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segunda-feira, 18 de maio de 2015

Falando francamente – sobre horizontes políticos





Todas as filosofias políticas que conhecemos pecam pelo mesmo pecado bem original, arrastando todos os políticos, em decorrência: Não dão a mínima importância - propositalmente – à condição da natureza humana. De outra forma não poderiam “mandar” nas populações. Cientistas políticos giram em torno de velhos temas desgastados sem horizontes para o futuro de uma humanidade que se desenvolve e pensa mais rapidamente do que eles.Parecem velhos discos de vinil com agulha rodando no vazio de som. 

  1. Não é verdade que mães e pais na maioria dos contatos diários parecem não se entenderem?
  2. Não é verdade que irmãos e irmãs também sempre andam em disputas?
  3. E também não acontece sempre que alunos tentam mostrar que são mais capacitados que outros?
  4. E não é verdade que uns são mais bem dotados que outros para certas tarefas e funções, e que estão sempre buscando melhores salários?
  5. E quem não quer uma casa melhor, um carro melhor, um emprego melhor?
  6. E quem não quer uma roupa melhor, uns sapatos melhores?
  7. E saúde pública melhor? Quem quer?
  8. E Ensino melhor, quem quer?
  9. E transportes públicos melhores?
  10. E quem não gostaria de mais segurança na cidade, ou cidade e campo sem bandidos?
  11. E creches, para que se possa trabalhar sabendo que as crianças estão sendo bem tratadas?
  12. E serviços básicos de saneamento?
  13. E um salário justo que não nos faça depender do Estado?
  14. E uma aposentadoria ou que outro nome tenha, que nos permita chegar à velhice com dignidade?

Há muito mais coisas que queremos.

  1. Um mundo de paz
  2. Um mundo de maiores igualdades entre os seres humanos
  3. A cura definitiva de doenças graves
  4. Um mundo de mais e completo e honesto amor.
  5. Liberdade de falarmos – e de sermos OUVIDOS em decorrência...

Há muitas mais coisas que queremos, mas já sabemos que

1.      Com o capitalismo não chegamos a ter isso, nem meio disso, aliás, muito pouco disso como sabemos.
2.      Com o comunismo, como já provado, quase nada disso.
3.      Com o socialismo, um pouco disso.
4.      Seremos exigentes demais, ou conformados demais?

Quem sabe, e dirão que é outra utopia, a Democracia Participativa Total e completa – SEM INTERMEDIÁRIOS – seja a solução para nossos males? Tente conferir no link a seguir...Mas não podemos tirar do pote mais do que o pote tem, e do que tem, há que dividir sem esquecermos de alimentar o pote para que sempre haja de onde tirar alguma coisa. Foi nisto tudo que o comunismo falhou, o capitalismo não se acerta, e o socialismo não consegue entender. 

domingo, 17 de maio de 2015

Contos do Barão de Rodrigsh.- Parte 1



Ella Athal é uma jornalista israelense que conheceu o Barão de Rodrigsh, Quando passou pelo “Bar do Chopp Grátis” em sua viagem pelo Brasil, contou esta história que fez fechar o bar, reunir todas as mesas do bar à sua volta, prendendo a atenção de todos. Silêncio total. Nem tilintar de copos, nem zunido de moscas. O Bar nunca teve moscas nem “ficou às moscas”.



1.    Ella Athal se encontra com o Barão Rodrigsh

Duques e Condes são muito introspectivos, sisudos. Barões são mais populares, por serem a fronteira entre o povo e a nobreza. Embora títulos de nobreza hoje só sirvam para não se sabe o quê, que nem se escuta falar, o de Barão soa como aventura. Foi com este espírito que Ella Athal descobriu o Barão de Rodrigsh quando estava a bordo de um balão desses que levam a bordo mais botijões de gás e sacos de areia do que pessoas. A cesta do balão era um barco com vela e tudo. Estava de partida para África. Ella então perguntou se poderia ir com ele. Ella era muito linda e ficara impressionada com os bigodes brancos e retorcidos do Barão, cheirando a tabaco. Sentia-se segura com ele. Ella jogou então a sua mochila para dentro da barca do balão, o Barão ateou fogo aos queimadores de gás e o balão começou a fazer pressão na corda que o prendia ao solo. O barão cortou a corda e o balão subiu aos céus. Era pelo por do sol.

(Foi assim que Ella viajou com o Barão sem muitas particularidades pessoais. Apenas relatou os fatos e as histórias do Barão).

2.    Como se fazem necessidades em pleno vôo.


- Barão!... Como se faz cocô a bordo deste balão? – Perguntou-lhe Ella, com o rosto já suando. Agüentara quanto pudera até se ver obrigada a perguntar.
- Lá em baixo, ao fundo do corredor entre os beliches. Pode puxar descarga que quando chegar lá em baixo, no solo ou no mar ninguém notará. Vai chegar tudo pulverizado. Faziam o mesmo em alguns aviões antigos. Como acha que era antigamente com aqueles aviões da primeira guerra mundial? Contam as histórias, mas nunca falam nesses detalhes. Alguns tinham um buraco no assento e um tipo de bolsa que abria para permitir a desova. Ou então, os pilotos faziam suas necessidades dentro do macacão de vôo. Por isso se que em filmes a mocinha sai correndo para o piloto logo que sai do avião para o beijar, é mentira. Os pilotos fediam... (E deu uma sonora gargalhada)... Mas tranqüilize-se, disse. Hoje já existem “reservatórios” especiais, embora alguns deles continuem despejando tudo aqui em baixo. Se andar pela cidade, tome cuidado com aviões que passam lá em cima... (E voltou a rir).

3.    O balão do Barão é multiuso, cheio de "guéri-guéri".



O Barão era assim. Cheio de surpresas, detalhando o que sempre escondiam. Ella Athal tinha receio do balão do Barão. Parecia uma geringonça, mas logo ganhou confiança quando passaram pela primeira dificuldade. Em pleno Oceano Atlântico viram uma enorme tempestade pela frente. Era tão grande que para contorná-la teriam que perder uns dois dias. Então o Barão Rodrigsh baixou-o até o nível do mar, pôs em funcionamento uma máquina de enrolar pano de balão, e quando este estava já enrolado e guardado, ligou o motor da barcarola e apertou um botão. Subiu uma capota transparente que impedia a entrada de água e mergulharam no mar, navegando até que saíram da área de tempestades. Enfrentaram enormes polvos marinhos, espadartes enfurecidos, tubarões irritados e fantasmas de piratas no fundo do mar. Depois que calcularam ter passado a área da tempestade, emergiram. Logo na frente avistaram o Cabo da Boa Esperança. Estava tão perto que desembarcaram no porto para comprarem mantimentos. Peixe não, por que tinham pescado muitas lagostas viajando pelo fundo do mar.

