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domingo, 23 de março de 2014

A realidade não nos assusta.

A realidade não nos assusta.

Um dia destes minha netinha de quatro anos pediu à mãe que passasse filmes de terror. Minha filha comentou comigo talvez, pensei eu, esperando que eu fizesse algum comentário. Disse-lhe que isso era muito bom, porque mostrava da parte de Maya, a minha netinha, que estava preparada para o “terror”, e nada amedronta mais do que o terror de histórias, revistas e filmes, quando estamos seguros em nosso meio. Pedir para ver filmes de terror é um modo de fortalecer o ego, pondo-se à prova do que mais nos mete medo: O terror! Associei este pedido a uma gravação que minha filha fez dela quando há apenas alguns meses minha neta tinha deixado de engatinhar. Deveria ter um ano e poucos meses. Caminhando da sala para o quarto da mãe bateu com a cabeça na porta, de forma tão forte, que caiu. Em vez de chorar, riu a bandeiras despregadas. Está gravado em filme. Tenho uma neta valente querendo preparar-se para o futuro. Será uma mulher valente. Aliás, na família todos somos.




Nós, em nosso mundo, todos somos valentes em princípio. Não fosse assim e não haveria exércitos. Não fosse assim e haveria mais desertores do que soldados convocados, mas sempre uns de nós somos mais valentes do que outros, e dentre estes, há sempre os valentes “cegos” que lutam por qualquer motivo e os valentes que sabem por que lutam. E não podemos esquecer os que lutam enganados: Pensam que lutam por uma causa comum que lhes convém, e na verdade lutam por algo muito diferente. Há ainda quem não se assuste com absolutamente nada, embora não chegue a ser valente, mas tenha um leve temor pelo desconhecido, embora enfrente os fatos, assim como há os destemidos que não importa qual seja o resultado, enfrentam os problemas de peito mais ou menos aberto, desde desprevenidos por completo, até os de peito aberto e escancarado. Sempre uma mistura do “eu” próprio do indivíduo, da tradição familiar, do meio em que se envolve. São as três forças da vida que definem a vida de cada um de nós.




Sendo isto uma verdade, é a velhice que mais nos torna conscientes do terror, do medo, porém possuidores de “armas” experientes que nos mostram o caminho para vencer toda essa problemática da realidade em que se vive desde que viemos a este mundo, um mundo curioso onde o que mais existem são os perigos. E mais curioso ainda como podemos conviver com eles e enfrentar o mais difícil de todos: A passagem escura que nos leva para outro mundo qualquer, desconhecido. É bem verdade que quando viemos também nos surpreendemos com este. Não nos lembramos, por que seria doloroso e nossa natureza nos proíbe o acesso às lembranças da mais tenra infância. O máximo até onde podemos ir para trás no tempo não passa geralmente dos dois anos de idade e daí até a velhice vai um longo caminho de sobressaltos, e estaremos tão mais felizes quanto mais perigos tivermos enfrentado e vencido.



Talvez por isso minha netinha querida tenha pedido à mãe para ver “filmes de terror”. Será o inconsciente coletivo da humanidade trazido à tona pelo comentário de alguém a quem ela escutou falar sobre o assunto, pode ser o seu próprio consciente querendo preparar-se rapidamente para o futuro. A juventude tem pressa e talvez, apenas talvez, lá no fundo, no mais profundo de seu inconsciente, saiba que fomos nós os responsáveis pela construção deste mundo altamente competitivo, e que, em assim sendo, não podem contar muito conosco, e embora não sejamos uma causa perdida, não parecemos ser bons conselheiros.



Deixemos que a juventude fale e aja. Ela sabe o que quer ainda que nos pareça um absurdo. Sem medo da realidade, que como sabemos, não nos assusta.


® Rui Rodrigues

sexta-feira, 21 de março de 2014

Sonho da ultima noite de Verão

Sonho da ultima noite de Verão



Olhei a humanidade e a vi desde o alto. Pastores sem cajados tocavam seus rebanhos de humanos, segundo sua vontade. Todos os pastores eram lobos e não pastoreavam. Uns se vestiam de sacerdotes e construíam estábulos onde os humanos iam consolar suas esperanças, chorar suas dores, pagar seus dízimos. Outros se vestiam de doutores e cobradores de impostos e os arrecadavam e suas casas eram ricas. Outros eram donos dos exércitos e mandavam em todos usando de palavras, porretes ou armas letais. Todos mandavam nos rebanhos e os tocavam pelas ruas das cidades, pelas pradarias, pelas matas. Só não lhes cobravam ainda o ar que respiravam, mas havia nações de pastores, profetas, doutores e mandantes que pagavam cotas pela poluição que provocavam. Um dia o ar faltaria a todos. Até aos mandantes. Então elevei o meu olhar ao Pai, peguei um avião e parti para Jerusalém.




Percorri toda a “Via Crucis”, caminhei pela cidade e vi a fé grupal, aquela em que alguns do rebanho fazem tudo o que se lhes sugere para mostrar que a religião lhes faz bem, que pertencem a ela, mas não vi nas suas atitudes, por mais que fossem comedidas e introspectivas, que houvesse muitos justos por lá. Eram turistas comedidos. Muçulmanos vão a Meca com a mesma devoção. Havia tão poucos quantos nas demais cidades do mundo, e eu já tinha viajado por quase todas elas. O mundo não me é estranho. Até pelo deserto já andei e nele vivi. Mordem mais os mandantes e os sacerdotes do que as víboras mais peçonhentas. E como se disfarçam. Então parei no Gólgota e perguntei sem obter resposta, enquanto o céu se fechava, escurecia, pesadas nuvens se formaram e uma chuva torrencial se abateu sobre a cidade:



- Pai!... Porque o abandonaste?

