Ironia do desatino... Pra coçar é só
começar!
Os apologistas de que somos
reféns de uma entidade que nos escreve um livro de nossos atos que somos
obrigados a seguir, constituindo o nosso destino, só têm uma resposta para
nossos problemas e fracassos, soluções e vitórias: Foi o destino! Uma ironia do
destino...
Quando se vai bem na vida e
de repente a casa cai, esses continuam dizendo que foi o destino, que não
cometemos desatinos. A culpa toda foi do tal sujeito sem gênero que teria
escrito o destino. Para o resto, a culpa foi mesmo de quem deixou a casa cair,
tombar, transformar-se em ruínas. Podemos enumerar alguns casos em que se
cometem desatinos que, geralmente, começam apenas como um coçar... E dizemos: Pra
comer e coçar é só começar, ou pra trair e coçar é só começar... Normalmente
ações ligadas a pessoas, mas, que de fato também acontecem em grupos,
instituições. Portanto, talvez seja prudente pensar antes de começar a coçar,
ou a comer, ou a trair.
Caso 1
Lurdinha desconfiava do
marido. Depois do trabalho sempre ficava por lá um par de horas e chegava em
casa cheirando a cerveja. Cheirava-lhe as roupas, procurava marcas de batom,
mas nada!. Custava-lhe acreditar que o marido saísse para tomar cerveja e não se
misturasse com as moças do escritório ou do bar. E não encontrar indícios de
traição não significava nada. Ele podia tranqüilamente dar umas escapadas em
horário de trabalho e não havia como vigiar. Não iria pôr detetive particular
atrás dele. Um dia deu-se uma coçada. Saiu para tomar chá com umas amigas.
Chegou tarde em casa. O marido entendeu. Afinal, ele também tomava as suas
cervejas. Lurdinha continuou se coçando e saindo com as amigas, escutando
histórias de maridos traidores e de amigas que já se coçavam há muito com os
amantes. E que coçadas! Quando Alfredo mais novo do que ela apareceu com sua
juventude num desses chás, ficou deslumbrada. Só uma saidinha ninguém saberia,
um pequeno tropeço na vida quem não tem? E o marido dela? Também não sairia com
outras mulheres? E se encontrou com Alfredinho – já o chamava de Alfredinho –
não uma vez, mas sempre que podia. O marido começou a achar estranho o
comportamento da mulher. Estava mais solta, mais condescendente, mais feliz,
mas da parte dele nada mudara. Indagou-se se a mulher não estaria molhando
biscoito alheio no seu chá... E foi num momento de reflexão, erguendo um copo
de cerveja que reparou na Ritinha, a alegre lourinha da recepção que estava
justamente a seu lado na roda de amigos, sorvendo o seu chope, e também
meditabunda: Seu namorado a deixara, confessou-lhe ela. Mas ele nunca soubera
que ela tinha namorado. Tinha mesmo? Mas isso não importava. Deu-se uma coçada
na perna, depois na testa, e quando reparou estava sozinho com ela no bar,
conversando. Os outros já tinham saído.
Na saída do Motel perguntou-se o que diria quando chegasse em casa. Não
disse nada. A mulher dele não tinha chegado ainda do chá. Hoje estão separados
e não sabe o que é feito nem de Lurdinha nem da Ritinha. A mulher já não tem
tempo para tomar chá com as amigas. Trabalha duro como ele não sabe onde. Um
dia passará por lá para bater um papo. E, definitivamente, nenhum dos dois sabe
quem começou primeiro a se coçar, quem foi o primeiro a cometer o desatino...
