Não
foi nada fácil, mas Jesus ressuscitou [i]...
João diz que na mesma
tarde Jesus se apresentou aos apóstolos, mas Marcos, Mateus e Lucas afirmam que
só mais tarde Jesus apareceu para os apóstolos, não nesse dia. Parece tudo
muito confuso, e é mesmo, mas há explicações que só agora foram possíveis
desvendar. E isso aconteceu na segunda ressuscitagem ou no segundo
ressuscitamento [ii],
quando Jesus passou lá pelo bar em 03 de março de 2014, durante o Carnaval no
Rio de Janeiro... A história passou-se assim, segundo conta o Barman [iii].
Quando vi
um camelo na Saara (contava o Barman) no Rio de Janeiro, pensei logo em
propaganda dos comerciantes árabes ou judeus do centro da cidade, mas aquele
árabe que saltou elegantemente e todo serelepe do camelo, era “diferente”. Para
começar, usava uma estrela de David de lápis lazúli pendurada no peito,
pendente de um cordão de couro trançado. Vestia uma túnica imaculadamente
branca e usava uma kipá [iv] sobre os cabelos em
tranças [v]. De sandálias de couro, o
rosto de olhos azuis, era emoldurado por uma barba comprida. Amarrou o camelo
num poste onde estava afixado o resultado do jogo do bicho da manhã, e entrou
no bar. Dirigiu-se ao balcão e pediu em meio a olhares de admiração dos
clientes:
- Um
pedaço de pão e um copo de vinho.
Depois se
dirigiu a uma mesa vazia a pedido do atendente do bar. Um cliente não se
conteve, olhou para ele bem nos olhos e disse:
-
Desculpe, mas você é muito parecido com Jesus!...
- Olhe em
verdade em verdade vos digo não sei quem é esse tal de Jesus [vi], mas meu nome é Yeshua [vii], estou
com uma fome danada e acabo de ressuscitar.
Primeiro fez-se um silêncio sepulcral no bar. Depois começou uma
vozearia, os garçons começaram a serem chamados para servir bebidas, as cabeças
voltavam-se para o tal de Jesus e para o camelo amarrado no poste lá fora na
calçada.
O cliente que perguntara achou que Yeshua lhe tinha dado permissão para
continuar a conversa e voltou a perguntar.
- Mas se é Yeshua onde estão as marcas dos cravos nas mãos, e os
arranhões na cabeça da coroa de espinhos?
- Ah... Essas feridas já curaram logo na primeira vez que ressuscitei.
Esta é a segunda. Eu disse para meu pai: Não adianta me mandar de novo para o
planeta Terra porque vão me matar outra vez só para ver se sou deus ou não.
Eles acham que se eu ressuscitar é porque sou deus, mas se eu continuar morto
então sou uma fraude. Assim não há humanidade que eu possa convencer. Mas meu pai
insistiu tanto que eu voltei.
Já não havia ninguém sentado nas mesas do bar. Todos os clientes estavam
de copo na mão formando uma roda em volta da mesa de Yeshua que agora saboreava
seu pão e seu vinho, um Cabernet Sauvignon chileno muito bom [viii].
- Mas agora ninguém mata ninguém por causa da religião. Só lá no Oriente
Médio – disse o cliente – Aqui é a Saara, uma zona comercial do Rio de Janeiro,
e estamos na América do Sul... Fica tranquilo, Yeshua.
- E vens me dizer – a mim – onde estou celerado? Respondeu Yeshua
visivelmente contrariado, mas condescendente. Querias que me ressuscitassem
onde? Na China, onde quase ninguém me conhece? Na Índia? No Oriente Médio, para
que Israel e os árabes se matassem uns aos outros em meia dúzia de dias só
porque eu voltei e aqui é o meu lugar? Eu sei onde estou.
Yeshua voltou-se então para a multidão que já se aglomerava na calçada
tamponando a entrada do Bar, e disse:
- Sentai-vos!... Hoje não é dia de milagres porque ninguém aqui está
casando, por isso não multiplicarei nem pão nem vinho nem peixes. Mas pago a
conta e mostrarei como não um, mas uma cáfila [ix] inteira
passa pelo buraco de uma agulha. E dito isto, retirou uma agulha grossa presa à
sua imaculada roupa branca, e colocou-a na horizontal. Então chamou um por um
para que vissem como uma cáfila que passava pela rua também passava pelo buraco
da agulha, como na foto. E depois disse:
- Comei e bebei que este é o meu bar. Eu pago a conta. E como não deve
haver tanto vinho nem tanto pão por aqui que dê para todos, uma mordida no pão
e um gole para cada um que é para não faltar... Que assim se faça como quem
come hóstia. Só engulam quando derreter na boca, que é para saciar a todos.
Uma senhora aproximou-se de Yeshua e disse em prantos:
- Senhor... Eu vejo!... Eu vejo!... (E ajoelhou-se aos pés de Yeshua,
tentando beijá-los). Yeshua a afastou docemente dizendo-lhe.
- Não, mulher... Não... Meus pés estão sujos de tanta poeira desse Rio de
Janeiro, de pisar tanto lixo... Peçam a César o que é vosso e não dai a César
enquanto não vos devolver em serviços o que lhe dais. Mas vês o quê? Não vias
antes?