E sem resposta ao diálogo perdido no tempo, dirigi-me, já noite, ao monte das oliveiras. Ainda lá estão. Os romanos derrubaram o Templo, mas não as oliveiras. Olhei para uma em especial, a mais retorcida, a mais velha, de casca mais áspera, e nela apus minhas mãos. Senti que tremia, meu rosto se encheu de suor de lágrimas, senti medo. Medo de consumação da vida, medo de nada poder fazer porque as escrituras da vida assim são: Um dia ela acaba e o que dá medo é a forma como acontecerá esse fim. Pelo amanhecer fui até o deserto. Parece impossível que nele haja vida, mas há e muita. Há pastores de ovelhas que cuidam dos seus rebanhos, mas são ovelhas e nada pedem, não falam, balem sem significados especiais. Não pagam tributos porque os tributos são elas mesmas e o que produzem. Não sabem reclamar que o leite da cria seja usado pelos pastores, as tosquias são favores, e depois de mortas que lhes importa a carne? O que as assusta é a forma como morrem, e balem porque percebem, mas os balidos parecem todos iguais e não impressionam os pastores algozes. A passagem é apenas um momento ruim da vida que logo passa. E anoiteceu no deserto. Então olhei para o céu estrelado. Do céu do deserto se vêm as estrelas que não se vêm em qualquer lugar. E mais uma vez olhei o céu e chamei meu Pai. Disse-lhe:




- Faça-se em mim a Tua vontade!... Ressuscita a Cristo em mim e manda-me para Jerusalém, para qualquer lugar deste mundo, para que seja crucificado, receba injeção letal, morra em manifestação, seja fuzilado, enforcado, esquartejado, mas que veja toda a Tua Glória e este mundo tome jeito...

E me prostrei nas frias areias noturnas do deserto esperando uma resposta que como de costume jamais viria. Mas veio do céu uma voz que assustou meu camelo e o fez fugir a galope desenfreado, enchendo a noite de roucos e nervosos gritos.




- Filho... Porque és tão ignorante? Acaso não sabes que se aparecesses por aí fazendo milagres, coisa que mágicos fazem parecer tão bem, os sacerdotes, esses mesmos que falam em meu nome, te mandariam de Anás para Caifás, os mandantes, e te prenderiam numa prisão de meliantes ou de loucos e te anulariam como fizeram com ele? E que perguntariam ao povo: Querem este ou Barrabás? E que o povaréu gritaria em uníssono que preferiam soltar Barrabás e não a ti? E além do mais, que pensas tu que eu sou? Um tonto que insista em salvar um mundo que tem preguiça de se salvar a si mesmo, sendo composto de tantos bilhões de ovelhas tapadas, ignorantes como uma porta que beijam os pés dos mandantes aos quais pagam exorbitantes impostos, pagam dízimos aos sacerdotes e cultuam a aparência dos que os exploram, dizendo-lhes: Este é o justo?

- Não, meu filho... Não vou ressuscitar ninguém. E nem desamparei ninguém porque não amparo. O mundo é de vocês, virem-se... E tu, o que farias quando alcançasses – se alcançasses- o poder? Serias como eles, te juntarias a eles? Ou as ovelhas te escorraçariam? Então volta para tua terra, e aguarda. O mundo é imprevisível a cada instante. É o mundo quântico, em que uma andorinha só não faz verão, mas pode trazer alguma chuva ou secar um pouco os campos, mas nada para sempre. Não são apenas os mandantes e a natureza que fazem o mundo. Ovelhas também! E, além disso, que pensais? Ireis sofrer por séculos sem saberdes sequer se tenho a intenção de ressuscitar o Cristo, e muito menos quando, se por acaso essa for a minha opção? Pacientes tendes sido...



Peguei meu avião de volta, aterrissei no Pontal do Peró, e fui tomar um banho. Esse mundo é como é, e a história de Jesus caso não tivesse sido crucificado, ainda não se escreveu. Quem sabe teria sido eleito Sumo Sacerdote do Templo de Salomão, governador da Judeia... Um mandante diferente? 


® Rui Rodrigues 

quarta-feira, 19 de março de 2014

O céu noturno das Dunas do Peró.

O céu noturno das Dunas do Peró.



Nem sempre estou só, mas quando estou, não estou só. 

O céu das dunas do Peró não é um céu como outro qualquer. É um céu muito especial por não ter o que muitos céus que aparecem por aí têm, mas tem outras coisas que eles não têm. Sarkye, por exemplo, é uma tigre-fêmea mirim e minúscula a que muitos chamam de gato – e sempre aviso que se trata de uma gata – que vai para onde vou, quase não me deixa datilografar porque se encosta sempre em meu braço, e me acompanha à cozinha, ao banheiro e ao banho de chuveirão na área da churrasqueira, montando guarda sempre de costas para mim. Se miar, é sinal de que alguém se aproxima do portão, a uns dez metros de distância. É esperta e linda a minha tigre-fêmea anã, e é lindo e inteligente o meu céu. Nosso céu nos contém. Ele não fica “lá em cima”, somos nós que estamos dentro do céu que vemos. Lua cheia hoje. Desliguei as luzes e acabei de tomar o banho à luz da lua. Todas as estrelas estavam lá no céu, mesmo as que sei que estão lá, mas não as vejo a olho tão nu quanto eu no banho. Com um binóculo veria algumas mais, com um telescópio veria milhões mais.