Caso 2
O sujeito, que podemos
chamar de Luiz Inácio, era um líder sindical. Negociava com patrões e
empregados. No começo foi difícil, porque não havia acordos. As greves se
sucediam. O governo estava irritado, os empregados também, os patrões nem se
fala. Seu prestígio, o do Luiz Inácio, subiu. Os empregados o adoravam. Um dia,
os patrões chamaram o Luiz. Propuseram que ele maneirasse. Luiz deu então a sua
primeira coçada. Em troca de algumas maneiradas, receberia uma ajuda política
rumo à fundação de um partido. Nada de benefícios pessoais. Era pelo partido. A
partir daí, Luiz se coçou muito, porque as greves começaram a diminuir e, de
repente, pararam ao fim de uns cinco anos. Os empresários não acreditaram nele
de princípio. O que faria um partido dos trabalhadores com um dirigente que
nunca tinha sido político tarimbado, conhecedor da administração pública, ainda
mais feio como um sapo barbudo? E Luiz fundou o seu partido. Sua popularidade
cresceu de forma incrível. Com a mesma lábia com que negociara as
reivindicações laborais e defendera os empresários - ele é um grande negociante
– ganhou fama e seu partido tomou proporções nacionais. Perdeu as primeiras
eleições para um bom sujeito, político de carreira, e depois para um
aventureiro estressado que o colocou em saia justa num confronto desses que se
costumam proporcionar para os candidatos se destruírem uns aos outros. Fazendo
figura de pobre, disse no ultimo confronto que seu radinho de pilha não
funcionava porque faltava dinheiro para comprar as pilhas, sinal de baixos
salários, e o aventureiro oponente, filho de boas famílias disse que sorte
tinha o Luiz que tinha um radio, que ele nem radio tinha. E levou ao debate a
filha e a ex-mulher para falarem mal do Luiz. Luiz perdeu as eleições, mas se
elegeu em seguida. Finalmente já se podia coçar à vontade. Os empresários viam
nele o sujeito que não entendia nada de nada, e que faria tudo o que queriam
dele como pagamento pelos favores que lhe haviam feito: Elevá-lo ao mais alto
escalão do governo. Alias, coisa fácil para eles. Já tinham feito isso com
todos os presidentes inclusivamente com aquele que não tinha radinho de pilhas,
que nem cumpriu o mandato porque roubava muito e sofreu “impeachment”. Eleito o
Luiz Inácio, largou o governo com uma turma de antigos terroristas que
entendiam muito de roubar dinheiro. Tinha sido o dinheiro dos empresários que o
haviam elegido e não poderiam roubar dos empresários, até porque o tesoureiro
daquele tal do radinho foi assassinado por causa do caixa gordo 2 que não
parava de crescer já de olho nas “próximas eleições” que acabaram por não
acontecer. Viajou muito com seus amigos empresários. Seu filho ganhou rios de
dinheiro e comprou a mansão de um juiz que Luiz, em retribuição, nomeou juiz do
supremo tribunal. Coçava-se, e viajava para vender os produtos dos empresários.
Coçava-se muito e ficou rico. Seus amigos terroristas usavam dinheiro público
para a próxima eleição e foi reeleito. Com altos índices de aceitação popular –
o povo não sabia o que os terroristas roubavam nem como – chegou-se a
indivíduos como um que nega o holocausto, outro que baixou o padrão no país de
tal ordem que já não há pobres. Nem ricos!... Com os maiores índices de
corrupção e violência do continente. O dinheiro entrava tão fácil com altos
impostos que perdoou até dívidas externas de outros países. Como ele ficara
rico, no meio de tanto dinheiro, esqueceu o povo que continuou na mesma
penúria, não fez reforma alguma. Os senadores, deputados, vereadores,
governadores, ao verem como Luiz Inácio se coçava tão bem, começaram a se coçar
também... Foi contagiante a “coçadeira” e deram-se aumentos próprios. Ao largar
o governo, indicou para presidente uma moça simpática – ela é simpática – que
pertencera àquele grupo de terroristas que ajudaram o Luiz a “governar”. Claro
que a coçação foi parar nos tribunais e quase todos foram condenados. Ela
continua no governo mas ninguém sabe se ela já começou a se coçar... Mas há
quem desconfie, só pelo andar da carruagem onde todos desfilavam sorrisos,
frases de efeito, segurança nas palavras mais do que no trabalho...
Para começar desatinos e por
ironia do desatino... Basta começar...
Rui Rodrigues
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