Introdução- O clima
Em 1963 o Rio era uma cidade tranqüila, onde despontava um ou outro meliante, coisa rara. O governo tinha dado um ultimato aos políticos para se deslocarem para Brasília em definitivo. Havia relutâncias porque o Rio era o centro cultural da Nação. Por outro lado havia movimentos estudantis, liderados pela UNE - União Nacional dos estudantes, a favor de uma socialização política. Ativistas políticos tentavam sublevar os sindicatos por todo o país. Os movimentos se baseavam mais no comunismo de Marx, Lênin, Mao Tse Tung e Fidel Casto do que no socialismo. Não tinha nada, aparentemente, de parecido com o nacional socialismo nazista da Alemanha. A maioria esmagadora do povo brasileiro via nesses movimentos uma “ideologia sonhadora” coisa da juventude. Já se falava em “golpe” para derrubar o presidente João Goulart, Jango. Era voz corrente pelas ruas que a reforma agrária teria que ser efetuada para valer, tal como o presidente apregoava. Che Guevara e Fidel Castro chegaram a visitar oficialmente o Brasil, e esta atitude vista como apoio político ao governo, que era de esquerda, além das contribuições monetárias para alguns movimentos armados criaram um impasse político.
Em época de guerra fria, a nação tinha um grande problema. Ou caía para o lado comunista, ou se mantinha na mesma linha de pensamento dos aliados na segunda guerra mundial. Para piorar as coisas, Fidel se envolveu juntamente com a URSS numa crise envolvendo mísseis nucleares que até começaram a ser instalados em Cuba. Fidel e Nikita Kruchev perderam esta queda de braço para JFK , o presidente dos EUA. A melhor fotografia que se pode tirar desta fase política é que o governo socialista de João Goulart queria dar um golpe para mudar a constituição e impor o comunismo no Brasil. Forças sociais e militares queriam dar um golpe para acabar com estes movimentos. Quando as forças militares se envolvem, o resultado de vitória só pode ser do lado que apóia. Se a população está do lado das forças armadas, tudo corre normalmente na política. Se não estivesse, e fosse de opinião geral, não poderiam calar a população. Eram muito poucos os que queriam uma revolução de esquerda no Brasil . Os terroristas estavam em Agosto de 1963 em plena fase de guerrilha no Araguaia tentando sublevar as populações á moda da revolução russa. Nunca conseguiriam.
Não era o povo que queria o comunismo, porque nosso povo não tem "o perfil". Eram os interessados no poder querendo impor-lhe o comunismo. Queriam sua vez de mandar. Os únicos realmente socialistas e comunistas eram os intelectuais.
Ao anoitecer no Bar do Chopp Grátis
Não se pode imaginar como chovia naquele dia ao entardecer. Chuvas torrenciais são sempre desagradáveis por que acabam por trazer para o Bar do Chopp Grátis pessoas molhadas que nem pensariam em entrar com tempo mais agradável. O cheiro a molhado é sempre desagradável. Essas pessoas aparecem para se proteger da chuva, e acabam até por tomar alguma bebida só por vergonha e não “fazerem feio”. Nenhum cliente habitual as conhece, os olhares são de curiosidade. Naquele dia, de chuva, raios e trovões, um sujeito de aspecto tétrico apareceu imponente na porta, justamente quando a energia elétrica se foi abaixo e um relâmpago iluminou o céu e a rua e a luz invadiu o bar parecendo que tudo era feito de eletricidade azulada tremeluzente como a luz negra das boates do Rio de Janeiro. Corria o ano de 1963, pelos meados de Agosto. Um homem apareceu na porta de entrada do Bar.