Os muros da casa não me deixaram ver o Cruzeiro do Sul, mas não importa. Sei que está lá, assim como sei que o céu que vejo é um enorme computador onde tudo se equilibra. Se a Terra parasse, a Lua dispararia imediatamente como lançada por uma catapulta e tomaria um novo rumo a caminho do Sol, provavelmente. É como se as leis do Universo – aquelas da Física - fossem “automáticas” e houvesse censores espalhados em cada ponto que transmitissem a informação de que algo mudou por ali e precisa ser “equilibrado”. Tudo automaticamente. O Universo é um computador automático, inteligente, que se sustém a si mesmo. Eu não! Minha tigre-fêmea anã também não. Eu sustento a minha guardiã, o Universo me sustenta aqui na Terra. Se eu sair completamente nu para dar um passeio pelo Universo, morro logo que atingir a altitude de 5.000 metros por completa falta de ar, e se conseguir sobreviver a mais uns tantos mil metros, meu corpo explode todo estraçalhado, ensanguentado, tudo congelado, porque a minha pressão interna o fará explodir. Lá fora a temperatura estará próxima do zero absoluto, ou seja, - 253º graus centígrados. Esquisito esse meu céu. Não sei como alguns religiosos imaginam que seja o céu, como paraíso, mas deve ficar em algum planeta, ou numa porção deles, porque fora deles viver é quase uma impossibilidade. Só pedras se dão bem.




Lembrei-me de tomar um café. Minha gata gigante, guardiã levantou a cabeça – estava dormindo – e olhou-me como quem pergunta: Para onde vamos? E tive que dizer-lhe como é costume, que ficasse onde estava porque ia só tomar café. Deu-me uma lambida rápida na mão esquerda que ainda mantinha apoiada no teclado, e se arrumou para se encostar. Fui até a cozinha e me servi de um café. Só então ela se encostou tranquilamente para dormir mais uns minutos. Ela não toma café. Em certos dias o planeta vermelho que passa pelos céus em seu trabalho diário de girar em torno do Sol e manter o equilíbrio do sistema solar parece mais com cor de café ralo. Dizem que é vermelho, que já teve oceanos de água e até que já teve vida. Interessante como isso me preocupa, mas nem deveria porque nunca me preocupou antes de eu nascer e nem me preocupará depois que parar de viver. Com um pouco de sorte, se não sofrer de Alzheimer, ainda poderei me preocupar com isso uns anos mais. Mas mesmo com essa doença, também não terei porque me preocupar: Meu computador craneano terá perdido a noção de quase tudo e terá outras preocupações.



É claro que eu sou o meu céu, dotado de um computador onde tudo está funcionando perfeitamente, mas que já nasceu com um defeito congênito, problema que o céu lá de cima (mas que na verdade cerca este planeta) não tem: Nasceu para ser infinito no tempo, com uma temperatura média de 2,4º Kelvin, ou seja, próximo do zero absoluto, mas com zonas tão quentes e tão temperadas como o meu corpo, que fico impressionado, dentre tantas outras coisas, como até nas leis da natureza alguém parece ter-se preocupado com o isolamento térmico. Se este isolamento não funcionasse, estaríamos mortos há muito tempo, o Sol apagado, o Universo inteiro morto.



Fica a pergunta se o universo é assim para nos manter vivos. Parece que esse é o único propósito deste Universo. O meu, é continuar gastando meu tempo com a vida que herdei de forma tal que posso dar minha vida por um ente querido ou por uma causa que mantenha a vida, mas preocupado a cada instante para que não seja em vão, á toa, um desperdício. Já me perguntei se minha gata Sarkye faria o mesmo por mim. Acho que não. Ela me avisa se tem algo “vivo” diferente nas imediações da casa, faz vigília a meu lado, mas é a primeira a fugir a cada ruído estranho que chegue mais perto. Se eu pudesse iria dar um passeio por Alfa de Centauro que fica bem perto de nosso planeta, mas ainda não abriram as bilheterias para embarque. El algum lugar do mundo haverá um “louco” pensando na melhor e mais eficiente forma de chegar até lá, mas as Agências Espaciais têm outras prioridades, e os governos nem se preocupam com as populações. Seu imediatismo é serem reeleitos para serem donos das verbas públicas que dividirão com quem entenderem ser “melhor” dividir, sempre pensando na reeleição.




O céu desses – aquele céu divino de que falam as Escrituras e Livros Santos – Não o céu que vemos, é nos palácios onde são servidos a expensas dos cidadãos. Dizem eles que isso é Democracia. Democracia é a vida entre eu e minha gata: Eu cuido dela como posso, ela cuida de mim como pode. O Céu, cheio de estrelas, planetas e políticos é testemunha. O que o céu contém nem me conhece, mas continuarei estudando o céu, o universo. Meu filho chega hoje da Noruega. Passou por Barcelona e Lisboa para se despedir dos amigos. Outros terras, outros céus.

® Rui Rodrigues






domingo, 16 de março de 2014

Ucrânia – Crimeia por Guantánamo?

Ucrânia – Crimeia por Guantánamo?
... E histórias sempre se repetem. O que muda é a “paisagem”.


