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quarta-feira, 5 de março de 2014

Não foi nada fácil, mas Jesus ressuscitou [i]...

Não foi nada fácil, mas Jesus ressuscitou [i]...



Parece que os Evangelhos atribuídos a Marcos, Mateus e Lucas foram escritos pelos mesmos “monges copistas” que se escondiam nas catacumbas de Roma, porque os três começam por: “Logo após o nascer do sol no dia seguinte ao Sabbath...” e logo em seguida parecem “complementar-se” na informação de como aconteceu o ressuscitar de Jesus, o Cristo. João não começa assim, mas complementa a história e conta mais ou menos o mesmo. Depois, incrivelmente, Jesus não dá muita importância a quem aparecer primeiro, e só depois de aparecer a dois caminhantes da estrada de Emaús, se apresenta para dar um susto nos apóstolos.
João diz que na mesma tarde Jesus se apresentou aos apóstolos, mas Marcos, Mateus e Lucas afirmam que só mais tarde Jesus apareceu para os apóstolos, não nesse dia. Parece tudo muito confuso, e é mesmo, mas há explicações que só agora foram possíveis desvendar. E isso aconteceu na segunda ressuscitagem ou no segundo ressuscitamento [ii], quando Jesus passou lá pelo bar em 03 de março de 2014, durante o Carnaval no Rio de Janeiro... A história passou-se assim, segundo conta o Barman [iii].



Quando vi um camelo na Saara (contava o Barman) no Rio de Janeiro, pensei logo em propaganda dos comerciantes árabes ou judeus do centro da cidade, mas aquele árabe que saltou elegantemente e todo serelepe do camelo, era “diferente”. Para começar, usava uma estrela de David de lápis lazúli pendurada no peito, pendente de um cordão de couro trançado. Vestia uma túnica imaculadamente branca e usava uma kipá [iv] sobre os cabelos em tranças [v]. De sandálias de couro, o rosto de olhos azuis, era emoldurado por uma barba comprida. Amarrou o camelo num poste onde estava afixado o resultado do jogo do bicho da manhã, e entrou no bar. Dirigiu-se ao balcão e pediu em meio a olhares de admiração dos clientes:

- Um pedaço de pão e um copo de vinho.

Depois se dirigiu a uma mesa vazia a pedido do atendente do bar. Um cliente não se conteve, olhou para ele bem nos olhos e disse:
- Desculpe, mas você é muito parecido com Jesus!...
- Olhe em verdade em verdade vos digo não sei quem é esse tal de Jesus [vi], mas meu nome é Yeshua [vii], estou com uma fome danada e acabo de ressuscitar.
Primeiro fez-se um silêncio sepulcral no bar. Depois começou uma vozearia, os garçons começaram a serem chamados para servir bebidas, as cabeças voltavam-se para o tal de Jesus e para o camelo amarrado no poste lá fora na calçada.
O cliente que perguntara achou que Yeshua lhe tinha dado permissão para continuar a conversa e voltou a perguntar.
- Mas se é Yeshua onde estão as marcas dos cravos nas mãos, e os arranhões na cabeça da coroa de espinhos?
- Ah... Essas feridas já curaram logo na primeira vez que ressuscitei. Esta é a segunda. Eu disse para meu pai: Não adianta me mandar de novo para o planeta Terra porque vão me matar outra vez só para ver se sou deus ou não. Eles acham que se eu ressuscitar é porque sou deus, mas se eu continuar morto então sou uma fraude. Assim não há humanidade que eu possa convencer. Mas meu pai insistiu tanto que eu voltei.
Já não havia ninguém sentado nas mesas do bar. Todos os clientes estavam de copo na mão formando uma roda em volta da mesa de Yeshua que agora saboreava seu pão e seu vinho, um Cabernet Sauvignon chileno muito bom [viii].
- Mas agora ninguém mata ninguém por causa da religião. Só lá no Oriente Médio – disse o cliente – Aqui é a Saara, uma zona comercial do Rio de Janeiro, e estamos na América do Sul... Fica tranquilo, Yeshua.
- E vens me dizer – a mim – onde estou celerado? Respondeu Yeshua visivelmente contrariado, mas condescendente. Querias que me ressuscitassem onde? Na China, onde quase ninguém me conhece? Na Índia? No Oriente Médio, para que Israel e os árabes se matassem uns aos outros em meia dúzia de dias só porque eu voltei e aqui é o meu lugar? Eu sei onde estou.
Yeshua voltou-se então para a multidão que já se aglomerava na calçada tamponando a entrada do Bar, e disse:


- Sentai-vos!... Hoje não é dia de milagres porque ninguém aqui está casando, por isso não multiplicarei nem pão nem vinho nem peixes. Mas pago a conta e mostrarei como não um, mas uma cáfila [ix] inteira passa pelo buraco de uma agulha. E dito isto, retirou uma agulha grossa presa à sua imaculada roupa branca, e colocou-a na horizontal. Então chamou um por um para que vissem como uma cáfila que passava pela rua também passava pelo buraco da agulha, como na foto. E depois disse:
- Comei e bebei que este é o meu bar. Eu pago a conta. E como não deve haver tanto vinho nem tanto pão por aqui que dê para todos, uma mordida no pão e um gole para cada um que é para não faltar... Que assim se faça como quem come hóstia. Só engulam quando derreter na boca, que é para saciar a todos.

Uma senhora aproximou-se de Yeshua e disse em prantos:
- Senhor... Eu vejo!... Eu vejo!... (E ajoelhou-se aos pés de Yeshua, tentando beijá-los). Yeshua a afastou docemente dizendo-lhe.
- Não, mulher... Não... Meus pés estão sujos de tanta poeira desse Rio de Janeiro, de pisar tanto lixo... Peçam a César o que é vosso e não dai a César enquanto não vos devolver em serviços o que lhe dais. Mas vês o quê? Não vias antes?
- Não senhor... Não via. Tenho aqui até os documentos dos médicos cubanos que me examinaram. Eu estava irremediavelmente cega, mas ao ouvir-te passei a ver.
- Mulher, que tu és muito apressada nos milagres. Porque não esperas-te por mim, porque não me pediste o milagre para que eu te o fizesse?
- Senhor... Lá no meu bairro a gente já sabe que não precisa pedir. É só chegar ao templo, mostrar papéis e dar o testemunho, chorar bastante de alegria, que depois os homens do pastor acertam conosco fora das vistas alheias...
- Yeshua olhou a mulher e disse-lhe: Pois em verdade te digo, mulher de muita fé, que tens toda a fé nos vendilhões do templo, mas que quando realmente precisares rezarás a todos os deuses deste planeta e dos outros, e nenhum te ouvirá, porque se não morreres de uma coisa, morrerás de outra, que este é o destino de todos os mortais.   




