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terça-feira, 17 de junho de 2014

Sentimentos à flor do pelo.

Sentimentos à flor do pelo.



Dizem que, olhando do alto de uma pirâmide no Egito, Napoleão, um cara famoso por ter tido a idéia molieresca [1]de conquistar o mundo, teria dito: “Do alto destas pirâmides quarenta séculos vos contemplam”. Há controvérsias, porém, devido á datação de uma estátua tão famosa como as pirâmides: A esfinge! O que será a esfinge? Parece um leão com cabeça humana, mas pode ser um gato ou uma gata, a julgar pela posição das patas frontais, com cabeça humana, talvez por que os gatos pareçam tão humanos em seus sentimentos. Cães, por mais que sejam simpáticos, agem como se fossem treinados para agradar e têm uma memória a curto prazo completamente deficiente. Não esquecem os donos, mas só se lembram deles quando estão em contato. Gatos não. Só nos agradam se lhes agradamos e tornam-se fiéis e amigos por opção enquanto os tratarmos bem. Nesta situação de agrados mútuos são companheiros inseparáveis donos de uma inteligência incomum. Comunicam-se muito bem, mas é necessário que “sejam decifrados”. Um olhar pode ser um aviso de algo que nos pode prejudicar, um alerta para algo que esquecemos, como o fogão aceso, por exemplo. A esfinge teria dito a Édipo: “Decifra-me ou devoro-te”. Para uma esfinge leão isso seria admissível, mas para uma esfinge gato, seria totalmente despropositado.


Uma visita ás tumbas e o que vemos? A julgar pelos alimentos em vasos de argila acreditavam que haveria uma vida após a morte. Vemos utensílios do dia a dia de acordo com a sua aptidão em vida: Ferramentas, armas, tinta, roupas. Em tumbas de nobres podemos ver seus escravos que os cuidaram em vida, mortos para que os acompanhassem nessa nova vida. No início da civilização egípcia só os nobres eram embalsamados. Depois, talvez pela necessidade de faturamento dos sacerdotes, passaram a embalsamar qualquer um que tivesse dinheiro para isso, e quem podia embalsamava seus animais de estimação. Há muitos gatos embalsamados. Poderíamos nos perguntar o que é a vida realmente, e se mais um par de dias ou de meses em nossas vidas faria qualquer diferença substancial, e até que ponto valeria a pena sacrificar animais de estimação e escravos para nos acompanharem nessa grande viagem ao além. 

E como sabemos, não valeu de nada, se até os deuses que nunca existiram de fato já estão definitivamente mortos. Haverá quem ainda adore Ísis e Hórus, talvez mesmo Ptha, mas existia um deus (que nunca existiu) que tinha a forma de uma gata: Bastet. Era uma deusa da fertilidade, protetora das mulheres. A confusão entre leão e gato é tão grande, como no caso da Esfinge, que muitos confundiam a deusa Bastet com Sekhmet, uma feroz deusa leoa incumbida por Rá de provocar enormes castigos.
Quem tem gatos e os mantém de forma amável, sincera, calma, “conversando” até com eles, ficará surpreso quando os vir acompanhar seus companheiros (nós) para onde formos, olhar-nos com aqueles olhos límpidos e calmos, e poderá entender seus diferentes miados. Bem tratados não prescindem de nossa companhia. Aquecem-nos os pés na cama, “pedem licença” com seus olhares e gestos antes de tomarem qualquer atitude, podem ficar perto de algo que deixou cair até que você se dê conta e demonstre que o que deixou cair não tem a mínima importância. Conhecem a casa toda, todos os recantos, todos os objetos. Marcam-nos roçando o pescoço em suas esquinas. Se tirar algo de lugar, lá está ela ou ele, para “cheirar” o objeto e memorizar onde está. Estes felinos têm personalidade. Se você estiver triste, olham com fixação como quem pergunta: - O que se passa? E de repente correm escadas acima para brincar de esconde-esconde, pega-pega. Ou aparecem de repente, dão uma leve patada em suas pernas e saem correndo pela casa para que sejam procurados. A Sarkye, uma gata de três cores que me acompanha há doze anos atirava-lhe uma pequena bola. Ela brincava até se cansar. Olhava-me, pegava a bola com a boca e vinha trazê-la para que voltasse a jogá-la. Quando finalmente se cansava, parava e saía de perto da bola. Bebe água da torneira da qual deixo cair um fio constante. Quando acaba de beber olha-me para avisar que acabou e só então salta da pia. Se ela quer sair de casa para se espreguiçar ao sol, fica na porta parada, de costas para mim. Se demorar a abri-la emite um miado curto. Abro-lhe a porta e sai. Sento-me para digitar no computador e lá vem ela, de mansinho, toda cheia de dedos, suavemente, como quem me pergunta: - Onde me deito? Podes arranjar-me um cantinho? E aninha-se com a cabeça em meus braços. Se pelo contrário lhe digo: Agora não, Sarkye... Ela se afasta e aninha-se em qualquer lugar livre onde ela caiba. Tem sua ração preferida. Se a misturo com outra, escolhe pacientemente os pedaços da reação preferida e deixa a outra se acumular.


Quem não tem cão caça como gato, dizem, mas com a Sarkye não é assim. Qualquer movimento e ei-la de orelhas a pino, o nariz levantado cheirando o ambiente, o olhar fixo no que se movimenta. Já descobri outros gatos lá fora, pássaros, borboletas, lagartixas, gambás, cachorros. Quando se trata de pessoas, mesmo fora do portão, na rua, ela rosna. Rosna mesmo. Se vou ao banheiro e fecho a porta, vem correndo e mia até que a porta lhe seja aberta. Então entra e fia ali, de costas para mim, como quem me guarda e me avisará de qualquer perigo. Se me distraio, entra em minhas calças ou short arriados e tenta se arrumar até que eu faça menção de me movimentar para apanhar o papel higiênico. Mas o melhor de tudo é o assobio. Ela vem quando assobio e me cheira o nariz, provavelmente procurando por um passarinho fantasma que lhe escondo. Se ela gosta do assobio, porque nunca assobio diferente, ela mia para me acompanhar.



Para mim, Sarkye é uma “pessoa”. Se eu vivesse no antigo Egito não teria os conhecimentos que tenho hoje, e dadas as circunstâncias, pediria para que a embalsamassem quando partisse a caminho dos céus de Osíris e de Hórus. Seria uma atrocidade minha, mas os costumes são de época de acordo com os conhecimentos adquiridos numa civilização e há que isentar a falta de conhecimento. O que não se deve é isentar a escravidão seja qual for a forma de escravizar. Não podemos – sob pena de sermos condenados no tribunal de Osíris ou em qualquer outro – fingir desconhecimento do que conhecemos de acordo com as conveniências.  Está bem certo que Osíris era falso como deus porque não existia de fato, mas nossa vida se constrói dia a dia numa comunidade de amigos, conhecidos, nossa “identidade” se constrói pelos atos e não por um título, uma carteira, uma impressão digital, um voto. Podemos perdê-la num simples ato grave, ou numa série de pequenos atos. Reis e presidentes deveriam perder os cargos quando perdem a identidade. Isso nós sabemos, temos conhecimento. Por que não adotamos um voto para deseleger e sermos assim democratas na verdadeira acepção da palavra?

