassada, perderia créditos, não poderia exercer a profissão. Muito complicado. Tinha dois dias para se explicar de forma documentada. Como era um cidadão honesto, telefonou para o médico, e ele mesmo mandou um texto, aproveitando para se explicar em viva voz, informando que é amigo do arguido, mas que negócios são negócios. Passara aquela noite cuidando do amigo, e passara recibo em nome de seu consultório porque não tem dois tipos de recibo: Quando visita ou quando é visitado por pacientes em seu consultório. Essa foi fácil de resolver, até por que contando com a boa vontade do funcionário do imposto de renda, ele repassou a informação para o “sistema” e a informação foi aceita, sujeita a verificações.

Mas a caminho de casa, nosso cidadão foi remoendo até que ponto era controlado. Isso gerava pressões sobre personalidade, havia muita gente deprimida no mundo. O problema maior de tudo isso era a sensação de perda de liberdade, até mesmo para errar. O sistema mundial nem lhe permitia errar, ou melhor, até permitia, mas com a certeza de ser inquirido de imediato sem que mais de uma semana se passasse após o cometimento do “erro”. Tinha pena dos brasileiros e dos povos latinos em geral, tão habituados a dar o seu “jeitinho” em tudo. Esses viviam momentos de pleno horror. O Estado brasileiro, representativo de uma entidade maior, o Estado Mundial, cumpria a rigor com os preceitos da lei, enfim, de todo o sistema.

Todos os políticos representavam, e isso não era pura representação teatral. Representavam mesmo, pra valer!  O povo, diziam, estava representado segundo o estado de direito. Tinha a liberdade de reclamar, de votar nos indicados pelo Partido Mundial, mas nem pensar em fazer manifestações. Eram todos cidadãos educados e assumiam publicamente que tudo o que aparentemente parecia errado, se devia a sua deficiência em escolher bem entre os candidatos que o PM – Partido Mundial, lhes apresentava, se bem que houvesse desconfiança que, todos os indicados, fariam exatamente o que estava determinado pelo PM. O problema é que não se podiam testar dois candidatos elegendo-os ao mesmo tempo. Sempre ficava a dúvida: E se eu tivesse votado no outro, seria melhor ou pior? Para o sistema não fazia diferença nenhuma: Candidato que não fosse eleito numa eleição, sê-lo-ia em outra.



Lembrou-se também dos tempos do comunismo e da luta contra o capitalismo, até mesmo do regime nazista de Hitler, séculos atrás, as proibições de falar, de escrever, de se comunicar, de sair do país, de divergir... Alexander Soljenítsin [i] foi apenas um dos exemplos, ou da fuga de cérebros como Einstein nos tempos da segunda guerra mundial... Mas o que começava a incomodar, é que os tempos atuais eram de democracia e capitalismo.

Como este sistema de capitalismo democrático caíra para as bandas do comunismo e da ditadura financeira que impunha outras ditaduras para poder ter um super-neoliberalismo capitalista? Era o dinheiro que mandava, embora não houvesse corrupção aparente. O poder era agora tão forte, que não havia modo de superar o seu controle. Julgou-se um escravo de um governo central em nome de uma humanidade que começava a afastar-se das intenções que o Partido Mundial dizia serem as dos cidadãos.

Impossível fazer uma revolução francesa, porque com os movimentos controlados, era impossível qualquer compra ou fabricação de armas. A Bastilha jamais cairia, os políticos podiam agora nos mandar comer brioches quando faltasse pão. Mas todos bem vestidos, porque quando um cidadão mostrava nas câmaras de vigilância que suas roupas estavam deterioradas, logo chegava a sua casa uma encomenda com roupa nova do governo, cheirosa, impecável. Era uma dádiva de umas senhoras muito finas e ricas que tinham fundado uma ONG para estes casos. Faziam o mesmo com comida e serviços médicos. Ninguém sabia de quem morria, porque não havia notícias de óbitos.

Realmente era um paraíso o mundo em que vivia o nosso cidadão. Uma gaiola que era quase de loucos, onde havia três paraísos: O dos políticos que não precisavam de ajuda de ONGs; o das ONGs que enriqueciam dia a dia porque estavam fora do controle do governo (na verdade concessões a amigos do Partido Mundial com verbas públicas), e o dos loucos, isto é, dos cidadãos, que obedeciam segundo o lema “manda quem pode, obedece quem tem juízo”. Os filósofos políticos tinham a gora o pomposo nome de “cientistas do bem estar social”...

Termos que lembrassem o passado foram eliminados do dicionário, e as novas gerações nem sabiam que tinham existido algum dia. O herói mundial, o grande “deus” da humanidade chamava-se Gramsci, um herói revertido da paranoia comunista e anarquista, capitalizado pelo grande sistema da “Democracia super-neoliberal capitalista”. Jean Paul Sartre, que abandonara o comunismo era agora um herói mundial.



Nosso cidadão sentiu-se frustrado. Precisava de algo mais do que um drinque. Como cigarro estava proibido, o tabaco impedido de ser plantado, apanhou um punhado de sativa-canabis e mandou ver: Fumou todas! A célebre maconha estava liberada, podia fumar à vontade e até em seu pequeno peitoril da área de serviço de seu apartamento tinha meia dúzia de  pés plantados para o caso de uma falta.