Ouviu-se um murmúrio. O homem era alto, sua silhueta contrastou com a luz que iluminou a rua com o relâmpago. Usava um chapéu de abas horizontais e largas. Vestia uma japona escura sobre os ombros. Não era uma figura usual. Parecia uma assombração que ficou por algum tempo no olhar de todos quando se deu o primeiro apagão. A energia elétrica voltou logo em seguida. Os sons que vinham da rua e se misturavam ao tilintar de copos e pratos e a vozearia do bar misturava-se aos da chuva torrencial batendo forte nas pedras da calçada e ao rolar de pneus afastando as águas da rua em sua passagem. Alguém colocou na velha vitrola da Phillips um disco de 78 rotações com uma versão de “El condor pasa”, uma linda música triste tocada com flauta peruana [1]. O novo cliente procurou uma mesa, viu que uma delas estava vaga, perto da porta, e sentou-se tirando o chapéu e a capa. Pediu um Bourbon e um charuto cubano, um puro Montecristo. Sua pele parecia de cera. Quando o garçom chegou com o seu pedido, puxou de uma carteira e pagou com uma nota de cem dólares. Enquanto esperava o troco acendeu o charuto e tomou seu primeiro gole de Bourbon. Deu uma baforada, recostou-se na cadeira e caiu com um estrondo. Enquanto alguns clientes e o garçom corriam para a mesa do freguês a chuva caía implacável. E mais um apagão. Esse durou um pouco mais de tempo.
1. Dois dias antes.
Usar estolas de pele mesmo sendo inverno no Rio de Janeiro, somente por vaidade, não por necessidade, mas para quem embarcava no Aeroporto argentino de Ezeiza, tinha toda a razão. Lá faz um frio de rachar.
Os últimos passageiros subiam as escadas móveis para embarcarem no aeroporto de Ezeiza num Super Constellation da Panair do Brasil, vôo 263, debaixo de chuva. Essa chuva chegaria ao Brasil em mais um par de dias aproximadamente. São as frentes frias que vêem da Antártida. Iza Lendel era uma bela mulher, habituada aos olhares de admiração e desejo dos homens. Sabia como atrair os homens sem chamar a atenção nem se mostrar oferecida, e era exatamente por isso que decidira usar seu vestido tubinho preto, sapatos pretos fechados, de salto alto, chapéu de tule com uma discreta flor, e uma estola de marta para embarcar. O batom rosa discreto realçava levemente os lábios carnudos numa boca perfeita. Ela tinha uma missão. Para cumpri-la tinha que atrair um homem. Esse homem estava justamente atrás dela preparando-se para subir as escadas de acesso á aeronave. O homem parecia um criador de gado argentino. Usava um chapéu de abas largas, parecido com aqueles usados nos pampas pelos gaúchos e japona de tweed. Virou-se lentamente para trás como se procurasse alguém que deixara na gare do aeroporto e seus olhos pousaram docemente no olhar do homem, voltando-se imediatamente para frente. Para ela seria o suficiente.
Rafael Perez tinha uma missão. Sua primeira regra era não se envolver com estranhos nem para dar informação. Nada de simpatizar com ninguém. Desde que recebera a missão até que fosse cumprida, tudo deveria decorrer como se o tempo não existisse entre os dois extremos sem envolvimento, nada a lembrar a não ser a normalidade. A mulher á sua frente era linda. Passaria por essa. Durante o vôo percebeu que a mulher o olhou mais uma vez. Depois adquiriu um semblante de cera, impávido, indiferente. O que chamou a atenção de Rafael foi o ar de pessoa confiante e determinada que ela passou a ostentar. Sua viagem iría apenas até o Rio de Janeiro. Não iría até Londres. Perguntou-se qual seria o programa da bela mulher. Não lhe pareceu que fosse daquele tipo de mulher fatal.
Quando desembarcaram no Rio de Janeiro, Rafael e Iza se encontraram no ponto de táxi. Ela se ofereceu para dividir o táxi com ele. Ambos iam para o bairro da Glória, Hotel Glória, perto do Palácio do Catete. Foi durante a viagem que decidiram como passar o tempo. Jantaram juntos no restaurante Casa da Suíça, na subida para Santa Teresa. Passaram a noite no mesmo quarto no Hotel.