Saíram do porto no balão. Passaram dias viajando pelos ares, a Terra sempre perto.A bela Ella Athal continuava contando sua história embevecendo todos os presentes, como se fossem sócios da Ambev, tomando cerveja atrás de cerveja, interessados em seus relatos.

4.    O baloneiro é mágico.



- Gente... (disse a bela Ella, Athal, com olhar de incrédula). O baloneiro, o barão Rodrigsh é mágico. Eu não sabia, mas é mágico. Só me dei conta quando os gansos passaram voando...
- QUAIS GANSOS? (Ouviu-se em coro da platéia e alguns até se engasgaram com a cerveja).
- Apareceram uns gansos voadores no céu quando estávamos sobrevoando o delta do Nilo, perto da cidade do Cairo... Voavam em “V” como se fossem para uma batalha. Fiquei assustada porque poderiam vir contra nós para pousarem na barcarola, e avisei o Barão. Aí ele muito calmo me disse:
- Prepare-se para o pior. São gansos galafantes.
- O que são galafantes?
-É uma palavra espanhola que significa “ladrões”. Esses gansos roubam tudo o que podem em suas viagens. Prepare-se que vão pousar aqui.
- Então... (continuou Ella, Athal)... Um bando de uns vinte gansos enormes pousou na barcarola. Tinham os pescoços muito compridos, e o barão chegou a olhar para mim com terceiras e quintas intenções, mas estava meio ocupado com uma tesoura tentando cortar as asas dos gansos. Então o avisei que se cortasse as asas dos gansos eles não poderiam voar e teríamos que matá-los. Era melhor enxotá-los. Começamos a enxotá-los, mas saiam de um lugar, voavam logo para outro da barcarola. E aí o Barão se mostrou. Fez um largo gesto com as mãos onde havia uma panela e os gansos foram entrando um atrás do outro sem nunca encherem a panela. Olhei a panela, e dentro havia vinte gansos quietos, pequenos, grasnando de medo. O Barão então enfiou a mão na panela e foi tirando uns papéis. Eram ações ao portador de grandes companhias, diamantes, pepitas de ouro, tudo marcado com uma estrelinha e o numero 13. Então, depois de livrar a carga dos gansos galafantes, o Barão bateu um panelaço ensurdecedor na panela usando um porrete de aço, e os gansos foram saindo das panelas meio mirrados, tristes, com olhares de pobres imigrantes africanos quando pedem ajuda às autoridades de imigração ou quando pedem perdão depois de presos. Todos tinham agora uma tatuagem nas costas: Uma estrela com o número treze. A estrela era vermelha. O Barão juntou tudo numa caixa e pediu para que eu a despachasse logo que chegássemos a bom porto. Tinha um endereço: À Polícia Federal do Brasil.

5.    Os sentineleses da Baía de Bengala nas ilhas Andaman.



Logo que os gansos se foram, a caminho do Brasil, ou seria Venezuela Cuba ou Argentina, não sabemos, olhamos para baixo e vimos uma ilha que o Barão logo reconheceu como a ilha de Sentinela, na Baía de Bengala. Aliás, desde 2004 quando houve um tsunami que passou por lá, duas ilhas se juntaram numa só: A Ilha de Constança que antes ficava a cerca de 600 metros de uma outra a Sentinela do Norte que era como uma salsicha. A união das duas numa só a tornou ligeiramente quadrada e o nível subiu cerca de dois metros. Pertence à Índia embora seja legalmente independente. Nela vivem os Sentineleses, cerca de 400 indivíduos, desde 60.000 anos atrás. Não querem conhecer o continente, nada, e a Índia também não está interessada neles. Se puderam viver bem durante 60.000 anos, poderão tranqüilamente viver mais outros 60.000.

Deve ser assim que a coisa funciona (disse Ella Athal e continuou sua história, com o bar inteiro prestando a maior atenção).

- Então descemos na ilha, cheios de presentes para eles. O homem que parecia ser o chefe se acercou de nós, olhou os presentes e disse num perfeito português:
- Somos comunistas. Só eu falo a vossa língua e por isso sou o chefe. E podem guardar os vossos presentes. Vão tirar fotos na casa do baralho (ou algo parecido que ele disse).
Então, disse Ella Athal, lhe perguntei se não precisavam de saúde pública, hospitais, remédios... E ele me respondeu:
- Aqui se morre de morte natural. Aceitamos isso. Tomamos chás de ervas, fazemos emplastros, damos uns tabefes em quem fica pálido, pomos lãzinha na testa para parar de ter soluços. Há 60.000 anos que somos assim...
- E de dinheiro não precisam?
- Para quê? Comprar de quem, se caçamos, plantamos, e dividimos tudo?
- E para controle de natalidade? Se aumentarem muito em número não caberão na ilha nem haverá alimentação para todo mundo.
-  Temos nosso próprio método para garantir sempre o mesmo numero. Pegamos os mais espertos da tribo, os que mais reclamam, e jogamos do despenhadeiro junto com a família toda. É uma seleção natural. Mas nunca precisamos fazer isso. Quando passamos de 400, dividimos a aldeia ao meio e separamos as mulheres dos homens por uns cinco anos. Até lá já morreram alguns de nós e então já podem transar novamente, mas sempre usando métodos contraceptivos naturais, como o chá de Dong Quai ou Angélica chinesa. As mulheres tomam o chá para regular a menstruação, e se falham tomam do mesmo jeito que abortam. Aqui nesta ilha não cabe sempre mais um.
- E segurança, como fazem?
- É simples... Ladrão de mulher e abusador de menores, corta o pau e ele vira mulherzinha da tribo. Se roubar alguma coisa, apanha até ficar tonto e devolve tudo. Se já estragou o que roubou e não pode devolver, jogamos do desfiladeiro.
- E instrução?
- Para quê instruir? Gente instruída reclama muito e deixa os outros se sentindo ironizados porque não sabem o que eles sabem. Então os chamamos de prepotentes. Melhor que fiquem ignorantes. Já vivemos assim muito bem há mais de 60.000 anos. Tudo controlado.
- E antes de serem comunistas, o que eram?
- Sempre fomos comunistas. Só que não sabíamos disso.
- E quando souberam?
- De um caixote de livros de Mao Tse Tung, escritos em português, destinados á leitura obrigatória em Macau durante o governo comunista da China. Só fiquei com um livro para mim. O resto tasquei fogo.
- E se um dia invadirem a ilha como se defenderão?
- Não vão invadir. Aqui não temos petróleo, nem ferro, nada... Só tínhamos cobras naja, galinhas e porcos selvagens. As najas deixamos ficar porque servem para controle de natalidade. As galinhas e os porcos que ficaram selvagens matamos todos porque eram objeto de disputa entre a tribo. Tribo feliz é a tribo que não tem nada para dividir. Vamos fumar o cachimbo da paz?
- E nos convidou para fumar um enorme cachimbo feito de bambu – disse Ella Athal – Mas não fumamos... Era pura maconha!



