(Antes
de iniciar esta crônica,
ou o que quer
que seja que
vocês,
queridos leitores, entendam que estas linhas sejam – pode ser uma
historieta do tipo da Nau Catarineta, ou um besteirol qualquer –
deixem-me avisar-lhes que por aqui (no Bar do Chopp Grátis)
passam umas
pessoas
“diferentes” que nos contam umas fábulas
“do arco da velha”. O
que importa é
o “paladar”… Se gostarem, voltem sempre!)
Não
havia engano. Aquele barulho constante não
era apenas do vento. A chuva tinha chegado também.
Haveria água suficiente
para mais uma semana a julgar pela intensidade dos pingos caindo
sobre o convés. Quem
alertou o comandante foi o “Urso”, um cachorro malvado, preto,
sorridente, bonachão,
bem-mandado, mas que quando resolve brincar pula no peito de qualquer
um, incluindo o do comandante. Por isso e somente por isso Urso era
um cachorro malvado. Mas compensava de muitos modos. Por exemplo, ele
sempre avisava quando chovia. Corria de um lado para o outro do
convés chapinhando na
água, e nessas
ocasiões os marujos já
sabiam o que fazer, e colocavam barricas vazias sob as enormes velas
para recolherem a água
da chuva. Urso tinha apenas um ano de idade, mas era inteligente e
competente. Descendia de uma “labrador” e de pai desconhecido.
Sua vida Urso a leva entre vários
aspectos:
1-
Delirante, despreocupado e alegre como cachorro da “muy nobre Vila
do Peró”, muito
a norte do Reino de Nichteroy. Uma vila onde todos são seus amigos,
como responsável pela alegria e bem estar de seu mais
recente amigo Rui, o
comandante de alguma coisa importante que ele urso não tem idéia do
que seja, mas que parece que tem que obedecer, senão ele o
comandante, vocifera coisas como “- Seu cachorro malvado...Não
pula no meu peito senão vou te quebrar ossinho por ossinho com uma
marreta!!!” E seu
amigo diz isso com uma bengala preta que ele mesmo fez, com a cabeça
de um cavalo com olhos brancos enormes, crina e
dentes dentuços e
tudo, no empunhamento. Se o comandante tinha feito isso com um
cavalo, reduzindo-lhe a cabeça ao tamanho de um ovo de codorna, Urso
imaginava o que poderia
o comandante
fazer com uma cabeça do tamanho da dele, um simples cachorro...
2-
Preocupado,
delirante e alegre, quando o comandante, (nem sabia de que seria ele
comandante) a quem chamavam de Rui, ia ao posto médico,
ao supermercado, à
peixaria. Montava guarda, sentado ou em pé,
gania inconformado com a ausência
do amigo, e impaciente “proferia” frases ininteligíveis.
Depois deitava-se com a cabeça
sobre uma das patas, o olhar daquele jeito, de gente meio intrigada,
pidona e observadora, resultando numa tristeza de derreter coração
de capitão do mato.
3-
Livre, leve e solto, quando participa de aventuras com seu amigo Rui,
numa nau imaginária
cheia de aventuras, onde ele pode fazer qualquer coisa. Os dois
podem. As aventuras permitem tudo. Sonhar é
o limite.
Afora
estas três atitudes,
Urso se sente tão
deprimido que senta de preferência
em frente à janela ou
porta do amigo e fica ali parado, deitado, esperando um ruído
revelador que lhe indique que “vão
sair”. Seu amigo vai sair e Urso vai junto. Ou isso ou uns restos
gostosos de comida. Mas estava chovendo na nau, (lembram-se?) e
chovia também agora na
rua quando saíram para
o posto médico e isso
não era coincidência.
Eram seis e meia da manhã.
Para que se precisa de um cachorro destes numa nau capitânia
como essa do Peró?
Porque quando os piratas invadem naus assim pela calada da noite, os
cachorros latem, ladram e depois os mordem. E quando os piratas se
aventuram durante o dia, o melhor são
três cachorros. Dois
ficam quase de frente para o pirata, um mais para a direita e outro
mais para a esquerda, obrigando-o a se preocupar com os seus flancos.
O terceiro cachorro ora fica na frente ora atrás
do pirata. Numa dessas, morde o bandido por detrás,
nas pernas. Urso, pelo contrário,
quando sai gosta de mostrar a força
que tem. Na voz! Onde sente que tem cachorro, ladra forte como um
trovão, não
se importando se recebe em troca algumas “ladragens” com voz
ainda mais tonitroante. Ele sabe que os outros cachorros estão
presos, mas quer impressionar seu novo amigo homem. Os da rua são
sempre mais tranquilos, e quando vê
outros tão ou mais
fortes que ele, dá-lhes
uma cheirada e passa adiante. O Urso não
é trouxa!
Encontramos
um sujeito a meia nau, que tinha apanhado Chikungunya… Disse que
durante mais de 30 dias o corpo lhe doeu de nem poder andar ou sair
da cama. Ele gosta de frequentar os bailes de salão
e deve ter uns 70 anos. O pai dele tem mais de 90. urso ficou muito
impressionado quando o amigo dele disse “ Que bom que com essa
idade você ainda tem
pai”, e o bailarino respondeu… - “Que bom?! Quê
que é isso… Ele
nunca foi um pai que me tivesse dado algo assim de importante, ou
feito algo por mim… Só
que agora tenho que cuidar dele. Com mais de 90 anos, já
estava na hora de Deus o chamar...”. urso e o amigo ficaram sem
saber se o bailarino tinha filhos e se fez alguma coisa por eles ou
lhes deu algo de importante. Melhor que tenha dado e feito.
Depois
de longa espera até às
08:30 da manhã, o
amigo de Urso não
conseguiu marcar médico
no SUS, embora a pressão
já se tivesse
normalizado e a urgência
não parecesse tão
urgente. A nau do Peró
sente muito a queda da economia. Todo mundo sente, e o pessoal do
posto é muito
simpático. Não
pode acontecer o que
aconteceu no Jardim Esperança:
O pessoal invadiu e quebrou o posto.
®
Rui Rodrigues
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