Iza Lendel era uma ativista comunista que operava na Argentina. Roberto Perez estava de passagem pela Argentina. Tinha viajado de Washington para Santiago do Chile, e de lá até Buenos Aires. Para todos os efeitos, parecia mais um chileno que visitava a Argentina e que se dirigia ao Brasil. Iza sabia quem era Roberto. Roberto não sabia quem era Iza.
2. Um dia antes.
Roberto perguntou-lhes se tinham contado para alguém. Ninguém sabia, afirmaram. Então levantou-se com esforço, tirou a carteira do bolso e lhes deixou umas notas pedindo para que ficassem calados. Depois saiu para a rua.Olhou o relógio. Tinha tempo ainda de cumprir sua missão. Depois de caminhar uns dois quarteirões, conseguiu um taxi. Rumou para o Bar do Chopp Grátis. Tinha um encontro inadiável.
4. Décadas depois do apagão.
Quando a luz voltou no Bar do Chopp Grátis, cerca de dois minutos depois, Roberto já estava de pé. Pediu um prato para viagem, esperou cerca de vinte minutos, recebeu o troco, pegou o embrulho com a comida e saiu. Nunca mais vimos Roberto Perez. Como dono do Bar deveria saber tudo o que se passa por aqui. Todo o meu pessoal é de confiança. Mas até que ponto?
Um dia destes, um sujeito que trabalhara para nós há muitos anos atrás passou por aqui. Fizemos-lhe uma festa que serviu para os outros empregados saberem como se tratam bem os empregados neste bar onde todos têm participação nos lucros. É muito modesta a participação, mas é incentivadora. Todos trabalham com prazer. Foi durante a libação em sua homenagem que ele contou o resto da história. Disse-nos:
"Naquela época eu era agente ocasional da CIA. Recebia uns trocados por cada serviço leve. Por mais fiel ou infiel que eu pudesse ser, não lhes importava, porque eram tarefas muito simples, como ser intermediário. O intermediário nunca tem responsabilidades muito grandes, e se for apanhado, só pode contar que um sujeito, jamais o mesmo, lhe entregou algo para dar a outro que jamais viu e verá de novo.
Roberto Perez era também agente do FBI. Não se tinha muita confiança no embaixador, porque quando se comunicam com pessoal graúdo nos países em que atuam, para demonstrem confiança, costumam falar um pouco demais de vez em quando. Fora ele, o garçom, quem colocara no pacote da comida para viagem, que Roberto encomendara, um pacote contendo documentos importantes tal como instruído. Tinham-lhe mostrado Roberto Perez com a bela mulher no Hotel Glória quando o contataram para lhe entregar o pacote no dia seguinte. Deveria por na vitrola uma musica "El COndor pasa". Foi o que ele fez exatamene quando Roberto entrou no bar. Vinha sem a tal mulher. Anos depois, contou, viu a foto dela num jornal. Tinha sido morta misteriosamente mostrando sinais de tortura na Argentina."
Quanto aos movimentos de esquerda que não deram certo na época do regime militar no Brasil, e que não dão certo agora nem nunca darão, se deve principalmente ao fato de a população - apesar do nivel baixo de instrução continuar praticamente o mesmo - não ter o perfil adequado ao comunismo e já saber um pouco mais de história que constata por todos os lados: Quem quer o poder faz a hora, não espera acontecer... Mas quem faz a hora? Nenhum movimento revolucionário foi feito pelo povo neste Brasil amado. Todos foram feitos por outros que querem pensar "pelo povo". E quando os movimentos são feitos por outros, minorias, com botas de veludo ou com coturnos, o povo desconfia... O povo brasileiro pode ser qualquer coisa, menos burro!... O PT sempre foi mais ignorante do que o povo. COm os cofres abertos por ter ascendido ao poder, comprou o que pôde e quem pôde até o dinheiro acabar...
Pois que acabe o PT - que não tem perfil nem de socialista nem de comunista - e toda a corrupção deste país que o PT incentivou e ampliou. Companheiros no PT são os que eles mesmos chamam ao poder e com eles divide "benesses". O povo não é companheiro. O povo está sendo roubado a cada dia e é chamado a comparecer em manifestações de apoio á base de pão, mortadela e uns trocados pra se sentir feliz.