A Rua da Alfândega e algumas outras das adjacências estavam sendo fechadas pela polícia, porque era tanta gente que o trânsito parara. Repórteres tentavam chegar ao Bar do Chopp Grátis. Helicópteros de reportagem pairavam com pás adejantes pelo céu. A cidade estava virada do avesso. As imagens do acontecimento estavam em todas as redes de emissoras de televisão do mundo inteiro. Só a Globo dera um leve “tararan-tararan” interrompendo a transmissão de uma novela por breves segundos, informando que no Jornal da Noite dariam mais detalhes.



- Pois bem (disse Yeshua indo já no terceiro copo de vinho e no terceiro de pão, agora acompanhado com rojões de peixe molhados em molho rosa) – Vim para vos dizer algumas coisas mais, e di-las-ei, mas não aqui e agora. Mas para que não digais vós que não vos dei notícia de fé, direi que há filhos neste mundo que não são de Noé, pois que enquanto Noé construía sua arca de muitos côvados, outros que ouviram dizer do dilúvio, construíam uma enorme bexiga redonda e transparente, feita com bexigas de gado vacum, que flutuou nas águas do dilúvio por quarenta dias e quarenta noites até que as águas se evaporaram para a Amazônia. Eles ficaram no fundo da bexiga, sempre estável por causa de seu peso concentrado no fundo, mesmo quando girava ao sabor do impacto das ondas. A bexiga girava, mas eles, lá no fundo, não. E foram muitos os que enganaram Noé. Esses ainda hoje enganam a humanidade, aproveitando-se dos crentes, da crença e da fé. Vigilai, pois, para que não fiqueis curtos no vestuário, na educação, na saúde, nos transportes, no pão e no vinho, para encherdes os alforjes dos que vos pedem em meu nome, porque sempre dei a césar o que é de césar e a Deus o que é de Deus... Moedas são dos césares, não dos templos, não minhas...  



E ao dizer isto, Yeshua desapareceu como que por encanto. O camelo foi seguido, mas quanto mais corriam, mais depressa o camelo andava desembestado pelas ruas do Rio de Janeiro em meio a lixo, assaltantes, traficantes, rapinantes, quadrilheiros, entorpecidos e entorpecentes, camisinhas de vénus, seringas, pastores milagreiros, políticos embonecados, carros alegóricos, fogos de artifício, balas de borracha, cacetadas e prisões que são autênticos palácios onde se preserva o crime da violência das ruas.



O camelo desapareceu misteriosamente, mas há quem diga que o viu cavalgando sobre as águas da Baía de Guanabara, desviando-se convenientemente das manchas de lixo espumoso...

Era carnaval nesse dia.

® Rui Rodrigues    









[i] Nota do Barman: (Aqui pelo bar do Chopp Grátis passa boi, passa boiada, é um grande movimento, e de vez em quando passam umas “avis raras” que nos contam umas historietas para distrair enquanto pegamos algumas, tomamos umas e largamos outras).
[ii] Não há dicionário que aceite estes dois termos, ressuscitagem e ressuscitamento e nos querem obrigar a usar um monte de palavras para transmitir a ideia fundamental: Ressuscitar... Nossa língua por vezes não ajuda: Atrapalha!
[iii] O barman naquele dia por acaso era eu. Quem sou eu? Eu sou o barman em certos dias. Noutros sou só eu.
[iv] Aquele gorro que os homens judeus usam para cobrir a cabeça e que chegou a ser usado por homens e mulheres. Ver em http://www.igrejadedeusemsaopaulo.org.br/averdadeiraorigemdokipa.htm
[v] Peot em hebraico.
[vi] Em hebraico, Jesus se escreve Yeshua.
[vii] Nome hebraico de Jesus como já devem ter percebido da nota anterior.
[viii] Se a Adega chilena me pagar adequadamente, informo qual a marca do vinho que Yeshua bebeu.
[ix]   Cáfila é um agrupamento de camelos. Vara é de porcos, bando e quadrilha são de políticos que roubam pondo-se de acordo entre si.  

quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

A Ordem é uma estrada e por ela vai um Bando...

A Ordem é uma estrada e por ela vai um Bando...




... Entre uma praia maravilhosa que se abre para mar bravio e indomável, e uma pradaria suave e florida que se abre para densa floresta hostil. Não é muito larga. Pelo contrário, só nos permite uma limitada liberdade, e por vezes é tão estreita que se transforma numa linha onde somente passa a moral e a justiça.

Durante doze mil anos religiosos se revezaram no comando da gerência da moralidade, da justiça, da ordem, no sentido de tornar este mundo melhor a cada dia. Milhões, bilhões, trilhões de famílias educaram seus filhos ensinando-lhes os bons caminhos: Os do progresso, da Ordem, da fé, da bondade, do amor... Mas em algum momento entre o nascer e o tomar ciência plena do mundo em que vivemos, muitos de nós tomam um rumo de contestação como parte fundamental e necessária da evolução, porém, se uns exageram em impor uma ordem modificada em tempo que não é compreensível para a humanidade, outros contestam a própria ordem e desandam para aquilo a que chamamos crime, perversão, os males do mundo. Porém, há que ter em conta que a ordem, que inclui a moral, é independente do olhar do observador. A moral não depende da visão de um contestador do lado do crime, nem da visão de um contestador do lado do progresso. Ela é a estrada perfeitamente identificada quer por quem venha do lado do mar, quer por quem venha do lado da floresta. Mesmo até por quem venha dos céus, ou aflore dos subterrâneos do mundo. Há uma consciência latente na humanidade e em cada uma de suas células: O homem e a mulher. Homens e mulheres somente são diferentes pela genitália. De resto, fígado não tem sexo, coração não tem sexo, rins não têm sexo, cérebro e neurônios não tem sexo. Por isso não se pode atribuir os males do mundo, ou os bens do mundo aos homens ou ás mulheres exclusivamente. Nem aos que exibem uma cor de pele, uma bandeira de nacionalidade, uma opção sexual. Parece que ainda não compreendemos que somos partes de um todo que deve continuar vivo, ocupando um lugar perfeitamente definido neste mundo aparentemente sem grandes demonstrações de inteligência. Para continuarmos vivos, temos que ser muito e muito mais inteligentes do que temos demonstrado ser até aqui, após esse longo caminho de 12.000 anos como civilização.