® Rui Rodrigues

PS - Esta é uma homenagem a todos os felinos caseiros, mas muito em especial a todas as deusas gatas mulheres deste planeta. Sem elas eu não seria o que fui e nem que sou como sou. 




[1] Refiro-me a Moliére um grande autor de peças teatrais. Napoleão perdeu tudo o que ocupou e que nunca conquistou de fato. Provavelmente nem as mulheres. Ficou na história como um general fracassado, baixinho, gordo, mulherengo para vencer seu complexo de inferioridade. Perdeu a mãe de todas as batalhas em Waterloo e morreu envenenado por papel de parede contendo chumbo, numa prisão. Umidade e chumbo o mataram. A França diz que ele é um herói.  Não posso olhar para uma figura destas de mão no estômago para acariciar uma úlcera atroz como uma figura heróica. Mas respeito o povo francês. Têm um paladar maravilhoso. 

segunda-feira, 16 de junho de 2014

A famigerada copa Brasil 2014 da FIFA.

A famigerada copa Brasil 2014 da FIFA.



  1. O cenário Brasil.

Quando a fome se junta com a vontade de comer, temos sempre uma lambança. A lambança tanto pode ser comunista, como socialista, como capitalista, sob a égide mancomunada de ditadores como na Argentina de Videla, de reinados, de republicas, de quem “manda” nos governos que vêm na realização das Copas boas oportunidades para alguma coisa, mais que não seja, a promoção pessoal em governos de caudilhos e populistas, ou de partidos políticos no poder com vistas à reeleição ou para firmar sua posição de liderança. Em países mais democráticos, uma esperança de bons negócios. Para todos, afinal, sempre a perspectiva de bons negócios não importa quem paga as despesas, quase sempre as populações com os impostos provenientes do trabalho. Mas no Brasil, um país com os mais altos índices de corrupção, com um “ex-líder” populista no comando do governo onde impera soberana uma ex-guerrilheira completamente “tapada”, obsessiva e vingativa, unida a uma emissora de televisão que pensa estar sempre sobrenadando sobre a mídia desde que apoiada pelos governos a quem sempre pede ajuda financeira em troca de favores, e um senado cheio de políticos que têm contas a ajustar com a justiça e que pensam que sempre terão as bênçãos do governo desde que o consintam e o apóiem, todos os males se somam apoiados por uma população com os mais ínfimos índices de educação mundiais.

No Brasil as bênçãos são mais abençoadas e os malefícios são mais demoníacos. Somos brasileiros, não desistimos nunca, mas demoramos muito a escoicear o montador que nos empurra com a propaganda que nós mesmos pagamos para nos mostrar “o bom caminho a seguir”. O mensalão é uma prova de que os políticos não representam o povo brasileiro.  Foi assim que trouxeram a Copa do Mundo da FIFA de 2014 para terras brasileiras. Com todos aqueles “predicados” não é difícil entender porque razão a copa se realizou em terras tupiniquins: A Copa é um bom negócio para quem a usa, a FIFA é uma empresa e o governo brasileiro parece ser uma empresa particular de partidos, políticos, politiqueiros, amigos unidos do PT. Nenhum deles é comunista nem socialista. Ganham o dinheiro questionável do uso de impostos públicos. A FIFA é a única de princípios capitalistas, assim como as empresas de construção e de exploração de espaços, suportados por uma mídia e artistas pagos a peso de ouro: Há que convencer o povo que o que é bom para os EUA é bom para o Brasil – assim se dizia antigamente – e que o que é bom para a FIFA é bom para o PT.

  1. FIFA - Antes e depois de João Havelange

Até o reinado de Stanley Rous como presidente da FIFA, de 1961 a 1974, nunca se levantou acusação séria de corrupção em seus bastidores. Faleceu com 91 anos em Guildford, em 1986, livre de denuncias. Sucedeu-lhe João Havelange, brasileiro, porque apoiava os países africanos. Havelange ficou suficientemente rico para se dedicar a trabalho filantrópico junto às aldeias internacionais SOS, patrocinado pela entidade em 131 países. Para se livrar de acusações de corrupção [1], abdicou de sua posição de presidente de honra da FIFA.  Não trouxe nenhuma copa para o Brasil, embora tenha organizado seis delas [2].  Sucedeu-lhe Joseph Blatter, e há rumores de corrupção incluindo a realização da Copa de 2022 no Qatar. Franz Beckenbauer foi afastado de seu cargo no comitê organizador de copas na FIFA e promete cooperar com as investigações. Os resultados da comissão de ética da FIFA serão divulgados após a copa de 2014. Em termos de esporte muito se deve à FIFA. Não é isso que se questiona aqui.

  1. Brasil, FIFA e “Não vai haver Copa”.


Era evidente que haveria Copa. Primeiro porque algumas confederações de futebol hesitaram ou não confirmaram suas candidaturas à realização da Copa. Foi o caso de Chile em conjunto com a Argentina tal como se chegou a cogitar em 2005; o Canadá ficou em compasso de espera caso o Brasil não conseguisse cumprir com as premissas; A candidatura Colombiana obrigaria á cessão para o México por questões financeiras e o presidente Uribe desistiu de concorrer em 2007; Uma pretensa “Comunidade Andina” constituída de Colômbia, Equador, peru e Bolívia nem foi oficializada, mas estaria fadada ao insucesso por causa das altitudes dos campos de jogo, além desses quatro países estarem automaticamente classificados; os EUA, hipótese levantada por Blatter seria uma opção caso o Brasil não cumprisse com as exigências estabelecidas, tal como o Canadá; Hugo Chavez, o desastrado e cômico presidente da Venezuela, apresentou sua candidatura quando as inscrições já estavam encerradas. Sobrou a candidatura do Brasil. Um dos primeiros passos da presidente Dilma Rousseff, pouco experiente em economia, em contratações e em gerir uma democracia, foi baixar um decreto – e país onde se governa por decretos não tem nada de democrático com um congresso comprado – estabelecendo o sigilo das despesas para a Copa - além de um outro segundo o qual há uma reserva financeira que pode ser usada pelo Estado sem ter que dar satisfações a ninguém. Num Estado com tantas deficiências na educação, na segurança, na saúde e nos transportes públicos, dizendo-se socialista, era de esperar que os investimentos nacionais se voltassem para estas áreas. Em vez disso, a presidência, o PT e seus partidos associados financia porto em Cuba, perdoa dívidas de conhecidos ditadores africanos, baixa decretos atrás de decretos alterando leis e uma principalmente, o decreto 2.300 sobre contratações, a pretexto de dar velocidade ao andamento de projetos, e construções em geral. A transposição do Rio São Francisco não foi realizada deixando o Norte e Nordeste sem água, o gado morrendo, e acumulando erros atrás de erros, o governo brasileiro atrelado ao Congresso Nacional levou o povo para as ruas. Um dos slogans era “Não vai ter Copa”...Mas sempre que o povo sai ás ruas por um movimento lídimo e patriótico, a ala destruidora dos partidos políticos, do governo e dos políticos associados, vem para as ruas também, para desvirtuar. 

