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domingo, 12 de outubro de 2014

A tensão da vida moderna e os programas da TV pública.

A tensão da vida moderna e os programas da TV pública.


(Só para você... Que já nasceu na era da Televisão e das telecomunicações...)



Antigamente não havia nada do que dispomos hoje nesse campo da inventiva humana. Só se conhecia o rádio e o telégrafo. Quando quis falar com meu pai desde Lisboa até o Rio de Janeiro, na década de 50, onde ele estava, fui até o edifício da Marconi com meus tios e falei de lá. Eu tinha sete anos. Só cerca de cinco anos depois a TV estaria ao dispor de meia dúzia de portugueses e mesmo assim só funcionava em cerca de um terço do dia: De cerca das seis horas da tarde até a meia noite. Tudo a preto e branco. Já em 1962 ouvi as transmissões da Copa do Mundo no Chile, logo aqui ao lado, por rádio. Tínhamos TV, mas não havia como transmitir em direto. Os lances do jogo víamos através do Canal-100, uma empresa que transportava curtas-metragens com os principais fatos ao redor do mundo e os “publicava” um pouco antes do inicio dos filmes nos cinemas do Brasil. O mundo andava mais devagar, as comunicações eram lentas, e os locutores punham ênfase exagerada em suas transmissões para “botar pilha” na moçada e atrair a preferência da audição para as suas respectivas emissoras. Sobretudo gritavam muito. Nossa adrenalina atingia níveis extremos através de nosso canal auditivo. Já na década de 70 era comum andar pela rua com um rádio colado à orelha preferencialmente para ouvir música. Outros tempos... Era necessário “botar pilha” para dar a emoção – exagerada- que os patrocinadores aconselhavam, e a ausência de imagem exigia para parecer “ao vivo” transmitindo para uma multidão de “cegos”... E muito pior, quando nos botam pilha dizendo uma coisa e nós vendo outra...



Mas algo ficou. Fausto Silva, o Faustão, é dessa época, ou parece ser e não evolui nada. Ele bota pilha pelos ouvidos de formas exageradas, cansativas, irritantes. Silvio Santos, que é mais idoso que o Faustão, muito mais, consegue ser bem mais moderno: A pilha está na ação a que assistimos em seus programas, e sua voz é pausada, calma, relaxante, embora ele mesmo faça parte do programa. Experimente assistir e comparar se ainda não o fizeram... A “pilha” está na ação e cada um de nós bota a pilha que quiser, sozinho ou acompanhado em sua casa, no bar, onde quer que o assista. Claro que quem não gosta não assiste e para isso basta dar um “clique”, mas há muitos lugares no Brasil onde o único canal com sinal disponível é o da emissora à qual o Faustão “pertence”. E não é só o Faustão que grita de forma exagerada, abusa da entonação vocal e “bota pilha” como vendedor de baba da cobra na Treze de Maio ou na Saara do Rio de Janeiro... Os que transmitem jogos de futebol ou qualquer esporte pela TV botam pilha de forma indiscriminada. Os lances podem não ser excitantes, o jogo pode estar quase parado, mas lá estão eles gritando, botando pilha, irritando a ponto de nos obrigar a dar um clique para acabarmos com aquela poluição auditiva. E eu dou sempre que me sinto irritado pela transmissão.  A propaganda segue o padrão com fundos musicais “excitantes”, pesadamente sonoros, como hinos nacionais tocados em meio a batalha sangrenta.

Num mundo cada vez mais agitado que nos gera tensões a cada instante, ou os senhores que estão á frente das programações dos canais de TV pública aprendem a geri-los de acordo com a vida moderna, ou estarão fadados à queda de audiência, à ineficiência das propagandas. A NET dá alternativas de escolha que a TV pública não dá. A juventude está se afastando da TV e eu sou um jovem de 70 anos...

Se desejar ver programas engraçados que não “invadam” agressivamente a sua opção sexual, religiosa, ou política, assista o “Chaves” no SBT ou” a Praça é Nossa”. Zorra Total é apenas para um público muito em especial, assim como a maioria das novelas, uma poluição visual herdada ainda dos tempos do rádio em que se precisava de “pilhas”. Hoje cada um bota a pilha que quer mesmo que dure menos.  


® Rui Rodrigues

sábado, 11 de outubro de 2014

Aécio 45 em 2014





Esta nossa vida é curta para algumas coisas e muito longa para outras...



Depende de nossa ambição...





Quando em Cubatão eu ia com meu amigo Mauro abrir as portas de lojas para que Lula pudesse discursar em sua campanha, e face à repressão, eu disse a um grupo da comitiva que o esperava: - Mas se eles nos reprimem a palavra, então devemos também reprimi-los...

E umas senhoras que hoje talvez reconheça me responderam que Lula não queria a violência. Queria o poder e devagar chegaria lá... Já abandonei o PT há pelo menos uns oito anos...



Se alguém pensar algum dia em impor ou instalar um regime comunista no Brasil, sua vida lhe parecerá muito curta... O povo brasileiro quer justiça social mas não quer que lhe tapem a boca ou impeçam de votar como em Cuba... Da mesma forma a vida de Lula lhe pareceu muito curta quando percebeu o mesmo: Comunismo por aqui, é quase – se não impossível – de instalar, instaurar ou impor! Somos um povo livre abençoado por Deus, quer exista ou não...



E apressado, indicou para presidente uma ex-terrorista, filhinha de papais dos anos sessenta, que estava no movimento revolucionário porque “era bonito e contestador” de uma sociedade elitista dos méritos de cada um e não das “vontades” de cada um ou de cada uma!... Uma deslumbrada sem o mínimo valor em nada.


Por isso, senhor futuro presidente Aécio Neves, o estamos elegendo...



Nunca se esqueça das liberdades brasileiras, assim como a do hino nacional, nem das justiças sociais de verdade e não de promessas como as de um Lula desvairado, da aplicação das leis e das penas que devem obrigar à reposição do valor roubado acrescido de perdas e danos: Um Brasil para pobres, remediados e ricos. Que os ricos não exagerem e aos pobres nada lhes falte. O que temos que acabar de vez é com a miséria, porque pobres há em todo mundo e com a corrupção que produz ricos sem mérito e miseráveis sem razão.



Não se esqueça nunca! Somos um povo, uma nação e não um bando de aventureiros com sede em Cuba.





® Rui Rodrigues

sexta-feira, 3 de outubro de 2014

As eleições de 2014

As eleições de 2014



O mesmo filme contado por diferentes pessoas, não será o resumo do filme tal como idealizado pela equipe de filmagem... E no caso de filmes baseados em livros, não será certamente o resumo do livro tal como “realmente” foi idealizado pelo escritor. Somos todos diferentes geneticamente desde a nascença, e continuamos a ser diferentes pela educação e pelo meio em que vivemos. No entanto, perante a lei, deveríamos ser todos iguais. Não somos. Uns têm dinheiro para pagar bons advogados e por sorte ou por outros meios, ter um complacente juiz no dia do julgamento, e outros não. Em termos de política, não temos políticos credíveis pugnando por um posto nos altos escalões da política nacional porque o próprio sistema está em “cheque” à beira do “cheque-mate”. O sistema está corroído, contaminado pela corrupção em todos os partidos, e há partidos que há décadas não têm mais do que um por cento das preferências da população e continuamos pagando-lhes verbas para propaganda e manutenção desses partidos, mesmo sabendo que nem com ajuda “divina” um dia terão a preferência de parcela realmente “representativa”. É dinheiro desperdiçado e não é pouco!

