Já sei onde está o céu.
Sabe aquelas noites
estreladas, longe das luzes fortes das cidades? Olhando-se para cima, vê-se o
céu. A nós, parece-nos acabar logo ali, as estrelas coladas como se fosse na
parte interna de imenso balão de gás feito de látex negro. Mas não... Esse céu
é imenso, imenso, imenso, praticamente infinito de tão grande. Tão infinito que
se conseguirmos imaginar que tenha bordas, fim, chegaríamos à conclusão de que
seria plano onde quer que estivéssemos pisando em sua fronteira. Sabemos que
não tem nem bordas nem fronteiras. É infinito!
Um dia me preocupei em saber
o que pensaria uma formiga do Empire State Building, uma construção antiga na
cidade de N. Iorque, imaginando-a no limiar do primeiro degrau do prédio. Nada.
Ela não estaria preocupada com o prédio porque não tem noção de sua dimensão.
Sua visão é muito curta, não têm olhar telescópico, assim como nós também não
temos. Têm que chegar muito perto do topo do prédio para saber onde estão, mas
o máximo que saberão é que estão “ali”, sem saber nem ver a rua lá embaixo.
Nossa visão é um pouco mais melhorada, conseguindo ver a rua e outras mais, e
quase toda a cidade, mas como a Terra é redonda, a sua curvatura nos vai
escondendo o resto da paisagem, e não podemos enxergar mais do que umas dezenas
de quilômetros. Olhando para cima, vemos um céu. É o céu que temos.
Descobriram o uso de motores
para foguetes e os telescópios, bem como sistemas de transmissão de imagens e
dados. Juntaram os três e hoje temos imagens de boa parte de nosso universo, o
nosso céu, cheio de planetas, estrelas, cometas, pedregulhos imensos, pedras,
pedrinhas, poeira e gases. Estrelas já explodiram dando origem a novas estrelas
e planetas. O ouro e o urânio que usamos são produtos de estrelas que já
explodiram. Nossos telescópios não enxergaram vivalma fora de nosso planeta.
Alguns objetos chamados de “não identificados” têm sido confundidos como
produtos manufaturados, industrializados, provenientes de outras civilizações,
mas tendo o Universo que conhecemos a mesma idade em cada ponto, as demais
“civilizações” teriam aproximadamente o mesmo tempo de existência do que a
nossa, e estando os sistemas solares que podem abrigar vida a anos luz de
distância, nem nós tivemos tempo de poder chegar ate eles nem eles a nós.Mesmo
que tivessem evoluído “mais rapidamente” e melhor do que nós. A escala do
tempo, as velocidades e as distâncias conspiram contra um encontro imediato ou
por “estes dias”. Vivemos sob o mesmo “céu” sob as mesmas condições de
evolução. O próprio Universo, o único céu que conhecemos, evolui.
Assim como as formigas do
Empire State Building não conseguem enxergar do primeiro degrau o topo do
prédio nem sabem que lá existe um miradouro e uma torre cônica, nós também não
conseguimos enxergar as sete dimensões extras que este Universo parece possuir.
Nossos olhos são “funcionais”. Só percebem e enxergam o que precisam de forma
imediata. Além disso, essas sete dimensões ficaram enroladas desde o inicio da
formação do nosso universo. Não se expandiram como ele, que continua se
expandindo a uma velocidade aparentemente constante. Nosso Universo “infla”
constantemente. Cresce, aumenta de volume, de massa, mas a densidade continua
constante, próxima de 1 (Um). As outras dimensões são microscópicas,
insuficientes para conter outro céu, outros céus. Se houver mais algum “céu”,
ainda que seja um paraíso, será fora do nosso Universo, mas o mais provável é
que encontremos outros Universos se conseguirmos sair deste algum dia. E nos
colocaríamos num dilema: Onde estaria o céu extra de cada Universo (já temos
um, o que vemos) ou o outro céu comum a todos os universos? Parece que não poderemos contar com mais
nenhum céu além do que temos e vemos. A natureza não desperdiça nada. Um céu
apenas parece ser o bastante e já nos distrai suficientemente para que o
exploremos. Há trabalho para bilhões de anos. Para uma eternidade. Trabalho a
realizar-se geração a geração.