Como lhe era possível ter saudades de um tempo em que não tinha vivido, aqueles em que tudo era proibido, mas podia fazer tudo o que lhe desse na telha?

Ah.. E quando lhe perguntavam se era feliz, nem lhe passava pela cabeça dizer que não. Vai que as câmaras o denunciassem... E quem sabe, se na sua ultima ida ao dentista não lhe tinham implantado um chip no dente, um comunicador com a Central de Comunicação do Bem Estar do Ministério da Extrema Felicidade?

Nestes tempos de gaiola dourada, nosso cidadão não podia correr riscos, neste sistema de Democracia, para não perder o prazer de viver ao lado dos outros, sua vaidade atendida de fazer parte de uma grande massa de gente com os mesmos ideais, irmanados na vontade de dizer que eram felizes toda vez que eram perguntados..

© Rui Rodrigues  

PS- Há uma saída para evitar este futuro e não ter saudades de um passado que nunca se viveu. Só conheço esta http://conscienciademocrata.no.comunidades.net/ 








domingo, 12 de janeiro de 2014

Somos viajantes do tempo. Como gastá-lo?

Somos viajantes do tempo. Como gastá-lo?

Esqueça o espaço em que vivemos. Abstraia-se dele, nem que tenha que fechar os olhos por uns momentos até que se possa situar. Depois...

... Depois imagine apenas uma cápsula que envolve o seu corpo, e através da qual pode – agora sim – ver o espaço que a envolve, paisagens, vida, universo. Você também ouve e sente. Tem emoções.Assim como no traje de um astronauta.

Mas está dentro de uma cápsula que é apenas tempo. Para onde quer que vá, sua cápsula flutua e viaja no tempo. O espaço não se gasta, não desaparece. O tempo sim... Esse passa junto com você, acompanhando os movimentos dos ponteiros de seu relógio. Por mais que os expert da Física Quântica digam que espaço e tempo são inseparáveis – e o são realmente – o fato é que o espaço aparentemente nem se sente que mude tanto quanto o tempo.. O tempo simplesmente desaparece, fica para trás, ou para qualquer lado, porque é a sua cápsula do tempo que viaja pelo espaço.

Porque desperdiçaríamos esse nosso tempo, já que passa a cada segundo de forma irreparável, irrecuperável?

Porque pensamos, e gostamos de meditar!

Nossa sensação de tempo é diferente, por exemplo, da sensação dos demais animais. O cão, por exemplo, fixa “fatos” mas não tem noção de tempo, e mesmo que se passem anos sem ver o primeiro dono, quando o vê fica eufórico, feliz, como se não se tivessem passado mais do que parcos minutos de separação entre os dois. Já as efemérides, pequenos insetos alados, não vivem mais do que 24 horas. Nesse período, nascem, crescem, reproduzem-se e morrem de morte natural ou comidos pelos pássaros e outros predadores. É como se comprimissem nossa noção de tempo passado por oitenta anos em simples 24 horas. E se conversassem entre si, seriam muito rápidos na comunicação, e talvez tivessem a sensação que temos de viver nossos 80 anos.

Para nós o tempo parece ser tão pródigo e em tal quantidade de minutos, que o desperdiçamos. Mas se não o desperdiçarmos meditando, dormindo, jamais teríamos condições de “memorizar”, tal o estado de mente ocupada no realizar o “já”, o “agora”, o “hoje”... É como se tivéssemos 10.000 amigos e amigas... E nem nos lembraríamos do nome de cada um deles, nem dos momentos que passamos. Talvez de um pouco mais de umas dezenas.. O restante seria esquecido por não ter sido memorizado.

A memória é a única fuga do tempo, e mesmo assim precária, porque também está dentro da cápsula do tempo que viaja junto com o espaço, mas sempre de forma tal que não se pode ver o tempo que passou, embora o espaço que “passou” ainda permaneça quase sem alteração. É o que nos parece.

Por isso nos é importante a moderação, o equilíbrio, para que esteja dentro de nossas possibilidades de compreensão, de memorização, e não nos frustremos ao chegar a um futuro de algumas dezenas de anos, e não nos lembrarmos do que fizemos, esquecendo até coisas de que precisaríamos nos lembrar e não o podemos fazer.

Lembro-me de meus tempos de criança, quando encheram uma pequena praça, na verdade um “largo” da confluência de duas ruas onde há uma capela, com cadeiras e mesas, com lindas toalhas, copos com cravos vermelhos e cheirosos mergulhados em água, pratos, talheres, comida, garrafas de vinho, gente que começou a chegar, encheu a praça, deram abraços, se cumprimentaram, e quando passaram à sobremesa, lá estava o arroz doce cheirando a canela, fartas doses de vinho do Porto.. Foi em 1949 em minha aldeia natal e eu tinha quatro anos ou estava para completa-los. Meu pai estava na aldeia, porque sinto que estava lá, mas não tenho a mínima certeza. Nem sempre meu pai esteve presente em minha vida.