Apaixonado que sou pela Democracia Participativa Socratiana [1]- tenho uma palavra a dizer, e embora “democraticamente” me escutem não me dão a mínima importância. Nem a mim, nem a milhões como eu e já somos muitos... – não tenho nenhum partido que me represente. Nem a mim, nem a esses. Portanto, não voto. Seria como ter que votar em sete diabos e me ver obrigado a escolher o diabo “menos ruim”. Diabo é sempre diabo.  Prefiro perder meus “direitos” a votar neles. Esperarei pela completa, total e verdadeira democracia sem intermediários.

Hoje é sexta-feira e domingo haverá votação para eleger, dentre outros contumazes políticos que fazem desta obrigação social um emprego vitalício, altamente rendoso, o presidente da República Federativa do Brasil de bandeira amada verde, amarela, branca e azul. O povo , esse, anda vermelho de raiva, alguns com a esperança verde corrompida pela falsa noção vermelha de um esquerdismo que jaz moribundo por todo o planeta. Por aqui, a esperança é vermelha, mas a vermelhidão que acabou nos demais países ocorreu por falência múltipla dos órgãos por falta de condições para lidar com o capital, tão necessário até para os países mais comunistas do planeta e que atualmente são apenas dois que nem vale a pena nomear por falta de representatividade mundial.

Com o povo vermelho de raiva e a presidente atual com uma rejeição histórica das mais elevadas, sendo vaiada onde quer que vá, o país nos últimos lugares em tudo menos no voleibol, por enquanto também no futebol e nos primeiros lugares de falta de segurança, falta de educação, falta de saneamento básico, de excesso de corrupção... Bandidos andam à solta desde as ruas até os palácios, invadiram a jurisprudência, comandam das prisões.

Com este panorama, vemos três candidatos potenciais ao palácio do planalto, uns quatro que não têm representatividade alguma e  uma candidata do RGS que parece saída de um centro comunista da KGB, cheia de respostas explosivas mas sem cultura alguma, agindo na base da “ignorância”, um fogo de artifício político adquirido das “bases” sessentistas da política internacional da velha, falida e extinta URSS.

Os três candidatos são Dilma Rousseff, uma ex-terrorista de codinome Vanda, uma militante que militou no mesmo partido de Dilma de nome Marina Silva, e um neto de um grande político que não faz dele um político grande: Aécio Neves.

Dilma aprendeu “política de guerrilha” na mesma escola da candidata grosseira, esposa de político do RGS: A cozinha, onde eram governantas e alcovitavam sobre a forma de tomar dos patrões um pouco mais do que lhes davam, sabendo perfeitamente que se chegassem algum dia a ser patroas, tratariam os seus empregados da cozinha de igual forma que estavam sendo tratados pelos patrões. Ainda nas cavernas há bilhões de anos, os seres humanos já se dividiam entre os que iam à caça, os que esperavam a caça chegar e eram servidos primeiro por que tinham “mais força” e eram chefes, e os que cuidavam do harém de fêmeas dos chefes (do político e do religioso) e eram servidos depois, submetendo-se aos primeiros. Sonhar com mundo diferente deste, é sonhar com uma nave espacial que colonize um outro planeta e tudo comece diferente, porém com a certeza que, passados milhares de anos, prevalecerá o domínio de uns pelos outros. Basta olhar à nossa volta. Vemos algo diferente, depois de tantas promessas de “revolução”, das quais despontam a da Queda da Bastilha na França e a Revolução Bolchevique de 1917 na Rússia czarista. Não mudou nada. Se mudou foi na Suíça, na Suécia, na Noruega, na Dinamarca, na Islândia, mas nesses países a Democracia é Participativa e não Representativa. Desta forma, como as eleições terão lugar no domingo sob bases representativas, nada mudará... Vote-se em quem se votar.

Votaria em Aécio como o “menos ruim”... Mas nem nesse votarei... Não agüento participar de um “esquema” no qual me impingem para votar. O esquema tresanda de mau cheiro nas confrontações entre candidatos nas redes de televisão. Se não têm mais nada para mostrar, isso é muito pouco para um povo ávido de justiça de todos os tipos, incluindo a justiça social. Querem que mulher vote em mulher, gay em gays, nulidades em nulidades. Vão escolher errado por falta de opção correta (votamos em quem nos empurram para votarmos) e passarão mais quatro anos reclamando.

® Rui Rodrigues








[1] Ver em  http://conscienciademocrata.no.comunidades.net/

sexta-feira, 26 de setembro de 2014

Se pudéssemos ver o mundo que não veremos... Ou “minha galinha merece uma medalha de honra ao mérito”

Se pudéssemos ver o mundo que não veremos... Ou “minha galinha merece uma medalha de honra ao mérito”





Este mundo que vemos é produto da evolução e seleção naturais. Entenda-se como “natural” o que é produto apenas das leis da natureza e sua aparente aleatoriedade... O que vemos é um céu cheio de espaços aparentemente vazios palmilhado de astros. Uns raros caem sobre nós, a maioria esmagadora fica lá em cima rodando, girando, “voando” a velocidades fantásticas que não percebemos. Para nós parecem estar todos parados. Por “nós”, entenda-se toda a espécie viva de qualquer dos reinos da natureza, mesmo que aparentemente nos pareça não terem qualquer laivo de inteligência que possa competir com a nossa, a dos humanos. Talvez um dia se chegue à conclusão que “inteligência” é algo que ainda não entendemos muito bem e que os vírus são muito mais inteligentes do que os humanos. Estamos em plena guerra contra eles e pelo que parece, não estamos ganhando. O Ebola é um exemplo e há muitos mais exemplos.




Um dia morreremos e deixaremos de “ver” este mundo, mas ele continuará evoluindo, espécies mais adaptáveis às transformações do ambiente proliferarão mais do que outras, novas espécies surgirão e outras serão extintas ou se extinguirão por falta de condições de adaptabilidade ao meio. Mas...