Até hoje o governo brasileiro e o Congresso atrelado com os respectivos partidos políticos ainda não quiseram entender que não vai ter Copa. Claro que está tendo Copa, mas vai custar muito caro aos que se distraem com futebol no governo. O preço será cobrado a qualquer momento, antes, durante ou após as eleições. Duzentos milhões são brasileiros neste país e não desistem nunca. Era melhor para eles, os que governam com o Senado atrelado com os respectivos partidos políticos que tivessem desistido da Copa. Para nós, povo brasileiro, agora seria tarde para desistir. Como brasileiros torcemos pela seleção nacional, mesmo que a Copa fosse realizada em outros países, mas parece que não estavam interessados. Depois de Stanley Rous, a FIFA mudou muito. Ficou rica. Não ela apenas, como entidade, mas tal como no governo brasileiro, os políticos também estão encontrando suas fontes de enriquecimento.Governos passam, o povo fica. A "pilha" da emoção da Copa é da Globo, da FIFA e do governo brasileiro. O dinheiro já foi gasto, as obras afora os estádios não... Você, contribuinte vai continuar sem educação, sem infraestruturas, sem transportes dignos, sem segurança e sem saúde públicas. E haverá apagões de energia e financeiros. 

® Rui Rodrigues

  











[1] No livro Foul! The Secret World of FIFA: Bribes, Vote-Rigging and Ticket Scandals, lançado em 2006, o jornalista investigativo Andrew Jennings descreve Havelange como um dirigente corrupto. Segundo Jennings, o filho do fundador e ex-diretor da Adidas, Horst Dassler, comprou votos de delegados indecisos na primeira eleição de Havelange. Dois anos depois, o brasileiro retribuiu o favor entregando a Dassler o poder exclusivo sobre a comercialização dos principais torneios mundiais. Em 2011 já havia  renunciado do COI, dias antes da entidade anunciar decisão sobre casos de corrupção que envolviam o nome do brasileiro  .
[2] Um dia se saberá como que a Globo conseguiu a exclusividade para a transmissão dos jogos da Copa da FIFA. Em 1981, o Comitê Executivo da FIFA nomeou o poliglota Joseph Blatter como secretário-geral da entidade e, em 1990, o promoveu a diretor executivo (CEO). Sob o seu comando, foram realizadas cinco Copas do Mundo: Espanha 1982, México 1986, Itália 1990, Estados Unidos 1994 e França 1998. Nesse período, junto a Havelange, ele teve um papel preponderante nas negociações dos contratos de televisão e de marketing da Copa do Mundo da FIFA e na modernização do formato comercial do evento até o ano de 2006.

sábado, 7 de junho de 2014

Já pensou?

Já pensou?

A realidade não nos incomoda senão por escasso tempo. O que nos incomoda é a dúvida, a hipótese de realidade. Venha comigo percorrer um agreste caminho na trilha da essência da vida.



Nascemos. Até cerca de dois anos não nos lembramos de nada. Foi um período de concentração total em assimilar o mundo que nos cercava, todo o esforço concentrado em memorizar, dar os primeiros passos, reconhecer. Depois começamos a viver a “nossa vida”, sem sequer sabermos o que isso significa, o que isso é realmente. Guardamos boas e más lembranças, mas a definição de boas e más depende do que cada um possa suportar de dor, ou apreciar de prazeres. Nem todos temos a mesma capacidade de avaliação. Vemos o futuro como algo que nos preocupa de vez em quando mas que podemos sempre mudar, a qualquer tempo. Já na meia idade começamos a perceber que o tempo vai ficando escasso para mudarmos alguma coisa em nossas vidas. Nem isso realmente interessa muito, porque já nos moldamos a nós mesmos e na verdade não queremos, não temos desejo de mudar tanto assim. Seria incômoda uma “nova” vida, cheia de incógnitas. Com muita sorte nossa memória continuará ativa e nos lembraremos de muitos acontecimentos, cada um servindo de experiência para outros futuros, mas infalivelmente nos perguntaremos: Tudo isto, uma vida, para quê? No início pensávamos que a vida era para nos servir. Depois pensamos que servia apenas para sermos servidos pelos que nos amam e lhes servir, como os filhos e os nossos pais, por exemplo, e finalmente, também com alguma sorte na associação e idéias que nós existimos apenas como garantia adicional da manutenção de uma espécie cuja totalidade dos membros constitui a humanidade, o conjunto da espécie Homo Sapiens. Mas imediatamente nos começaremos a preocupar com a “passagem”. Uma passagem para onde? E em eufemismos, morremos e vamos para onde?

Os romanos tinham uma percepção muito diferente dos egípcios sobre a  existência: Para os egípcios, a vida era qualquer coisa como um preparativo para uma outra vida. As almas dos mortos se submetiam a um tribunal, o tribunal de Osíris, e se elas, as almas, contidas no “coração” pesassem no máximo o peso de uma pena, teriam direito à reencarnação num outro mundo. Para os romanos a vida era apenas a vida que se levava. Finda, não havia mais nada. Contentavam-se com o viver e manterem-se vivos enquanto pudessem. A morte era algo muito natural e inevitável. Enquanto no mundo egípcio a esperança numa outra vida aliviava as dificuldades, no mundo romano sem essa esperança, as liberdades eram muito mais amplas, quem pudesse tirar mais vantagens da vida era o abençoado. A frase que da vida se levam os prazeres é certamente romana, não egípcia. Por essas razões o povo egípcio sempre aceitou mais os seus governantes a quem viam como descendentes dos deuses, do que os romanos, um mundo de revoluções e traições. Não que não houvesse traições no mundo dos antigos egípcios, mas não de forma tão comum. Não é o caso de entrar em outros detalhes de outras religiões, mas desde não se ir para lugar nenhum, até termos 25.000 céus à disposição, há muito em que se crer. Cada roca com seu fuso, cada mundo com seu uso. Porém, o que seria da ordem nas sociedades se não houvesse mecanismos que as mantenham na ordem por vontade própria? Por exemplo, fazer o bem sem esperar a quem, sermos todos “bons sujeitos”, não cobiçar a mulher (ou o homem) do próximo, e outras “leis” que nos mantenham num comportamento que não sobressalte os próximos nem os que nos governam? Por isso mesmo sempre existiram os segredos de Estado, os cadernos das leis não são distribuídos pela população ou ensinados nas escolas exceto em Universidades, e uma série de medidas que sempre foram colocadas à margem. Nos templos se ensinava o comportamento ideal para que as sociedades continuassem “em paz”.