Assim, para andarmos sempre na estrada, ou como diziam antigamente nossos ancestrais, no caminho da retidão, os costumes podem e devem ser alterados para dar liberdade à evolução, mas não devem subverter a ordem, como por exemplo, dar o crime como legal e encarcerar a legalidade. Um assassino tem seus próprios motivos pára assassinar, mas ver um destes no governo de uma nação seria um caminho aberto para a desordem, um abandono da estrada para cairmos na floresta ou nos afogarmos no mar. Estrada é estrada, não é nem floresta nem mar bravio. Um assassino ou um ladrão no governo que usasse o convencimento popular através de “diálogos” sendo o povo ignorante por relapso de outros governantes, pode usar tanto as verdades quanto as mentiras, alegando que os meios servem aos fins. No entanto, se um individuo dessa laia faz o diabo para se eleger, podemos imaginar com quantos diabos fará um inferno para não largar o poder. E foi assim que em terra de papagaios, de Santa Cruz, alguns indivíduos falando entre si, resolveram oferecer verbas públicas a terceiros que não por acaso também eram políticos para que votassem de acordo com suas diretrizes em certos assuntos a serem votados no Senado e nas câmaras federais. Denunciados por um deles, foram denunciados ao Ministério Público, investigados, julgados. Já na época do julgamento se verificou que os ministros tinham sido indicados por alguém muito poderoso que fazia parte de um dos partidos a que pertenciam alguns dos julgados. Um deles tinha sido até presidente desse partido. Parece a qualquer mortal, mesmo dos mais idiotas, que se trata de uma formação de quadrilha. Eles foram presos mas com penas suaves, ou pelo menos apropriadas pelo Supremo tribunal, mas já se notou que havia política misturada com justiça. Alguns dos ministros disseram que não tinha havido formação de quadrilha. Apareceu então uma nova figura na jurisdição: Os embargos infringentes: Uma forma de questionar o julgamento dos ministros. E neste interim novos ministros são adicionados ao Supremo, indicados pelo mesmo partido do poderoso da nação, aproveitando que outros tinham atingido a idade de aposentadoria. E ao julgar os embargos infringentes, foi aprovada moção segundo a qual os réus já presos e condenados com penas definidas – e suaves – o Supremo tribunal federal resolveu que não houve formação de quadrilha. Definitivamente a justiça brasileira saiu da estrada da Ordem, e avançou para mar aberto. Se fosse para a floresta, seria comida pelas feras. Prefere afogar-se no mar bravio que não é de água. Este mar é de lama. Porque a partir de agora, e com todo o “direito”, quadrilhas de bandidos não serão quadrilhas mesmo atuando em conjunto e de forma mancomunada.




Que lei e em qual país, a justiça é realmente justa, se os ministros são indicados por governos e cada governo tem os seus ministros? Que justiça é realmente ilibada neste mundo, se nem os governos são justos? É claro que esta característica não tira os governos nem os seus ministros nem sua justiça da estrada da Ordem, porque no geral, costumam percorrer a estrada da Ordem que dá estabilidade à nação, confiança aos cidadãos. Andam nesses casos pelo acostamento da estrada da Ordem e embora abalada a população segue seu caminho verso ao futuro com Ordem e Progresso. Porém, quando quadrilhas deixam de serem quadrilhas numa canetada com assinatura de um poderoso e seus ministros, fazendo o diabo, então não há retorno para esta situação, porque até o mais imbecil deste Brasil consegue entender que não se fez justiça, mas sim política. Política suja. E certamente para proteger o chefe do bando.




Quadrilha, bando, é tudo a mesma coisa e posto que não seja quadrilha, que seja bando então... Eles foram condenados por “formação de bando”, se o assunto é o “politicamente correto”. O perfil do senhor Barroso é avesso ao uso da palavra “quadrilha” e certamente ele não é veado. Mãe só há uma e muitas vezes ela se engana e engana o pai por amor ao filho. E decididamente, quando a política se intromete na lei e na economia, a estrada desaparece, transforma-se numa trilha onde os transeuntes são assaltados por meliantes provindos da floresta, imprensados que ficam entre o mal e a lama: Ou se unem aos meliantes ou chafurdam na lama, mas já sabemos pelo resultado que temos agora duas quadrilhas, ou como prefere o ministro, dois bandos. Ele pertence a um deles e já conhecia o outro de longa data. 



® Rui Rodrigues 

quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

Não são apenas “coisas” que mudaram...

Não são apenas “coisas” que mudaram...


Este mundo é feito de objetos, pensamentos, memórias, e o “eu”. Sem o “eu”, não há mundo, nem objetos, nem pensamentos e muito menos memórias. Basta perguntar a um morto se se lembra de alguma coisa, e para quem pensa que só “coisas” vivas morrem, relógios ficam doentes e também morrem, pensamentos morrem, memórias morrem. Este planeta que é da vida é também da morte. Elas se confundem.

Algumas coisas que morreram não nos fazem a menor falta. Outras fazem uma falta tremenda, porque parte de nós também morreu com elas. Não somos nem piores nem melhores do que os outros semelhantes. Nada disso. Temos tanto em comum, que dizermos que somos diferentes seria um completo absurdo. Saudades, por exemplo, todos nós temos, e muitas são saudades comuns.




Quantas vezes já olhamos para uma cena de carnaval, por exemplo, todos se divertindo no meio da rua ou de um salão de um clube, demonstrando alegra, despreocupação, e os “interpretamos” como “objetos” animados como perfeitas marionetes, comandadas por exímios artistas que nem lhes notamos as articulações?
No entanto, no conjunto da turma animada do salão ou das ruas, uns estão ali mesmo para se divertirem, outros foram convidados e gostando ou não se sentem na obrigação de ir, outros ainda nem tinham alegria para se divertirem, e muitos estão trabalhando. Muitos dos que promoveram a festa nem estão lá. Apenas um negócio comercial. Eles trabalharam muito e estão descansando em suas casas. Artistas normalmente estão lá por um bom “cachê”.