® Rui Rodrigues
PS - Dedico este conto aos leitores de Allan Edgar Poe e de Agatha Christie. Nos dias atuais nossa realidade é ainda mais amedrontadora do que no tempo deles.
[1] Se desejar ouvir a bela música enquanto lê, favor clicar em https://www.youtube.com/watch?v=M_gSydN_BYM
[2] Fidel Castro sempre disse que os americanos o queriam matar. Quem morreu assassinado foi JFK em novembro de 1963. Esta história se passa em agosto do mesmo ano.
1. Dois dias antes.
Usar estolas de pele mesmo sendo inverno no Rio de Janeiro, somente por vaidade, não por necessidade, mas para quem embarcava no Aeroporto argentino de Ezeiza, tinha toda a razão. Lá faz um frio de rachar.
Os últimos passageiros subiam as escadas móveis para embarcarem no aeroporto de Ezeiza num Super Constellation da Panair do Brasil, vôo 263, debaixo de chuva. Essa chuva chegaria ao Brasil em mais um par de dias aproximadamente. São as frentes frias que vêem da Antártida. Iza Lendel era uma bela mulher, habituada aos olhares de admiração e desejo dos homens. Sabia como atrair os homens sem chamar a atenção nem se mostrar oferecida, e era exatamente por isso que decidira usar seu vestido tubinho preto, sapatos pretos fechados, de salto alto, chapéu de tule com uma discreta flor, e uma estola de marta para embarcar. O batom rosa discreto realçava levemente os lábios carnudos numa boca perfeita. Ela tinha uma missão. Para cumpri-la tinha que atrair um homem. Esse homem estava justamente atrás dela preparando-se para subir as escadas de acesso á aeronave. O homem parecia um criador de gado argentino. Usava um chapéu de abas largas, parecido com aqueles usados nos pampas pelos gaúchos e japona de tweed. Virou-se lentamente para trás como se procurasse alguém que deixara na gare do aeroporto e seus olhos pousaram docemente no olhar do homem, voltando-se imediatamente para frente. Para ela seria o suficiente.
Rafael Perez tinha uma missão. Sua primeira regra era não se envolver com estranhos nem para dar informação. Nada de simpatizar com ninguém. Desde que recebera a missão até que fosse cumprida, tudo deveria decorrer como se o tempo não existisse entre os dois extremos sem envolvimento, nada a lembrar a não ser a normalidade. A mulher á sua frente era linda. Passaria por essa. Durante o vôo percebeu que a mulher o olhou mais uma vez. Depois adquiriu um semblante de cera, impávido, indiferente. O que chamou a atenção de Rafael foi o ar de pessoa confiante e determinada que ela passou a ostentar. Sua viagem iría apenas até o Rio de Janeiro. Não iría até Londres. Perguntou-se qual seria o programa da bela mulher. Não lhe pareceu que fosse daquele tipo de mulher fatal.
Quando desembarcaram no Rio de Janeiro, Rafael e Iza se encontraram no ponto de táxi. Ela se ofereceu para dividir o táxi com ele. Ambos iam para o bairro da Glória, Hotel Glória, perto do Palácio do Catete. Foi durante a viagem que decidiram como passar o tempo. Jantaram juntos no restaurante Casa da Suíça, na subida para Santa Teresa. Passaram a noite no mesmo quarto no Hotel.
Iza Lendel era uma ativista comunista que operava na Argentina. Roberto Perez estava de passagem pela Argentina. Tinha viajado de Washington para Santiago do Chile, e de lá até Buenos Aires. Para todos os efeitos, parecia mais um chileno que visitava a Argentina e que se dirigia ao Brasil. Iza sabia quem era Roberto. Roberto não sabia quem era Iza.
2. Um dia antes.
Aquela era uma missão muito simples para Roberto Perez. Tudo o que
tinha a fazer se limitava a apanhar um pacote de documentos que lhe seria
entregue num bar da cidade. Depois pegaria um vôo para Washington, e o
entregaria diretamente a seu chefe no FBI – Federal Bureau of Investigation.