O mundo da informática veio mudar tudo isso. Não se pode esconder mais nada ou muito pouco. Crianças se transformam em adultos mais cedo, querem viver a vida, chamam por Deus mas ele não lhes aparece, o que aparece é a vida em todo o seu esplendor, e uma pergunta constante:  Por que não ter o que se vê?
Detalhes de cada religião podem ser facilmente acessados, e os males são iguais para as sociedades de todas as religiões, o que as iguala. São todas “iguais” para todos os efeitos práticos. Há quem queira morrer numa cama praticando sexo; quem amealhe cada centavo para deixar para os filhos ou sem saber para quê; quem queira morrer aos 120 anos com cara de trinta ainda que isso não lhes sirva para nada a não ser manter uma “identidade” ou fazer inveja a quem olhar; e quem não se incomode com nada para não se aborrecer. Há de tudo no mercado pessoal dos seres humanos. Compramo-nos e vendemo-nos por qualquer coisa que nos pareça “interessante”. Comportamo-nos como turistas da vida apesar de todas as vicissitudes. Queremos olhar, sentir o mundo, experimentar de tudo e esse tudo é restringido ou ampliado em função da moral que por sua vez é ditada quer por governos, quer por religiões, quer pela mídia. Há, contudo, exceções em cada aspecto, mas há séculos, milênios, que não nos aparece um profeta. Não existe mais ambiente para eles. Tudo muda e já são raros os entregadores de leite, os jornaleiros que vendiam jornais nas ruas, geralmente menores de idade, não têm aparecido compositores de música clássica ultimamente, as salas de cinema estão acabando.

A vida parece um filme do qual somos ao mesmo tempo os produtores, os diretores e os artistas. Ilusão? Pode ser. Pode ser pura ilusão e nem existirmos realmente, tudo fruto de um cenário em quatro dimensões, comum a todos nós: Três de volume e uma de tempo. Em relação ao Universo somos muito menores do que um simples micróbio em relação a nós. Não somos realmente nada. Um nada quase absoluto, onde a vaidade destoa, mas faz parte da ilusão de nossos personagens. Sim. Somos os nossos próprios personagens também, sempre iludidos que os outros seres humanos nos vejam como nós pensamos que eles nos vêm, isto é, como gostaríamos que nos vissem, mas essa imagem é completamente irreal. Não temos a menor capacidade de lhes transmitirmos o que realmente somos nem o que queremos que pensem e vejam. É sob este aspecto, principalmente, que somos uma ilusão para os outros. E se pensarmos bem, veremos que não nos conhecemos completamente. Passamos os dias a nos convencermos que “somos assim como queremos” e por vezes nos surpreendemos do quanto somos diferentes em algumas atitudes que tomamos.



Enfim, e por fim, mas de forma não completa, somos o que ‘imaginamos” num mundo que também “imaginamos”. Somos fortes. Todos nós somos fortes, impressionantemente fortes, se pensarmos que trilhões de seres humanos que já passaram por este mundo sofreram o que iremos sofrer um dia. E conseguiram apesar de tudo viver felizes seus momentos de felicidade, vencer suas vitórias, divertir-se em salas de baile que já estão desaparecendo, amar em leitos, em cadeiras, em trens e aviões, em corredores, banheiros salas e cozinhas, no banco de trás ou atrás das moitas. Portanto, viver a nossa vida é um privilégio tão particular que deveria ser humanamente impossível que alguém pudesse interferir em nossas vidas sem a nossa consentida permissão. Um espírito libertário?  Pode ser que sim, até porque não parece possível enjaular toda uma humanidade que hoje beira os 7,5 bilhões de seres humanos que querem viver sua precária vida o melhor que podem, em seu pleno direito.

Para onde vamos? Será que isso importa?

®Rui Rodrigues










terça-feira, 3 de junho de 2014

Carta de Malabar a Simão Pescador - Via Ricardo Kohn

Carta de Malabar a Simão Pescador

Caro Ricardo Kohn, passo-te uma carta do “Malabar”, de nome de registro Afonso Candeias Pereira, que pescou muito com o Simão quando ainda eram uns putos imberbes. Costumavam ir à chocalhada em bons pesqueiros ali prós lados de Setúbal. Chamavam-lhe Malabar porque às vezes, quando lhe interessava, e muito queriam saber pescadores de outras bandas, os levava para pesqueiros vazios, ou onde já tinha pescado nos dias anteriores. Ele ficava desacreditado, passaram a chamar-lhe de Malabar [1], mas os seus chocos ficavam vivos, por lá, até que ele e Simão os fossem apanhar.


Mas eis a carta:

“Cabo Frio, 08 de junho de 2013

Meu grande amigo Simão.

Certamente não sabes nem onde eu estou.  Estou no Brasil a caminho de Espanha. Vou para as Astúrias. Vou pescar embarcado num pesqueiro, o “mar Nosso”, de bandeira portuguesa, e propriedade de um armador espanhol, galego. Não pescar propriamente dito. Vou como consultor, mas de vez em quando para matar a saudade, vou agarrar na cana e tirar uns peixitos. Escrevo-te porque vi que te correspondes com o Kohn aqui do Brasil. Disse-mo o meu filho que tem um frigorífico aqui em Cabo Frio. Tive que emigrar de Portugal – coisa que jamais me passaria pela cabeça – para vir pescar no Brasil, tão mal andam as finanças portuguesas, por culpa desses traidores socialistas que traíram os sonhos do 25 de abril quando fizemos aquela revolução cravejada.  Mas por infelicidade do destino, lá vou eu emigrar deste lugar para terras de Espanha, porque aqui também traíram as esperanças de o Brasil ser o país do futuro. Parece-me que o futuro do Brasil ficou tão distante, que agora passou a ser o Brasil do infortúnio do futuro-mais-que-presente. Sabes aqueles políticos socialistas portugueses que arrasaram as verbas da União Européia doadas a fundo perdido em benefício de amigos? Pois é... Aqui fizeram exatamente o mesmo e da mesma maneira, mas com os impostos públicos. 

No caso das pescas, por aqui criaram épocas de defeso, o que é muito bom para a recomposição de ardumes, mas começaram a pagar subsídios de pesca para meia dúzia de pescadores e para pescadores de subsídios. O resultado foi que muitos com pouca ou nenhuma família vivem bem com o subsídio e não pescam nada, porque além desse subsídio, ainda têm um tal de bolsa-família, um salário e meio se vão presos por bandidagem, as mulheres deles têm mais um salário auxílio, e se a filha for uma piranha, isto é, uma prostituta, ainda recebe mais um salário. Ou seja, ganham mais, os pescadores de subsídios do que trabalhadores, professores, e em alguns casos mais do que engenheiros e médicos. Uma secretária de um executivo, falando quatro línguas tem vergonha do salário miserável que recebe. Num país destes, eu tenho que pensar em emigrar.




