Os típicos tipos do
FB
Antigamente, há muitos anos atrás, rapazes e meninas saíam à
tardinha para fazer o “footing”, isto é, a caminhada pelas calçadas na parte
mais movimentada da cidade, para se mostrarem e poderem ser notados ou notadas.
Vestiam-se as melhores roupas, mesmo emprestadas, os melhores perfumes, cabelos
alinhados, sorrisos discretos ou abertos. Uma mostra na vitrine da cidade, uma
tentativa de arranjar novos relacionamentos, quem sabe um casamento. Normalmente
não era essa a imagem de cada um, ou de cada uma, no dia a dia, mas era preciso
mostrar a melhor imagem possível – ou a mais descarada – para impressionar quem
passava. Naqueles tempos algumas mulheres usavam até sutiãs com enchimento para
dar mais um “volume”, e algumas ainda usavam espartilhos e cintas para
adelgaçar a silhueta. A falta de respiração era muitas vezes entendida como um
desejo quase irreprimível de elas se lhes lançarem nos braços. Muitos namoros e
casamentos acabaram justamente porque no vestibular do relacionamento, muitos e
muitas não passaram. Alguns usavam enchumaço na bragueta.
Os tempos mudaram e veio a “balada”. O mundo escancarou. A
filosofia de vida é mais franca. Muito mais. Na balada a imagem é “estou aqui,
estou a fim, sou assim mesmo. Vai nessa?”. E veio o FB.
FB não é a sigla do FBI à qual tenha caído a letra final.
Mas tem muito de FBI, se atentarmos para alguns detalhes, a começar por nos
querermos meter na vida dos outros e das outras, tentando descobrir os seus
íntimos, as suas preferências, as suas tendências, se mente ou não, se está a
fim ou não, se é crente, mais ou menos, complacente ou curte uma
devassidão. Como representatividade de
uma sociedade humana, é pasto fértil para psicólogos de carteirinha, de
plantão, ou dos que se acham. Os verdadeiros, calam, apreciam, vão na certa, ou
constroem teses.
É também um baile de coreto, um baile de gala, uma balada,
um centro de AAA – Auto Ajuda Anônima. Uns reclamam, outros gritam, alguns
gemem, suspiram, riem, meditam, amam, execram, pescam, namoram, beijam,
abraçam, ou exercitam os dedos apertando um só botãozinho: o de curtir. Ainda
tem os que não dizem nada, só olham, e os que garimpam o que se espalha pelas
postagens.
Tudo isso é muito normal. Somos nós como somos. E existem
outros tipos que, também, absolutamente normais, têm características mais
diferenciadas, como, por exemplo, os que gostam de cutucar. Nunca sabemos o que
significa a cutucada, mas também ninguém pergunta. Cutuca-se para cá, cutuca-se
para lá, e fica-se nisso anos a fio, sentindo uma vontade danada de dar uns
“amassos” a quem nos cutuca, mas mantendo a linha para não perder a amizade.
Mas há outros tipos ainda.
Os crentes extremistas que não querem saber de conversas e
afirmam com toda a convicção que é assim mesmo - e pronto - só lêem o que lhes
interessa e quem diz o contrário do que pensam é descrente ou burguês, ou
reacionário, ou comuna. O seu mundo é o mundo que deve ser e assim tem que ser
mesmo que o mundo prove que não é nada disso que lhe interessa, que o que quer é
liberdade, tudo pago, tudo fácil, tudo parado, sem se mexer, orando todos os
dias, pagando impostos altos mais os dízimos, aceitando a corrupção como coisa normal,
corriqueira e aceita, muitas baladas, muitas promoções, notícias leves na TV,
nos jornais, nada de complicações, o seu céu na terra, a sua ideologia em
bandeiras pelos ares. Nada de sair para as ruas para reclamar. Como está, está
bom de mais, e se ficar melhor estraga.
Há os que não têm mais nada para fazer. Continuam não
fazendo nada no FB. Clica aqui, clica ali, dá um curtir, come mais um biscoito,
arrota e toma um refrigerante para arrotar mais, fechando a tubulação
arrotativa com mais um biscoito. Há não... Estes não molham o biscoito nem elas
dão o café com leite para que o biscoito se molhe todo.
Outros e outras nem colocam fotos para não chamarem a
atenção. Nunca se sabe quem está por detrás de uma imagem sem foto
personalizada, nem se a foto é do – ou da -responsável pelo perfil. São os
fantasmas do FB que tanto podem ser camaradas como companheiros como diabos que
vestem Prada, como Jack o Extirpador, ou mesmo algum presidente disfarçado. O
Jô Soares jura que não tem nenhum perfil no FB, mas todos duvidamos disso.
Os arautos são sensacionais, como todos descritos até agora.
Cedo, ainda de madrugada, levantam-se “pé-antepé” para não acordar a casa, nem
o papagaio nem o cachorro, e vão garimpar as notícias do dia. São os primeiros
a avisar das últimas e recebem os dois ou três cliques habituais de que viram,
mas não leram. Aliás, o maior número de usuários é exatamente o dos que nem
clicam, seguidos dos que clicam e não lêem. Não lêem nada. Só os títulos e as
duas primeiras linhas. Os comentários ficam para eles mesmos, sem som ou imagem
que nos chegue.
A maioria nunca foi a coreto e está largando as baladas para
féicebuquear. Como propaganda é a alma do negócio, todos nos afirmamos pelas
qualidades que pensamos ter, todos ocultamos os defeitos que sabemos ter,
deixamos nossas pegadas nesta estrada virtual do FB que se move ao longo do
tempo, na esperança dos paleontólogos do futuro venham a escavar e nos dêem,
finalmente, o crédito póstumo que merecemos.
Então vamos todos féicebuquear antes que venha um novo site
de relacionamento diferente, cheio de novidades novas. Nada de velhas novidades
que abalaram os coretos da balada.
Rui Rodrigues.
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