Convido quem estiver interessado em verificar como começaram a primeira e a segunda guerra mundial, e o que aconteceu na crise dos mísseis entre Cuba e os EUA[i].



Na primeira guerra mundial, 1914-1918, com Lloyd George à frente do governo britânico, ainda a maior potência colonial da época, Inglaterra, França, EUA, viram a Alemanha do Kaiser Guilherme e de Bismark se armar com pesadas naves de guerra, manobras militares, e atitudes diplomáticas agressivas. Não quiseram admitir a possibilidade de uma guerra mundial. Quando em Sarajevo assassinaram o Arquiduque Francisco do Império Austro-Húngaro, simpático à Alemanha de Bismark e do Kaiser. A Alemanha invade a Bélgica para atacar a França. Problemas de mobilização atrasada por parte da França, Inglaterra e mais tarde EUA, permitiram à Alemanha sonhar em atacar a Rússia.  Em 1917 a Rússia se retirou da guerra por causa da revolução comunista de outubro. Foi durante a guerra que as potências que lutavam contra a Alemanha e o Império austro-húngaro foram recuperando o tempo perdido. A democracia é lenta...



Na segunda guerra mundial, 1939-1845, Hitler deu demonstrações de que se estava armando e fazendo manobras militares, além de construir navios de guerra poderosos e testar aviões de combate. Sua política externa endureceu. Só após invadir a Polônia as potências ocidentais se uniram para dar-lhe combate, mas já tinha invadido a França e a Holanda quando começaram a ser enfrentados. Os EUA entraram muito atrasados na guerra, em 1942. A democracia é lenta...

Porém, entre tantas guerras que acontecem dois outros conflitos que não alcançaram o nível de envolvimento “mundial” merecem atenção: A guerra da Crimeia, 1854-1856 e a crise dos Mísseis, cuja tensão internacional durou 13 dias em Outubro de 1967.


A guerra da Crimeia se iniciou com a Rússia invadindo a Moldávia e a Valáquia (na atual Romênia) que pertenciam ao Império Otomano que incluía a atual Turquia, a pretexto de defender os lugares santos dos Cristãos. Na verdade o Czar Nicolau queria aumentar sua influência nas Balcãs, uma passagem de sua frota pela península da Crimeia, de onde sairia do Bósforo e do Mar negro para o mar Mediterrâneo. Isto não interessava ao Império Britânico. A Rússia foi derrotada por uma coligação e ficou proibida de ter frota no Mar Negro pelo tratado de Paris.

A crise dos misseis foi uma – aparentemente- uma besteira fenomenal da política externa russa acreditando que estava à frente da corrida espacial (1967) e que em breve dominaria o mundo com sua política comunista. Mandou misseis com ogivas que poderiam ser municiadas com bombas atômicas para Cuba a pretexto de defender a ilha de Fidel Castro de uma possível invasão norte-americana. O acordo entre Rússia e EUA chegou a bom termo com uma troca: Os EUA retiravam seus mísseis da Turquia e a Rússia os seus de Cuba. Vistas bem as coisas, não houve besteira alguma: A Rússia saiu em vantagem com a retirada dos mísseis da Turquia. E talvez nunca fosse sua intenção deixar misseis nucleares numa ilha sobre a qual não tinha controle a menos que ocupasse a ilha com forças suficientes. Fidel não era pessoa na qual pudessem confiar e daí a tomar os mísseis e jogá-los sobre os EUA era um passo para uma guerra mundial.

Será a crise da Crimeia uma retomada de algum plano do tempo da guerra fria, quando Putin chegou a ser o chefe supremo da terrível polícia política russa a KGB?

Se atentarmos para alguns fatos, talvez não seja uma opção para jogar fora. Recentemente a Rússia tomou conta de boa parte da Geórgia sob os olhares coniventes do Ocidente, fez acordos com a Síria para a construção de um porto, e pretende construir outro na Venezuela. O Brasil construiu um para Cuba – aparentemente a fundo perdido porque Cuba não tem dinheiro para pagar a conta – e terá incitado e apoia um movimento separatista da Crimeia que faz parte da Ucrânia. Estará a Rússia num processo expansionista de influência, chegando mais perto a cada dia das terras da América do Norte?



Quando patriotas foram para as ruas de Kiev contra a posição de um primeiro ministro que sem fazer plebiscito resolveu desprezar a aproximação da Ucrânia com a União Europeia, declarando que se aproximaria da Rússia, o governo russo viu uma grande oportunidade de influir na península da Crimeia e garantir a passagem de sua frota naval do Bósforo e do Mar Negro, dando-lhe passagem para o Mar Mediterrâneo. Acabou por provocar uma secessão ucraniana muito parecida com a anexação da Áustria à Alemanha de Hitler e mais recentemente de uma parte da Geórgia à Rússia.  Exatamente como em 1864 ao desejar anexar a Crimeia. Por outro lado, como abrir mão desta passagem se está abrindo portos em zona de influência tradicional norte-americana? Somos levados a pensar, face à experiência histórica, se a Rússia pretende negociar algo com o mundo ocidental, ou se pretende realmente enfrentar o ocidente e só a anexação da Crimeia lhe atende os desejos.




Há algo que devemos ainda ter em mente: Em 1929 houve uma crise econômico-financeira de amplitude mundial que concorreu para o inicio da segunda guerra mundial. Tivemos uma crise idêntica em 2008 e ainda não saímos dela. Muitos países se encontram em crise. Nestas épocas os ânimos da política internacional andam mais exaltados, o dedo treme acariciando o gatilho.