... Mas se pudéssemos ressuscitar daqui a um milhão de anos, talvez desejássemos voltar para a cova: O planeta Terra ficará irreconhecível, o comportamento humano será muito diferente, os valores sociais, morais, a moda, os hábitos, nosso próprio corpo sofrerá alterações significativas principalmente devido ao uso de “partes” físicas a que hoje chamamos “próteses” para dar a nosso corpo capacidades extras que naturalmente não conseguimos obter. Por outro lado, as modificações genéticas que já iniciamos em vegetais e animais não são fruto de uma “evolução natural”, mas de nossas próprias necessidades. Um ou outro gene escapa para a natureza e de repente nos iremos deparar com novas espécies transgênicas desenvolvidas (agora já naturalmente a partir de alterações que induzimos e que fugiram ao nosso controle) que surgirão da noite para o dia. Passaremos a estudá-las, a reaproveitar seus genes para novas alterações genéticas... E alguns desses genes nos atingirão. Poderemos passar a ser uma espécie “azulada”, esverdeada ou amarelada.




Minha galinha – tanto quanto parece – não tem genes alterados. É uma no meio de quatro que comprei como sendo “caipiras”, e que se juntaram a outras duas e a um galo que eu já tinha. Uma fugiu! Nunca vi galinha voar, mas estas quatro caipiras voavam – literalmente voavam – pulando muros de mais de três metros de altura. Tive que lhes cortar as asas. No segundo mês era-me fácil recolher dois a três ovos por dia, depois escassearam... Vi que comiam os ovos, menos uma, a única branquinha do lote das quatro novas. Quando certo dia a vi deitada no chão por bom tempo, e no dia seguinte também, percebi que estava chocando ovos. Chocava apenas dois ovos. Apanhei então mais cinco ovos dos que havia guardado, e coloquei-os no ninho improvisado. Por umas duas vezes a ouvi gritar: As outras galinhas tentavam comer-lhe os ovos, seus filhotes. Separei então as galinhas. Certa noite veio o gambá por uma fenda na malha de cobertura do galinheiro. Eu tomei conhecimento quando a meio da noite ouvi seu grito lancinante que parecia de gente. Era um grito de dor, mas não apenas de dor. Era um apelo a um “deus”, á natureza, a algo para que a salvasse da morte... Ela tinha uma missão a cumprir e essa missão estava sendo interrompida pela nulidade da inexistência antecipada. Era um pedido de socorro. Levantei-me desperto a meio da noite e abati o gambá. Lamento até hoje a morte prematura do gambá, mas não tive alternativa. A galinha era minha amiga, o gambá um simpático intruso que sempre via passar em cima do muro, tranqüilamente, que vinha comer os restos de frutas que eu lhe deixava. A ele e a seus parentes que vivem algures no condomínio e que nunca procurei saber onde!

Naquela noite, sete dias atrás, o gambá a mordeu de morte. Tem uma mancha sanguinolenta do lado. Está seriamente ferida. Não sei onde arranjou forças, mas se alimenta, bebe água e impressionantemente continuou chocando seus sete ovos. Vi que o gambá estava comendo um ovo quando o abati. Então, ela não só estava chocando os ovos que pusera, como os que coloquei  e mais alguns que as outras galinhas haviam posto antes que as apartasse.

É esta maternidade da natureza que me impressiona e admiro: Nenhuma mãe tem filho feio, nenhum pai se incomoda em criar filhos de genes alheios. Mãe ou pai que se incomodam com genes alheios não são da natureza embora pertençam a ela... São natureza desnaturada.

E se pudéssemos ressuscitar daqui a um milhão de anos, veríamos que “nosso” planeta estará deveras diferenciado. Sinto, porém, que o termo “nosso” está completamente equivocado. O planeta não é nosso, não nos pertence... Nós é que lhe pertencemos enquanto vivemos. E para lhe pertencermos de fato é necessário senti-lo. Quem vive alheio ao meio em que habita não pertence a nada. É um monte de sentimentos desperdiçados. Minha galinha merece uma medalha de honra ao mérito. 

PS- Quase 15 dias decorridos desde que foi mordida pelo gambá, a galinha continua chocando os ovos. Não me atrevi a verificar como está a sua ferida. Não deve ter sido letal e provavelmente ela se irá recuperar. 



® Rui Rodrigues

segunda-feira, 15 de setembro de 2014

Trem Noturno para Paris.

Trem Noturno para Paris.


I - Em algum dos dias de Junho de 1991.




Collor tinha sido eleito presidente do Brasil. Eu havia trabalhado para uma empresa de Consultoria e tinha notícias fidedignas de sua ânsia pelo poder e principalmente pelo dinheiro, além de um comportamento muito próximo dos sintomas de bipolaridade, quase loucura patogênica, meio “hitleristica”. Como previ um desastre na economia, resolvi voltar à “terrinha” para manter minha decência profissional. Com emprego já garantido em Lisboa, resolvi gastar os últimos tostões disponíveis para visitar um amigo de longa data, Jaime Irigoyen, de nacionalidade chilena que estava trabalhando em Madrid para uma empresa inglesa gerenciadora de uma famosa obra de dois prédios inclinados: Altos custos e desperdício de área de construção em favor de uma beleza inusitada e “estranha” feita para impressionar e compensar o fato de que entre os dois prédios passava uma “rua” subterrânea. Como engenheiro só penso como pensam os arquitetos quando tenho necessidade de entendê-los. 




Portanto, fui até a estação de Caminhos de Ferro de Santa Apolônia e peguei o primeiro trem para Madrid. Ainda era dia. Quando passamos pelo Castelo de Almourol em pleno rio Tejo, já a loura no banco em frente ao meu esticava suas pernas sobre os meus joelhos como se estivesse “distraída”, mas eu não estava atrás de aventuras. Quem sabe, talvez eu conseguisse emprego na empresa onde trabalhava o amigo chileno? Precisava estar “focado”, sem compromissos com a loura. Além do mais, não existem ainda “camisinhas” para relacionamentos seguros em trens europeus: Você pode acordar em algum lugar desconhecido sem carteira, nu até a alma. E para completar a imagem, eu era casado do tipo “não desesperado”... Em breve minha família estaria comigo em Lisboa. Por isso, tentei dormir, e quando percebi que os olhos da loura se entreabriram procurando ver se eu já estava dormindo, encontraram-nos semi-abertos justamente quando o trem parava numa estação para recolher passageiros. O que meus olhos viram eram soldados da primeira guerra mundial. Milhares deles, portugueses, embarcando para a Flandres. Provavelmente a estação era em Elvas, quase na fronteira com a Espanha. Da cintura dos soldados pendiam máscaras antigás. Desses soldados portugueses cerca de 2.200 morreriam e outros tantos ficariam abalados física ou moralmente para todo o resto de suas vidas. Quase o contingente inteiro! Serviram de carne de canhão para generais burros tradicionais engordados na paz para justificarem verbas de guerra. Como não entendiam nada de estratégias, ficaram se guerreando em nome de “propagandas” fabricadas que justificavam a guerra para ambos os lados opostos das trincheiras. A linha Maginot não funcionou. Nada funcionou para ambos os lados, até que chegasse a salvação das Américas. Ainda hoje esses generais são considerados como heróis... Pobre imaginação nacionalista!... Enquanto forem considerados heróis serão copiados e nada mudará, por que os generais que na paz atacam as populações para “controlá-las” como se fossem escravas ou galinhas de “granja produtiva”, são os mesmos que declaram as guerras: Ministérios da Defesa que se transformam em Ministérios de Ataque! Ganha quem tiver as melhores forças treinadas, a melhor tecnologia, e nem sempre vence quem merece, até porque ninguém merece numa guerra. Vivemos num mundo completamente equivocado, fruto de tradições, nacionalismos, esperanças vãs.