Mas apesar de sermos todos iguais há sempre pequenas e sutis diferenças às quais damos muito valor e que usamos como rótulos para identificar pessoas ou grupos: Os latinos, os anglo-saxões, os brancos, os negros, os comunistas, os capitalistas, os artistas, os militares, os políticos... Como se um artista não pudesse ser um militar, negro, capitalista, político, anglo-saxão, mesmo tendo nascido em meio a latinidades, e não possa ter um pensamento tão brilhante ou tão limitado, ser um numero significativo à direita, ou um zero à esquerda... O que nos faz diferentes é a nossa necessidade de “rotular” para identificar.




Algum de nós, nascido em meio a latinidades, sejamos de origem latina ou não, se transferido para o Reino Unido ou para a Noruega, por exemplo, sentiremos diferenças de grande amplitude que nos podem deixar temporariamente desconfortáveis. Depois nos habituamos. O mesmo acontece com anglo-saxões e nórdicos que se desloquem a países latinos. Mas isto é uma mudança perfeitamente definida no tempo, porque é “aqui e agora”, e não uma mudança no tempo. Este artigo destina-se a “coisas” que mudam no tempo, e que nos dão um sentido mais dissolvido do que é evoluir. Embora todos os seres humanos evoluam, uns o fazem mais devagar, outros muito de repente, outros ainda são capazes de fazer a proeza de regredir. Julguem como quiserem.

Não era até interessante, nos tempos em que reis e presidentes faziam visitas a países amigos e desfilavam pelas ruas com papel picado caindo das janelas, colchas estendidas para dar as boas vindas? Pois é...Embora não façam falta nenhuma, acabou este tipo de desfile que ainda se vê, muito raramente, quando um príncipe inglês visita ex-colônias em África, por puro exemplo. Parece que política não é o forte da diversão ou admiração nos dias atuais.

E as corridas de cavalos em Ascot, em hipódromos espalhados pelo mundo? O turfe, com direito até a lojas espalhadas pela cidade para recolha de apostas parece ter falecido de morte natural. Nem houve propaganda contra o turfe dizendo: “Seu cirurgião adverte: Turfe faz mal à saúde”. E nem propaganda dizendo que faz mal à moral ou ao bolso. Mas os poucos hipódromos que ainda existem parecem fadados ao encerramento.




Antigamente, quando havia segurança nas ruas, o povo saía no carnaval de ponta a ponta das cidades latinas, anglo-saxônicas, nórdicas. Aos poucos se foi reduzindo a festa a países de origem latina, e certamente o Brasil será dos últimos a apagar as luzes do ultimo barracão onde se constroem carros, se costuram fantasias. Mas cada vez menos nas ruas. Sair fantasiado de palhaço, por exemplo, pode ser entendido como uma fantasia contra o regime duro da posição no governo. Se usar máscara de zorro, pode ser retido para averiguações, ser identificado, registrado, e se resistir e sofrer abusos, poderá ser alvo de uma investigação futura por uma “Comissão da Verdade”. É a falsa noção de justiça que só se aplica depois que o sujeito morreu, por grupos revanchistas que ocupam o poder, nele se instalam e com mais ou menos violência exercem a sua própria ditadura. Na Alemanha trabalha-se, eles nem são muito de sair para passear, sua alegria está no dia a dia, porque podem ser alegres todos os dias e não apenas em alguns míseros dias comerciais de carnaval. A economia da Alemanha vai muito bem. Para eles, nazismo, comunismo, socialismo, nunca mais, e socialismo, só no nome: Trabalham para ganhar dinheiro, para poderem gastar de forma reservada, economizar, progredir socialmente dando trabalho a toda a população para que possam pagar seu consumo.




E os artistas? Até que ponto são artistas? Artistas são pessoas que sabem fingir muito bem. Choram com vontade de rir, riem com vontade de chorar. É a arte do fingimento. Muitos artistas, por exemplo, fazem propaganda de coisas que nunca consumiram, não consomem nem nunca consumirão, e o fazem por puro dinheiro, muitas vezes induzindo os fãs ao consumo desses artigos. Por exemplo, Ana Maria Braga que usa o programa para vender produtos, Roberto Carlos que era vegetariano e que para vender carne de certa marca, aparece dizendo que deixou de ser vegetariano. É propaganda enganosa.  Antigamente peças de teatro ficavam em cartaz por anos a fio. Agora o mundo prefere divertir-se com jogos na Internet, ou com jogos controlados em casa, como jogos de futebol da FIFA, Civilization, Piratas do Caribe, ou tendo acesso a todo tipo de leitura, informação, conversas pelas redes sociais. O teatro no Brasil vai perdendo seu lugar, tal como o turfe. As salas de cinema foram compradas por igrejas, algumas salas coletivas ainda existentes em shoppings estão com os dias contados.



Na praça do coreto já não há bandas, conjuntos, crianças ocuparam o lugar durante alguns minutos do dia sempre antes dos bandidos e ladrões aparecerem. Ninguém sai à noite para passear a não ser em zonas ainda protegidas pela polícia, como em zonas “nobres” da cidade, ainda que em tais zonas não more um nobre sequer: A nobreza no mundo se resume a uma meia dúzia de nações. O rei que mais destoa de todos é o rei de Espanha, que gosta de caçar animais selvagens em África, e cuja filha responde a processo por malversação de verbas pelo marido. Ela declarou que não sabia das atividades do marido, nem que as verbas eram ilícitas. O rei foi destituído de suas funções de representante da WWF para a Espanha. Ainda se matam touros em corridas na Espanha, nas arenas. Arenas agora são a identificação dos “estádios” de futebol, como os da Copa do Mundo de 2014. Deu no mesmo. Lá se matam outras coisas, como por exemplo, o sonho de melhores serviços de saúde, de ensino, de segurança, de transportes, de redes de esgoto, de água potável, sem apagões de energia elétrica. Isto num país que se identifica com Cuba e o Bolivarianismo de Chávez soam a mentira, a falcatrua, a distorção de verdades, de cultura.