Vão fazer uma Copa em 2014, mas a população está toda nas ruas, uns a quebrar e queimar autocarros [2], outros a quebrar comboios [3], outros a queimar pneus nas estradas por causa dos buracos nas estradas – que são uns caminhos abertos a trator no meio de lamaçais de terra encarnada –outros quebram montras de Bancos e destroem tudo que vêm pela frente. Na verdade não há governo por aqui e a explicação é muito simples: Um torneiro mecânico ignorante, eleito presidente pela ignorância nacional, pediu ajuda a antigos guerrilheiros e subverteram as leis incluindo a constituição. A base intelectual da esquerda saiu toda do partido e passou para o estado de observação. Vendo que não podia ser reeleito outra vez, indicou uma terrorista, fugitiva dos bancos de escola para seu lugar. Ela assaltava cadeiras de escola, bancos, fazia seqüestros relâmpago de embaixadores, matava e mandava matar nas ruas e selvas do Brasil. Uma mulher dessas não pode ser grande coisa e eu estou saindo deste presídio, onde nós população estamos reféns de bandidos atrás de grades que colocamos em portas e janelas de nossas casas. Como que podem ter a pretensão de sediar uma copa do mundo de futebol?   Só se for para roubar mais ainda, muito mais do que o mensalão que serviu para aprovar as alterações das leis de que te falei, uma forma de pagamento aos que votam essas coisas lá em Brasília.




Quando chegar por aí, nas próximas férias, conto-te as novidades.

Um grande abraço do teu amigo,
Calabar.

PS. – Prepara as brasas, a aguardente e os chocos, que eu levo as lagostas, umas garrafas de Rioja e um abraço. E outra coisa... lembras-te daqueles iscos que encontramos uma vez lá pros lados de Setúbal, quando estávamos a pescar chocos? Por aqui não os há, e, portanto, ninguém lhes sabe o nome. As sardinhas são maiores que as daí, e o arroz de tamboril daqui não deve nada ao daí com o açafrão daqui. (Não sei se o percebestes, mas tenho já um sotaque brasileiro e é com dor no coração que me mando daqui. Amo esta terrinha do caraças!) ”



Amigo Ricardo Kohn, fui eu que contei ao Malabar que tu conhecias o Simão. O Malabar, ele morreu numa pescaria lá nas Astúrias. O barco deles era de bandeira portuguesa, mas pertencia a um armador galego. Eram 12 tripulantes, sete eram portugueses. Morreram três portugueses e dois espanhóis que ficaram lá a 170 metros de profundidade. Uma tragédia a que os pescadores portugueses já estão habituados. Para os pescadores não é uma tragédia: É um trabalho perigoso. Para a família é uma tragédia, para a população basta um comentário: “Olha... Soubeste que morreram mais uns pescadores na faina da pesca lá nas Astúrias? O barco dos gajos afundou-se!” E no dia seguinte só se comenta se alguém leu o jornal com atraso e pergunta se alguém soube da novidade contando-a à queima-roupa. Mas não é nenhuma novidade. Todos sabem que não usam EPIs, aqueles trajes de segurança para o caso de caírem ao mar e não se afogarem. 


Como é que no caso do “Mar Nosso” morreram logo sete de uma vez se o barco não foi torpedeado? Mas isto são perguntas que não se fazem por total abstinência de pensar de duas nações inteiras: Portugal e Espanha, porque pensar por lá dá muito trabalho e pode gerar muita confusão como a perda de emprego de familiares. Por lá nunca se pode reclamar sob pena de perder o que se tem.
Com o meu abraço,

® Rui Rodrigues

e que raios ma partam se não há sempre um fundo de verdade em tudo que se mostra e se diz... e que por vezes o fundo da verdade é toda a essência da verdade que não pode nem ser vendida como em frascos de perfume. A minha seria embalada em Paris. Simão publica seus artigos através de Ricardo Kohn em  
http://ambiente.kohn.eco.br/2014/06/03/mais-um-circo-montado/  






[1] Malabar, uma referência ao piloto árabe “traíra” que orientou as naus de Vasco da Gama para lugares hostis, como consta nos Lusíadas de Luis Vaz de Camões.
[2] ônibus
[3] Trens

Coisas do comunismo e dos extremismos sociais...


Coisas do comunismo e dos extremismos sociais...



Alguém famoso já disse que as mulheres se vendiam ora por um casaco de peles, ora por um automóvel, e até por amor... Foi um machista que disse isto, e certamente não teria fama nos dias de hoje. Teve sua fama no passado.

Quando fui avaliar os estragos numa prisão de Luanda - os presidiários tinham ateado fogo a uma das alas - me receberam como um camarada, com comitê de boas vindas: Um coro de belas cabritinhas assistentes camaradas vestidas de branco com lacinhos vermelhos no cabelo, cantando trechos do livro vermelho de Mao Tse Tung ainda vivo lá na China. Embora os camaradas cubanos ainda andassem por lá fazendo mira em elefantes e rinocerontes para testar seus canhões de tanques, era a empresas portuguesas e brasileiras que entregavam as suas obras de engenharia. Cuba não era famosa em obras de engenharia e fui levado pelo páteo principal acompanhado de três guardas camaradas, dois funcionários públicos e o vice diretor. Uma vala de esgoto corria pelo meio do páteo a céu aberto, abrindo caminho até um ralo de águas pluviais que levaria o esgoto até a Baía de Luanda. Ouvi gritos pedindo assistência dos direitos humanos das Nações Unidas por alegada inocência. Homens semi-nus passeavam pela praça do presídio com olhares desconfiados, entre esperança e desânimo. Não mais do que eu. O incêndio era no segundo andar. Eu desconfiava que me estavam intimidando aproveitando a vistoria.

No escritório de Luanda havia uma sala. Havia uma sala no escritório de Luanda. Lá os senhores camaradas recebiam passagens grátis com estadia em Lisboa e no Porto. As cabritinhas faziam tudo em honra do partido, os funcionários tudo faziam em honra do partido, os aparatos bélicos chegaram a Luanda vindos de Cuba em frangalhos, por causa do boicote, saíram novos em folha, pintados e com armas mais modernas quando começaram a sair de volta a La Habana. Os charutos eram caríssimos. Os camaradas funcionários tinham sempre vales sobrando para comprar caixas de cerveja e eletrodomésticos no único shopping center de Luanda. Com as caixas de cerveja compradas em Kuanzas, podiam comprar dólares e escudos no mercado negro.

O comunismo também sabia ser selvagem na sua mais vermelha versão comunista. Se não era em vales e passagens, era com cabritas e favores, tudo valendo dólares e escudos com Kuanzas sempre desvalorizados. Os observadores internacionais sempre disseram que as eleições eram legais. Os diamantes sempre foram caros no mundo, mas por aquelas regiões eram mais baratos Em empresas privadas capitalistas funcionários não podem ser nem comunistas nem corruptos, mas por vezes até podem corromper.

₢ Rui Rodrigues

sexta-feira, 30 de maio de 2014

Cronicas do Peró - siris,toco e pimenta rosa

Hoje saí para pescar siri, mas só colhi um ramo de pimenta rosa e coletei um toco.