II – Depois da meia-noite do primeiro dia de alguns dos dias de Junho de 1991.





A Loura, agora que acordei sobressaltado com a parada repentina do trem que ia para Madrid – ou seria Paris? – acenou com a cabeça para mim, no trocar de olhares com um sujeito estranho de pele cor de azeitona. Dos passageiros, alguns eram nitidamente turistas, mas outros eram ou soldados à paisana ou espiões ocidentais, de chapéu negro ou marrom enterrado na cabeça até quase tapar os olhos, gabardine cinza, negra ou bege, rostos patibulares que não denotavam emoção. Estávamos certamente já em terras de Espanha e Francisco Franco recebera ajuda de Hitler para sufocar e exterminar os contrários ao seu regime de ditador espanhol. Ele não deixava passar pela Espanha – neutra na segunda guerra mundial – soldados ocidentais destinados a combater as forças de seu amigo Hitler. Empresas são como países em guerra. Há de tudo nelas, desde soldados a policiais, alguns da “secreta”, espionagem e contra-espionagem. Alguns chegam a propor ou idiotices para que o antagonista perca o posto, ou absurdos corruptos para que o antagonista perca o seu emprego. Estava sem sapatos, a calcinha branca aparecia sob a aba do casaco de veludo aberto estrategicamente. Sempre desconfiei, até nos empregos que tive, de tudo o que me davam de “mão beijada”, a troco de aparentemente nada. Nos trens europeus também. Nos sul-americanos nem ando. Por aqui se acha que trem é... Isto é... Acha-se que trem não serve para nada, apenas e quando muito para transportar gado humano e safras interestaduais de gente rica. Não admira, pois, que entra governo, sai governo, se tenha a esperança de que o comunismo ou o socialismo comunizado pareça a solução salvadora dos que se sacodem ou simplesmente nada podem: Nas eleições votam sempre na esperança, o futuro lhes traz sempre mais do mesmo, mudando apenas as cores das falas, o tom da indignação e da esperança partidária eleitoreira. Para mim estava claro que a loura tinha seu próprio negócio e sócios, um deles com pele cor de azeitona e que viajava no trem, e que a mercadoria seria eu mesmo. Fingi não ver seu sorriso de boas vindas porque estava chegando a Paris e os passageiros se preparavam para desembarcar. Já estavam todos uniformizados com uniformes de guerra americanos, ingleses, franceses... Na gare, mulheres belas, perfumadas, os lábios pintados da mesma cor da vagina, os esperavam com beijos, o corpo tremendo com vontade de ser doado á Juventude. Os soldados tinham entre 18  e 25 anos. Grande parte da Juventude francesa havia perecido na longa guerra de 1939 a 1945. A libertação de Paris era um bom motivo para ter prazer com falos ávidos de vaginas nervosas, lábios nervosos. O que pode haver de melhor para uma mulher ávida senão um jovem cujo falo forte foi impedido de funcionar por dias de martírio sob fogo, tensão, adrenalina que queimava desde as pernas até o mais interno ponto de seus cérebros? Seria sexo contínuo para toda a noite e todo o dia seguinte, coisa que namorados e maridos nunca lhes deram. Para elas, esses eram os heróis, mas Não!!!.. Ouvi mulheres: Esses não eram os heróis. Os heróis morreram no campo de batalha abrindo caminho para a vitória dos vivos que agora chegavam para “libertar”... Humanidade que não aprende, porque aprender não é importante! Aprender parece mais ser uma desculpa. Dá-se valor ao que “interessa” dar valor e não ao que merece. Que mundo queremos nós – homens e mulheres - se nos escondemos da verdade para não nos confrontarmos com a nossa própria imbecilidade?




Quando recolhi minha bagagem do bagageiro sobre minha poltrona de segunda classe, do trem que ia para Madrid, não vi a loura. Desistira da mercadoria. Também a França desistira por várias vezes da Igualdade, Liberdade, Fraternidade até os dias de hoje, depois de guilhotinas, revoluções e guerras. O mundo todo desistiu disso. Até Jean Paul Sartre, um correspondente de guerra, que tinha uma mulher que foi para ele o que ela não queria ser. Simone de Beauvoir, o nome dela, das que apregoam “uma coisa” e fazem outra. Tal como Jean Paul que viveu a vida toda panfletando comunismos e socialismos e ao final da vida os negou mais de três vezes. E com razão! Ambos!...



Não cheguei a Paris dessa vez. Já tinha estado lá por diversas vezes e ainda a visitaria uma vez mais, dessa vez viajando num caminhão que ia buscar mercadorias no porto de Hamburgo. Era a terceira vez que iam buscar a mercadoria que nunca conseguiam retirar. Exercitei meu inglês americanizado e assenti um esporro violento no chefe do porto de Hamburgo apelando para sua incompetência. Naquele fim de tarde meu amigo Rui Lopes retirou a mercadoria, finalmente, depois de duas horas extras de trabalho de gente negra fazendo no porto o trabalho que gente branca não queria fazer: Hitler deixou herdeiros! Deixamos uma gorjeia porreta para os dois neguinhos como se fossem queridas gentes brasileiras, e recebemos dois sorrisos alegres de presente além da mercadoria. Guerras deveriam resolver-se com esporros!


® Rui Rodrigues. 

O Bruxo do Pontal do Peró. Será bruxo?

O Bruxo do Pontal do Peró. Será bruxo? 

Há dias que não parecem dias, em que os grãos de areia empurrados pelos fortes ventos competem por alvos invisíveis, formam dunas, encobrem esqueletos de peixes, aves e répteis, e formam rios de névoa de areia que agitam a praia como se estivesse viva... E é nestes dias em que não se avista vivalma que o bruxo do Pontal aparece, lê as areias, consulta as águas superiores e inferiores em que o mundo está dividido, e do cimo da rocha de onde tudo se vislumbra, se esclarece do porvir... Nada vem sem que o bruxo dele saiba. São falsos os que lêem em vísceras de peixes e animais, nos astros e em borras de café: Têm perfil, mas falta-lhes o conhecimento dos verdadeiros bruxos, das leis que movem o mundo e o Universo. Assim era Nostradamus, o que leu o porvir de tal forma que se interpreta como se quer desde que pareça fazer sentido. O bruxo do Pontal do Peró, não! Ele vê com o conhecimento pleno das ciências, dos subconscientes, dos inconscientes tanto do que é vivo, como do que parece inerte, morto, sem cadáveres.