De um mundo que causava inveja pelo gaudio provocado por nobres que desfilavam, de desfile de modas no turfe, de garbosas fardas de militares em desfile, de concursos de Miss Universo com belas mulheres sem silicone, sem lipoaspirações, os olhos e cabelos naturais de cor natural. Não precisamos realmente de “nobres”, embora a nobreza de intenções nos faça muita falta. Parece estar em falta.

Os festivais da canção acabaram. E se voltarem não terá o mesmo brilho... Fazer festival de “rap” não parece ser uma boa ideia, porque a “voz” está separada da canção. Qualquer voz pode cantar “rap”.
Há sim, o direito de ir e vir, mas também o direito a assaltar quem vai e vem, quer por abrandamento das leis, quer por ineficiência da polícia, quer pela falta de verbas para se poder ser eficiente. Quando a corrupção vem de cima para baixo, a resposta ao mundo que não sabemos gerir vem de baixo para cima, e é neste fluxo e refluxo de marés de mudanças que esperamos um grande tsunami e um dilúvio que inundem a terra. Podemos construir uma arca com vários estádios ou côvados de comprimento, e até lhe podemos dar um nome: Democracia Participativa. Nela cabem todas as sociedades de todas as nações. Nos palácios atuais só cabe quem tem influências ou dinheiro para pagar os votos dos que representam essas sociedades, e o sistema é tão falho, que é a própria sociedade que elege os seus algozes em meio de cidades poluídas pelo trânsito, sufocadas pela insegurança, atulhadas de vendedores e consumidores de drogas, em meio a um céu pleno de aviões onde viajam os políticos para cima e para baixo, para além e para acolá, com gordos cartões de crédito com fundos garantidos de verbas públicas. Ângela Merkel viaja tão pouco... Obama quase não sai dos EUA face à sua reponsabilidade, presidentes europeus nem se houve falar que saia de avião a passear, a rainha de Inglaterra quase nem sai do próprio palácio.




Seja bonzinho (a), aliene-se, deixe o mundo rolar... Assim, pensam os que querem fazer opinião, para que você possa ser considerada (o) boa cidadã (o).  Antigamente, se os netos e netas nos cobrassem por nossa passividade, poderíamos dizer: - É assim porque é assim e pronto! Mas os netos e as netas estão ficando cada vez mais espertos. E teremos que lhes explicar porque somos tão comodistas e passivos.

Mesmo morto, meu estado de passividade será lido por minha neta.  




® Rui Rodrigues

domingo, 23 de fevereiro de 2014

REARRANJO NA GEOPOLÍTICA MUNDIAL?

 REARRANJO NA GEOPOLÍTICA MUNDIAL?

(Política é como a ciência e a ficção: Na ciência, quando nos chega um novo produto eletrônico, é por que nos “bastidores”, já anos se passaram de pesquisa e estudos; na ficção, os ovos são chocados e só mais tarde se sabe que são de dragão e já é tarde porque dragões crescem muito depressa; na política só sabemos que o mal está instalado quando tudo o que não presta se instalou a pouco e pouco, e a força das armas se impõe sobre as multidões, ou uma base como a de Pearl Harbor é atacada de forma inesperada e aparentemente sem motivo).  


O silêncio era total, e ficamos sabendo de repente, no decorrer de janeiro de 2014. O Brasil financiara a construção de um porto em Cuba, o porto de Mariel, e a presidente foi à sua inauguração. Parece incrível que nos dias de hoje, com tanta abertura política os cidadãos do Brasil não soubessem desse investimento do BNDES. A primeira impressão que é também a última, é que se o negócio fosse bom para a nação brasileira, uma aplicação financeira, teria havido divulgação desde o início. Como tudo decorreu em silêncio, não pode ter sido bom negócio, até porque há projetos importantíssimos no Brasil parados por falta de financiamento, de capital, de dinheiro.


Por estes dias, talvez em 21 de fevereiro, fiquei sabendo de um novo porto agora em construção na Venezuela, em Puerto La Cruz na província de Anzoátegui, financiado pela Rússia. Em 22 deste mesmo mês, o Congresso da Ucrânia demitiu o presidente, a pedido da população, porque teimava em afastar a nação da União Europeia e aproximá-la novamente da Rússia, como nos tempos da URSS. Sabemos que Putín já foi o chefe da antiga polícia secreta russa KGB, que nas ultimas eleições foi denunciado por ter sido eleito através de fraudes na votação ou na apuração de votos, e que distribuiu verbas publicas com amigos que fundaram as maiores empresas hoje ativas em seu território. A Rússia tem um porto na Síria, em conflito interno, entre duas forças: As do Rei Bashar Al Assad e os rebeldes, estes uma miscelânea de grupos não simpáticos a Israel e ao Ocidente. A Ucrânia deixou claro que não quer mais nada nem com a Rússia nem com o comunismo ao derrubar, também, a última estátua de Stálin.



Sabemos também que, nas duas últimas décadas, na América do Sul, o poder caiu em mãos de antigos guerrilheiros, como no caso do Uruguai e do Brasil, que na Bolívia o presidente é um antigo cocaleiro, na Argentina a viúva de Kirchner que era socialista, e que na Venezuela está no poder um motorista de caminhão indicado por um militar populista. Em particular, Cuba, que nunca se preparou para um sistema produtivo, vive da “compreensão” de países “amigos” que aplicam verbas em seu território. Exporta principalmente açúcar porque o consumo de charutos no mundo está diminuindo consideravelmente e há cerca de um ano atrás, tentava enviar para a Coréia do Sul, o único país no mundo que tem um regime realmente comunista, velhas cápsulas de mísseis. Não se sabe se para serem recarregados e voltarem a Cuba, se como sucata para o ditador Kim II que fuzilou a esposa, o tio e a família do tio por traição à pátria. Recentemente Chile, Peru, México e Colômbia formaram o Bloco Comercial do Pacífico, praticamente esquecendo o Mercosul que se transformou num bloco político [i].