Saí de casa em dia de sol e céu de brigadeiro, e caminhei 150 metros até a borda da areia da praia. Depois mais 500 metros até as pedras do Pontal, e fiz o percurso de volta. Levei meu puçá de cabo para apanhar uns siris. Estava com vontade de fazer um espaguete de siri com queijo ralado e molho de pimenta rosa. Logo na areia da praia me deparei com uma “poluição” saudável: Restos de  algas, pedaços de vegetais empurrados pelas marés, trazidos das ilhas em frente. São bastantes ilhas que compõem a paisagem.  Hoje havia uns dois ou três tarrafeiros tentando pescar umas tainhas ou paratis distraídos. Não tem sido grande a pesca artesanal e de subsistência por aqui porque o barco de arrasto passou antes da páscoa para limpar a área de peixes e tudo o que vem no arrasto. A ultima maré trouxe também um lindo tênis branco solitário da direita, cordões ainda amarrados, um par desencontrado de sandálias tipo hawaianas, uma profusão de tampas plásticas de garrafas pet, pedaços de isopor e de cordas. Marés já trouxeram até coisas bem maiores, como um cadáver de baleia que tresandou a praia por uns bons quinze dias, imobilizado nas pedras. Hoje a água estava morna.




Mas hoje não havia siris. Não vi nenhum. Devem andar assustados como tudo o que vive em Cabo Frio, Rio de Janeiro, Brasil e arredores. Há bastante tempo que não vejo siris por aqui. Há muito tempo mesmo, quase um ano. Nem as conchas, difíceis de coletar, enterradas na areia. Mas a natureza sempre nos compensa, e hoje fui compensado com três coisas: Uma revoada de centenas de andorinhas percorrendo as dunas, um toco para a minha churrasqueira para dar sabor ao churrasco, e um ramo de sementes de aroeira, a famosa pimenta rosa.


A pimenta rosa é coletada de forma extrativista na região. O que mais existe por aqui são aroeiras, mexilhão nas pedras do Pontal, pitangas selvagens, paratis nas ondas e gente que chega em caminhões e ônibus e enchem a praia de sujeira que é recolhida como se pode. Os papagaios passam sem parar a caminho das ilhas para pernoitarem fazendo uma chilreada alegre. Os pica-paus não se misturam com os quero-queros senão o cantar dos filhotes seria meio estranho e misturado.
A coleta permite que empresas revendedoras vendam, a granel, o quilo dos grãos de pimenta rosa entre  49,00  e 100,00 reais. Para um custo de matéria prima igual a zero, por ser uma dádiva da natureza pródiga, é um custo muito alto. Ainda mais quando se sabe que os coletores a vendem aos atravessadores a 1,50 reais o quilo.  Mas quando chega à Europa, por exemplo, é vendida a 4,00 euros, ou 15 reais o sache de 40 gramas. Isto resulta num preço de quilo de 375 reais. Realmente a economia mundial padece de alguns controles para evitar o excesso de lucros tão gritantes. Algo que custa 1,50 na colheita não deveria ser vendido a 375,00. Isto é uma loucura e impede o largo consumo por economia de escala.


A fábrica de refrigerantes da Shweeps fabrica uma especialidade à base de pimenta rosa, alguns perfumes franceses têm como matéria prima a pimenta rosa, condimentos e até sardinhas são fabricados com pimenta rosa. Quanto ao sabor não há nada comparável. Em lugar algum. O sabor e o cheiro são únicos. Ainda me lembro de meus passeios pelo campo nas fazendas do Rio Grande do Sul, quando me diziam que ao passar perto de uma aroeira a teria que cumprimentar humildemente, dizendo: Bom dia ou boa tarde senhora aroeira, para não sentir alergia que poderia até fechar a garganta. Sou alérgico a muitas coisas, inclusive à incompetência, mas à senhora aroeira, não.



® Rui Rodrigues 

segunda-feira, 26 de maio de 2014

Coisas do mês de maio de 2014













Nos idos dos anos 80 escrevi um relatório de 10 páginas, dizendo para os "donos da empresa": Está tudo errado !... Se não acabarem com isto e aquilo (cinco primeiras páginas) e fizerem isto e aquilo (as restantes cinco páginas), sofrerão intervenção federal... Riram de meu relatório (eu ouvi) jogaram-no no lixo, e todos, e eu junto, respondemos a duas CPIs. Só não respondi a uma terceira, do Senado... Fui parar no analista que por sorte não era de Bagé. Fiquei sabendo anos mais tarde que quando cheguei para a primeira consulta eu estava à beira de um "ataque" irreversível de nervos. Porém, há outras pessoas que passam essa linha divisória do bom senso e jamais voltam. Elas tanto podem ser competentes como incompetentes, ter ou não ter mérito, mas quer pessoas como eu quer a pessoas sem mérito pode acontecer a mesma coisa.

O que acontece nesses casos? 


Simplesmente há incompetentes que ocupam cargos importantes, não por mérito, porque seus erros conseguem estragar - ou quase - a sua vida profissional, pública, no lar arrastando os outros ... Normalmente essas pessoas são indicadas porque fazem, ou farão, o que lhes for "mandado fazer". são pessoas plantadas. Porém ambas sofrem um certo tipo de "desilusão sem contrapartida"... É o sistema que não pode ser denunciado e que tem que ser defendido de seus erros para que não nos arrastem ainda mais... Quer os que fazem o que lhes mandam achando que é o certo, quer os que avisam que está tudo errado, sentem-se impotentes contra o sistema, julgam-se traídos. Eu nunca mais fui o mesmo como profissional. melhorei muito e escolhi muito melhor para quem trabalhar. Não era qualquer empresa que me servia. 

Karen Hudes encontrou seus fantasmas. Agarra-se a eles como os últimos deuses que podem explicar sem “espiações” nem expiações, e completamente sem culpas, os erros que viu em sua vida no Banco Mundial... Só não sabemos se foi para lá por mérito ou porque foi indicada... 

O que ela viu, quem sabe, um dia nos contará... 

₢ Rui Rodrigues.

http://noticias.seuhistory.com/ex-executiva-do-banco-mundial-afirma-criaturas-nao-humanas-controlam-o-mundo

domingo, 18 de maio de 2014

Carta de Gilberto Geraldo Garbi para Lula.

Não costumo publicar textos de terceiros. Creio que este é até agora o único. O texto é muito bom (recebi por e-mail) mas não tenho certeza se o texto é mesmo dele. Procurei em seu blog e não o encontrei. Por isso o publico. Eis o blog do eminente professor : (http://blogdogarbi.wordpress.com/about/)


""Carta de Gilberto Geraldo Garbi para Lula.

 
Gilberto Geraldo Garbi foi um dos alunos classificados a seu tempo como UM DOS MELHORES ALUNOS DE MATEMÁTICA que já haviam adentrado ao ITA. 
Depois de graduado, desenvolveu carreira na TELEPAR, onde chegou a Diretor Técnico e Diretor Presidente, sendo depois Presidente da TELEBRAS.