E viu, num desses dias de fortes ventos que sempre chegam em céus claros de um só tom de azul, o rosto de um velho que não era do Restelo, mas de perto para onde iam as naus que ele, o velho do Restelo acautelava, que lhe mostrou os desenhos dos grãos de areia empurrados para formar dunas, agitar a praia, que se transformou em enorme tela de cinema colorido em cinemascope, como nos velhos anos sessenta do século passado: O velho, que não era do restelo falava como o vento forte, catalisando em sua voz as imagens das areias esvoaçantes:





- Houve tempos em que se definiram as fronteiras, de grandes e sangrentas lutas, em que a humanidade se tentou aniquilar movida por apenas um sentimento: Cada uma das nações que se formava queria prevalecer sobre as demais. Foi a época dos reis que depois se estendeu pela dos presidentes. Uma das nações conseguiu pela primeira e única vez na história dessa mesma humanidade, construir um Império onde o sol nunca se punha. Hoje é uma ilha dividida. Outras nações são ainda maiores e imperiosas pelo futuro. Da primeira nação imperialista ficou a língua, mas para a futura, nova língua de milhares de caracteres se imporá. Não pela força, não pelo derramamento de sangue humano, mas pela paciência. O perigo nunca foi o amarelo, mas a ambição dos homens que copiaram  a ambição dos tais reis e presidentes: Querer dominar outros homens e outras nações pela força dos braços, das armas ou do dinheiro com que se constroem enormes e influentes empresas que compram e vendem os reis, os presidentes, os homens e as nações. E nem só de homens se fazem as nações de hoje, mas de mulheres também, nos destinos do mundo. O mundo já não é o mesmo de ontem, nem do passado.  





(As  areias se agitaram ainda mais. Dunas que não existiam se viram crescer e engolfar as casas. O céu ficou branco. As águas do oceano recuaram mostrando o cadáver do fundo do mar. Uma chuva de cadáveres de aves mortas inundou a areia do novo deserto onde antes era a praia. Barcos naufragados que jaziam num fundo de mar agora exposto se oxidaram instantaneamente. As areias engoliam múmias secas e esqueletos de mamíferos que ainda há pouco viviam numa mata atlântica úmida e verdejante. Não havia corvos para comerem os olhos da vida morta)




- Este que vês é o futuro que não verás! Que importa a política, o comércio, a ambição, se este é o futuro? Seria o futuro diferente se a política, o comércio e a ambição mudassem? Claro que sim!... Mas são demasiado fortes os apelos imediatistas da política, do comércio e da ambição para que sejam alterados pela cegueira dos que detêm algum tipo de poder: Desejam perpetuá-lo! Só a humanidade em uníssono pode alterar esse estado de coisas, mas para um Universo governado por leis que a humanidade não pode controlar, apenas se podem protelar os efeitos, porque o fim será um único! Apenas um fim final e definitivo aguarda este planeta Terra: Será engolido por um Sol moribundo. Não sobrarão pedra sobre pedra, apenas grãos de areia, que, mal comparando, do templo de Salomão ainda sobraram algumas!





(O Sol era agora uma enorme bola vermelha que ocupava 90% de todos os horizontes. A Terra era um planeta sem vestígios de civilizações ou sequer de restos de vida. Um cantil sem tampa derretendo-se pelo calor do Sol avassalador em seu crescimento avermelhado lembrava a secura de um deserto que reinou por milênios e que agora nada mais era do que um pequeno e mísero detalhe de uma Terra completamente desértica.)

- A fartura gera desperdícios. Quem tem muito, desperdiça porque pode pagar os custos do desperdício. Quem não tem, nem pode desperdiçar. Se tivesse, também desperdiçaria. Quem quer impor pelo poder, impõe por pouco tempo até que outros ocupem o poder, mas cada um que ocupa o poder, destrói um pouco do Ambiente em que vive. As tradições mantêm o “status quo”. Não há Terras santas nem santificadas, porque servem aos negócios particulares de particulares. O grande Templo de Salomão, não era o Templo do qual sobrou pedra, mas a Terra da qual nada sobrará engolida pelo Sol. Humanidade despreparada pelo poder que se alimenta da ignorância não terá salvação, porque perecerá junto com o planeta sem meios de fugir para outro. Os Impérios que exilaram o povo do Templo de Salomão, não são os Impérios que exilarão a humanidade da face da terra, mas os novos Impérios da política, do comércio e da ambição. Portanto, vigiai, vós que sois humanidade e não sois tradição, porque há modo de sobreviver ao fim destes tempos e iniciar outros tempos em outros lugares do Universo, mas para isso há que pensar desde já no futuro. O tempo é curto, urge e não tem alternativas.




E o velho e o filme em cinemascope acabaram de repente, tão de repente quanto o vento forte e a corrida dos grãos de areia pela praia do Pontal do Peró. Ainda se ouviu a voz do velho numa última e definitiva frase:

- Corre e conta o que viste como o filho do Homem mandou que se apresentassem os que ganharam milagres, aos senhores do Templo, porque não sobrará grão sobre grão deste Templo de vida chamado Terra! Um outro velho do Restelo terá que aparecer para acautelar as naves que partirão para as novas Terras!

® Rui Rodrigues  

sexta-feira, 12 de setembro de 2014

O tecido das lembranças.

O tecido das lembranças.

Deve ser mesmo algum tipo de tecido, aquele em que guardamos nossas lembranças no mais recôndito de nosso cérebro. Por vezes nos lembramos de coisas de uma época, encadeadas ou não, em seqüência, relacionadas, ou soltas, sem nexo, recolhidas, catadas, aprofundadas num tema, ou simplesmente tão soltas como grãos de areia soprados pelo vento do deserto. Nenhuma tem cheiro. São apenas imagens coloridas ou a preto e branco, raras em três dimensões, muitas parecem filmes sem pretensão a Oscar. Os sons não se escutam, apenas se entendem e traduzem. Sentem-se! Nem sempre nos lembramos das melhores ou piores lembranças. Elas aparecem soltas, segundo uma falta de lógica que só Freud poderia explicar se fossem produto de algum tipo de demência sob análise, mas sendo produto apenas de reflexões do passado antes que ele passe do tecido das lembranças, não são causa de efeitos, mas apenas circunstâncias não relacionadas.