E o ocidente, democrático, costuma demorar muito a tomar decisões... Por isso não será de estranhar se houver mais um acordo com ou sem mais uma guerra, esta também mundial.



A surpresa será, em havendo acordo, o que a Rússia colocará no prato da balança contra a anexação da Crimeia: Será a base de Guantánamo em Cuba, ou o que sobrou da Geórgia? Não se sabe o que se passa nas cabeças do governo russo, mas porque não?


® Rui Rodrigues  










[i] A WEB está repleta de sites a propósito dos três assuntos para conferência de detalhes. Limito-me a resumir neste texto. 

quinta-feira, 13 de março de 2014

Notícias e propaganda.

Notícias e propaganda.




Nesta vida tudo se resume em “acreditar ou não acreditar”, desde acreditar em Deus, em nós mesmos, ou nos outros. Quem tem conhecimento – e ninguém tem conhecimento de tudo – pode facilmente avaliar se deve acreditar ou não. A ciência ajuda muito. Quem não tem conhecimento ou é muito rudimentar, tem que ir pela voz dos outros, pelas aparências, sem jamais ter a visão do “todo” (ou tudo) que envolve desde uma simples propaganda para evitar a caspa, até a da indicação para presidente de uma república, só para dar dois exemplos.

Qual o melhor sabonete para seu neném se você não entende nada de química? E quais os melhores brinquedos, os que não oferecem perigo de vida ou à saúde? Qual o supermercado melhor, o mais barato ou o mais limpo? Artistas cantam, representam, dançam, pintam, e de vez em quando se metem em política a favor de um candidato. Qual deles ouvir nesses casos? Qual o candidato em quem votar?



Afinal, para tudo temos que ter uma opinião porque de uma forma ou de outra estamos sempre sendo obrigados a escolher alguma coisa. E quando nos pedem opinião é comum darmos a nossa própria. Algumas propagandas levam populações ao delírio, propagam-se rapidamente como rastilho de pólvora. Aconteceu na Alemanha a partir de 1919 e levou Hitler ao poder. Foi tão bem dirigida que todo o povo alemão viu nele, Hitler, o salvador da Pátria, aquele que devolveria toda a glória à Alemanha, a tiraria da depressão, a libertaria das pesadas multas de guerra impostas pelo Ocidente, daria ao povo o bem estar que toda a socialdemocracia poderia permitir. Foi esta socialdemocracia que se transformou no nazismo. O apelo da propaganda era o bem estar, o desenvolvimento, o fim das multas de guerra, o fim da inflação, a pátria, a família.



Roberto Carlos, apelidado “O Rei” por alguns, canta muito bem e era vegetariano. Recentemente disse numa propaganda que já não é vegetariano e dá a entender que só come se a carne for de determinada marca. Custa a acreditar que o sujeito tenha deixado de ser vegetariano, mas isso não importa. Importa sabermos que ele faz apenas “propaganda” e que ganha um bom cachê por isso. Está ganhando o dinheiro dele e não está certamente preocupado com o que comemos. Ana Maria Braga sempre faz propaganda de outros produtos em seu programa na rede de televisão. Não nos cabe nem perguntar se os usa ou não, e certamente também não se preocupa com cada um de nós. Nem Roberto Carlos nem Ana Maria Braga têm noção de química, de processos de produção ou de fabricação, são apenas artistas, tanto quanto alguns que andaram fazendo propaganda de produtos (sem saberem provavelmente) que ou eram inconstitucionais, ou atentavam contra a saúde pública, ou eram captadores de recursos de forma não muito legal, como a propaganda de “Bancos de empréstimos” a aposentados com taxas de juros exorbitantes. Artistas são artistas, pouco nada mais do que artistas e é assim que os apreciamos.



Quem se poderá convencer que quem bebe sempre uma determinada marca de cerveja passe a tomar outra só porque a mulher que anuncia é mais “gostosa” ou sexy do que a que costuma fazer a propaganda da que costuma beber? E se colocarem um monte de mulher gostosa e sexy perguntando se “você já?”, isto é, se já tomou dessa cerveja que ninguém costuma tomar?  Isso levaria você a largar a sua marca preferida? Trocaria a realidade por mulheres virtuais que nunca terá? Ou apenas porque elas dizem que essa marca é a preferida delas? Ficar na moda nem sempre é estar na moda. Moda não se faz. Moda adota-se.



Quem não sabe que a violência no Rio de Janeiro aumentou, e que a pacificação das favelas ainda não aconteceu? No entanto aparecem agora, às vésperas das eleições, partidos políticos que afirmam que o Rio é uma maravilha. Então, somos levados a pensar que talvez algum político de outro partido pudesse fazer melhor governo... Parece pura ilusão por três motivos [i]:

1.     Os interesses que regem a política são financeiros, e vice-versa, ou seja, os interesses que regem as finanças são políticos porque estão unidos e as “finanças” financiam os políticos.
2.     O sistema político e a constituição estão constituídos para atender isso mesmo, os interesses da política associada aos lucros.
3.     O comunismo acabou porque não deu certo, o socialismo é capitalista, e não há esperanças de dividir o que não se pode ter. Só se pode dividir o que se tem e os políticos ficam atualmente com a maior parte. Estão enriquecendo.