Que enorme festa foi aquela que marcou minha memória de pequeno ser iniciante da vida, viajando numa cápsula que parece flutuar no espaço, independente do espaço, mas que é inseparável do espaço? Porque memorizei a festa e não o motivo da festa? Porque eu estava com minha roupa domingueira, casaco e calças curtas com camisa e gravata, escolhida, cortada, alinhavada e costurada por meu pai?

Que importância teria tido essa festa - porque era uma festa - se só me lembro de me abraçarem, dizerem coisas bonitas sobre mim (que sempre disseram), e dito isso, me esqueceram durante todo o tempo que ela durou? E porque não me lembro de meus amigos de infância nessa festa?

Não tenho a mínima ideia, mas a festa existiu, e nenhum de meus parentes que lá residiam e com os quais tive contato ou me lembrei de perguntar, se lembram dela. Nem meu pai, enquanto era vivo. No entanto, entre elogios que recebi, e o isolamento a que me relegaram depois deles, marcaram minha memória até hoje, 64 anos passados. Mas me perguntem se me lembro de algum rosto da festa, e lhes direi que não tenho a mínima ideia. Só me lembro de algumas roupas, cravos na lapela, saias de pano escocês, chapéus masculinos e femininos e perfumes... Perfumes de roupa e perfumes de comida, sons de música no ar, talvez de foxtrotes.

Naquela época, tal como ainda hoje, existem dois “largos”. A festa foi no largo mais próximo de minha casa, no largo da Nogueira, sobrenome de minha avó paterna e também de minha mãe. A festa foi dada por pessoal da Nogueira.


Mas voltemos ao tempo e ao seu desperdício... Não me lembro de muitas coisas na vida, talvez por que não as achei importantes, e pelos vistos, no que respeita à referida festa, não estou só nessa precariedade. Ninguém se lembra, mas pelo aparato, foi uma festa “importante” no tempo e no espaço de Fornelos. Ficou lá como traço brilhante de foguete que explodiu no ar. Lançaram foguetes na festa, mas só me lembro do assobio e dos estrondos. E não era festa da Igreja porque se fosse o caso , teria sido no adro.

Entende-se agora que há momentos que não têm sentido prático algum aparente, mas que nos deixam lembranças vãs? Qual a diferença entre tê-los vivido ou passado à margem na consciência do hoje? Nenhuma. Apenas alguns átimos de prazer e interrogação sempre que me lembro deles. E há muitos. Uma imensidão aprisionada na minha cápsula do tempo retida na memória que é só minha. Um mesmo evento não é visto por ninguém de forma igual á de outrem. Não há momentos iguais. Nem por quem os compartilhou conosco.

Como pretendemos nós - mortais infantis - que nos possamos compreender e entender uns aos outros, se não vemos um segundo sequer de forma idêntica e comum a todos ou a um só ser humano mesmo que o tenha compartilhado conosco?

E então poderemos compreender toda e cada uma das variáveis que nos podem tornar – e tornam – diferentes, tudo função de discrepâncias no tempo, segundo o lado para o qual estejamos olhando em nossa cápsula do tempo, porque o momento “real e completo”, esse é igual para todos. Todos tiveram à sua disposição o momento completo da festa inteira, mas cada um apenas olhou e reteve o que lhe foi mais importante... Ninguém assistiu à festa inteira. Não teve tempo nem olhos, nem meios físicos de olhar em todas as direções do tempo da festa...

O problema está nos olhos... Na forma de olhar..




© Rui Rodrigues 

sábado, 11 de janeiro de 2014

A grade da Globo

Que me perdoem os que acharem que estou errado... Mas é a minha opinião que gostaria de compartilhar com vocês...

O que se espera da Globo? pela tradição, seria o "melhor", a excelência, até para justificar os "empréstimos" e doações de verbas públicas... Mas a "cabeça" da Globo está ficando velha e desatualizada.. O tempo não pára e a Globo parece parar... 

1- Como justificar escritórios de jornalismo no exterior se catam as notícias como nós mesmos catamos na net? Traz todo mundo de volta pra casa, economiza e as notícias saem do mesmo jeito.. Repórter transferido só para passar bem e desfilar vaidades, falando com trejeitos e tonalidades de "madames" e "madamos" é dinheiro jogado fora... Repórteres não são celebridades nem "a notícia"... Celebridades e notícias é que devem ser mostrados... Repórter nem precisa aparecer.. melhor que nem apareça. 

2- O que nos "apresentam" os desgastados Faustão, Xuxa, e a esposa do Luciano, senão banalidades, pobreza intelectual... 

3 - A propaganda embutida em todos os programas - propaganda da própria Globo - está tornando a emissora um porre fenomenal... Um saco!

3 - E o que dizer das novelas? Tudo a mesma coisa, misturando ódios, decepções, raivas, vinganças, conflitos, discussões, maldades... Que faça um ou dois filmes por ano... Prêmios no exterior? que faça novelas e as venda para lá.. Há muito trabalho para fazer neste país e não se deve passar das duas da tarde às onze da noite vendo novela... Ainda mais com novelas que nem vale a pena ver de novo... 