A CAMINHO DOS 99,9999995%
( Gilberto Geraldo Garbi )

Há poucos dias, a imprensa anunciou amplamente que, segundo as últimas pesquisas de opinião, Lula bateu de novo seus recordes anteriores de popularidade e chegou a 84% de avaliação positiva. É, realmente, algo "nunca antes visto nesse país" e eu fiquei me perguntando o que poderemos esperar das próximas consultas populares.

Lembro-me de que quando Lula chegou aos 70% achei que ele jamais bateria Hitler, a quem, em seu auge, a cultíssima Alemanha chegara a conceder 82% de aprovação. 

Mas eu estava enganado: nosso operário-presidente já deixou para trás o psicopata de bigodinho e hoje só deve estar perdendo para Fidel Castro e para aquele tiranete caricato da Coreia do Norte, cujo nome jamais me interessei em guardar. Mas Lula tem uma vantagem sobre os dois ditadores: aqui as pesquisas refletem verdadeiramente o que o povo pensa, enquanto em Cuba e na Coreia do Norte as pesquisas de opinião lembram o que se dizia dos plebiscitos portugueses durante a ditadura lusitana: SIM, Salazar fica; NÃO, Salazar não sai; brancos e nulos sendo contados a favor do governo.

Portanto, a popularidade de Lula ainda "tem espaço" para crescer, para empregar essa expressão surrada e pedante, mas adorada pelos economistas. E faltam apenas cerca de 16% para que Lula possa, com suas habituais presunção e imodéstia, anunciar ao mundo que obteve a unanimidade dos brasileiros em torno de seu nome, superando até Jesus Cristo ou outras celebridades menores que jamais conseguiram livrar-se de alguma oposição...

Sim, faltam apenas 16% mas eu tenho uma péssima notícia a dar a seu hipertrofiado ego: pode tirar o cavalinho da chuva, cumpanhero, porque de 99,9999995% você não passa.

Como você não é muito chegado em Aritmética, explico melhor: o Brasil tem 200.000.000 de habitantes, um dos quais sou eu. Represento, portanto, 1 em 200.000.000, ou seja, 0,0000005% enquanto os demais brasileiros totalizam os restantes 99,9999995%. Esses, talvez, você possa conquistar, em todo ou em parte. Mas meus humildes 0,0000005% você jamais terá porque não há força neste ou em outros mundos, nem todo o dinheiro com que você tem comprado votos e apoios nos aterros sanitários da política brasileira, não há, repito, força capaz de mudar minha convicção de que 
você foi o pior dentre todos os presidentes que tive a infelicidade de ver comandando o Brasil em meus 65 anos de vida. 
E minha convicção fundamenta-se em um fato simples: desde minha adolescência, quando comecei a me dar conta das desgraças brasileiras e a identificar suas causas, convenci-me de que na raiz de tudo está a mentalidade dominante no Brasil, essa mentalidade...
dos que valorizam a esperteza e o sucesso a qualquer custo; 
dos que detestam o trabalho e o estudo; 
dos que buscam o acesso ao patrimônio público para proveito pessoal; 
dos que almejam os cabides de emprego e os cargos fantasmas; 
dos que criam infindáveis dinastias nepotistas nos órgãos públicos; 
dos que desprezam a justiça desde que a injustiça lhes seja vantajosa; 
dos que só reclamam dos privilégios por não estar incluídos entre os privilegiados; 
dos que enriquecem através dos negócios sujos com o Estado; 
dos que vendem seus votos por uma camiseta, um sanduíche ou, como agora, uma bolsa família; 
dos que são incapazes de discernir, comover-se e indignar-se diante de infâmias. 
Pense a maioria o que quiser, diga a maioria o que disser, não mudarei minha convicção de que este País só deixará de ser o que é - uma terra onde as riquezas produzidas pelo suor da parte honesta e trabalhadora é saqueada pelos parasitas do Estado e pelos ladrões privados eternamente impunes - quando a mentalidade da população e de seus representantes for profundamente mudada. 
Mudada pela educação, pela perseverança, pela punição aos maus, pela recompensa aos bons, pelo exemplo dos governantes. 
E você Lula, teve uma oportunidade única de dar início à mudança dessa mentalidade.
Você teve a oportunidade de tornar-se nossa tão esperada âncora moral, esta sim, nunca antes vista nesse País. 
Mas não, você preferiu o caminho mais fácil e batido das práticas populistas e coronelistas de sempre, da compra de tudo e de todos.
Infelizmente para o Brasil você estava certo: para que se esforçar, escorado apenas em princípios de decência, se muito mais rápido e eficiente é comprar o que for necessário, nessa terra onde quase tudo está à venda? 
Eu não o considero inteligente, no nobre sentido da palavra, porque uma pessoa verdadeiramente inteligente, depois de chegar aonde você chegou, partindo de onde você partiu, não chafurdaria nesse lamaçal em que você e sua malta alegremente surfam.Mas reconheço em você uma esperteza excepcional: nunca antes nesse País um presidente explorou tão bem, em proveito próprio e de seu bando, as piores qualidades da massa brasileira e de seus representantes
Esse é seu legado maior: o de haver escancarado a lúgubre realidade de que o Brasil continua o mesmo que Darwin encontrou quando passou por essas plagas em 1832 e anotou em seu diário: "Aqui todos são subornáveis".
Você destruiu as ilusões de quem achava que havíamos evoluído em nossa mentalidade e matou as esperanças dos que ainda acreditavam poder ver um Brasil decente antes de morrer. 
Você não inventou a corrupção brasileira, mas fez dela um maquiavélico instrumento de poder. 
Você é o sonho de consumo da banda podre desse País, o exemplo que os funcionários corruptos do Brasil sempre esperaram para poder dar, sem temores, plena vazão a seus instintos.
Você faz da mentira e da demagogia seu principal veículo de comunicação com a massa.
A propósito, o que é que você sente, todos os dias, ao olhar-se no espelho e lembrar-se do que diz nos palanques?
Você sente orgulho em subestimar a inteligência da maioria e ver que vale a pena? 
Você mentiu quando disse haver recebido como herança maldita a política econômica de seu antecessor.
Você mentiu ao dizer que não sabia do Mensalão
Mentiu quando disse que seu filho enriqueceu através do trabalho
Mentiu sobre os milhões que a Ong 13, de sua filha, recebeu sem prestar contas
Mentiu ao afastar Dirceu, Palocci, Gushiken e outros cumpanheros pegos em flagrante
Mente quando, para cada platéia, fala coisas diferentes, escolhidas sob medida para agradá-las
Mentiu, mente e mentirá em qualquer situação que lhe convenha. 
Você não moveu uma palha, em seis anos de presidência, para modificar as leis odiosas que protegem criminosos de todos os tipos neste País sedento de Justiça e encharcado pelas lágrimas dos familiares de tantas vítimas. 
Jamais sua base no Congresso preocupou-se em fechar ao menos as mais gritantes brechas legais pelas quais os criminosos endinheirados conseguem sempre permanecer impunes, rindo-se de todos nós. 
Ao contrário, o Supremo, onde você tem grande influência, por haver indicado um bom número de Ministros, acaba de julgar que mesmo os condenados em segunda instância podem permanecer em liberdade, até que todas as apelações, recursos e embargos sejam julgados, o que, no Brasil, leva décadas.
Isso significa, em poucas palavras, que os criminosos com dinheiro suficiente para pagar os famosos e caros criminalistas brasileiros podem dormir sossegados, porque jamais irão para a cadeia.
Estivesse o Supremo julgando algo que interessasse a seu grupo ou a suas inclinações ideológicas, certamente você teria se empenhado de corpo e alma.
Aliás, Lula, você nunca teve ideais, apenas ambições.
Você jamais foi inspirado por qualquer anseio de Justiça. Todas as suas ações, ao longo da vida, foram motivadas por rancores, invejas, sede pessoal de poder e irrefreável necessidade de ser adorado e ter seu ego adulado. 
Você tem dividido a nação, jogando regiões contra regiões, classes contra classes e raças contra raças, para tirar proveito das desavenças que fomenta. 
Aliás, se você estivesse realmente interessado, em dar aos pobres, negros e outros excluídos as mesmas oportunidades que têm os filhos dos ricos, teria se empenhado a fundo na melhoria da saúde e do ensino públicos. 
Mas você, no íntimo, despreza o ensino, a educação e a cultura, porque conseguiu tudo o que queria, mesmo sendo inculto e vulgar. Além disso, melhorar a educação toma um tempo enorme e dá muito trabalho, não é mesmo? 
A Imprensa faz-lhe pouca oposição porque você a calou, manipulando as verbas publicitárias, pressionando-a economicamente e perseguindo jornalistas. 