(Então ouviu-se no bar o dono falar através do equipamento de som, pedindo para tomarmos os últimos goles porque já eram três da madrugada e o bar tinha que fechar. Ouviu-se uma vozearia de reprovação amigável).

Ella Athal prometeu que no dia seguinte continuaria com a história.


® Rui Rodrigues 

sábado, 16 de maio de 2015

Sopa das mil e uma noites afrodisíaca à Rui Rodrigsh




Não se trata de uma “economia de guerra”, mas nestes tempos de alta inflação, mais do que o governo diz que é – efeito Goebbels, o nazista-
Há que ter prazer de uma forma que seja também  saudável, e, sobretudo, econômica.

Esta sopa é especial para os que não costumam beber água e são avessos a legumes... Água é boa para o organismo, para a saúde. Então vamos a esta receita deliciosa.

Numa panela grande junte:

Água – para cobrir tudo com pelo menos três dedos acima dos sólidos.
Duas cebolas médias ou grandes.
Dois dentes de alho.
Uma cenoura grande cortada em cubos.
Meio repolho médio cortado em pedaços.
Duas batatas médias cortadas aos cubos pequenos.
Meio palmo de lingüiça calabresa cortada em pequenos cubos.
Uma xícara de chá de carne moída.
Duas xícaras de chá de massa fusili.
Três colheres de chá de curry.
Três cebolas médias cortadas aos pedaços.
Quatro ovos de galinha sem a casca – depois que a água estiver fervendo.
Sal a gosto - Cuidado para quem tiver pressão alta.
Um cubo de caldo de carne knorr ou similar raspado.
Pode acrescentar tomate cortado aos pedacinhos.
Se desejar, gotas de pimenta. 
Ferva tudo...
Folhas de hortelã para “decorar” o prato...

Deixe ferver tudo por uns vinte minutos e sirva com queijo ralado e/ou azeite... Acompanhe com torradas, vinho ou sem nada mesmo. Já tem muita coisa na mistura...

Seu corpo lhe agradecerá. Dos peitos á próstata, passando pelo útero.


® Rui Rodrigsh 

sexta-feira, 15 de maio de 2015

Conversas ao borralho - O sopro.



(Enquanto lê, convido a abrir nova página e escutar Django Reinhardt como musica de fundo para o texto)
https://www.youtube.com/watch?v=SR7U9T5Mdj4

De vez em quando o tempo esfria. Com tempo frio a alma e o corpo se contraem e obrigam a pensar. Tempo quente, pelo contrário, leva à expansão da alma, o sangue esquenta e a vontade é a de nos divertirmos um pouco até sem muita preocupação. O borralho da lareira, que é quando as labaredas já se foram e ficam apenas as brasas irradiando um ultimo calor, deixa-nos a um passo do inferno e a outro do paraíso. O vento quando sopra traz algumas coisas de volta do passado. O farfalhar de folhas podem ser de vestidos e meias de seda de mulher que nos vêm lembrar os velhos afagos perfumados e os beijos úmidos daqueles quando os olhos se fecham, em meio a roçar de pernas de mulher uma na outra. Pode até ouvir-se o som dos elásticos que seguravam as meias de seda ao serem soltos. Hoje as pernas vêm já preparadas assim como os hambúrgueres do fast-food. A maioria delas nem possuem mais aqueles pelinhos suaves e louros de água oxigenada. As pernas chegam a ser escorregadias de tão lisas e cremosas. As estátuas de cera do museu de madame Tussauds lá em Paris são assim mesmo. Já passei a mão em duas delas. Uma era de Marilyn Monroe. Não têm o tato de “naturais”.



Quando o sopro de vento passou pela lareira, vi a loura se aproximar, com seu sorriso encantador, assim como marca registrada, moldado ao longo de anos a fio, pelo menos uns 25, e sem ele ela era uma pessoa um pouco diferente, como se fosse outra. Usava diu como se fosse um cinto anticastidade, muito antes da pílula ser inventada, mas tão seguro o tal do diu, quanto o cinto de castidade, ou até mais. Ironicamente tinha Castro no nome e uns olhos verdes que eram fatais. Foi com ela que percebi pela primeira vez como nossos corpos são um amontoado de carne segura por ossos, tendões e nervos, com uma pele que nos impede de ver o que está dentro. Somos montes de carne com miolos, sobreviventes da natureza da vida, passando um tempo neste planeta como se estivéssemos de férias nos tempos livres, porque nos tempos ocupados não conseguimos pensar mais longe do que uma centena de metros. Dizemos que estamos trabalhando. Pelo menos temos essa impressão, e muitas vezes nos perguntamos para quê todo esse trabalho, para que fim maior trabalhamos tanto. Passamos a vida a trabalhar. Os únicos momentos de diversão eram com ela, principalmente quando tirava as meias, depois o vestido, e já sem roupa passávamos algumas horas juntos na cama, dividindo prazeres. Há quem não possa ter prazeres por causa do trabalho e quem não possa trabalhar por causa dos prazeres. E lá se foi a loura de olhos verdes e meias de seda quando novo sopro fez as brasas do borralho darem um estalo e uma miríade de pequenas estrelas se misturaram na paisagem com as outras estrelas do céu. Claro que foi apenas uma ilusão, mas iría jurar que quer as estrelas do céu, quer as da lareira, eram exatamente do mesmo tamanho, todas quentes. Como a gente se ilude!