Nunca soube ao certo se alguém apertava um botão para ativar a campainha do recreio ou se eram automáticas. Nunca me preocupei se as aulas eram exatamente de cinqüenta minutos cravados ou se alguma vez demoraram mais ou menos. Eu não tinha relógio. Quando tive, preocupei-me em checar se meu relógio estava “certo” com os dos colégios por que passei, ou se faltava muito para a aula ou o tempo de recreio acabarem. Havia aulas que era uma pena terminarem, recreios que nunca deveriam terminar. A vida é assim, se as aulas forem substituídas por trabalho e o recreio por momentos de prazer e descanso. O tempo é nosso parceiro inconstante por mais apurado e constante que seja o nosso relógio. Com 30 anos de idade aposentei meus relógios. O tempo estava já incorporado em meu modo de ser, sabia que eu era seu escravo, mas não escravo do mecanismo de um relógio por mais fiel e caro que fosse. Aposentei também o anel e o cordão pendurado no pescoço. Há 14 anos que o único relógio que tenho está pendurado na parede da cozinha. O tempo é uma medida de dimensão da qual podemos prescindir. O tempo não deveria ter a mínima importância em nossas vidas. Toda a vida animal ou vegetal deste planeta prescinde de relógios e vive muito bem. Nunca vi uma galinha consultar um aparato desses para botar ovo, nem galo olhar para um relógio para soltar seu canto. Naquele dia não esperei ouvir a campainha gritante dar sinal para o fim da aula, que nem era a última do dia. Minha avó tinha passado mal durante a madrugada. Saí mais cedo do colégio e fui para casa. Ao chegar, o que ouvi foram choros. Ninguém precisava me dizer nada, mas me pediram para não entrar logo em casa. Disseram-me que ficasse no jardim e que voltasse em meia hora. Ela tinha acabado de falecer. Não me importei em pensar se me queriam poupar da cena, ou se haveria algum outro motivo. O que me importava naquele momento era que já não tinha avó. Naquela época do tempo, naquele lugar do mundo a que se chama Europa, os filhos não eram amados como hoje, nem os netos. Não era uma questão propriamente de amor, mas de forma de amar. Filhos e netos eram propriedades. Pais e avós tinham as suas propriedades vivas que preservavam. A vida, essa, continua sendo uma campainha que toca sem relógio ou cronômetro em qualquer reino animal ou vegetal. Tanto vem de repente, como se vai sem sequer tocar para avisar, independentemente de espírito, alma ou religião. Podemos, sob esse aspecto, sermos diferentes em qualquer circunstância, mas não perante a natureza. Aqueles meus onze anos se foram com o tempo. Nunca mais voltaram.



Pelos anos sessenta a juventude usava ternos, calças compridas e paletós, com camisa de gola rolê ou social com gravata ou lenço de seda. Em ocasiões especiais, um cravo branco ou vermelho na lapela. Vaidades para “dar a impressão”. Sextas feiras e sábados à tarde e á noite, eram dias de festa. Sempre havia uma. Naquele sábado ao entardecer numa vila em São Cristóvão minha prima fazia aniversário. Eram tempos em que os aniversariantes davam, isto é, pagavam a festa inteira. Os convidados davam presentes. Durante anos a fio ganhei coleções de colônia pós-barba da Bozzano. Cheguei a pensar em abrir uma loja especializada nesse tipo de presente, mas sempre os agradeci por pura educação como se fosse um grande presente. Também agradeci a meu pai o lindo cobertor que me deu de presente no dia do meu casamento. Deve ter tido algum significado oculto ao decidir que seria um cobertor que me daria de presente de casamento, mas nunca lhe perguntei nem tive vontade de perguntar, porque importante mesmo foi o meu casamento, os dois filhos que nele tiveram origem, e quanto a cobertores comprei muitos com meu próprio dinheiro. Não me lembro do presente que levei para minha prima, mas deve ter sido um perfume bom. Uma prima linda que casou com um cadete da Marinha, irmã de outra prima minha, igualmente linda que casou com um médico nissei que talvez não por acaso também era da marinha. Fui com meu terno azul claro, louco para beijar a prima. A vila estava abarrotada de convidados, músicas atuais saiam da vitrola convidando para dançar, mas a dança não saiu. Era um aniversário de família e não uma soiré dançante, por que assim se dividiam as “diversões”. Dançava-se em gafieiras, em boates, ou em casa quando os pais passavam o fim de semana fora. Carinho de leve beijo na boca entre mãe e filho era “libidinoso”, beijo de pai para filho não era coisa de “homens”. Humanidade burra e preconceituosa há-a em todos os lugares e civilizações, a aprendizagem é lenta como passo de tartaruga sonolenta. O planeta gira á velocidade de milhares de quilômetros por hora, mas nele tudo é vagaroso. Quem corre muito se arrisca a tropeçar nas células da humanidade mais próximas, ou a que lhe passem uma rasteira. Áquela festa  fui com meu pai, minha madrasta e minha pequena meia-irmã. Pela primeira vez provei uísque com guaraná e pedras de gelo que já saiu de moda sem que uma campainha tocasse para avisar. Quando acabou a festa eu estava no meu segundo copo e começava a gostar da mistura, mas as ordens eram ordens. Larguei o copo pela metade e acompanhei a minha nova família até em casa. Nenhuma campainha tocou para avisar que a festa tinha acabado para mim. Voltei a encontrar a prima, recém casada, em Santos. Ainda não tinham filhos por essa altura, mas eu já estava casado e tinha dois. O pai dela era irmão de minha avó, de quem não herdei os olhos azuis claros quase transparentes.


O tecido das lembranças rasga-se muito facilmente por que elas servem como suportes para decisões no futuro, quer para evitar momentos desagradáveis, quer para repetir as condições de momentos de prazer. Lembranças são como gavetas de arquivo que se resgatam quase à velocidade da luz. Elas podem ser verdes de esperança, brancas de pureza, negras de maldades, vermelhas de raivas, de todas as cores e matizes. Se alguém de quem você se lembra, passados anos não se lembrar de você, não dê nenhuma importância. A lembrança desses finalmente ficou transparente.


® Rui Rodrigues

quarta-feira, 10 de setembro de 2014

Crônicas do Pontal do Peró – Antes e depois de Outubro.

Crônicas do Pontal do Peró – Antes e depois de Outubro.



Estamos em 2014. Não é bissexto, mas é um ano diferente, ano de eleições que afetarão certamente o Pontal do Peró. Se antes e até agora não tínhamos serviços públicos – absolutamente nenhum – agora, depois das eleições, teremos muito menos do que nada. Havia quem dissesse que qualquer governo seria melhor que os de Lula e Dilma. Eu era um deles!... Hoje temo pelo Brasil da futura presidente Marina. Ela é revanchista e acha que não é necessário o conhecimento para governar uma nação: Qualquer ignorante o pode! È a sua opinião, seu defeito! Para quê então desejar melhorar a educação deste país?

Mas em certas horas nem interessa se temos que levar nosso lixo nas costas até a portaria, aproveitando para ver se chegou correio, ou se nossa água é de poço porque nada chega até aqui, ao loteamento... O que interessa é que dois pombinhos enamorados passaram por aqui. Uma linda sueca e meu lindo filho! É nessas horas que se sente que o amor é lindo. Uma frase feita para sorrisos espontâneos que brotam a cada palavra, os olhos explodindo de alegria. Não há experiências ruins que determinem o comportamento na juventude a ponto de falsificar sentimentos. Na juventude os sentimentos são puros. A experiência é boa como moeda de seguro e “performance” sexual, dois opostos que não podem conviver por muito tempo. Quanto mais experientes melhor é o sexo, mas pior é o relacionamento, porque “gato escaldado de água fria tem medo”. Quando gatos não foram ainda escaldados, e isso só acontece no cedo início da juventude, até a falta de experiência sobrepassar de longe as delícias pré-fabricadas e mecanizadas da experiência.  