Quem não sabe que temos dos piores e mais caros “sinais” do mundo em termos de conexão de Internet? Todos nós sabemos, todo o planeta Terra sabe disso. As empresas fornecedoras de sinal, as chamadas “teles” são campeãs em reclamações de clientes. Todos nós sabemos. No entanto continuam fazendo propaganda como se fossem a melhor maravilha do mundo. Artistas renomados sabem disso e aceitam fazer propaganda. O mundo é assim mesmo. Ou acreditamos ou não acreditamos. Ou reclamamos ou ficamos calados. Ou votamos ou não votamos. A opção é nossa. Somos obrigados a pensar sempre nas consequências porque podem representar sérios danos às nossas necessidades: O dinheiro que deveria ir para o leite das crianças vai para impostos, para despesas “extras” em faturamentos fora da realidade que somos obrigados a pagar para depois tentar reaver na justiça.



As notícias que nos atingem são sempre de ordem econômica, política ou social e todas elas, de certa forma, embutem propaganda sob a forma de “opinião”. O mesmo assunto, o mesmo fato, pode ser usado por partes antagônicas para se explicarem, defenderem, atacarem. É o mundo da aparente confusão, e no qual temos que apanhar uma ponta da linha para desfazer os nós, refazer o novelo e formar uma opinião global, total. Quem vai muito a baladas, festas da prefeitura, e se diverte muito na vida, não tem muito tempo para estudar e apreciar o que a vida nos oferece de riscos. Um meio termo é o ideal. Há tempo para tudo.

E como sempre, o mundo é dos espertos por pouco tempo, dos inteligentes e que tem conhecimento normalmente até o final da vida, e quem não tem conhecimento ou é parco de inteligência, sofre mais. Tudo dentro da diversidade genética, da educação em casa, na escola, na vida... O mundo é assim. Foi e continuará sendo.



Previna-se... Cuide-se... Transmita conhecimentos a seus filhos e netos. Não tenha pressa em adotar uma atitude. Peça informação certifique-se e então aja. E não jogue em loterias para ficar rico ou rica. Vai ficar sempre mais e mais pobre. Pode ter certeza.

® Rui Rodrigues

  





[i] A solução é mudar o sistema para a democracia participativa.  O hábito faz o monge, e nosso sistema político está completamente corrompido. Lá fora o mundo não está muito melhor. A democracia está desgastada.  Ver em http://conscienciademocrata.no.comunidades.net/

domingo, 9 de março de 2014

A benéfica modorra “patogênica”.

A benéfica modorra “patogênica”.




Modorra é aquela preguiça que todos nós conhecemos, é a vontade de “descansar” o raciocínio, de dar uma pausa, um tempo, o ato de pensar por vezes é tão difícil que gera ansiedades, dá ânsias de vômito, crianças fogem da escola, gente estressada grita gesticula e xinga porque não quer “discutir a relação”. E quando se trata de ter que entrar por um raciocínio com visão tridimensional, então isso já não é para qualquer um ou uma: É necessário um desenvolvimento de sinapses de tal ordem que apenas uma pequena porcentagem de alunos de engenharia consegue terminar o curso no tempo previsto de quatro a cinco anos. Nossa humanidade, nossa constituição física e mental não é de um “deus”. Para sobreviver somos obrigados a evoluir e só evoluímos mentalmente descoberta a descoberta. É-nos impossível dar “saltos” no conhecimento. Sofremos de preguiça mental hereditária. Por isso se hoje houvesse uma catástrofe meteórica, mesmo que tivéssemos um prazo de 10 anos para nos safarmos deste planeta, talvez ninguém escapasse. Não tivemos tempo “ainda” de processar nossos neurônios de forma a podermos transformar em técnica acessível a todos os nossos conhecimentos já adquiridos. Gastamos nossas disponibilidades em muitas outras atividades e com equipamentos que vamos classificando como “prioritários”. Mas até na classificação temos que evoluir. Há indícios de que estamos no caminho errado.

Parece que temos evoluído mais ou menos assim:



Não podemos “adivinhar” o que desconhecemos. O que podemos e temos feito é seguir uma sequência lógica que nos permite evoluir ao longo de descobertas. Quando se descobriu o uso da roda há cerca de 10.000 anos atrás, não poderíamos imaginar sequer a possibilidade da construção de um motor de automóvel, e muito menos imaginar este tipo de veículo. O máximo que pudemos imaginar foi um profeta sendo levado aos céus por uma carruagem de fogo que podia voar graças á intervenção divina, coisa que os romanos também fizeram em terras do Oriente Médio onde existia um templo em que um “deus” de cobre dirigindo uma carruagem era elevado aos céus através de uma engrenagem hidráulica. No lusco fusco do templo, os fiéis enganados se admiravam de como um deus estátua conseguia subir aos céus. Por isso a roda foi sendo utilizada passo a passo em veículos de guerra atrelados a cavalos, em rodas de arado, em carroças de transporte, em manivelas hidráulicas, em mós de moinhos, acoplada ao leme de embarcações à vela para controlar os rumos.

