Depois de mais um infrutífero dia arrastado entre espinhos e lixas irrespiráveis de um trânsito engarrafado em S. Paulo, Rio ou Belo Horizonte, a gente flutua entre a incredibilidade, a raiva, o desespero e a inércia do espanto de se esperar a chegada de qualquer esperança num trem desses quaisquer que chegam em estações de contos, novelas, filmes, livros, carregados de caminhos para soluções. E esperamos. Vamos esperando até chegar o desespero aflitivo da desilusão.
A desilusão vai chegando dos dias após dias frustrados por nada chegar, nem uma cesta, um fardo, um caminhão, um trem, e do entardecer se passa à noite, que sem luz é um breu onde pululam receios medos e horrores embrulhados em pesados e espessos silêncios até que de repente se escuta um "tlac" e luzes se acendem.
Não importa onde estamos. Importa em que plateia nos vemos, e vemos muitas plateias para um só palco, assim que temos a certeza que a mesma coisa deve ser vista e entendida por todas as plateias. Exatamente a mesma coisa, mas entre cochichos se escutam divergentes histórias, que não aquela que se conta no palco. E na saída, comentários ainda mais díspares. E chegamos à conclusão que partes da platéia eram cegas umas, outras surdas, em maior ou menor grau como se houvesse uma lente e um filtro mágico oculto que nenhuma entropia entre o ambiente e os atores no palco podia vencer. As lentes e os filtros de cada um distorciam tudo em maior ou menor grau. Ora entoldavam, ora mostravam toda a realidade que nem os atores queriam mostrar. A verdade é que ninguém, absolutamente ninguém viu ou ouviu a mesma coisa. E tudo ficou parecendo como um grupo de saltimbancos, mambembes, falando aos gritos roucos ou tilintantes de escalas musicais inalcançáveis de quebrar cristais, gentes esfarrapadas, esgares tresloucados de esgazeados perdidos na vida, fumarolas de drogas, névoas esfumaçadas de verde, gente bronca idiotizada pela tentativa de se passar por erudita, raivas impotentes contidas em panelas de pressão, anjos alheios a tudo esvoaçando com harpas em nuvens brancas que pairaram em silêncio. As harpas estavam lá, e até poderiam ser farpas, mas nem um só som se escutava. Ainda é um som de coisa podre em que se bate e tudo se abafa como bosta que cai direto na fossa. Mas quem vê e escuta, vê e escuta o que escuta e vê. Os opérculos visuais e auditivos se fecham, coisa empossada de cabeça feita com má-formação degenerativa é o que se vê e escuta no palco. É o rei que está nu, os artistas que estão nus, é a verdade nua e crua sem sal nem fogo de fogão.
- Vossa excrescência solta bandidos de colarinho branco condenados porque se apraz com os presentes que recebe em troca.
- E vossa excrescência solta bandidos armados de bandoleira por ideologias esfarrapadas.
- E vossa excrescência não tem mais poder nem dinheiro do que eu
- E vossa excrescência é grosseira e não tem a mesma classe que eu.
- Vou me queixar ao FHC
- Vou me queixar a Dilma que é amante de Lula, que é companheiro de FHC
- Está ficando impossível alguém se governar neste país sem vir mosca pousar no prato.
- Está ficando impossível comer a sopa do prato onde a mosca vem pousar.
- Pois é.
- Pois é.
- Aqui cada um tem o direito de libertar o seu bandido e evitar a prisão de seu protegido benfeitor.
- Exatamente.
- Exatamente, meninos. Acalmem-se e vamos trabalhar... Temos muitos salafrários para libertar que pobres, desiludidos, não podem pagar, não têm o que doar, nada que possa interessar. Aplique-se a lei a cada um segundo a sua conta a ajustar. Mas fica provado que todos têm medo do criador de casos de gordas beiçolas como as de imenso e mafioso mero, mandíbulas de cão raivoso, guardião dos ovos do dragão do reino.
Rui Rodrigues
(Das fábulas fabulosas dos idiotizados do Reino das Bufunfas Aglutinadoras)