Há cerca de 5.000 anos
atrás, uma migalha de tempo desde que o Universo se iniciou (cerca de 10,4
bilhões de anos) os egípcios descobriram uma possibilidade de existência de um
segundo “céu”, sem saber onde se localizaria. Era um céu que corrigia todos os
erros vivenciados neste planeta. Para se chegar lá era necessário passar por um
tribunal comandado por um de seus deuses, Osíris, e ter uma alma (Ka) ou um
coração tão puro e leve, que se colocado numa balança para competir com o peso
de uma pena, não poderia pesar mais do que ela. A alma era submetida também a
um interrogatório, e toda a população do Egito sabia de cor as perguntas, não
fossem esquecer-se e perder a oportunidade de passar para o outro céu, o céu
extra. Embalsamaram também os corpos para que pudessem chegar lá inteiros. Não
conseguiam imaginar um céu polvilhado de esqueletos sem roupa, sem arcos e flechas,
pratos, cavalos, cães e gatos. Colocavam tudo nos túmulos. Ladrões de túmulos
nunca acreditaram nessa teoria teológica e devastaram muitos túmulos,
estragaram muitas múmias.
Mais ou menos pela mesma época, no Extremo Oriente
surgiu uma religião – o Tao – que prometia 25.000 céus a seus fiéis. Nunca
foram mostrados. Apenas se falava deles. Os fiéis precisavam ser bem
comportados para ganhá-los assim como prometemos doces a crianças para se
comportarem bem. Entenda-se que “comportar-se” bem significava dentre outras
coisas, contribuir para a vida dos sacerdotes, a manutenção dos templos. A
função dos templos nunca foi a distribuir riquezas por seus fiéis, mas
exigir-lhes contribuição. Três mil anos depois apareceu Jesus na Galiléia.
Mágico, curandeiro, milagreiro, nunca chamou seus discípulos e lhes deu uma
visão do céu. Falou dele, mas não o mostrou. Como Deus poderia tê-lo feito. Maomé
prometeu um céu especial para os guerreiros que lutassem pela causa do islã: Um
céu com sete virgens. Não lhe passou pela cabeça que mulheres pudessem ser
guerreiras também, e que ao morrer pela causa teriam um céu especial com sete
mancebos virgens, ou com extrema experiência. Deveriam elas morrer virgens?
Ainda hoje se fala muito em
céus, e se há lugar onde possa haver outro além deste que olhamos nas noites
estreladas, longe das luzes fortes das cidades, é em nosso cérebro, em nossa
farta e pródiga imaginação que uns exploram e outros deixam explorar. Nossos
esqueletos são o que deixamos de material neste planeta. O intangível, o
imaterial que deixamos foi passado na forma de ensinamento a cada nova geração.
Ficou na tradição oral, nos livros, nas gravuras, nas artes e construções, e
agora fica nos computadores. Um dia ficará num lindo cristal de quartzo branco
ou verde como no filme de Superman, mas ainda precisamos descobrir a sua
tecnologia. A humanidade é um enorme animal de fluxo contínuo – por enquanto –
que em camadas de gerações após gerações busca povoar o único céu que
conhecemos. Não há outro real, mas em nossa imaginação talvez seja conveniente
acreditar que somos tão bons que mereceríamos um “céu”, quem sabe um planeta
especial onde não existissem os horrores que vemos neste. Será este uma
provação, uma escola para o “outro” céu? Não pode ser. Muitos de nós provocamos
esses horrores e morremos tranqüilamente em palácios, mansões, cercados de todo
o conforto até na morte. Vamos para onde todos nós vamos: para a terra da
Terra, limpar dos ossos as carnes, alimentar seres minúsculos para que a vida
continue e o planeta não se desestabilize.
Precisamos construir nosso
segundo céu, o paraíso, aqui mesmo, neste planeta e em outros que iremos
povoar. Como está, estamos muito mal. Só temos um céu distante, frio a apenas
2,4 graus Kelvin, muito próximo do zero absoluto, sem ar. Precisamos de muita
fé e quase zero graus de hipocrisia para o construirmos.Temos que construir um
paraíso AQUI MESMO!
® Rui Rodrigues.