No Brasil, a presidente doou milhões de dólares para presidentes reconhecidamente ditadores em África. Há um acordo de cooperação militar entre Brasil e China que ela também promoveu. O povo do Brasil não está gostando disso porque é um país em desenvolvimento (emergente) cuja economia vai muito mal, pleno de carências internas. O que levaria uma presidente a “velar” as distribuições de verbas até serem descobertas, providenciar este tipo de ajuda acima das necessidades de seus cidadãos? Só se for por um motivo muito maior.
Os serviços americanos de inteligência costumam estar sempre atentos, ainda mais a partir do 11 de setembro[ii] quando as torres gêmeas foram destruídas por ataques terroristas. Portanto, não seria de estranhar que em 2013 o mundo tivesse amanhecido com a maior história de espionagem – uma tática tradicional da humanidade desde que levantou dois membros do chão e os usou para produzir artefatos : Os EUA vinham espionando as redes sociais e até presidentes como Ângela Merkel da Alemanha. Os EUA espionaram amigos, inimigos e indiferentes. Coisa antiga do tempo do avião U-2 abatido quando em missão sobre a URSS na época da guerra fria. De lá para cá, o mundo tem toda a razão para desconfiar da nova Rússia. Um ex-comunista poderoso está no poder e está atento ao redor do globo terrestre. Quando os EUA invadiram o Iraque, acabaram com um promissor acordo entre a Rússia e Sadam Hussein para fornecimento e exploração de petróleo, infringindo um acordo internacional segundo o qual o petróleo produzido no Iraque serviria para fins comunitários.

O que está acontecendo no mundo? Como se dividem as forças? O que estão aprontando os “chefes de governo” sem que saibamos?
A voo de águia, sem muitas considerações, e face à conjuntura política mundial, parece-me o seguinte:

1 – A Rússia e a China têm interesses comerciais – puramente comerciais – ao redor do globo. Sua capacidade negocial de argumentação vai desde o estudo e propostas financeiras a “aproximações” de filosofia política: Na Síria a pretexto de defender os interesses do rei Assad; na Venezuela para cooperar como o Bolivarismo Chavista; no Brasil, Uruguai, Argentina e Bolívia, para acabar com a miséria, unir estes países num grupo denominado UNASUL com interesses em outros grupos com outras denominações. Digamos que há núcleos de nações sob influência destes dois países agindo em separado, de forma não mancomunada.

2- Os países da UNASUL aos quais Cuba se alia, têm pelo menos dois fatores em comum: Alto grau de pobreza e analfabetismo político endêmico; incapacidade de lidar com a economia altamente competitiva internacional, por sua ojeriza histórica ao capital e às ciências necessárias para lidar com ele. Dilma Rousseff se diz economista, mas há sérias dúvidas de como conseguiu se formar. Não parece ter sido por mérito. É assessorada por um ministro, Mantega, que por mais que possa entender de economia, se vê entre a espada e a parede: Ou atende os devaneios da presidente e do partido a que pertence - o PT e seus outros aliados - ou toma conta da economia da nação. Digamos que neste bloco se propaga a igualdade social para conseguir votos usando mesmo verbas públicas, mas que a situação de pobreza, de falta de educação, de segurança, de saúde pública, portos e transportes, só pioraram. O resto da América latina, com exceção do Bloco do Pacífico, continuará da mesma forma de antes: Sem expressão, com os mesmos problemas de sempre.

3- A União Europeia continua dividida: A Inglaterra e a Noruega não adotaram o Euro como moeda, a Alemanha e a França têm mais interesses comuns do que o resto da Europa do mercado, a parte latina de nações enfrenta sérios problemas por corrupção, os países nórdicos e a Alemanha têm o melhor padrão de vida dentre todos eles.

4 – África continua sendo África e nada mudou a não ser a África do Sul despontando como país emergente. Sempre foi o país mais desenvolvido desde os tempos coloniais. A primavera árabe ainda não viu flores que possam dar frutos

5- O Oriente Médio, embora aparentemente mais calmo, está sempre em guerra latente. Uma paz fria, agora assombrada pela possibilidade nuclear do Irã.

6- O restante da Ásia, dominado por China, Rússia e Japão, tem a Índia como país emergente com características inusitadas que a tornam sui generis: A divisão social em castas, as disputas religiosas, o antagonismo com o Paquistão. Ambas as potências dominam a energia nuclear e possuem mísseis nucleares de longo alcance.

7- EUA e Canadá têm um pé na Europa com três aliados tradicionais: O Reino Unido, Turquia e Portugal. O presidente Obama parece ter dado uma ligeira guinada à esquerda através do programa social de saúde conhecido como “Obamacare”, e uma revolução nos costumes ao apoiar a ideia de desarmar a população. Obama não invadiu a Síria do rei ditador, e se aproximou do Irã sem contudo abandonar seu aliado Israel.

Apesar do mundo agora dividido em “Blocos comerciais” há sempre nações em suas fronteiras que estão desprotegidas de acordos. Nas próprias fronteiras se travam lutas de influências, como no caso do Paraguai que estava na zona de influencia da UNASUL e dela saiu, e a Ucrânia que esteve a ponto de voltar para a influência da neo-URSS. A Turquia ainda não faz parte da União Europeia, pede para entrar com o apoio e a recomendação dos EUA. A China enfrenta o Japão pela posse de um pequeno arquipélago no mar da China. Com presidentes populistas e a corrupção nos países da América Latina, principalmente nos da UNASUL, com políticas sociais baseadas numa economia política, tendem a atrasar-se cada vez mais, a convulsões sociais, a desperdícios de energia no sentido de as tornar nações sustentáveis política e economicamente. 

Se perguntassem se há risco de uma terceira guerra mundial, diríamos que é tão pequeno que podemos desprezar essa hipótese, mas recomendaria que pequenos grupos de inteligência apartados e secretos, cuidassem desse assunto. Guerras isoladas continuarão mundo afora, quer bélicas quer comerciais.

E se perguntassem o que mudou em relação aos tempos em que romanos, gregos, assírios e egípcios dividiam o mundo entre si, diríamos que temos agora muito mais conhecimento científico, mas que nada de essencial mudou. Somente somos mais medrosos pela existência de bombas atômicas e nucleares, de armas químicas que podem destruir nações inteiras. As diferenças sociais continuarão eternamente.

