Os Bairros do Rio de Janeiro que eu amo...
(ensaio de Besteirol)
O Rio que aprendi a amar é
alegre, bem humorado, irreverente desde quando começou a gozar com as gentes da
corte do rei D. João VI quando chegaram das Orópa numa manobra política que
logo foi recebida na gozação como uma fuga aos exércitos de Napoleão. O povo esperava muito mais do que aqueles
fidalgos da corte Portuguesa todos vestidos de preto, suando em bicas, morrendo
de febre amarela, depressão, dengue, gordura exagerada e sezões. Logo
descobriram que se poderiam tornar independentes deles, e que nobreza em termos
de vida dava no mesmo. Rio de Janeiro, Cidade de Deus! Dizem até que Dom João
VI não era muito Realengo por que comia frango com as mãos. E franguinhas
também...Por isso que a mulher dele o traía...
E os Bairros do Rio de
Janeiro são a sua própria expressão que o define muito bem.
Dizem que Nero incendiou
Roma. No Rio não se Botafogo... De jeito nenhum. Não teria a menor Maria da
Graça, e embora haja muita gente erudita, sempre aparece alguém de Casca (mais)
Dura. Faz parte da miscigenação genética e cultural. É uma pena que tenham
perseguido tanto o Jacaré, principalmente o de papo amarelo, por que agora só
se vê Jacarezinho e Jacarepaguá...Mas foi o preço pago pelo progresso: Os
europeus chegaram para construir um Jardim (na) América. Sem se questionar se
era uma ação irrefletida ou bem Madureira. E sempre um estado dos mais
Progressistas, haja vista que nem o avião de Santos Dumont havia ainda decolado
e já se sabia que era do Alto que se tinha a Boa Vista, a melhor! E não era tão
perigoso como hoje Andaraí... Tanto progresso que hoje se lava roupa em máquina
de lavar e muito pouca em Tanque. Valha-nos o Santíssimo!
Meu Ti’juca adora futebol.
Futebol e uma cerveja. Sempre que o Flamengo joga vai ao Maracanã. A mulher
dele torce pelo Bangu, e quando perde é preciso dar-lhe chá de flor de
Laranjeiras para acalmá-la e é preciso ter muita Paciência com ela. Uma das
coisas que ela reclama muito, agora com os juros tão altos é que antes, quando
ia orar a São Cristóvão, no Bairro Imperial, via a cidade cheia de portuários e
atualmente só de Bancários. Nem lá a Praça é Seca. O Rio é muito úmido! Uma
cidade onde todo mundo Pechincha. No tempo do Império olhava-se o lugar e
via-se um Campo Grande, imenso... Hoje nem importa se é Várzea Grande ou Várzea
Pequena, ou um simples Campinho, uma Rocinha... Porque já não se cultiva quase
nada por aqui. Só Mangueira e Pitangueiras.
Dizia Camões que para tudo é
preciso ter engenho e arte. Vão ver lá no Engenho de Dentro, no Engenho da
Rainha, Engenho Novo, mesmo que não se fabrique mais cachaça nem se produza
mais açúcar, no que pese o Engenheiro Leal, que esse sim, entendia de
engenhocas. Era de se ficar Encantado! Não há gente com complexos por aqui, nem
com o Complexo do Alemão. Colégio há por
toda a parte. Infelizmente, se chamar ambulância ou polícia, alguém dirá:
Irajá! Mas não acredite: Os políticos são de safra tão ruim que tudo demora
muito. Acreditar em políticos é como acreditar no conto do Vigário Geral,
embora a democracia tenha sido sempre um dos Pilares de nossa nação. Esses
políticos me dão Penha. Penha Circular, de todos os tipos... Por vezes esta
cidade parece uma batalha do Riachuelo. Valha-nos S. Francisco Xavier,
valham-nos Todos os Santos. Eles se aproveitam muito das verbas públicas.
Sempre foi assim. Dizia-se até “aproveita enquanto o Brás é tesoureiro”, mas
não era o Brás de Pina. Esse era um homem de Bonsucesso, não era dessas coisas.
Brincava-se muito perguntando “qual é a cor do cavalo branco de Napoleão”, e se
dizia que de noite todos os gatos são pardos. Mas nunca ninguém descobriu qual
é a Cordovil. E como a religiosidade é
muito grande nesta cidade, não se dispensa uma Água Santa, mesmo que não venha
de um Bento Ribeiro, ou da Ribeira, mas certamente santificada por Anchieta, ou
Padre Miguel - lá no Parque Anchieta - totalmente livre de qualquer Zumbi. Ainda
há procissões em domingos de Ramos, carregando a Santa Cruz!