Você pode desdenhar tudo aquilo que aqui foi dito, como desdenha a todos que não o bajulem. 

Afinal, se você não é o maior estadista do planeta, se seu governo não é maravilhoso, como explicar tamanha popularidade? 
É fácil: políticos, sindicatos, imprensa, ONGs, movimentos sociais, funcionários públicos, miseráveis, você comprou com dinheiro, bolsas, cotas, cargos e medidas demagógicas. 
Muita gente que trabalha, mas desconhece o que se passa nas entranhas de seu governo, satisfez-se com o pouco mais de dinheiro que passou a ganhar, em consequência do modesto crescimento econômico que foi plantado anteriormente.
É esse, em síntese, o triste retrato do Brasil de hoje... E, como se diz na França, "l´argent n´est tout que dans les siècles où les hommes ne sont rien". 
Gilberto Geraldo Garbi""

sábado, 17 de maio de 2014

As cerejeiras de meu pai.

As cerejeiras de meu pai.


Quando eu tinha meus quatro anos acompanhava meu pai em seus tempos livres em que cuidava de sua horta, de seu pomar, do outro lado da rua, ribanceira abaixo cheia de castanheiros, rumo ao rio por onde por ali não se chegava. Era isto em Fornelos, minha terra natal. Lembro-me de sua plantação de morangos, das abelhas e de uma em especial que me mordeu na perna. Foi ao Abílio que uma outra deixou com o beiço inferior do tamanho de uma abóbora. Havia ali uma cerejeira cujos frutos eram grandes, carnudos, de cor vermelha escura. Bem escura quase como sangue seco. Uma vez o vi subir nos galhos para colher os primeiros frutos a ficarem bem vermelhos. De cima dela me atirava algumas dividindo entre nós o fruto do trabalho. Lembro-me que temia por sua segurança. Queria subir também, mas só anos depois entendi que realmente ele não me poderia ter deixado subir. Isso eu fiz três anos depois quando ele já tinha emigrado para o Brasil e eu fui de férias á minha terra com a minha prima Fernanda.

Conversas de aldeia, por aqueles tempos, versavam invariavelmente sobre a época de colher os frutos, troca de batatas por outro produto da terra, as despesas, notícias de emigrantes, umas da Austrália, outras do Brasil, da França e Alemanha... A diáspora portuguesa desde que os governantes descobriram que emigrantes não produzem custos ao Estado e enviavam todo o seu dinheiro para a Caixa Geral de Depósitos para que um dia pudessem regressar e construir a sua casinha, viver bem de aposentadorias. Se a intenção é apenas lucros, os governos portugueses podem orgulhar-se de seu passado e presente: São empresas altamente lucrativas para quem governa e contrata obras e serviços, mas não para quem fica na terrinha, se não fizer parte esses que governam ou não tiver uma “cunha”. Falava-se do tempo, das colheitas, das festas promovidas pelo senhor abade às expensas da fé dos bons cristãos, tudo florido pelas senhoras que freqüentavam a sacristia e que de tudo o que tinham para contar algumas coisas não contavam (do que viam) porque ninguém acreditaria. Mas nem todos os abades eram assim, e por essas indiscrições, lá se foi um par de dois ou três abades que deixaram admiração. A religiosidade era tanta por aquelas terras de montanhas, que com quatro anos eu já me preocupava, junto com meus colegas de mesma idade, que pecado eu teria que confessar ao abade para que ele tivesse fé em mim, porque como todos confessavam pecados, se eu não contasse nenhum, ele acharia que eu estava mentindo e me recomendaria mal ao pai. Não ao meu pai, mas ao pai dele. Só muito mais tarde eu li sobre a Síndrome de Estocolmo, e entendi porque razão a aldeia não comentava à boca larga e escancarada as mazelas quando as havia lá para os lados do Adro da Igreja. Pensavam por aqueles tempos que criança não presta atenção no que dizem, mas há crianças que prestam atenção em tudo e ficam caladas para não perceberem que entenderam.


Aquela cerejeira era muito linda, mas apenas dava frutos uma vez por ano. Meu pai a amava. Não me lembro de ter comido cerejas, dela, com dois ou três anos, mas apenas aos quatro. De todas as vezes que voltei a minha terra não foi em época de florada nem de frutificação. Mas a vi, cada vez maior, mais frondosa. Mas isto foi em 1949. Quando me encontrei com meu pai em Fornelos em 1983, ele me mostrou uma nova cerejeira que plantara, nada mais que uma haste de pouco mais e um metro e meio de altura, mas já com flores. Tiramos uma foto que está guardada num baú, o olhar embevecido de meu pai como se fosse um olhar para um filho amado. Não sei se ela ainda existe, mas provavelmente sim. O pessoal de minha terra é conservador, evita desperdícios e, sobretudo, adora cerejas. Eu também. Meu pai já faleceu. Um dia recebi de meu tio Miguel, seu irmão, uma foto de meu pai sobre uma cerejeira. Não me admiraria se fosse essa que ele plantou em 1983. Nunca perguntei. Prefiro pensar que sim, mas amo tanto este planeta, que gostaria de passear com alguém pelos campos para que me contasse a história de cada árvore, quando foi plantada, quem a plantou, a história do lugar, suas floradas, sua generosidade nos frutos. È que eu também gosto de árvores que dêem frutos, de cuidar do que se tem, sejam filhos ou árvores. Tenho algumas... Ou será que elas me têm a mim?





® Rui Rodrigues