Aproveitei o ensejo e fui até o balcão da cozinha. Abri uma garrafa de vinho, cortei duas fatias de queijo e duas de pão. Servi-me de um copo de vinho, coloquei tudo num prato dentro de uma bandeja e levei até a mesinha perto do borralho. Foi então que reparei numa figura bem conhecida sentada numa cadeira, já à mesa. Era Peter, amigo do João Padeiro. João Padeiro morava na época em que nos conhecemos, na mesma rua. Era excessivamente católico, muito certinho, não saía jamais de uma linha de comportamento. Tinha nascido para isso, completamente previsível. O sobrenome Padeiro herdou entre nós por causa do ramo de comércio a que seu pai se dedicava. Já Peter era o oposto. Um extraordinário jogo de cintura e um espírito de sobrevivência que fizeram dele exatamente isso: Sempre na malandragem, equilibrou-se a vida toda num fio de navalha. Chegou a chefiar uma gang de ladrões juvenis para conseguir dinheiro nos tempos difíceis das guerras coloniais, em Lisboa. O João Padeiro morreu nessas guerras. Perguntei ao Peter como andava a vida dele. Disse-me que trabalhava agora para o governo em obras assistenciais e que namorava duas irmãs com o consentimento dos pais. Casara, mas separara-se da mulher que morava no mesmo prédio dele e que o via subir pelo menos duas vezes por semana com as duas irmãs. As roupas dele tinham um cheiro meio de perfume meio de maconha. Passava horas a fio na cama mesmo durante a semana em dias de trabalho. Empregos do estado permitem que se conheçam médicos do estado que atestam com atestados, fornecedores do estado que fornecem fornecimentos, advogados do estado que conhecem onde os rabos ficam presos. As duas irmãs nunca brigaram entre si. Tinham o resto da semana livre. Levantei-me para apanhar mais um copo. Quando voltei, Peter havia sumido. Nunca mais o vi. O borralho continuava quente.


- Oi!... (Ouvi vindo da garagem. Era uma voz feminina, conhecida).
- Oi!... Senta-te! (Disse-lhe, enquanto me levantava e lhe preparava a cadeira de ferro fundido branco, para que se sentasse. Um dia pintaria as cadeiras e as mesas de preto). Ajeitei-lhe a cadeira. Sentou-se e então continuei:
- Há quantos anos não te vejo... Como chegaste?
- Pelo sopro do vento. Uma onda me deixou na praia. Sou a sereia da tua vida.
- Sim, sempre foste. O que nunca entendi foi por que não nos casamos, sendo tu tão linda, tão perfeita de corpo, tão prendada... O tipo de mulher que ninguém perderia.
- Mas eu sei! – Disse-me ela, com um sorriso. E antes que lhe perguntasse concluiu:
- Conhecemo-nos uns meses antes do tempo em que estaríamos preparados um para o outro. Tudo tem o seu tempo, e por vezes nosso tempo corre mais depressa para uns do que para outros. Naquela época tinhas a “tua vida”. Corrias de um lado para o outro, abraçavas todas as oportunidades. A vida era apenas aquele momento diferente todos os dias. Não paravas quieto. Do trabalho para a universidade, de lá para as aulas particulares... Para os namoros... Que mulher deixarias escapar se te olhasse mais interessada e te agradasse?
- Quer dizer que sabias disso... (Eu sempre desconfiara que ela sabia de minhas aventuras, mas nunca me encostara contra a parede obrigando-me a uma confissão).
- Sabia... Quer dizer... Desconfiava com aquela certeza. Homens e mulheres têm o tal do sexto sentido. Sempre se sabe. São pequenas “coisas” deslocadas de um perfil que não batem. É como um relógio com arritmia...
- Entendo... Mas agora já não dá mais para voltarmos atrás, não é? Tudo mudou muito. Não?
- Mudou!... Mudamos a cada dia. Quem está perto da gente não nota, e por isso há casamentos que duram uma vida. Quem se afasta por algum tempo nota a diferença. Ofereces-me um café?
- Claro!... E levantei-me da cadeira, indo até a cozinha. Coloquei o filtro na máquina de café, o pó, três medidas de café, água no reservatório e quando voltei para o borralho da lareira, as cadeiras estavam vazias. Minha sereia tinha-se ido, provavelmente para nunca mais voltar. As pessoas mudam muito e o peixe anda escasso. Fiquei com a preocupação de algum pescador lhe lançar a rede de arrastão e lhe romper as meias de mesmo nome. Ela ficava sensacional com aquelas meias. Já não se usam. E foi com melancolia que notei que quase nada se usa mais. Ou quando se usa não têm o mesmo sabor. Aquele sabor inconfundível que só o sopro do tempo faz reavivar as brasas do borralho. Era uma brasa, Mora!



®Rui Rodrigues.


terça-feira, 12 de maio de 2015

Geografia Humana - mais uma visão.




Somos já tantos, nós, os humanos, que já merecíamos ser considerados como um “mar de gente”, um oceano humano. Se somarmos a biomassa humana obteremos um numero aproximado de 562.500.000.000 [1]de quilos. Nem os dinossauros deveriam ter tanta biomassa apesar de serem tão estupidamente enormes: Eram mais pesados, bem mais, mas não eram tantos quanto a nossa humanidade senão teriam comido todas as florestas do planeta. Graças à natureza da qual nos originamos, possuímos um mecanismo de autocontrole de natalidade que funciona mais ou menos assim: Imaginemos uma área controlada de onde animais não possam sair. Neles vivem apenas a vegetação, antílopes e leões. Os antílopes se desenvolvem porque há muita comida e os leões também porque têm muitos antílopes para caçar. Na medida em que a vegetação começa a faltar, a quantidade de antílopes baixa também e em decorrência a quantidade de leões. Numa situação extrema, uma grande seca contínua por alguns anos extinguiria antílopes e leões por falta de comida.