Se finalmente perguntassem que sistema político melhor representaria os cidadãos e poderia garantir a paz no mundo, diminuindo as diferenças sociais, então teremos que recomendar a Democracia Total, Completa, Verdadeira [iii]


® Rui Rodrigues 











[i] Um tremendo erro geocomercial, certamente induzido pelo Brasil de Lula, Dilma e Mantega.
[ii] A partir daí, em 2002, o mundo começou a virar do avesso e em 2008 veio a crise econômica mundial e ainda estamos nela. Certamente todos os países do mundo remanejaram o uso de suas verbas, de seu capital de giro.  

sábado, 22 de fevereiro de 2014

O Cavalo de Noé e a Arca de Troia

O Cavalo de Noé e a Arca de Troia



Fazer confusões é coisa do dia a dia de nossas vidas. Da minha e da sua, que ora está lendo estas alegres linhas cheias de bom humor, mesmo que com pouca ou nenhuma graça. Claro que a arca foi a de Noé, e o cavalo foi o de Tróia, mas deixei ficar o título assim mesmo porque é preciso que se saiba que fazer confusões é coisa normal e corriqueira desde tempos que ninguém recorda porque só nos ficou a tradição até que veio a escrita. E aí, meus amigos, nossos problemas começaram. Uma vez escrito nada poderia ser corrigido, porque os museus guardam sempre um exemplar para comparação. 
Nem um dilúvio consegue apagar o que já uma vez foi escrito. E é exatamente a história emblemática do dilúvio que aqui se conta numa versão confusa. Ah... Tróia ficava perto de onde Noé estava. Os carpinteiros devem ter sido os mesmos e todos sabiam no lugar que quando as neves das montanhas da Armênia derretiam, o caudal dos rios engrossava e “inundavam tudo ao redor até onde os olhos não alcançam, destruindo tudo ao redor”, tal como escreveram e deixaram gravado os sumérios em placas de argila. As inundações vinham sempre e normalmente nos meses de Abril e Maio.


Temos duas testemunhas históricas: Um rei da suméria chamado Gilgamesh, conforme atestam as tais tabuletas de argila gravadas em escrita cuneiforme, e Moisés, que escreveu, segundo dizem, o Gênesis. Nossa história é de um terceiro, também desconhecido. Todos os três vivendo ali perto, em terras de Canaã, que correspondem hoje aos territórios ocupados pelo Líbano, a Palestina, Israel, partes da Jordânia, do Egito e da Síria. Gilgamesh foi um rei lendário de terras hoje ocupadas pelo Iraque. Troia não se sabe onde fica, mas os gregos que apareceram posteriormente apareceram por lá e rasgaram os mapas. Mas a ideia do cavalo oco cheio de coisas nasceu nessas regiões. Assim falou Xaratróstra, o nosso bardo do dilúvio.

(antes, porém, é preciso que se saiba que naquela época ninguém sabia da existência do planeta Terra nem de sua extensão. Sabiam da existência de terras a norte, sul, em todas as direções, mas não tinham a perspectiva do “descobrimento” e contentavam-se com a visão de um mundo pouco maior do que aquele que viam. Inundar um mundo pequeno destes era muito fácil. Bastava imaginar uma enchente um pouco maior, assim como se espera o terremoto dos terremotos na península da Califórnia que a pode transformar numa jangada de pedra [i])

Assim falou Xaratróstra:




Por aquela época os filhos e as filhas de Deus se uniram às filhas e aos filhos dos homens. Não se sabe quem corrompeu quem, mas a piedade se enfraqueceu e a corrupção tornou-se lei. Deus olhou para baixo das nuvens, olhou, olhou, franziu o sobrolho e chamou Xaratróstra. – Xaratróstra... (gritou)... Vem cá!...
Xaratóstra que estava fazendo um bodoque com as ligas das meias da mãe, largou tudo e foi-lhe ao encontro correndo. Encontrou-o no cimo do monte Ararat.
- Senhor... Aqui me tens!...
- O que estavas fazendo, meu filho?
- Um bodoque para caçar passarinhos.
- Maldito seja a tua raça que não te ensinou bons costumes. Que mal te fazem os passarinhos para que os mates?
- Não era para mim, Senhor... Era para meu pai que gosta deles fritos na farinha de mandioca com dendê.
- Ah!... Logo vi. Bom... O assunto é o seguinte: Vou acabar com a raça dessa miscigenação humana fruto de filhos e filhas de Deuses com filhos e filhas de homens. Não prestam, andam sempre em lutas, guerras, são corruptos e não têm nem piedade de... De... De passarinhos, para que vejas... Vou também aniquilar com esses deuses que criei e que fizeram filhos e filhas que se misturaram com humanos e humanas. Vou acabar com essa sacanagem toda. Agora me irritei. 



Só conheço dois justos: Gilgamesh e Noé. Vou mandar um dilúvio que varrerá toda essa raça da face da Terra, exceto a família desses dois que também pouparei. Corre e diz-lhes que construam uma arca e que metam toda a bicharada dentro, incluindo pássaros e aves porque não terão onde pousar nem o que comer. Mas presta atenção: o desgraçado do porco não pode entrar na arca porque é um animal impuro. Nem o bode nem a cabra, nem todos os que tiverem o casco como o deles. Entendeste?
Xaratróstra assentiu com a cabeça, duas lágrimas escorrendo por seus olhos negros como tição apagado.
- Mas senhor, porque duas arcas?
- Porque um deles pode falhar e a arca afundar, não sejas idiota. Eles não sabem construir nada que preste. Mas olha... O Gilgamesh lançará corvos e o Noé pombas, entendeste?
- Mas por que razão Senhor?
- Perguntas muito, Xaratróstra... Perguntas demasiado. É que assim não se confundirão os dois caso nenhuma das arcas afunde... Entendeste? Senão pensariam que um povo descendente de um teria copiado a história dos descendentes do outro e se geraria uma guerra que poderia acabar com a nova humanidade.
- E os genes senhor? Os genes do antigos descendentes, fruto dos filhos e filhas de deuses na mistura com os humanos e humanas não passarão para as novas gerações?
- Já me estás a irritar, Xaratróstra... Claro que passam, mas eles só descobrirão isso passados milênios. Depois verei se acabo ou não com essa humanidade novamente. Mas da próxima vez será uma crise que consumirá todo o dinheiro existente na face da Terra.
- E como a nova humanidade acabará por falta de dinheiro?
- Quando há falta porque não se produz os que têm menos querem que os que têm mais dividam com eles. Eles até dividem, mas isso lhes tira – aos que têm menos - a “necessidade” de produzir e vão deixando de trabalhar. Começa a faltar mão de obra e os preços sobem gerando inflação. Logo o dinheiro acaba porque não há como substituir nem produzir mais dinheiro todos os dias com inflação cavalar a ponto de para comprar uma ferradura, terem que encher uma arca de 40 côvados de dinheiro. Entendeste? Então se matam em revoluções sangrentas. 