4 - Vídeo Show é um vídeo mal enjambrado, jamais um show... Calçada da fama é para quem merece... que nem diploma universitário que não deveria ser comprado. 

4- BBB... Nem adianta falar nessa coisa... A excrecência humana posta a nu... A alma vendida ao diabo para ganhar uns trocados, com um repórter gozador nos calcanhares. 

5- E tem o programa do "olha mãe... Olha mãe.. Olha mãe".. que vale pelo elenco e por si mesmo, mas que ficaria melhor sem as "fernandices" de" mãe olha pra mim".. 

Fica a sugestão, e parabéns à emissora por ter acabado com a praga , que nem carraça, do Esquenta... Aquele programa não esquentava: Gelava de pasmaceira ao ver a ignorância triunfar sobre o conhecimento.. A Globo não sai do lugar e vende a mesma fórmula de sempre... Já cansa !!!

RR

PS - Hoje um dos sites da Globo saiu do ar.. Esse foi uma pena.. O que deveria sair do ar, é a mania de querem fazer a sua opinião... Incentivem a aposentadoria.. Faz bem à saúde.. Que alguns funcionários da Globo aproveitem para curtir a vida e se divertirem... (Lá fora)

sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

A minha breve história da Malásia.

A minha breve história da Malásia.



Nunca fui um cara excelente em tudo... Fui e sou bom em muitas coisas, mas em nada por excelência. Não sou ruim em nada. De onde vem isso? Vem de uma “liberdade” que eu mesmo tomei quando era ainda muito jovem. Tão jovem que a única coisa que eu sabia deste mundo era que tinha família, que havia lobos que comiam pessoas, que era bom jogar futebol com uma bola feita de meia de mulher preenchida de forma arredondada com enchimento de pano e costurada, que os peixes do rio, os barbos, eram muito gostosos, e que porcos gritam muito quando são espetados à faca para morrer. Tinha 4 anos e vivia numa aldeia onde no inverno eu gostava de sair descalço na neve para sentir os pés gelados. Meu pai não gostava que eu fizesse isso, nem que jogasse bola descalço. Por conta de minha desobediência, apanhei uma pneumonia na neve, e uma unha do dedão do pé voou num chute que dei meio despreocupado da vida. Comecei a prestar mais atenção, e nunca mais fiquei, nem doente nem sem unha. Foi então que me lembrei que Adão e Eva também tinham desobedecido ao senhor abdicando da própria vida eterna. Eu também desobedeceria. Uma vida eterna deve ser um saco, um porre, um sacrifício.  Uma vida bem dosada, não precisa ser eterna. Estou com 68 anos e se for amanhã, será um bom dia. Sou um contestador das coisas deste mundo, e tudo o que não é conhecido, é um desafio para ser conhecido.



Foi assim que escolhi o que admirar o que ignorar e o que esquecer. Admiro a Malásia desde que um amigo meu de infância, cego, o Pedro, me pedia para lhe ler livros de histórias. Eu lia porque me aproveitava para colher conhecimento de seus livros e porque ele era meu melhor amigo. Então me caíram nas mãos vários livros de Emílio Salgari, um italiano que escreveu histórias fascinantes sobre Sandokan, “O tigre da Malásia”, um príncipe malaio que tenta reconquistar o trono tirado por assassinos de sua família. Transforma-se num pirata. Sandokan se junta a um português amigo também nobre, o Ianes, para ajuda-lo em seus empreendimentos e é apaixonado por uma moça (Marianne) com quem casa, mas que morre por uma bala inglesa.

O Bornéu e seus caçadores de cabeças foram um mistério para mim, algo que eu temia mesmo sem estar lá, até que compreendi que era a manutenção de sua cultura que eles queriam preservar. Cortar cabeças e preservá-las de forma a que encolhessem penduradas em suas casas, era apenas uma questão de cultura de somenos importância. Isso poderia ser e foi mudado com o progresso deste mundo. Tudo evolui.


A Malásia evoluiu muito. É uma jovem tigresa asiática, com sérias e inquestionáveis pretensões a ser tigre. Povo inteligente, empreendedor, olhos postos num futuro promissor.


A Malásia, que se situa entre o Índico e o pacífico, no Estreito de Malaca, está situada numa rota de interesses internacionais. Por isso desde o século VII tem atraído comerciantes e conquistadores. Primeiro foram os siameses de Funan, depois indonésios de Srivijaya e Majapahit, seguindo-se muçulmanos de Malabar, da Pérsia e da Arábia, depois ainda portugueses no século XVI, no século XVII os holandeses. No século XVIII foi a vez dos britânicos.  Em 31 de Agosto de 1957, a Federação Malaia ganha a sua independência do Reino Unido, e passa a fazer parte da Commonwealth. Em 09 de Agosto de 1965, Singapura declarou-se independente.


