Sempre disse que sou crente
em Deus O ser Único, onipresente, todo poderoso, construtor do Universo,
Legislador das Leis que o regem. O que não posso acreditar é que seja como os
sacerdotes de todas e cada uma das religiões nos dizem que seja. A aceitar o
que esses religiosos nos dizem, Deus não seria único: Cada religião teria o seu
e esses “deuses” não podem expressar a totalidade do Ser que é Deus. Sendo
assim, há longos anos virei minhas antenas para Deus, para todos os lados do
Universo, buscando entender porque as religiões divergem tanto, e vindos desse
espaço infinito escutei alguns ecos de um planeta idêntico à Terra, como se
fosse gêmeo, porém atrasado em 100 anos em relação a este nosso, em que
vivemos. E parece que Deus é bem diferente do que dizem por lá e por aqui.
Numa aldeia ao Norte da
Península de Akadraban, no Continente de Anilim, existe um país muito
religioso. A maioria acredita em Deus e há séculos rezam por doentes que tossem
convulsivamente e acabam por morrer esvaídos em sangue como se os pulmões se
rasgassem. Alguns se salvavam dando sinais de que Deus escutara as suas preces.
Isso fazia com que a cada novo caso, novas promessas se fizessem para que Deus
salvasse esses novos doentes acreditando os devotos que poderiam ser atendidos
em suas preces. Recentemente uma médica pesquisadora descobriu uma
vacina extraída de um fungo. Evidentemente que havia uma indústria girando à
volta da doença: Os médicos prometiam cura ou discretamente informavam que “fariam
todo o possível“, os sacerdotes recebiam donativos e oferendas. Muitas famílias
perderam tudo o que tinham economizado na vida para curar os seus doentes.
Ficaram pobres, foram morar em bairros pobres e adquiriram outras doenças por
falta de serviços sanitários. As antenas dirigidas para essa aldeia de
Akadraban já não escutam nenhuma prece a Deus para curar seus familiares dessa
doença pulmonar porque ela já não existia. Uns diziam que Deus lhes mandara a
vacina. Os médicos diziam que até poderia ter sido, mas que o mais certo tinha
sido a vacina ser decorrente de seus estudos através do uso de sua inteligência
que, agora sim, Deus tinha dado à humanidade. Só não sabiam como Deus tinha
introduzido essa inteligência em seus cérebros, mas uma parte, senão a maior
parte, era devida ao estudo em Universidades através da transmissão de
conhecimentos de geração em geração.
Na cidade de Ambrush no
outro continente ainda lutavam com uma doença que paralisava os membros, atrofiava
os músculos de crianças deformando-as e impedindo movimentos. Numa gruta onde
alguns fiéis disseram ter ocorrido um milagre, fizeram um santuário. As
peregrinações eram constantes. Quando o membro afetado da criança era a perna
esquerda, ofereciam moldes de cera de perna esquerda e assim era para todos os
membros. Ao sair os fiéis sempre deixavam esmolas na caixa de coleta. Um dia
houve uma epidemia de uma doença que fazia cair os cabelos. Passaram a oferecer
os seus próprios cabelos em sacrifício que faziam cortar pela raiz e doavam ao
santuário. Os sacerdotes administradores passaram a vender esses cabelos para
fazer perucas e arrecadavam bom dinheiro que juntavam à cera derretida vendida
para os fabricantes de moldes de cera. O santuário nem pagava imposto. Quando
descobriram as vacinas para a queda do cabelo – uma doença que aqui chamamos de
tifo e que se adquire em águas contaminadas – os fiéis deixaram de rezar a Deus
para esse fim e passaram a tomar vacina. Quando descobriram as vacinas para a
atrofia muscular, a paralisia muscular, deixaram também de rezar a Deus porque
já não era necessário, mas o costume ficou e ainda hoje vão aos templos para
deixar suas mechas de cabelo, suas velas – já não moldes de membros, e
continuam deixando suas esmolas, desenvolvendo o comércio local.
Agora pedem a Deus pela paz
mundial porque só há uma meia dúzia de doenças que ainda não têm cura. Quando
tiverem, os sacerdotes temem pelo fim das hordas de fiéis. Alguns pensam que
enquanto houver desgraças no mundo, as religiões estarão salvas.
Um comentarista de radio de
um terceiro continente, dizia a seus ouvintes:
- Há uma queda no número de
fiéis, muitos templos estão fechando. Dizem que com a diminuição das doenças,
salvas por vacinas, remédios, cirurgias, melhores hospitais e rápido atendimento,
os fiéis agora pedem a Deus pela paz mundial, para lhes garantir o emprego,
preservar-lhes a vida de desastres ou de assaltos de meliantes, que os
furacões passem bem longe (mesmo que destruindo outras cidades onde vivem
outros fiéis), que os terremotos sejam em outro continente (onde vivem outros
fiéis) e que os morros não desabem com a chuva, mas que se tiver que chover que
chova em outro lugar. Entretanto, a maioria esmagadora dos fiéis, em enquête
levantada pela radio nos últimos cinco anos demonstra que os maiores pedidos a
Deus são feitos para que não chova no final de semana, que seu time de
ludopédio ganhe o campeonato, e que Deus lhes dê bons governantes que não
roubem as verbas públicas nem declarem guerra sem motivo. Algumas fiéis ainda
pedem que Deus dê bons maridos para suas filhas, um futuro bom para os filhos e que as rugas demorem bastante
a modificar-lhes o rosto.
É como se Deus tivesse feito
o mundo a partir do nada deixando que suas leis evoluam fazendo-o evoluir
e se tenha ausentado para cuidar de outros mundos, deixando que a humanidade
aprenda a cuidar de si mesma: Unindo-se definitivamente em torno de uma
vivência e sobrevivência dignas, construtivas, de modo a que um dia possam
encontrar-se com Deus, que então ficará muito orgulhoso ao ver que sua obra
progrediu e já O pode ver ao longo dos universos.
Deus está em toda a parte, mas tal como nossos pais, também deixa que progridamos na vida, de forma a nos tornarmos independentes. O comércio é só um modo de vida.
Rui Rodrigues
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