Nossa humanidade, embora digam que é “semelhante” a Deus, feita à sua imagem, não é não. É exatamente como qualquer outro ser vivo que depende da vida neste planeta. Pode extinguir-se do mesmo modo, não temos nada de diferentes dos outros animais no quesito “viver”. Devem ter dito e escrito essa linda frase da semelhança para nos fazerem subir o ânimo, colocar-nos num patamar intermediário entre toda a vida na Terra e deus, de forma a nos entendermos como “gente importante” e podermos entender os sacerdotes que nos disseram isso e que se diziam intermediários entre deus e os demais seres humanos. Rendeu-lhes próspero negócio com pombas, rezes, e notas farfalhantes de gordos dinheiros, dos quais, os sonantes, em moeda, pertenciam a César. Notas de dinheiro é coisa recente gerada pela inflação dos dízimos. Mas voltando à nova geografia: Merecemos uma nova geografia para incluir neste planeta o mar de gente em que esta humanidade se transformou desde quando não passava de uma pequena tribo de símios arborícolas que tiveram que se pôr de pé para ficarem com a cabeça acima da vegetação rasteira e perscrutar os horizontes à procura de possíveis predadores que os pudessem comer. Nossa humanidade já foi alimento de muitos predadores. O medo subjacente que lhe ficou desses predadores é tanto e tão enraizado no nosso DNA, que pessoas que nunca viram uma cobra ou um rato, quando alguém grita: “COBRA!”, foge ou fica estática, congelada pelo medo, sua frio, passa mal. Quando gritam “rato”, sobem em cima de cadeiras, sofás e mesas. E nossa humanidade decidiu acabar de vez com todos os predadores maiores. Está quase conseguindo, “herdando” assim o planeta.



Sem predadores, a terra da Terra foi ocupada, ampliaram-se as áreas de cultura, mais alimento ficou disponível, e a biomassa da humanidade aumentou em progressão geométrica. Somos agora cerca de 7,5 bilhões de seres humanos pesquisando como se pode cultivar mais para alimentar mais, num planeta que não estica. Somos muito inteligentes para procurarmos novas formas de produzir mais alimentos, em patamares, em garrafas “pet”, através de modificações genéticas, e qualquer dia estaremos enchendo oceanos de plataformas com terra para aumentarmos a área de cultivo, o que seria um desastre ecológico para as plataformas marinhas. Mas somos tão falta de inteligência que não conseguimos controlar nossa própria natalidade sem auxílio dos antigos predadores. Sem termos quem nos coma, estamos em risco de nos comermos uns aos outros em guerras, em epidemias, por falta de camada de ozônio, por falta de ar, água...Políticos e comerciantes dizem que quanto maior a população, maior o desenvolvimento industrial e comercial, maior a coleta de impostos, mais o país cresce. É por aí que estamos indo. O problema é que para tudo há um limite e ainda não aprendemos qual é o nosso limite. Somos uma humanidade jovem que pensa como os jovens: Para tudo se dá um jeito. Basta pensar... E por vezes, já em pleno afã de realizar o tal jeito, se defronta com impossibilidades que demoram tanto para serem resolvidas, que quando vem a solução, já nos comemos uns aos outros reduzindo a nossa população em guerras. Deve ser para isso que as guerras servirão: Substituem os predadores na função de reduzir a quantidade de bocas a alimentar. As riquezas acumuladas pelos que morreram passam então para as mãos dos sobreviventes, melhorando-lhes a “vida”. Os que morreram já não têm a quem culpar ou a quem agradecer porque estão mortos. Os sobreviventes dizem que agradecem a deus. Entende-se! São semelhantes a Ele. Os que morreram não deveriam ser. E rezam missas com as notas herdadas.



Grandes guerras matam muito de uma vez só ao longo de uma meia-dúzia de anos. Pequenas guerras matam muito mais ao longo de décadas, séculos, milênios. Esta é a nossa geografia. Vivemos em pequenas guerras com o apoio tácito das organizações internacionais, morrendo milhões por ano, bilhões por século, trilhões por milênio... E aparentemente ninguém está interessado em se organizar para que a dor das guerras acabe através de controle de natalidade. Igrejas precisam de mais fiéis para contribuir com dízimos e esmolas, governos precisam de maior volume de impostos. O que necessitamos não é de socialismo ou comunismo para que todos possam ter um bom quinhão das riquezas, até porque esta filosofia política apenas sobrevive porque é a “esperança” – vã – das maiorias pobres, e acaba por dividir a amargura da pobreza sem nada mais para dividir porque os leões - sejam de que filosofia política forem- comem tudo num mundo sem pasto para ovelhas.



O que precisamos neste planeta para que todos vivam com relativa privação de dificuldades e tristezas, é que cada país tenha uma população que não seja excessiva, isto é, que não ultrapasse sua capacidade de gerar-lhe conforto em todos os sentidos e níveis. O Canadá é um excelente exemplo: Área de 10 milhões de quilômetros quadrados, e uma população de 34 milhões de habitantes. Há terra, comida, saúde, transportes, educação e desenvolvimento para todos. Nossa geografia política, e principalmente nossa geografia da humanidade devem mudar não para conceitos filosóficos da ciência política voltada para a política, mas para o controle de natalidade. Se continuarmos gerando filhos como coelhos, em breve comeremos todo o pasto, e para que isso não aconteça, dizem os políticos tem que haver guerras para reduzir os comedores de pasto.
Auto-sustentabilidade é isso: Podemos herdar a terra da terra, sim, e os mares e os ares, mas há um limite para quantos poderão beneficiar-se dessa herança. E nem o Universo inteiro seria suficiente para a teoria do “sempre cabe mais um...” Um dia nem mais um caberá da forma como vamos parindo por este mundo.

Se for triste ou não, não me cabe julgar. Esta visão é a da realidade. Precisamos mais de geógrafos - e de outros elucidados especialistas - do que de políticos, via de regra escolhidos por "simpatias" ou pela fé da ignorância.



® Rui Rodrigues



[1] 7,5 bilhões de pessoas a um peso médio de 75 quilos. (A humanidade está ficando mais alta e “acima do peso”). O total das águas nos oceanos é de 1.332.000.000 de quilômetros cúbicos aproximadamente. Área de terras emersas, aproximadamente 150 milhões de quilômetros quadrados, e de mares 360 milhões.

segunda-feira, 11 de maio de 2015

Dia das mães. É puro amor e nostalgia!