Vieram brancos como cerâmica japonesa. Quando voltaram da praia, depois de uma noite e um dia em Búzios, pareciam dois alegres camarões fritos, o sorriso ainda mais aberto, a postura de quem chegou ao paraíso, vivo, e para quem passado e futuro são detalhes impensados do presente. Sei reconhecer o amor quando o vejo, encontro ou desfruto... Os papagaios que chilreiam por aqui são assim também. Toda a natureza é, desde botões em flor, até papagaios, peixes e onças. Seres humanos é que de vez em quando parecem umas coisas e são outras. Principalmente no carnaval, na política e na hora de venderem algum produto. Índios devem ter achado muita  graça no avermelhamento dos brancos depois de expostos  ao sol. Negros são mais preparados para os efeitos da luz solar e uma mistura é providencial para a sobrevivência da espécie humana. Além de ser uma mistura gostosa, é funcional e necessária num planeta cada vez mais seco!...



Tive notícias diretas da Suécia. Do mundo em geral tenho sempre pela NET de forma indireta: Colhida através de reportagens. Direta porque vem através de uma pessoa. Na Suécia, e nos países nórdicos, socialistas, a extrema-direita toma força. Na França também, e em outros países da Europa. O mundo é como um rio: Desce para o mar pelo caminho mais fácil. O capitalismo selvagem ou não, não atende as necessidades igualitárias da humanidade; o Comunismo só serve para quem está no poder ou para aqueles com os quais o poder está diretamente relacionado; O socialismo não sabe lidar com o dinheiro; o que resta é uma dúvida: O que vem depois? Parece que é a Democracia Participativa, mas partidos políticos falam dela de forma premeditadamente equivocada: Pretendem que o povo “submeta” a votação o que “líderes” populares propõem ou submetem a um órgão intermediário que aprova ou contraria. É assim em Cuba e se dizem democráticos. Pura mentira, puro engodo!

Mas que importa, mesmo jogando o Flamengo contra o Goiás, lá em Goiás? Para um dos pombinhos que é Flamengo, nem caipirinha já pronta, geladinha, interessa... O cansaço é muito grande depois de um dia e uma noite em Búzios. Revi-me nos meus tempos de jovem. Por aqueles tempos, meu olhar era assim. Meu sorriso era sempre o do momento. O ontem seria sempre o hoje e o amanhã também, como se o tempo estivesse parado. Que importavam as eleições, se o que importava era a vida? E foi assim que minha filha nasceu. O filho veio depois, fruto do mesmo amor. Nossos filhos namoram filhos (as) dos outros para o quais seus filhos são como os nossos: O que de mais importante se “fabricou” neste planeta. Razão pela qual o tratamento deve ser igual ao que é dado aos nossos. O mundo se constrói com amor. Sem amor o destruímos! Basta ver o falso amor de Putín pelos russos que vivem na Ucrânia. Eles são usados para uma política revisionista e interesseira da neopolítica de uma República Socialista Soviética revisitada, que nada tinha de socialista: Stalin mandava, matava, calava, mandava para Gulags, sem permitir a liberdade típica e própria da democracia. O casal de pombinhos nem assistiu o jogo, nem tomou caipirinha. Curtiram a pele acamaronada no andar de cima. Primeiro tempo zero a zero! Entra treinador, sai treinador e a defesa do Flamengo nunca foi de excelência. Por que será? Não deve ser função da política. Já era assim na democracia, continuou na democradura, e continua na democradura partidária dos dias atuais onde todo mundo rouba e aumenta os próprios salários sem que o povo possa contestar. Contestar até pode, mas não adianta: Ninguém escuta o povo, mesmo se dizendo “representante” do povo. É uma democradura néscia!



O pão no forno ficou pronto e cruciante, mas os pombinhos voam até dormindo! Amanhã de manhã, será outro hoje sem passado, com futuro desconhecido que não tem a mínima importância! Amanhã, que já é hoje, os papagaios passarão por aqui a caminho da Ilha dos Papagaios. Eles, o casal de pombinhos, já estará no Rio de Janeiro que também é de Fevereiro e Março... Alô, alô Realengo... Aquele abraço! Eu sou Flamengo, tenho uma nêga e não se chama Tereza...

® Rui Rodrigues












 



     



quinta-feira, 28 de agosto de 2014

Trabalho pra caramba! ... Onde anda minha caixa de etiquetas?

Trabalho pra caramba! ... Onde anda minha caixa de etiquetas?

Moro sozinho 99% do meu tempo ocupado. Tempo livre é só 1% de meu tempo total (é quando vou no banheiro, porque quando durmo estou trabalhando em silêncio)... E faço tudo o que é necessário, por que a mão de obra é cara, displicente, ambiciosa e, sobretudo, socialista “modernosa”: Acham que eu sempre lhes devo alguma coisa, que me fazem um favor, e que a lei os beneficia... Ta!... Então não contrato ninguém e eu mesmo faço tudo. Há inúmeras vantagens... Uma delas é que não pago INSS, nem férias, nem impostos. Eu mesmo me aproveito dessa grana que só serve para políticos distribuírem verbas públicas entre amigos. Amigos por amigos, meu maior amigo sou eu mesmo!

Vendi minha camioneta S-10... Não gasto gasolina, não dou gorjeta para o guardinha safado que anda sempre procurando sarna para eu me coçar, nem multas extorsivas, nem uma fortuna que custa manter um veículo nos dias de hoje. Nem passo pelo sofrimento de filas imensas de trânsito, filas no Detran, filas, filas e filas, busca incessante de estacionamentos que quando pagos custam uma meia dúzia de sorvetes, uma janta em restaurante de classe, um par de caças jeans, uma camiseta de marca, uma camiseta oficial do Flamengo, um mês de Internet ou de canal de filmes e programas via antena mirim e decodificador!

Sou o meu cozinheiro com vantagens de ter um particular: Meu colesterol não sobe, minha comida tem sempre o mínimo de sal para não subir a pressão, não corro o risco de ser envenenado e não sofro de azia. Nenhum cozinheiro me cospe no prato quando acha que trabalhou demais ou não foi devidamente apreciado. A comissão pela compra de alimentos no açougue, na peixaria ou no hortifrúti, eu mesmo recebo. Serve para despesas extras, como pagar táxi, comprar um par de sapatos novos, dar um presente para a Afonsina, que tem um nome horrível (e até é meio feia), mas é nota dez nos quitutes dos carinhos, e não fala demais da conta nem cria problemas. Olha só quanto economizo...