Havia um ponto de interrogação que lhe roia o cérebro: Porque o pacote não
seguiria diretamente pela mala diplomática. Será que temiam os “acordos diplomáticos”
pessoais do embaixador no Rio de Janeiro? Só saberia se nos próximos dias, um
par de meses, chamassem o embaixador a Washington e não voltasse mais. De
qualquer forma, tinha ainda quase dois dias inteiros para se divertir. Iza era
uma mulher muito interessante, daquele tipo que não pergunta sobre o sujeito, e
se concentra em agradar ao máximo. Só tinha conhecido uma assim no Japão, mas
achou que fosse por causa da língua. Aproveitaria sua estadia o melhor que pudesse com Iza na bela
cidade do Rio de Janeiro. Quando acordou, o sol já brilhava na cidade, o povo
carioca tentava chegar na cidade com ruas inundadas. Havia uma enchente devido
ás chuvas torrenciais que começaram durante a noite. A temperatura da cidade
estava amena mesmo em pleno inverno. Iza tinha passado cerca de duas horas com
ele em seu quarto, depois se retirara para o seu. Nada de anormal em sua
atitude que lhe despertasse qualquer suspeita, a ele, membro treinado da melhor
agência do mundo, o FBI e a CIA.
Não é qualquer um que pertence ás duas organizações. Foi por isso que notou uma ligeira desarrumação no modo como suas roupas estavam dispostas no quarto. Adquirira o costume de colocar primeiro a calça sobre o assento de uma cadeira, e depois a roupa restante, de tal forma que um alinhamento da borda da camisa ou camiseta indicasse a direção de sua maleta de viagem, assente no piso, a exatos dois passos. Não estavam assim, embora a diferença fosse muito sutil. A nota de cem dólares em sua carteira, bem no meio das outras, porém, estava certinha no lugar. Não deveria estar. Ele a deixara levemente fora de alinhamento das demais. Tinha sido espionado, mas não se incomodou muito. Sua missão era tão simples, que tudo o que tinha que fazer estava em seu cérebro. Não havia nada que o pudesse incriminar, denunciar. Teria sido Iza, o pessoal do Hotel, ou algum vizinho de corredor? Arrumou-se e bateu no quarto de Iza. Quando ela abriu a porta do quarto fecharam as cortinas e se entregaram ao sexo mais selvagem que ele já tinha praticado na vida. Ficaram no hotel até á noite. Saíram para jantar na casa da Suíça já passava das 22:00. Saíram a pé e caminharam por algumas ruas na direção da Cinelândia. Antes de apagar por breves instantes, Roberto se criticou por ter sido tão ingênuo.Iza chegou sozinha no Hotel.
3. Os Vermes da Terra.
Roberto estava completamente lúcido mas não podia se mexer. Nenhum músculo seu respondia a qualquer comando. Apenas ouvia e pensava. Não sabe como aconteceu, mas tinha sido muito rápido. Não chegou a cair quando a paralisia surgiu porque Iza e dois sujeitos o ampararam. Colocaram-no num táxi e o levaram para algum lugar do subúrbio da cidade onde havia um descampado logo depois que as casas começaram a rarear. Depois que pararam ouviu os sons de pás cavando a terra, as conversas, e deduziu que não sabiam nada de sua missão. Era um alívio que não ajudava muito. Tentou imaginar o que teria acontecido. Devem ter-lhe dado uma droga que o deixara em estado catatônico, em letargia. Talvez introduzida em sua bebida. Poderiam também ter-lhe dado alguma pancada na cabeça de que não se lembrava, ficando naquele estado. Sabia que se recuperaria, mas se o estavam enterrando é porque esperavam ter dado uma dosagem mortal, certa. Depois que o jogaram na cova, sentiu pazada por pazada de terra se acumulando sobre si. Quando tudo ficou escuro começou a sentir os primeiros vermes tentando entrar em sua boca, percorrendo seu corpo por entre a roupa. Os vermes eram muito rápidos. Farejavam carne enterrada. Quem o poderia salvar? Foi uma agonia não poder se mover. Sentiu seu corpo ser mordido sem sequer poder gritar.