1.    No Shopping


Foi agora, quase há meia hora, que não acabou de chover. Aqueles rastros de luzes no asfalto quando já é noite, dão uma falsa ilusão de vida. É movimento de vida, mas vida não é feita apenas de instantes de sinais. É sábado, véspera de dia das mães, embora todo dia seja dia das mães presentes, ausentes, ou idas definitivamente. Mesmo quem sempre amou a sua mãe não resiste ao apelo do comércio para que gaste uns instantes e algumas notas para presenteá-la. As demonstrações são sempre importantes, e há sempre daquelas que mesmo recebendo presentes o ano inteiro ficam tristes quando no dia aprazado para a comemoração não houver um daqueles que os filhos sabem que irá dar-lhe prazer. Antes de começar a chover o chão do estacionamento já estava molhado, escorregadio. Anoitecera mais cedo por causa das nuvens negras e o shopping deveria estar cheio. Mas não estava.


Não havia muitos filhos e filhas nem netos nem netas pelo shopping construído há já uns bons dez anos, o único nas redondezas. Num daqueles balcões em centro de corredor, sem paredes, feitos com puras prateleiras do lado de dentro e vitrines do lado de fora um vendedor daqueles espertos desembrulhou um par de camisetas e disse a uma criancinha de seis anos para a colocar sobre o peito para ver como ela lhe ficava bem, na frente do avô. Evidentemente que contava com sua esperteza para que a criança se olhasse no pequeno espelho e disse-se para o avô: - Avô... Gostei...Compra-me uma? Mas o avô sabia que era dia das mães – não dos netos nem dos filhos - e percebeu também o golpe baixo do vendedor. Um aceno negativo de cabeça, rosto sério e a extorsão terminou por ali mesmo. Assédio comercial deveria ser passível de punição. Um dia teremos também o assédio só no olhar, no caminhar, e ficaremos todos em casa o tempo todo, até nos dias de folga para não sermos indiciados por estes tipos de crimes. Assim nossa atenção ficará definitivamente desviada para essas grandes causas, e deixaremos as pequenas, como os roubos milionários e bilionários dos políticos para segundo plano.

Em duas mesas junto á pequena máquina de café e de chás, dois amigos conversavam sobre outros amigos. Ainda ouvi um deles dizer para o outro: - Precisas aparecer por lá. Sentem a tua falta...E não me lembro de ter ouvido resposta, mas tomaram mais dois cafés, enquanto na mesa ao lado, três senhoras de mesma idade avançada conversavam sobre banalidades, sobre os ex-maridos. Uma delas dizia para a outra -... Ah... Mas eu sempre soube. Só que não ligava até aquela vez em que... E lá ao fundo sobre uns assentos aos fundos de imenso tapete vermelho escuro, estava sentado um jovem lendo uma revista recém comprada numa livraria vazia onde as mães levam seus filhos para lerem revistas disponíveis enquanto dão uma olhada sobre os livros expostos. Um ou outro freguês compra alguma coisa. Também entrei lá com minha neta e procurei por alguma novidade em livros de cosmologia ou de física, mas não havia nenhum. Havia muitos romances, livros de auto-ajuda, de direito, um escaninho com versos, alguns de história, outros de capa dura e lustrosa com fotos de cidades pelo mundo. Não lembro de nenhum título, mas minha neta que já começa a ler aos seis anos, ficou lá junto às revistas infantis tentando ler o que estava escrito nos títulos. Foi preciso perguntar-lhe se queria ajudar a avó a escolher um biquíni para a mãe dela. Umas três vezes, porque já se havia passado quase uma hora que a avó estava lá sem se ter ainda decidido. Lojas deveriam ter uns dois ou três modelos e umas duas ou três cores de biquínis. Muitos modelos e cores geram confusão e não permitem uma escolha rápida. A boneca tivemos que escolher numa loja especializada fora do Shopping. Foi então que o céu desabou sobre o shopping vazio. Como é possível comer e deixar o lixo sobre as mesas sem se dar ao trabalho de levantar, apanhá-lo e despejar no aparato específico, ainda mais quando se trata de adultos acompanhados de crianças? Naquela mesa havia cinco.

A senhora que passou me fez espirrar e sentir falta de ar. Perfume forte. Se usasse menos, poderia comprar perfume mais caro e mais suave. Lá fora a chuva não caía. Despencava em cataratas. Alguns fumantes fumavam lá fora o que não podem fumar lá dentro: Cigarros de tabaco. Já lá fora, por toda a área, outros podem fumar á vontade o que não é permitido por lei: Crack e maconha. Cheirar até se pode em banheiro de rodoviária. Precisam inventar o bafômetro para drogas leves, pesadas e mais-que-pesadas. Vendem em pequenos pacotes de alguns gramas que nem sequer pagam impostos. Os do tabaco são absurdos. Em casa fuma-se qualquer coisa enquanto não colocam câmaras de vigilância para nos vigiarem... “Lar doce lar” é coisa do tempo em que nossas casas eram um lar. A minha ainda é.

2.    Dois dias depois do Shopping

Então, chegando à rodoviária de Cabo Frio, já numa segunda-feira que é hoje, fui para o supermercado que fica a uma quadra, e comprei, além de outras coisinhas, um molho de brócolis dos quais Bill Clinton gosta muito, e chegando em casa cortei-o em pedaços pequenos, em tiras e rodelas de talos, e pus para cozinhar com três dentes de alho também cortados em pedaços bem pequenos. Sem sal, porque servirá para cozinhar com arroz ou massa. O produto da cozedura vai para o freezer guardado num “taperware”. Olhei a minha panela de aço inox e vi que está um pouco suja dentro da pega, produto de inúmeras cozeduras. Nossa indústria, a portuguesa e a chinesa merecem nota quase zero com aproximação de dois pontos decimais para mais ou para menos. A pega é tão cheia de “interstícios” que a sujeira se acumula sem percebermos. Então só se tira com WD-40 e depois com algumas lavagens para tirar o cheiro. Já aquela acoplagem que comprei para instalar uma lâmpada e que se coloca numa tomada, deve ser chinesa: As tomadas têm os furos na vertical, e a lâmpada fica na horizontal. Nem pensaram nisso. Eu nem reparei. Deveria ter reparado. Temos que ser mais espertos que eles, os industriais do consumo por “reposição obrigatória”, já que nosso governo está muito preocupado com as propinas e nem fiscaliza as impostações da importação.