A história da humanidade é pródiga em conquistas, fazer escravos, guerras... É uma história muito triste. Por isso não estranhei a forma com Afonso de Albuquerque, um comandante (e governador) português se impôs na Malásia, conquistando Malaca em 1511. Construiu aí uma fortaleza chamada “A Famosa”, mas que não foi suficiente para impedir que em 1541 os holandeses a conquistassem, mas deu tempo suficiente para que São Francisco Xavier ali pregasse por algum tempo. Começou então uma rivalidade entre Malaca, Achém, Johor, Celebes e Riau.
Hoje a Malásia é constituída por várias etnias principalmente de malaios (60% da população), chineses (25%) e hindus (10%). Há também eurasiáticos, cambojanos, vietnamitas e tribos indígenas. Dos eurasiáticos, a maioria é cristã mestiços de portugueses e malaios. Falam uma língua crioula de base portuguesa denominada “Papia Kristang”.
Portugueses costumam miscigenar-se com facilidade em todos os lugares do planeta. Não descriminam religião, preferências sexuais, nem cor de pele. Não descriminam nada nem ninguém. As demais potências da antiguidade viam nisso uma “falta de nobreza”, porque elas descriminavam. Hoje os conceitos mudaram e provam que portugueses têm características de decência humanística e ambiental. Somos assim.
Entre 1980 e 1990 a Malásia se dedicou á industrialização no setor de informática e sua economia hoje depende principalmente das economias dos EUA, da China e do Japão. É uma economia forte, multi-setorial, exportando também matérias primas. Os países denominados “tigres asiáticos” são os principais investidores na economia malaia.  Segundo o Banco Mundial a Malásia e de uma lista de 183 países, é o 18º país onde é mais fácil fazer negócios, o melhor na obtenção de crédito (1º lugar), o 4º na proteção a investidores, e o 29º nas relações trans-fronteiriças.
Além disso, as fotos mostram o quanto a Malásia é um país desenvolvido. Numa viagem que fiz à Turquia, em 1994, aproveitamos, eu e minha esposa, para entrarmos numa excursão que saía de Ankara até quase a fronteira do Iraque, passando por Kaisery e Capadócia. Foram uma excelente companhia, e seus traços malaios eram realmente belos.
Eu amo a Malásia desde que lia os livros de Emilio Salgari. Quem sabe um dia ainda passo por lá.. 

© Rui Rodrigues







quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

A Relação Empresa x Empregado e os conceitos de moral e ética

A Relação Empresa x Empregado e os conceitos de moral e ética


(Expressando o que nunca expressei, apesar de toda a minha experiência internacional em grandes projetos). Que agora sirva para as novas gerações.

Salários de empregados – em qualquer nível – é função de mercado. O mercado varia de acordo com a economia. Economia em alta, os salários são mais altos e com economia em baixa, os salários baixam. É também uma questão de oferta e procura.

Empresas são entidades. Entidades têm uma personalidade calcada por “normas e procedimentos” elaborados por funcionários, aprovados pelas “diretorias”, estas também constituídas de empregados. Empresas são entidades com personalidade delineada pela inventiva, experiência, erros e fracassos de seus empregados. A diretoria normalmente pede opinião dos empregados e reconhece que não entende de modo amplo todos os aspectos que envolvem as atividades da empresa, exatamente pela quantidade de perguntas que fazem para uma nova ideia, uma nova norma, um novo procedimento, e porque ninguém neste mundo domina todos esses aspectos. Empregados usam a empresa, a empresa usa os empregados. Mas não há uma proporcionalidade entre os lucros das empresas e o trabalho dos empregados. Empresas ficam normalmente com todos os lucros, os empregados apenas com os salários. Pelas normas de mercado e pelas leis aprovadas em todos os países do mundo, isto é o “mercado” e assim julgado justo. Na realidade não é: Cada empregado contribui com uma porcentagem do lucro da empresa. Imaginando que 50% do lucro fosse destinado ás empresas, os outros 50% deveriam ser distribuídos pelos empregados, mas isto não  tem funcionado nem é incentivado. E provoca prejuízos para as empresas por falta de cooperação e dedicação totais por parte dos empregados que se sentem sem incentivo a produzir mais e melhor. Porque a falta de incentivo? Porque sabem que a empresa tem lucros e que contribuíram para isso. Mas terão que admitir, se quiserem participar dos lucros, que quando a empresa tiver prejuízos, terão que participar deles de igual forma.

O engenheiro de contratos, por exemplo, conhece ética, moral, técnica, administração, economia, direito e é geralmente um excelente negociador... Ele sabe de tudo o que é primordial para a empresa e gerencia o relacionamento entre a empresa e terceiros, tendo como bíblia, as leis do país e os contratos assinados com esses terceiros, por cuja elaboração ele é geralmente o responsável. O recurso a reclamações é um costume generalizado que visa aumentar o lucro contratual por parte desses terceiros. Um economista que seja empregado de uma empresa e que estabeleça um programa que a curto, médio ou longo prazo a desenvolvam significativamente, merece mais do que o simples salário, assim como um engenheiro ou qualquer funcionário... Estes fazem muito mais do que o trabalho para o qual foram designados. Dara lucros sem participar é deprimente.