Não pôde precisar quanto tempo ficou enterrado. Lembra-se apenas do momento em que sentiu uma necessidade imensa de respirar e conseguiu encher os pulmões num urro. Era noite ainda e estava deitado no solo. Via as estrelas e duas pessoas a seu lado. Eram pessoas simples. Contaram-lhe que tinham visto quando dois homens e uma mulher o enterraram e que logo depois que o automóvel em que tinham chegado se afastara correram para ver se estava vivo. Não é qualquer um que pertence ás duas organizações. Foi por isso que notou uma ligeira desarrumação no modo como suas roupas estavam dispostas no quarto. Adquirira o costume de colocar primeiro a calça sobre o assento de uma cadeira, e depois a roupa restante, de tal forma que um alinhamento da borda da camisa ou camiseta indicasse a direção de sua maleta de viagem, assente no piso, a exatos dois passos. Não estavam assim, embora a diferença fosse muito sutil. A nota de cem dólares em sua carteira, bem no meio das outras, porém, estava certinha no lugar. Não deveria estar. Ele a deixara levemente fora de alinhamento das demais. Tinha sido espionado, mas não se incomodou muito. Sua missão era tão simples, que tudo o que tinha que fazer estava em seu cérebro. Não havia nada que o pudesse incriminar, denunciar. Teria sido Iza, o pessoal do Hotel, ou algum vizinho de corredor? Arrumou-se e bateu no quarto de Iza. Quando ela abriu a porta do quarto fecharam as cortinas e se entregaram ao sexo mais selvagem que ele já tinha praticado na vida. Ficaram no hotel até á noite. Saíram para jantar na casa da Suíça já passava das 22:00. Saíram a pé e caminharam por algumas ruas na direção da Cinelândia. Antes de apagar por breves instantes, Roberto se criticou por ter sido tão ingênuo.Iza chegou sozinha no Hotel.
3. Os Vermes da Terra.
Roberto estava completamente lúcido mas não podia se mexer. Nenhum músculo seu respondia a qualquer comando. Apenas ouvia e pensava. Não sabe como aconteceu, mas tinha sido muito rápido. Não chegou a cair quando a paralisia surgiu porque Iza e dois sujeitos o ampararam. Colocaram-no num táxi e o levaram para algum lugar do subúrbio da cidade onde havia um descampado logo depois que as casas começaram a rarear. Depois que pararam ouviu os sons de pás cavando a terra, as conversas, e deduziu que não sabiam nada de sua missão. Era um alívio que não ajudava muito. Tentou imaginar o que teria acontecido. Devem ter-lhe dado uma droga que o deixara em estado catatônico, em letargia. Talvez introduzida em sua bebida. Poderiam também ter-lhe dado alguma pancada na cabeça de que não se lembrava, ficando naquele estado. Sabia que se recuperaria, mas se o estavam enterrando é porque esperavam ter dado uma dosagem mortal, certa. Depois que o jogaram na cova, sentiu pazada por pazada de terra se acumulando sobre si. Quando tudo ficou escuro começou a sentir os primeiros vermes tentando entrar em sua boca, percorrendo seu corpo por entre a roupa. Os vermes eram muito rápidos. Farejavam carne enterrada. Quem o poderia salvar? Foi uma agonia não poder se mover. Sentiu seu corpo ser mordido sem sequer poder gritar.
Roberto perguntou-lhes se tinham contado para alguém. Ninguém sabia, afirmaram. Então levantou-se com esforço, tirou a carteira do bolso e lhes deixou umas notas pedindo para que ficassem calados. Depois saiu para a rua.Olhou o relógio. Tinha tempo ainda de cumprir sua missão. Depois de caminhar uns dois quarteirões, conseguiu um taxi. Rumou para o Bar do Chopp Grátis. Tinha um encontro inadiável.
