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domingo, 23 de março de 2014

A realidade não nos assusta.

A realidade não nos assusta.

Um dia destes minha netinha de quatro anos pediu à mãe que passasse filmes de terror. Minha filha comentou comigo talvez, pensei eu, esperando que eu fizesse algum comentário. Disse-lhe que isso era muito bom, porque mostrava da parte de Maya, a minha netinha, que estava preparada para o “terror”, e nada amedronta mais do que o terror de histórias, revistas e filmes, quando estamos seguros em nosso meio. Pedir para ver filmes de terror é um modo de fortalecer o ego, pondo-se à prova do que mais nos mete medo: O terror! Associei este pedido a uma gravação que minha filha fez dela quando há apenas alguns meses minha neta tinha deixado de engatinhar. Deveria ter um ano e poucos meses. Caminhando da sala para o quarto da mãe bateu com a cabeça na porta, de forma tão forte, que caiu. Em vez de chorar, riu a bandeiras despregadas. Está gravado em filme. Tenho uma neta valente querendo preparar-se para o futuro. Será uma mulher valente. Aliás, na família todos somos.




Nós, em nosso mundo, todos somos valentes em princípio. Não fosse assim e não haveria exércitos. Não fosse assim e haveria mais desertores do que soldados convocados, mas sempre uns de nós somos mais valentes do que outros, e dentre estes, há sempre os valentes “cegos” que lutam por qualquer motivo e os valentes que sabem por que lutam. E não podemos esquecer os que lutam enganados: Pensam que lutam por uma causa comum que lhes convém, e na verdade lutam por algo muito diferente. Há ainda quem não se assuste com absolutamente nada, embora não chegue a ser valente, mas tenha um leve temor pelo desconhecido, embora enfrente os fatos, assim como há os destemidos que não importa qual seja o resultado, enfrentam os problemas de peito mais ou menos aberto, desde desprevenidos por completo, até os de peito aberto e escancarado. Sempre uma mistura do “eu” próprio do indivíduo, da tradição familiar, do meio em que se envolve. São as três forças da vida que definem a vida de cada um de nós.




Sendo isto uma verdade, é a velhice que mais nos torna conscientes do terror, do medo, porém possuidores de “armas” experientes que nos mostram o caminho para vencer toda essa problemática da realidade em que se vive desde que viemos a este mundo, um mundo curioso onde o que mais existem são os perigos. E mais curioso ainda como podemos conviver com eles e enfrentar o mais difícil de todos: A passagem escura que nos leva para outro mundo qualquer, desconhecido. É bem verdade que quando viemos também nos surpreendemos com este. Não nos lembramos, por que seria doloroso e nossa natureza nos proíbe o acesso às lembranças da mais tenra infância. O máximo até onde podemos ir para trás no tempo não passa geralmente dos dois anos de idade e daí até a velhice vai um longo caminho de sobressaltos, e estaremos tão mais felizes quanto mais perigos tivermos enfrentado e vencido.



Talvez por isso minha netinha querida tenha pedido à mãe para ver “filmes de terror”. Será o inconsciente coletivo da humanidade trazido à tona pelo comentário de alguém a quem ela escutou falar sobre o assunto, pode ser o seu próprio consciente querendo preparar-se rapidamente para o futuro. A juventude tem pressa e talvez, apenas talvez, lá no fundo, no mais profundo de seu inconsciente, saiba que fomos nós os responsáveis pela construção deste mundo altamente competitivo, e que, em assim sendo, não podem contar muito conosco, e embora não sejamos uma causa perdida, não parecemos ser bons conselheiros.



Deixemos que a juventude fale e aja. Ela sabe o que quer ainda que nos pareça um absurdo. Sem medo da realidade, que como sabemos, não nos assusta.


® Rui Rodrigues

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