- Não senhor... Não via. Tenho aqui até os documentos dos médicos
cubanos que me examinaram. Eu estava irremediavelmente cega, mas ao ouvir-te passei
a ver.
- Mulher, que tu és muito apressada nos milagres. Porque não esperas-te
por mim, porque não me pediste o milagre para que eu te o fizesse?
- Senhor... Lá no meu bairro a gente já sabe que não precisa pedir. É só
chegar ao templo, mostrar papéis e dar o testemunho, chorar bastante de
alegria, que depois os homens do pastor acertam conosco fora das vistas alheias...
- Yeshua olhou a mulher e disse-lhe: Pois em verdade te digo, mulher de
muita fé, que tens toda a fé nos vendilhões do templo, mas que quando realmente
precisares rezarás a todos os deuses deste planeta e dos outros, e nenhum te
ouvirá, porque se não morreres de uma coisa, morrerás de outra, que este é o
destino de todos os mortais.
A Rua da Alfândega e algumas outras das adjacências estavam sendo
fechadas pela polícia, porque era tanta gente que o trânsito parara. Repórteres
tentavam chegar ao Bar do Chopp Grátis. Helicópteros de reportagem pairavam com
pás adejantes pelo céu. A cidade estava virada do avesso. As imagens do
acontecimento estavam em todas as redes de emissoras de televisão do mundo
inteiro. Só a Globo dera um leve “tararan-tararan” interrompendo a transmissão
de uma novela por breves segundos, informando que no Jornal da Noite dariam
mais detalhes.
- Pois bem (disse Yeshua indo já no terceiro copo de vinho e no terceiro
de pão, agora acompanhado com rojões de peixe molhados em molho rosa) – Vim para
vos dizer algumas coisas mais, e di-las-ei, mas não aqui e agora. Mas para que
não digais vós que não vos dei notícia de fé, direi que há filhos neste mundo que
não são de Noé, pois que enquanto Noé construía sua arca de muitos côvados,
outros que ouviram dizer do dilúvio, construíam uma enorme bexiga redonda e
transparente, feita com bexigas de gado vacum, que flutuou nas águas do dilúvio
por quarenta dias e quarenta noites até que as águas se evaporaram para a Amazônia.
Eles ficaram no fundo da bexiga, sempre estável por causa de seu peso
concentrado no fundo, mesmo quando girava ao sabor do impacto das ondas. A
bexiga girava, mas eles, lá no fundo, não. E foram muitos os que enganaram Noé.
Esses ainda hoje enganam a humanidade, aproveitando-se dos crentes, da crença e
da fé. Vigilai, pois, para que não fiqueis curtos no vestuário, na educação, na
saúde, nos transportes, no pão e no vinho, para encherdes os alforjes dos que
vos pedem em meu nome, porque sempre dei a césar o que é de césar e a Deus o que
é de Deus... Moedas são dos césares, não dos templos, não minhas...
E ao dizer isto, Yeshua desapareceu como que por encanto. O camelo foi
seguido, mas quanto mais corriam, mais depressa o camelo andava desembestado
pelas ruas do Rio de Janeiro em meio a lixo, assaltantes, traficantes,
rapinantes, quadrilheiros, entorpecidos e entorpecentes, camisinhas de vénus,
seringas, pastores milagreiros, políticos embonecados, carros alegóricos, fogos
de artifício, balas de borracha, cacetadas e prisões que são autênticos
palácios onde se preserva o crime da violência das ruas.
O camelo desapareceu misteriosamente, mas há quem diga que o viu
cavalgando sobre as águas da Baía de Guanabara, desviando-se convenientemente
das manchas de lixo espumoso...
Era carnaval nesse dia.
® Rui Rodrigues
[i] Nota do Barman: (Aqui pelo bar do Chopp Grátis passa boi,
passa boiada, é um grande movimento, e de vez em quando passam umas “avis
raras” que nos contam umas historietas para distrair enquanto pegamos algumas,
tomamos umas e largamos outras).
[ii] Não há dicionário que
aceite estes dois termos, ressuscitagem e ressuscitamento e nos querem obrigar
a usar um monte de palavras para transmitir a ideia fundamental: Ressuscitar...
Nossa língua por vezes não ajuda: Atrapalha!
[iii]
O barman naquele dia por acaso era eu. Quem sou eu? Eu sou o barman em certos
dias. Noutros sou só eu.
[iv]
Aquele gorro que os homens judeus usam para cobrir a cabeça e que chegou a ser
usado por homens e mulheres. Ver em http://www.igrejadedeusemsaopaulo.org.br/averdadeiraorigemdokipa.htm
[v]
Peot em hebraico.
[vi]
Em hebraico, Jesus se escreve Yeshua.
[vii]
Nome hebraico de Jesus como já devem ter percebido da nota anterior.
[viii]
Se a Adega chilena me pagar adequadamente, informo qual a marca do vinho que
Yeshua bebeu.
[ix] Cáfila é um agrupamento de camelos. Vara é
de porcos, bando e quadrilha são de políticos que roubam pondo-se de acordo
entre si.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Grato por seus comentários.