4. Décadas depois do apagão.
Quando a luz voltou no Bar do Chopp Grátis, cerca de dois minutos depois, Roberto já estava de pé. Pediu um prato para viagem, esperou cerca de vinte minutos, recebeu o troco, pegou o embrulho com a comida e saiu. Nunca mais vimos Roberto Perez. Como dono do Bar deveria saber tudo o que se passa por aqui. Todo o meu pessoal é de confiança. Mas até que ponto?
Um dia destes, um sujeito que trabalhara para nós há muitos anos atrás passou por aqui. Fizemos-lhe uma festa que serviu para os outros empregados saberem como se tratam bem os empregados neste bar onde todos têm participação nos lucros. É muito modesta a participação, mas é incentivadora. Todos trabalham com prazer. Foi durante a libação em sua homenagem que ele contou o resto da história. Disse-nos:
"Naquela época eu era agente ocasional da CIA. Recebia uns trocados por cada serviço leve. Por mais fiel ou infiel que eu pudesse ser, não lhes importava, porque eram tarefas muito simples, como ser intermediário. O intermediário nunca tem responsabilidades muito grandes, e se for apanhado, só pode contar que um sujeito, jamais o mesmo, lhe entregou algo para dar a outro que jamais viu e verá de novo.
Roberto Perez era também agente do FBI. Não se tinha muita confiança no embaixador, porque quando se comunicam com pessoal graúdo nos países em que atuam, para demonstrem confiança, costumam falar um pouco demais de vez em quando. Fora ele, o garçom, quem colocara no pacote da comida para viagem, que Roberto encomendara, um pacote contendo documentos importantes tal como instruído. Tinham-lhe mostrado Roberto Perez com a bela mulher no Hotel Glória quando o contataram para lhe entregar o pacote no dia seguinte. Deveria por na vitrola uma musica "El COndor pasa". Foi o que ele fez exatamene quando Roberto entrou no bar. Vinha sem a tal mulher. Anos depois, contou, viu a foto dela num jornal. Tinha sido morta misteriosamente mostrando sinais de tortura na Argentina."
Quanto aos movimentos de esquerda que não deram certo na época do regime militar no Brasil, e que não dão certo agora nem nunca darão, se deve principalmente ao fato de a população - apesar do nivel baixo de instrução continuar praticamente o mesmo - não ter o perfil adequado ao comunismo e já saber um pouco mais de história que constata por todos os lados: Quem quer o poder faz a hora, não espera acontecer... Mas quem faz a hora? Nenhum movimento revolucionário foi feito pelo povo neste Brasil amado. Todos foram feitos por outros que querem pensar "pelo povo". E quando os movimentos são feitos por outros, minorias, com botas de veludo ou com coturnos, o povo desconfia... O povo brasileiro pode ser qualquer coisa, menos burro!... O PT sempre foi mais ignorante do que o povo. COm os cofres abertos por ter ascendido ao poder, comprou o que pôde e quem pôde até o dinheiro acabar...
Pois que acabe o PT - que não tem perfil nem de socialista nem de comunista - e toda a corrupção deste país que o PT incentivou e ampliou. Companheiros no PT são os que eles mesmos chamam ao poder e com eles divide "benesses". O povo não é companheiro. O povo está sendo roubado a cada dia e é chamado a comparecer em manifestações de apoio á base de pão, mortadela e uns trocados pra se sentir feliz.
® Rui Rodrigues
PS - Dedico este conto aos leitores de Allan Edgar Poe e de Agatha Christie. Nos dias atuais nossa realidade é ainda mais amedrontadora do que no tempo deles.
[1] Se desejar ouvir a bela música enquanto lê, favor clicar em https://www.youtube.com/watch?v=M_gSydN_BYM
[2] Fidel Castro sempre disse que os americanos o queriam matar. Quem morreu assassinado foi JFK em novembro de 1963. Esta história se passa em agosto do mesmo ano.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Grato por seus comentários.