O que a maioria das empresas não entende neste mundo moderno e menos submisso, é que assalariados  comissão caem no lugar comum de fazer apenas o essencial. Não raro vêm erros e não avisam porque acham que não vale a pena. Quando muito podem ganhar um pequeno aumento de salário. Uma meia dúzia consegue atingir postos mais elevados na empresa e até alcançar postos de diretoria ou de gerência, mas sem participação nos lucros, podem transformar-se numa dor de cabeça: subtrair lucros. Numa empresa em que trabalhei, e depois que saí, soube que um certo sujeito tinha alcançado a presidência da companhia. Essa companhia era apenas a maior do mundo em seu ramo. Estranhei essa pessoa ter atingido tal posição, mas cerca de dois anos depois veio a notícia que foi preso – parece que ainda está preso – por ter lesado seus patrões, um grupo de advogados, em milhões de dólares.


Em termos de gerencia de empresas, fazer inimigos pode animar o ego de qualquer gerente, mas para a companhia, isso não é bom. Que o diga a CIA ao contratar Ossama Bin Laden para seu corpo de operações. Bin Laden, insatisfeito, foi realmente uma tremenda dor de cabeça, e os EUA gastaram bilhões de dólares, talvez trilhões e ainda gastam a pesar de já estar morto. A Al Qaeeda continua em operação. Aqui no Brasil, as empresas de gerenciamento de construção praticamente acabaram. Parece que, ou não estavam capacitadas, ou se aproveitaram da ignorância de seus contratantes e clientes.
Em termos de gerenciamento de construção qualquer negociação é melhor do que um litigio, ainda mais no Brasil onde se sabe que a lisura da lei nem sempre está do lado certo... Mas para negociar, é preciso ter um conhecimento que raramente alguém tem neste mundo. Contam-se pelos dedos os expert em Reclamações (claims), do tipo que consegue encontrar não apenas cabelos em ovos, mas uma cabeleira...

E quando vemos obras do PAC no que se refere por exemplo à construção de Estádios e da transposição do rio São Francisco, sendo aumentadas por reclamação das empreiteiras, e porque os projetos estavam deficientes, dá para notar que há mais do que erro em projetos... Muito mais!


Um bom  negociador não avalia apenas o que está sendo negociado, mas suas implicações no futuro. 

© Rui Rodrigues
Engenheiro Civil


Curso de Claims pela Morrison Knudsen Int. Co. 

domingo, 5 de janeiro de 2014

O Poço dos Dragões



O poço dos Dragões.


Aos seis anos, meu pai foi-se embora. Deixou-me algumas recomendações em particular. Emigrou para o Brasil. Meu tio Miguel cumpriu bem a missão de acabar de me mostrar o que é ser homem. Quando eu me machucava, ou ralava os joelhos, ele me dizia o mesmo que meu pai: - Porque choras? Não é tão grave assim. Há desgraças muito maiores. E afinal, és o quê? Um homem ou um bicho? Logo percebi também que nossa dor não pode ser nunca proporcional ao mal que recebemos. Ela se limita à potência de nossa voz. Até certo ponto do estrago podemos compensar a dor com o grito e o choro, mas para lá desse limite, o estrago sempre ganha, e nosso choro e nossos gritos são incapazes de dar-lhe a dimensão da catástrofe... É nestas horas que mulheres choram baixinho, e os homens se conformam.


Então descobri o poço. É escuro, apertado, não tem escadas nem de corda, e é muito profundo. Entra-se nele de forma processual e sai-se dele da mesma forma, vencendo o processo. Beco sem saída nem é referência para um poço destes, porque lá no fundo existem dragões. São de vários tipos os dragões: Uns cospem fogo, outros são répteis de muitas patas, outros parecem morcegos alados, todos peçonhentos, mas não nos mordem o corpo. Só mordem, roem, amassam os nossos pensamentos quando estes sentem o impacto dos estragos que provocaram os temores e depois o medo. Por vezes nem passamos pela fase dos temores. O medo pode aparecer de repente.

Choro é medo. Medo provoca choro. Não podemos ter medo.

Assim cresci sem medos, porque os medos tolhem, e aprendi que se dermos atenção aos temores, mais do que eles merecem, logo se transformarão em medos. Avaliar os temores significa raciocinar sobre como eliminar as causas que os provocam. E ao raciocinarmos, encontramos soluções. E com s soluções, podemos ser felizes. Mais felizes, sem temores, sem medos. A felicidade está sempre em nossa bagagem de soluções para os temores e medos desta vida.

E é então, já com as soluções, que finalmente, em alguma fase de nossa vida percebemos que nunca houve poço, que os dragões são fantasmas inócuos, que se desfazem num mar de soluções. Por vezes pedi ajuda, que me dessem soluções. Raramente funcionou quando eu era criança, porque adultos pensavam diferente, e os amigos nem sempre tinham melhores soluções do que eu.  Então aprendi a “imaginar” que problemas poderiam advir de minhas atitudes, e mais tarde, na Universidade e mais tarde ainda em minha carreira profissional, a procurar as soluções mais efetivas e simples, sempre de olho nos problemas que poderiam causar. Tudo nesta vida é como descer num rio de soluções que de repente se vê abrir uma porção de braços de rio, como num delta, e só um deles nos leva á melhor solução. Quando o rio desagua no mar, sem braços de rio, há apenas uma solução que pode até não ser solução, mas que temos que enfrentar para ganhar o mar. Chegando ao mar pensaremos o que fazer. 