Agora vai, e diz-lhes... Mandarei o projeto da arca nos próximos dias.
- E quando será o dilúvio, Senhor?
- Daqui a 120 anos. Agora vai...

Xaratróstra desceu correndo o monte Ararat. Foi encontrar Gilgamesh no meio de uma farra, cheio de mulheres e mancebos do harém, numa festa do cabide, tomando vinho tinto e comendo pão com carne de porco embutida na própria tripa, defumada, com molho de pimenta, molho de tomate e mostarda amassada.



- Gil... (eram íntimos)... Vem cá... Dá-me uma ânfora desse vinho que preciso tomar um porre...
- Que foi Xara... Que te aconteceu meu amigo? Fedes como porco, estás suado e pareces vesgo...
- Ele vai acabar com todos vocês e os de Noé.  
- Calma... Primeiro... Quem é “Ele”?
- Deus!

Gilgamesh arregalou os olhos, teve um faniquito, um “piripac”, e desmaiou no mármore frio do palácio. Quando acordou, Xaratróstra o pôs a par da situação. Não se esqueceu do detalhe do porco que era um animal nojento, que até havia quem amarrasse as fêmeas e transasse com elas [ii], todos queriam comer porco, vivia chafurdando na lama fétida, transmitia doenças. Não deveria ser embarcado.


Então Deus voltou a chamar Xaratróstra. Xaratróstra saiu correndo de casa e subiu o monte. Chegou ofegante, suado, cheirando a porco.

Deus perguntou-lhe: Muito bem. Chegaste bem rápido. Mas dize-me... O que é isso aí atrás enfiado no teu saiote preso ao cinto?
- É... É um bodoque, Senhor...
- Mas não era para o teu pai caçar passarinhos?
- N... Não... Senhor... Isto aqui é para eu transar com gatas.
- Ora vamos lá... Explica-me isso!
- Senhor... Eu espero a gata passar, escondido atrás de uma árvore ou um muro de casa e dou-lhe um peteleco com o bodoque. Ela fica tonta e eu aproveito e transo.
- AH!... Está bem. Assim não te arranhas... Vou te perdoar essa. Sabes que sou bom e compassivo. O que não gosto é desta humanidade, e tu sabes que os homens e também as mulheres foram feitos à minha imagem. Eles também não gostam da humanidade porque são muitos e lhe fazem sombra. É competição pura. Qualquer motivo é motivo para que alguém queira dominar um grupo, uma nação... Conheço meu gado humano...
-Mas porque me chamaste Senhor?
- Quero que construas tu mesmo dois cavalos enormes de madeira, e enchas com uns animais que te vou trazer em carroças, separando casais distribuindo-os igualmente pelos dois cavalos.
- Mas que animais são esses Senhor?
- São animais que não existem por aqui.  E são vegetais também. Os que não se procriam por semente, mandarei mudas. Animais como o Canguru, o Ornitorrinco e o Equidno, o narval, a foca, a rena, sementes como as de manga, abacate e mamão, mudas de banana...
- Mas aqui não tem disso tudo... Senhor!...
- Eu sei! Por isso estou trazendo. Senão a história do dilúvio fica incoerente, sem sentido. Vou trazer esses animais da Austrália, da Ásia dos polos... Vais pô-los dentro dos cavalos para que não os vejam, não se assustem e não os matem...



E assim se fez e se fizeram as arcas com 300 côvados de comprimento, 50 de largura e 30 de altura, esta distribuída em três andares e coberta com breu que brotava naturalmente, uma espécie de asfalto de refinarias que naquela época ainda não existiam. Gilgamesh e Noé trabalharam durante cem anos durante os quais a humanidade comia, bebia, se divertia e fazia casamentos gerando filhos.




As reações aos cavalos foi a mesma por parte de Gilgamesh e Noé. Aceitaram como presente de Deus. Quando os desembarcaram, levaram-nos até a margem do mar e eles saíram navegando mar afora a caminho de lugares ainda inimagináveis naquela época. A humanidade (a nova) ficou milênios sem saber que existiam. 

Não se sabe, embora se desconfie, quem colocou o casal de porcos nas duas arcas embora fossem carne proibida. Noé não seria, nem Gilgamesh porque eram tementes a Deus, perfeitos porque ou não tinham genes de deuses ou não tinham genes de humanos, porque a mistura, como Deus dissera, era uma desgraça e por isso iria aniquilar a humanidade. Sobravam o próprio Deus e o Xaratróstra. Não temos dúvidas que a culpa foi do Xaratróstra...


Por 40 dias e 40 noites as águas das montanhas da Armênia desceram e inundaram tudo, juntando-se às águas das chuvas que caíram torrencialmente por igual período cobrindo toda a “terra” conhecida porque vista. Gilgamesh lançou seus corvos e Noé suas pombas como Deus os instruíra em separado. Quando nem corvos nem pombas voltaram, desembarcaram. Era sinal de que haviam pousado, já que não havia predadores vivos. De um cruzamento bem sucedido entre pombas e corvos, ou de outras aves que não chegamos a conhecer por terem sido extintas, nasceu o urubu, que hoje é a mascote da torcida do Flamengo no Rio de Janeiro. Ainda hoje se procuram as duas arcas que por serem de madeira... Imagina... Já foram comidas por fungos que ninguém reparou, mas também estavam na arca. Eles e os champinhons.




Ninguém informou como foram preservados os casais de peixes do mar, que como se sabe, não aguentam viver em água doce por mais do que umas poucas horas, mas deve ter sido construído um piscinão maior do que o de Ramos. Procuram-se os descendentes de Xaratróstra...


 ® Rui Rodrigues







[i] Provavelmente a base de inspiração do escritor português José Saramago em livro intitulado “jangada de pedra”, porém imaginando que a península ibérica fosse a que se desprendia do continente europeu.
[ii] Mulheres transavam com cavalos e cães até se casarem porque as famílias não permitiam o sexo antes do casamento.  Alguns moleques transavam com cabras e ovelhas. Parece que ainda fazem muito disso, sinal de que a humanidade , a tal, lá dos tempos de outrora continua sendo a mesma e herdou genes.