Ficamos séculos olhando o vapor saindo de panelas, até que se descobrisse o uso do vapor para mover objetos. Daí à invenção de uma caixa com rodas movida a vapor a que chamamos de locomotiva, já não demorou tanto. Parece que o conhecimento é uma intrincada “malha de descobertas” [i] ocasionais ou mentalmente elaboradas com raciocínio e cálculos de tal forma complicada que nos dificulta a evolução do conhecimento.  Assim como se fosse um enorme fluxograma. Mas então descobrimos o lado bom dessa benéfica modorra patogênica: Se soubéssemos tudo sobre o Universo e seus mistérios, o que estaríamos fazendo aqui? Em férias? Pois que é perfeitamente viável que nossa lentidão e preguiça mental se destinem a dar-nos uma boa razão para vivermos: Trabalhar na construção de nossa própria sobrevivência como espécie. Sabemos hoje que se não trabalharmos com afinco, qualquer meteoro desgarrado que tenha uns cinco quilômetros de diâmetro médio pode acabar com a vida na Terra tal como a conhecemos. Sabemos também que por duas vezes isso já aconteceu por aqui, e que novas espécies tomaram conta de nosso planeta e a herdaram.



Herdamos a terra. É agora a nossa vez, e para sobrevivermos temos que evoluir muito e muito mais. Paradoxalmente parece que evoluímos em todos os ramos da ciência, sempre bem devagar, exceto em um deles que nos pode ser fatal, e neste estamos absolutamente parados no tempo. Não evoluímos absolutamente nada. Zero em evolução desde os primórdios de nossa existência há cerca de 4,5 milhões de anos.

A convivência pacífica.




Naqueles tempos uma guerra entre grupos poderia eliminar a existência de um deles e acabar com sua transmissão de genes. Certamente perdemos muita carga genética e criamos uma cultura de sobrevivência do mais forte, o que tivesse maiores e melhores exércitos, mais força, mais inventiva para a descoberta de máquinas de guerra. Não mudamos absolutamente nada. Neste ponto, tanto homens quanto mulheres somos culpados. Mães sempre ensinaram os filhos a serem como os pais enquanto estes estavam ausentes na caça, na coleta de frutos e vegetais ou no trabalho da vida moderna, e as filhas iguais a elas para “servir” a família. Parte de nosso comportamento foi escrito por homens que se arvoraram em “tradutores” das palavras divinas de deuses que inventaram ou deficientemente descobriram [ii]. Não é de admirar que tenhamos sido nós, os homens a escrever tais livros, porque as mulheres eram fracas e estavam dominadas pelos homens. Começamos muito mal nossa “civilização”, ao darmos prioridade à força e não a dosarmos com a ponderação feminina.

O fato é que chegamos ao século XXI em meio a guerras, perigo de detonação de artefatos nucleares, repúblicas dominadas por presidentes que podem declarar guerra impunemente porque são os “chefes das forças armadas”... Já vimos muitos loucos na história deste planeta que declararam guerras e as perderam por completo como Napoleão, Hitler, por exemplo, e agora Putin da Rússia que invadiu a península da Crimeia que pertence à Ucrânia. Chegamos a ter a sensação que existe um gene muito especial em nossa humanidade destinado ao suicídio coletivo.




Precisamos descobri-lo e eliminá-lo. Seria uma pena exterminar uma humanidade tão simpática, alegre, evolutiva, que demonstra laivos de inteligência divina. Podemos até pensar que quanto menos evoluímos mais tempo durará a nossa existência como humanidade, mas estaríamos completamente equivocados. O que precisamos é aprender a conviver, mas para isso precisamos tirar todo o poder dos políticos que pensam apenas de acordo com a sua idiossincrasia, seus interesses, os interesses dos partidos que representam e esquecem a humanidade [iii].

Seremos mesmo tudo isso?

® Rui Rodrigues









[i] O Jogo eletrônico “Civilization” possui um breve e simplista fluxograma de evolução do conhecimento. Serve de base para ilustração.  
[ii] Eu mesmo acredito num Deus que criou nosso universo, mas a vida e as espécies são consequência de suas leis de formação de universos. O mais parecido é Javé (D’Us), mas é muito mais inteligente e poderoso do que consta nos livros sagrados. Não se arrepende do que proporcionou, não tem raivas, não tem nada de humano e não interfere em nada do que criou, porque uma vez criado o Universo que proporciona a vida, é autossuficiente e segue as leis estabelecidas na formação. É D’Us. São inúmeras as concepções de divindade que já apareceram na humanidade, e outro tanto que ainda persistem. Ou todas certas, ou todas equivocadas ou incompletas em sua concepção divina. Precisamos evoluir neste aspecto para que não se explorem os “pobres de espírito” de tal forma que por fé até podem acreditar em qualquer coisa que se lhes mostre como “deus”.

sábado, 8 de março de 2014

Carinhos das Traquitanas.

Carinhos das Traquitanas.



Não... Não é de carros velhos ou mal adaptados que vamos falar... É de nós mesmos, de nossos carinhos... 

Um dia ouvimos dizer que éramos feitos à imagem de Deus – mesmo nem sabendo o que é realmente Deus, nem a mínima ideia – e logo ficamos convencidos de que éramos o suprassumo da inteligência, o que de melhor existe neste mundo. Quando soubemos da existência de um Universo em que vivemos – sem contudo sabermos exatamente o que isso significa nem sua verdadeira composição - então sim nos perdemos definitivamente na análise do “eu” próprio de cada um por acharmos que somos a única espécie viva inteligente deste universo. No fundo precisávamos mesmo desse afago do ego para que parasse o tráfego de escravos, para que alguém disposto a escravizar outro alguém pensasse:
- Não posso fazer ninguém de escravo, porque se todos somos feitos à semelhança de Deus, então estaria escravizando a algo semelhante a Deus, e para se ser “semelhante” a Deus, não pode ser só na figura, mas também no espírito! Estaria escravizando (explorando) Deus...