Minha vida foi e é muito equilibrada, sem doenças, sem “graves” problemas, sem desastres, sem acidentes, e não dispendo nem 1 erg (uma medida de energia) para pensar em cuidados. Toda a minha vida foi preparada para isso e se transformou numa pequena parte de meu cérebro, numa rotina fácil, que nem incomoda. Escuto por vezes conselhos para fazer isto ou aquilo, de uma forma diferente daquela que estou fazendo, mas quem me aconselha não pode imaginar o futuro que previ para várias hipóteses de soluções. E explicar, por vezes nem é conveniente, nem importante. Pode até ser nefasto, porque nunca sabemos como seremos interpretados, nem se somos capazes de explicar em todos os detalhes, espalhados pelo presente e pelo futuro, de nossas soluções e consequências.


Como disse os poços de dragão não são reais. São apenas consequência de nossos temores, de nossos medos. Mas uma vez visualizados, são terríveis. Dragões surgem com suas bocas enormes cuspindo fogo, fica difícil pensar em soluções se estamos de tal forma acossados, mas nossa postura é muito importante nessas horas. Podemos acovardar-nos e ficarmos encostados no fundo, sentados contra a parede, as mãos protegendo a cabeça, o rosto abaixado, ou ficarmos de pé, tentando desviar-nos das labaredas. Acabaremos por perceber que temos tudo o que precisamos para encontrar as soluções e que os dragões na verdade nem nos queimam.  

É a postura na vida que nos abre os caminhos para um futuro feliz. A “quantidade” de felicidade passa a ser um detalhe, e com um pouco de imaginação podemos concluir que a ausência de infelicidade não é algo neutro: É pura felicidade. Quanto nos custa? Ora, cada um tem um preço para a sua felicidade.

Felicidade é sempre grátis, não importa quanto paguemos por ela.