Sou minha própria empregada: lavo, passo, costuro, arrumo, limpo, do andar de cima até a área da churrasqueira e do jardim com a garagem. A garagem é para a Afonsina que tem carro e ainda não descobriu as vantagens de usar ônibus com motorista particular, umas enormes limusines com seis rodas, muitas de marca “Mercedes” ou “Volvo”... Não é pouca coisa não... Só não faço renda nem crochê porque seria muita sacanagem e a Afonsina ia me mandar tomar... Banho! Ela gosta de macho, macho do tipo que parece frouxo e faz comida e uns cafunés para ela. É uma gata de duas pernas, mas não “ronroneia”... Se ronronasse eu a mandaria procurar outro gato.  Já imaginou quanto economizo, sendo minha própria empregada? Só não ponho lenço na cabeça. Seria muita sacanagem comigo mesmo!


Motorista já tenho. Anda sempre de calça preta e camisa azul. Uma grande vantagem é não ser sempre o mesmo. Depende da placa do ônibus. E seguindo a minha linha de conduta face às vicissitudes da vida e do mercado, sou meu próprio zelador. Abro a porta de minha casa para os amigos e amigas, arrumo a entrada da casa, a garagem, recebo a correspondência na caixa de correio instalada no muro da casa, abro o portão, e tenho sempre as respostas certas quando me pergunto alguma coisa sobre a vizinhança. Sei perfeitamente que a mulher de um dos vizinhos come fora quando ele viaja. É uma festa gastronômica!
Sou o meu próprio carpinteiro especializado. Faço meus móveis, como mesas, aparadores, armários até de cozinha, usando madeira de construção, tratando para não dar cupim, lixando, cortando, pregando, aparafusando, pintando... Instalando. Quando a Afonsina não gosta, é tarde... O móvel já está pronto e instalado e ela sabe que se eu gostasse de atender reclamações contínuas eu seria atendente de postos de Órgãos Públicos.

Sou meu próprio garçom. Sirvo-me a mim mesmo e não perco tempo escrevendo o pedido. No dia em que eu me perguntar: “É servido de mais alguma coisa? Temos uns...”, vou jantar fora e procurar um psicanalista! E faço minha própria segurança pessoal. Até hoje não fui assaltado. Postei duas placas no portão. Uma diz: “Se quiser dinheiro, assalte um banco como fez a Dilma Roussseff quando era assaltante de bancos, porque eu não tenho porra nenhuma” (agora assalta outras coisas dentre elas a Petrobrás). A outra diz: “Sorria a afaste-se: Você está sendo filmado e a imagem instantaneamente transmitida via net”. Ou seja, não adiantaria ao bandido safado assaltar com esperanças de destruir meu computador para apagar as imagens: A Inês estaria morta e ele preso! A Afonsina ri sempre quando olha as placas e eu também. Casal que ri junto permanece junto. Ainda bem que ela só passa aqui de vez em quando. Não agüento rir o tempo inteiro.

Sou o meu pastor!... Não pago essa coisa chata e extorsiva de dízimos e víntimos. Quando preciso falar com Deus ou que Ele fale comigo, cozinho um pão cuja massa eu mesmo faço, retiro da geladeira um bom naco de queijo Roquefort e abro uma garrafa de Cabernet Sauvignon. E então chamo Deus para a comunhão, aproveitando a boa hora para lhe fazer umas confissões e um ou outro pedido. Uma das coisas que lhe venho pedindo há anos é uma outra Afonsina, mais jovem um pouco, que não seja traíra e me avise antes de me largar e arranjar outro, mas ou eu ou Deus somos teimosos: Ele porque não me arruma uma dessas, e eu porque continuo tentando! Mas apesar disso, nos empanturramos de pão estaladiço acabado de sair do forno, queijinho Roquefort e vinho Cabernet Sauvignon. De vez em quando vai um “Santa Helena”, que “Casillero Del Diablo” é bem melhor, mas mais caro, e Deus não gosta muito desse. Esse eu tomo quando acho que Deus não anda por perto. Depois Lhe confesso, e Ele sempre faz aquele gesto de “deixa pra lá...”.

Como aparentemente não sofro de nenhuma doença, sou o meu próprio médico (tomo uns chás com porradas de vez em quando com a Afonsina), e também o meu próprio engenheiro (nesta especialidade me formei mesmo, pra valer), e sou meu consultor econômico. Para presidente da República votarei em mim mesmo. A minha república fica aqui mesmo em casa, e não acredito em políticos. Sou também o meu pintor de paredes e de quadros. Já imaginou quanto custa um Picasso, um Van Gogh, um Monet? Um absurdo! Assim, pinto os meus próprios quadros, penduro na parede e quando alguém visita minha casa diz logo: Não é do Picasso, mas parece... De quem é?  Se a visita é legal digo que é meu. Se não é digo que comprei numa loja de Monmartre em Paris, da ultima vez que fui lá, e depois navego na conversa a remos ou com motor de popa. A propósito... Sou meu próprio pescador e proprietário da peixaria: Pesco por aqui mesmo, na praia. Só uso peixarias para poder comer os famosos peixes “Scapô” [1] ...

Por isso economizo o dinheiro que não tenho e me divirto pra caramba... Por exemplo, com o rabino que sabe perfeitamente que não misturo carne com leite, nem manga com leite e que carne, só Kosher. Amo os animais. O padre já nem passa aqui em casa porque sabe que não tenho pecados nem dinheiro para as esmolas. O pastor ri comigo. Já viu por várias vezes que aqui em casa não há capeta nenhum, e nem um por cento posso dispor do que tenho, quanto mais 10%... O sacerdote muçulmano passou direto quando viu que me ajoelhei no chão, sobre um “quilim”, coisa que sempre faço quando sinto a presença de Deus e para não sujar os joelhos, mas como ele não andava com bússola (nem eu sei em que direção fica Meca) não se precisou sobre se a direção de minhas orações estavam corretas (para ele) ou não. Ficou por isso mesmo. Como tenho umas galinhas no meu galinheiro, umas garrafas de cachaça e uns charutos cubanos, o pai de santo já me convidou para passar lá no terreiro, e um hindu dos bons, daqueles que usam fralda conversível em turbante, sabe que medito muito e faço Ioga plantando bananeira sempre que preciso irrigar o meu cérebro.

Ora vejam só como não se pode dizer que não trabalho mesmo não fazendo porra nenhuma na vida! Mas sempre fica aquele gostinho de despedir todo o mundo no dia em que eu me for. E não precisarei dar baixa na carteira de trabalho de ninguém! Minha conta bancária? Que conta? Os Bancos que me peçam consultoria e se necessário que abram uma conta em meu “banco”. Ah! E evidentemente tive que esquecer minha caixa de etiquetas em algum lugar que já não me lembro onde. Houve tempo em que as usava, mas atualmente com tanto trabalho, e com a caixa esquecida, algumas já devem estar coladas outras grampeadas e algumas as traças já traçaram.

® Rui Rodrigues





[1] Scapô são aqueles que não pesco e se alguém me pergunta “o que foi que mordeu tua isca?”, eu respondo: Escapou!