Quanto á festa de minha netinha e o dia das mães, foram maravilhosos. Continuamos sendo uma família, a pesar de todas as vicissitudes da vida. O mundo pode cair. Nossa família, jamais!...

® Rui Rodrigues 

terça-feira, 5 de maio de 2015

Uivos, latidos e gemidos!



Parecem crianças assustadas quando uivam, e tal como quando alguém tosse numa missa, numa sala de aula, ou numa solenidade, e todos começam a tossir por “simpatia”, cães se contagiam no uivo sem saberem porque razão. O primeiro a latir sabe porque late, e se existe realmente uma linguagem canina, logo os outros passam a saber também. Seremos nós mesmos parecidos com os cães, ou os cães parecidos conosco? Ambos descobridores deste planeta, dois sobreviventes ao longo de milhares de anos, somos companheiros, vivemos numa certa relação simbiótica e muitas vezes fica indefinida a chefia da matilha. Há que ter cuidado para que a matilha não se vire contra o dono. Mas o que haverá de “humano” nos cães? Temos vários exemplos, antes, porém, é preciso que se saiba que cães uivam – tradição herdada dos lobos - para unirem a matilha por solidão ou para acasalamento.

1.    O cão dos Baskersvilles.

É tema de um romance de sir Arthur Conan Doyle. Corria voz numa localidade da Inglaterra que um cão costumava matar gerações da família Baskerville. Um deles, sir Charles, foi encontrado morto e logo a suspeita recaiu sobre o tal cão. Sherlock Holmes foi então chamado para investigar se o sobrinho de Charles, como herdeiro, correria perigo de ser morto. Porém sir Charles, como se confirmou, falecera de um ataque cardíaco. Um outro personagem interessado na fortuna cobria o cão com fósforo para que brilhasse à noite, aparentando-o mais feroz. O personagem chamava-se Stapleton e era irmão de sir Charles, tendo sido dado como morto quando era ainda jovem. A trama da história baseia-se num fato: Quando um cão é treinado para atacar alguém através do cheiro de roupa da vítima, se alguém colocar essa roupa até em seu dono, ele ataca do mesmo modo. Nessas horas o cão não reconhece o dono. Não pode uivar para que possa atacar em silêncio.

2.    Achiko.  

Achiko é um cachorro da raça japonesa Akita. No Japão, na estação de trens de Shibuya existe uma estátua em sua homenagem. Ele sempre ia esperar o dono, um professor, na estação, e um dia o dono não apareceu. Por anos a fio Achiko continuou indo até a estação, todos os dias, esperando pelo professor. Foi tema de um filme “Sempre ao seu lado”, símbolo da fidelidade, persistência. Você conhece alguma pessoa assim? Se conhecer dê-se por feliz. E se conhecer mais de uma, então sua felicidade é uma benção. Eu mesmo ficaria feliz em ser seu amigo.  

3.    Lassie.


Lassie é uma cadela da raça Colie. Separada do dono em circunstâncias terríveis, percorre centenas de quilômetros para encontrar com seu dono. Inicialmente o conto foi publicado no Saturday Evening Post em 1940, mas a série de televisão somente em 1954 e durou 20 anos. Muitos de nós certamente ainda nos lembramos desta série. Por esses tempos as séries eram mais "suaves" tentando fazer um mundo melhor e mais suave. Atualmente as séries são mais violentas, mais sanguinárias embora o sangue quase não apareça, embora aparentemente o motivo seja o mesmo. Algo não "bate" bem. 







4.    Blondi, cadela que não conhecia o dono.




Era a cadela de Hitler, da raça pastor alemão, presenteada por Martin Bormann, secretário particular de Hitler. Eva Braun, esposa dele, não gostava da Blondi e costumava chutá-la por debaixo da mesa. Ela preferia seus dois Scotish Terrier, o Negus e o Stazi. O que mais a irritava era o hábito de Hitler permitir que a cachorra dormisse com ele na cama. Acompanhou-o de 1941 a 1945 até o bunker quando Hitler já temia o pior. Por essa oportunidade Blondi tinha dado à luz cinco filhotes de seu cruzamento com Harras, pertencente a Paul Troost, o arquiteto de Hitler. Já desiludido, no bunker, Hitler pede a Werner Haase, seu médico que testasse em Blondi as cápsulas de cianureto que ele pretendia usar, para testar se eram eficientes. A cadela morreu, Hitler suicidou-se, os cinco filhotes foram abatidos a tiro pelo médico. Os soviéticos que invadiram o bunker exumaram o corpo de Blondi por indicação do médico. Com as costelas aparecendo como na foto, Blondi não teria de Hitler a retribuição que merecia, mas como se ser retribuído por um indivíduo como Hitler?  E porque Eva Braun não chutava Hitler em vez de chutar Blondi? Casada com Hitler, o que se poderia esperar de Eva Braun, uma modelo e assistente de Heinrich Hoffman, fotógrafo particular de Hitler. Por duas vezes ela tentou o suicídio durante seu relacionamento com Hitler. Finalmente, depois de conviver com ele casaram-se. O casamento durou 40 horas, antes que suas vidas acabassem no bunker. A história não é triste. Triste é o modo como alguns seres escrevem suas histórias na vida. Uns de forma consciente, outros, como Blondi, arrastados pela história triste dos outros. Agora imagine que isto se aplique aos relacionamentos humanos e que uma mulher como Eva Braun, sem instrução, amante do poder fosse indicada para a presidência de uma república, só porque alguém no poder a indicou, tão ignorante quanto ela. Se Hitler tivesse ganhado a guerra provavelmente a indicaria para sua sucessora: Podia dominá-la mais que qualquer um de seus mais eficientes colaboradores.


E é assim que se constroem histórias entre uivos, latidos e gemidos, onde a fronteira entre sentimentos não é assim tão bem definida. Há muitos seres humanos que são uns cães de Baskerville, outros que são como Lassie, alguns como Blondi, muito poucos como Achiko... E embora digam que cão que late não morde, que cães ladram enquanto caravanas passam, há sempre que ter em mente quem ou o que é cão, e o que não é, e assim mesmo, que tipo de cão são os que uivam, os que latem e os que gemem.


® Rui Rodrigues 

sábado, 2 de maio de 2015

Besteirol sem alienação bancária.