© Rui Rodrigues



sábado, 4 de janeiro de 2014

Das religiões



Das religiões


Quando comecei a construir minhas casas no Condomínio vi alguns carros depredados nas ruas mais afastadas, junto à reserva. Disseram-me para ter cuidado porque havia bandidos atuando na área e assaltando turistas. Depois disso, e ao longo dos dez anos até agora, foram várias as oportunidades em que bandidos apareceram para assaltar turistas e invadir casas cujos donos aparecem apenas em fins de semana esporádicos ou nas grandes festas como as de natal, Ano Novo, Carnaval, Páscoa. 
Notícias correntes na área dão conta de que todos já morreram. Só um deles foi preso.
Sempre reclamamos muito sobre a falta de atenção da polícia para a segurança do loteamento, mas não podemos esperar muito das autoridades, porque a instalação de energia elétrica sempre foi uma dificuldade, as ruas não são pavimentadas, não temos redes de água potável, de águas pluviais nem de esgotos. Para a prefeitura de Cabo Frio nem existimos, a não ser para nos cobrarem impostos e aprovação de projetos a maioria das vezes com caras “mais valias”. Onde está o erro?
O erro dos bandidos é imaginar que nunca serão apanhados, o da Prefeitura que ninguém do loteamento lhe moverá ação e se mover, a lei estará do lado da Prefeitura para empurrar o processo por tantos anos quantos sejam necessários.
Pensei em pedir ajuda a Deus, mas me ocorreu a dúvida de sempre: Será que Deus escuta esse tipo de pedidos, isto é, afastar bandidos do lugar e obrigar a Prefeitura a cuidar deste loteamento como deveria? Afinal, não pude vender nenhuma das casas que construí porque os possíveis compradores desanimaram pela falta total de infraestruturas. Pedidos constantes á prefeitura, tudo devidamente registrado não produziram efeito até hoje, nenhuma correspondência ou despacho ou satisfação dos Prefeitos.
Foi pensando nisto que fui até a praia com meu puçá para caçar alguns siris distraídos.
Foi-me impossível deixar de traçar um paralelo entre os siris e os prefeitos que já passaram pela prefeitura ao longo destes dez anos, porque logo que me vêm, os siris se enterram na areia tentando passar despercebidos.
Quando já tinha caminhado uns quinhentos metros sem ver sequer um siri, comecei a notar um vento mais frio e o céu mais escuro. Estava cheio de nuvens negras que avançavam rapidamente. Eu não escaparia da chuva. Iniciei meu caminho de volta os primeiros pingos grossos começando a cair. Molhado por molhado, resolvi parar e olhar a tempestade. Não deixava de ser linda a fúria da natureza, e um banho de chuva tem sempre o seu valor.
Como costumo fazer, abri meus braços, levantei a cabeça para o céu e fechei os olhos sentido toda a natureza envolvendo meu corpo. E ouvi então, como já estava ficando acostumado:
- Já ouviste dizerem, e já o disseste muitas vezes, que errar é humano. Claro que é. É uma verdade absoluta, sendo verdades absolutas aquelas que jamais mudarão, não importa quanto tempo possa decorrer, mesmo sendo infinito. Outra verdade absoluta é que este Universo sempre existirá. Outra ainda, que o Sol um dia se transformará de tal modo que não poderá proporcionar mais a vida neste planeta que habitas. Por isso a importância que devem dar ao desenvolvimento da ciência espacial. 
- Sendo tantas as preocupações da vida inteligente, assim a humanidade vem dando mais importância a umas coisas do que a outras. Assim, neste exato momento, a humanidade dá muita importância às religiões, aos jogos de futebol, aos relacionamentos de homens e mulheres, à moda e à aparência pessoais, e em caso de necessidades específicas ao que lhes falta. Como não sentem diretamente a necessidade – ainda – de um maior desenvolvimento das ciências espaciais, não pensam nelas: usam o dinheiro suado do povo para guerras, propagandas dos governos para dizerem que tudo está bem e progredindo.Isso lhes dá poder, dinheiro, boa vida, mas tudo é temporário. 
- Se olharem para trás, verão que até o momento, sempre houve uma fortíssima componente de preocupação de base religiosa, sacerdotes impondo a sua moral e de modo geral colocando a ciência como antagônica da religião, o que é um erro, porque sem ciência não há desenvolvimento e sacerdotes não são os mais indicados para discutir sobre a ciência por falta de estudos e conhecimento. 
- E olhando para trás, o que se pode constatar quanto ás religiões? Que simplesmente se fortaleceram em seus bastiões de credulidade, mantendo-se irredutíveis em seus conceitos que nunca são revistos para corrigir os erros humanos que as conceberam no passado distante, como se fossem verdades absolutas. A humanidade vai percebendo os erros, constatando a irredutibilidade na conservação desses erros pelos religiosos e vai se afastando delas. Não percebem os religiosos, de tão confortáveis que se sentem apoiados pelo estado, que deveriam sempre mudar para se atualizarem e ficarem sempre á frente da humanidade e não sendo corrigidos por ela, porque já é impossível esconder os erros...
- Há um muro numa cidade irlandesa dividindo cristãos de outros cristãos, e nenhum dos dois lados do muro está certo. Nem o muro. O mundo está cheio de muros. Está tudo errado por lá, assim como no mundo em geral. Cada religião quer que seu entendimento de “Deus” seja o melhor, o mais perfeito, e que Deus tem a sua preferência. Ora isto não é verdade. Deus, Eu, dos Universos, não posso ter preferência por um dos universos em detrimento dos outros. Não posso – porque não quero e assim tem que ser - abandonar um só grão de minha obra, assim como uma boa mãe ou um bom pai não dá preferência a um dos seus filhos ou filhas. 
- Zaratustra percebeu a existência de um Deus único – não foi apenas ele – mas o imaginou com muitos defeitos humanos. Os maias e Incas adoravam o sol e arrancavam corações humanos para aplacar a sua ira, como se o Sol, estrela ardente, permeada de explosões nucleares, pudesse exigir alguma coisa. Os egípcios embalsamavam seus corpos para que pudessem viver uma vida no além, como se o além fosse uma continuação da vida e fosse necessário preservar os corpos – só na aparência. Nunca se perguntaram, ao largar os pratos com comida para se alimentar no além, se não seria necessário também embalsamar os alimentos e manter os órgãos internos dos mortos para digeri-los. O povo inerte, absorto em seus pensamentos sem conhecimento, foi aceitando as predicas dos sacerdotes por medo e por esperança, enquanto estes se enchiam de ouro e bens doados pelos faraós e pelo povo. Estes exemplos são válidos nos dias de hoje. Mas quando o povo começa a perceber que vive num logro, a religião acaba. Subsistem aquelas para as quais o povo ainda não teve o conhecimento necessário para entender o logro. Acaso eu, Omo Deus, não teria o poder de vir ao mundo, e falando do céu, pairando nele, falar a todo o planeta o que quero, e como quero e quando quero? Todos sabem que sim, mas não raciocinam, e se deixam levar pelas falas dos sacerdotes porque os atemorizam com o inferno e lhes dão a esperança do céu se fizerem o que eles mandam. Então, quando aparecem as doenças venéreas, dizem para não usar preservativos, sabendo que como parte da vida existe o sexo que dá prazer, assim como o vinho. Não é para exagerar, mas para usar com decência tudo o que no mundo está disponível e não faz mal á saúde, porque o que atenta contra a saúde, atenta contra a vida que deve ser preservada, porque eu a dei ao Universo. 

Ouvi um latido vindo em minha direção. Era o cachorro meu amigo, o Oreba, que conseguira esgueirar-se pelo portão que eu deixara mal fechado. Veio com as patas no meu peito, correu à minha volta, latiu, riu, e parou de repente, sentando-se á minha frente e olhando para mim, a língua pendente em respiração agitada e alegre.
Oreba tinha uma boa vida, livre de preocupações, comida e água á vontade. Era feliz comigo e eu feliz com ele.
Se toda a humanidade fosse feliz comigo, eu seria feliz com ela, mas ela só pode ser feliz comigo se eu for feliz com ela. 
Cheguei encharcado em casa.

Era o décimo  dia, e a décima vez que me acontecia.  


₢ Rui Rodrigues