Mas esse pensamento nunca tomou forma e se assentou definitivamente em nossa linha de comportamento: A humanidade de forma geral continua sendo explorada uns pelos outros e alega-se de tudo para justificar esta exploração. Parece que somos todos nós uma perfeita “traquitana”, cada uma funcionando como pode, umas com motor à ré, outras com tração dianteira, com maior ou menor potência, a vapor, diesel, energia nuclear, mas todas precisando de carinhos. Sem carinhos parece que não sabemos funcionar de forma perfeita. Nem dando à manivela... Muitas das traquitanas precisam de aditivos humorizantes para poder levar a vida, rodar em velocidade de cruzeiro, navegar pelos mares da alegria, voar e dar piruetas pelos ares do sucesso. Mas como nelas funcionam as traquitanas e carinhos?  



Antes de nada mais somos extremamente egoístas, e até mesmo na associação dos beneficentes dos mais desvalidos o egoísmo funciona como motor: - Não se dá o que se pode nem o que se tem, dá-se para mostrar que não somos egoístas ou quando muito porque achamos que é o sistema que tem que mudar para que os benefícios cheguem a todos, mas nem é nesta parte descuidada dos aspectos sociais que somos realmente traquitanas e egoístas. A referência está no egoísmo: Gostamos de injetar em nossos cérebros boas doses de endorfinas que nos dão prazer. Assim, somos capazes de amar alguém que maltratamos até o sofrimento de parte a parte. Nós que levávamos uma vida normal com esse alguém, o maltratamos para ficarmos com grande deficiência de endorfinas. Sentimo-nos mal. Mas quando reatamos a relação normal logo as endorfinas enchem nosso cérebro de prazeres imensos. Sentimo-nos felizes, mas a cada separação e reatamento, mais endorfinas se fazem necessárias para nos dar o mesmo prazer. É como um vício. E logo estaremos terminando definitivamente para depois virem os carinhos de amigos, de amigas, que nos afagam, nos dão o consolo que gera endorfinas sem fim pelo resto da vida, porque em cada encontro se falará invariavelmente do mesmo: A relação terminada, como o outro alguém lhe "fez mal", como sofreu com ele, como deu a volta por cima, como ascende agora à condição de herói ou de heroína da vida.


Nossas traquitanas funcionam segundo o seu raciocínio guardado e desenvolvido nos motores centrais do cérebro, e não nos permitem, embora haja exceções – que tomemos consciência do “todo”, do envolvimento, da história por detrás das ações, das consequências dos nossos atos. Ao raciocinar na solução de um problema recebemos uma dose de endorfina sempre que “achamos lógica” uma atitude a tomar, e então achamos que seja a “solução” aquela que nos dê maior dose de endorfina... Nossa vida de traquitanas é muito rudimentar ainda e somos preguiçosos para manter nossos motores sempre na análise do conjunto do movimento: Nós (as traquitanas) e nos arredores da rede de estradas em que nos movemos. Uma entrada numa estrada muito equivocada e nunca mais voltaremos à estrada principal em que movíamos nossas vidas, como acontece sempre que alguma traquitana envereda pelo caminho das drogas e em particular pelo caminho do crack.



Algumas de nós ficamos doentes. É muito comum. Tão comum, que geralmente morremos de doenças ou da doença da falta de atenção e somos atropeladas no meio das ruas, nos escritórios por colegas ou chefes, em casa por esposas maridos filhos ou familiares, na política por competidores ou inimigos figadais. 


Por vezes nos atropelamos a nós mesmos por pura preguiça de raciocinar e não escolhermos o caminho mais adequado. Muitas vezes por pressa em resolver o que nos aflige. Não se pode ter pressa nesta vida, nem devemos permitir que nos apressem. Quem nos apressa já dá sinal de que não nos quer permitir o bom hábito de raciocinar: Ou não lhes interessa o que nos possa acontecer, ou estão torcendo para que nos precipitemos no abismo do desconhecimento de causa.  



Carinhos são muito bons por causa da endorfina que nos dá prazer, mas o que é “prazer” e onde busca-lo sem nos complicarmos, em qualquer ocasião? Uns dizem que é buscando amparo em Deus, essa figura que não conhecemos, que nunca vimos, de quem só ouvimos falar pela voz de outros, cada qual com sua opinião, simples traquitanas como nós. Outros dizem que conhecendo-nos a nós mesmos podemos obter todo o prazer do mundo sem recorrer a nada mais do que ao nosso raciocínio. Existe um imenso universo dentro de nós mesmos para ser desvendado, e a cada descoberta podemos ver como são parecidas todas as traquitanas que habitam este mundo. Tão parecidas que apesar das desigualdades sempre afirmamos que “somos todos iguais”. Mas não somos! Uns viram-se para o lado de fora, outros olham tanto para dentro quanto para fora, outros se encistam e olham apenas para dentro, mas destes há três tipos: Ou olham exclusivamente para o “eu”; ou para o “eu” no sentido de como predominar sobre os outros; ou apenas pela curiosidade de saber como é este mundo. O saber, o conhecer, soltam endorfinas deliciosas, uma salvação para quando estamos doentes e podermos nos restabelecer mais rapidamente. Não é toa que crianças e doentes em geral se animam e melhoram quando convivem em sua doença com animais, recebem a visita de “palhaços”, ou simplesmente sonham

O mundo é dos sonhadores e não podemos sufocar nossos gritos, nossas alegrias, nada do que queiramos expor.  


® Rui Rodrigues