Foi a Princesa Isabel que
lutou pela Abolição lá em Vila Isabel. Grande mulher para a época que assumiu o
que os homens da época tinham medo de assumir? Libertar os escravos, para não
se comprometerem. Hoje é uma cidade onde se Estácio muito bem mesmo que falte
lugar para se estacionar veículos quer tenham motor da Ford, quer da Renault ou
até do mui honorável Honório Gurgel.
Houve um tempo em que se
usavam colchões de sumaúma... Eu ria muito com um amigo meu que dizia que os
colchões eram de Inhaúma. Bem... Lá também se fabricavam colchões que eram usados
pelos Cavalcante, pelo Marechal Hermes, Pelos Lins de Vasconcelos, Quintino
Bocaiúva, Ricardo de Albuquerque, Tomás Coelho, Rocha Miranda, Vicente de
Carvalho, Magalhães Bastos, até o Oswaldo Cruz, o Coelho Neto, o Del Castilho,
Barros Filho e o Costa Barros. O senador Camará e o Senador Vasconcelos, além
do Marechal Deodoro menos toda a Vila Militar, onde os colchões eram feitos de
Taquara mesmo! Tropa é para dormir em colchão duro e desfilar na Praça da
Bandeira. É de se rezar ao Cosmos numa pedra como altar: Uma Pedra de Guaratiba,
em Guaratiba, que Guaratuba fica em São Paulo!
Sabemos que este imenso País
foi aumentado pelo esforço de bandeirantes, e como somos um povo muito alegre,
como não imaginar um Recreio dos Bandeirantes? Também tinham o direito de se
divertirem. Saíram por aí carregando bandeiras, cortando o território à Bangu,
levando uma vida que era uma Barra da Tijuca, uma Barra de Guaratiba... Deviam
rezar muito à Virgem de Guadalupe, evitando os Manguinhos por causa da
mosquitada. Quando os mosquitos apareciam pela tarde, diziam que estavam em
Maré de azar e como a cidade está à beira-mar, de vez em quando pinta uma maré
braba que nos deixa numa Pindotiba e não há Méier de sair disso. Cidade
construída com tijolos, um em cima do outro, ao lado do outro como em imensa
Olaria. Aqui nada vai para as
cucuias. Quer quiser que vá à Cacuia ou
a Cocotá, e se de madrugada encontrar alguém gritando Moneró, não pense que
está pedindo esmola, grana, “mónei”... Cantores têm sua Freguesia cativa, e nem
pense em se pavonear, muito menos na Pavuna. Quem quer aparecer ou “se achar” não
pega bem. Contudo, o pessoal se cuida muito, sabe tomar o Leme da vida, e
embora pareça o Cosme Velho, não é não... Está sempre renovado.
Já no tempo dos descobrimentos
havia Caravelas (que fica lá na Bahia) e Galeão que fica no Rio, com a Gávea bem
visível. Viajar é a Glória! E com tanto cadete da Marinha, o presidente se
matou no Catete. Outra grande Penha que nem o Santo Cristo nem a Santa Teresa
nem o São Conrado conseguiram evitar. Dizem que o presidente tinha pavio curto,
e por isso não aconteceu no Rio Comprido. Mas... Paquetá tanta preocupação? Foi só mais
um que se foi sem explicação numa Cidade Nova. E tem cada Lapa de mulher, de
boa Saúde, de se ficar tonto. Já não usam perfumes de Gardênia Azul... Para
uns, saudosistas, outra grande Penha! Uma metrópole muito higiênica que se
poderia chamar de Higienópolis de uma ponta á outra: De Acari a Cachambi, do
Joá ao Tauá, passando por Turiaçu, Gericinó e Grajaú...
Céu de Anil Benfica sobre a
cidade, e até na Praia da Bandeira, uma batidinha de Caju é sempre o Centro das
atenções. Vão lá no Catumbi para ver se é Gamboa ou se é ruim... No tempo do
Vasco da Gama não havia dessas batidinhas... Dizem que o que refresca bunda de
pato é Lagoa... (Urca, que esta foi do Catete! )... Criança que se perde nunca
pergunta onde o Pai tá... Quando muito pergunta onde Humaitá...
Há outros bairros no Rio de
Janeiro, em todos eles apartamentos com copa-cozinha e só um é Copacabana, o
que é muito Leblon. Se houvessem Hipopótamos no Rio de Janeiro o bairro da
série especial com direito a proteção especial de polícia especialmente educada
não se chamaria Ipanema. O Rio é uma imensa Cidade Universitária onde todo o
dia se aprende mais um jeitinho de sermos levados na vida. Sempre com muito
humor e alegria, sem gritar para não incomodar o juiz que condena a passar uns
tempos na prisão para receber salários maiores do que os percebidos por
professores. Afinal preso também é gente, gente também é professor. Professor
já leu muito e ensina. Preso se ler ainda recebe mais grana por mês. O Rio não
é uma pirâmide social. É um lápis em pé pela ponta.
® Rui Rodrigues
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