(No Bar do Chopp Grátis ouve-se todo o tipo de besteiras entre tilintar de copos, vozearia, olhares, passos, ordens á cozinha, roçar de pernas debaixo das mesas, farfalhar de vestidos no cruzar de pernas. Besteirol não precisa fazer sentido, não é necessariamente verdade, mentira, possibilidade, mas pode ser. É laxante mental, mas não quer dizer nada para nenhum analista freudiano, não é uma inspiração divina, não é um sonho, e pode ser tudo isso de zero a dez. Este começou assim quando o marido de uma cliente tomou um lacto-purga mental para aliviar os sintomas que sempre ficam depois de discursos de Lula, da Dilma, ou de algum dos muitos mentirosos que pululam saltitantes nos partidos políticos de uma base aliada tão ampla, que todos se beneficiam das manápulas dadivosas dos que pedem e dos que aprovam distribuições fartas de verbas que nunca servem para melhorar seja o que for nesta nação. Ele estava justamente no banheiro, porta aberta para o caso de ter que ir para o hospital correndo, quando tudo aconteceu).

- Franzina... Ó Franzina... Este papel higiênico que compraste no supermercado é um rala-cu.
- Foi o mais barato que encontrei... Doze rolos por 8 reais. Mas tens que lavar depois porque faz bolinhas e enrola nos pentelhos. Rasga-se todo. Cuidado com os dedos que ficam cheios de merda.
Calaram-se. No jornal sobre um banco no banheiro, para se ler enquanto o tempo passava, e o “barroso”[1] descia, uma foto de uma barata minúscula de menos de um centímetro presa no âmbar tinha sido encontrada em Myanmar, uma nação problemática ali para as bandas do Laos.Tinha mais de 100 milhões de anos e era uma predadora. Lourenço ficou se perguntando porque uma barata dessas se tinha extinguido. Talvez fizesse parte da vida dos dinossauros comendo os restos que eles trituravam e deixavam cair por entre os dentes, e com a extinção deles se tivesse também extinguido. Tinha asas, e Lourenço se imaginou num trem bala ligando o Rio a São Paulo para visitar uma creche num bairro do “Minha casa minha vida”. O trem bala nunca foi construído, a creche também não, e a “Minha casa” virou a casa deles, os que as invadiam ou compravam barato daqueles a quem foram inicialmente destinadas. Mudou então de pensamento ao sentir uma esguichada de um barroso liquefeito, bem ao estilo antesco e justificativo do PT. Tudo tem uma desculpa, uma justificativa que caiba na mente da ignorância. Olhos que não vêm, coração que não sente. Nenhuma plataforma se chama Lula ou Anta, Vacca ou Falcão. A barata predadora ficou esquecida por não se saber o que faria naqueles tempos. Uma barata tonta e predatória.

E viu-se de repente num mar revolto, cercado de gaivotas. Estava numa plataforma marítima esperando ver jorrar petróleo do fundo do mar, sugado lá das profundidades quilômetros abaixo da superfície. A broca brocava lá no fundo, no leito do mar oceano, e pelo tubo subiam para a superfície, aos borbotões, barris e mais barris de água salgada pintalgada de pequenas manchas marrons. As manchas eram o petróleo que em cada barril não enchia mais que um copo de mocotó. A rota dos enormes navios tanques que traziam o óleo cru importado passavam sempre por plataformas como essas. Só passavam. Na chegada aos depósitos nos portos, anotava-se como proveniente da produção dessas plataformas.     

-Lourenço... Ó Lourenço... Já acabaste de cagar, ou queres ajuda? É prisão de ventre ou estás com os intestinos soltos? Perguntou Franzina, a mulher – viviam sozinhos – preocupada com o estado em que ficaria o banheiro. Foi até uma gaveta, apanhou uma máscara dessas usadas por médicos, pingou umas gotas de perfume, e deixou-a à mão para o caso de vir a necessitar. Do lado de fora, bem ao lado da porta do banheiro, deixou um balde com água, uma garrafa de ácido muriatico, uma vassoura velha, um enxergão, uma garrafa de detergente com cheiro de pinho.
- Não Franzina... Ainda não...
- Então – Disse Franzina – Quando acabares tens ai o kit para limpares a merda que fizeste. Não podes ser igual ao PT e meu nome não é povo do Brasil...Não temos empregada. O dinheiro vai todo para os impostos, a energia, a água, o transporte, os remédios, o material de limpeza, as multas e a inflação. Ou paras de fazer merda ou nos separamos na Igreja e no civil.
Ouviu-se um sonoro peido esborrifado, tão estridente, que Franzina previu o pior. Abriu a porta do banheiro e Lourenço havia sumido. O banheiro era uma merda só pelas paredes, pelo chão e pelo teto. Sobrou no chão uma carteirinha de filiado ao PT.
 
O féretro saiu diretamente para o vaso sanitário, com meia dúzia de descargas, umas boas esfregaduras com enxergão, ácido muriático e para arrematar um balde enorme de essência de pinho. 
No dia seguinte uma comissão da verdade a procurou para lhe dar uma indenização milionária, válida até sua morte. Franzina estava rica, segura para toda a vida. Mas era pouco. Então se inscreveu no MST. Tentaria ganhar umas lascas de terra. Inscreveu-se também no Minha Casa minha vida e começou a estudar pedindo bolsa ao FIES. Tirou carteirinha de prostituta e ganhou não só um salário extra como uma bolsa-família. Finalmente, foi corajosamente até a cozinha, pegou o facão e cortou um dedo, o mindinho, exatamente o que menos falta lhe fazia e entrou com pedido de aposentadoria por incapacidade. O governo não controlava nada, só pedia em troca o seu voto.

(T
al foi a estória que se ouviu naquela noite no Bar do Chopp Grátis. Quem disse que fazer merda não dá lucro? E nunca na história deste país se viveu tanto em meio de merda como nestes ultimos 13 anos. E fica a pergunta: O que será mais nojento? Esta história ou o governo que temos?)  

® Rui Rodrigues.  







[1] Barroso é uma excreção anal, provinda dos intestinos, normalmente cilíndrica, mal cheirosa e da cor do barro. Mais popularmente é conhecida como cagalhão. Na política significa quase todos os atos da classe respectiva porque do que fazem nada de útil se aproveita. O PT é campeão, expelindo barrosos fenomenais com o maior “desbundamento”.