O dilema do eleitor na hora de votar.
Vivemos numa sociedade, em qualquer lugar do mundo, ainda no limiar da adolescência democrática. Até há cerca de 300 anos atrás quase todos os governos do mundo eram reinados e quem mandava era o rei que nomeava seus ministros, e não havia eleições. Se os governos não eram monárquicos, eram ditatoriais ou teocráticos. Não estamos habituados à democracia, ao poder do voto, e somos reféns de partidos políticos que nos empurram os candidatos que querem. Pior ainda, não se elege quem merece, mas quem faz a propaganda mais efetiva, quem se cerca da melhor equipe de marketing. Desconhecedor da vida do candidato, exceto por meia dúzia de atos públicos, vota-se no escuro, “rezando” ou torcendo para que o candidato, se eleito, cumpra com o que prometeu. Vemos horrorizados que ano após ano, não cumprem. Continuamos a reclamar as mesmas coisas. O sistema instituído preserva-se e a menos do voto, nunca mais nos perguntam nada durante todo o período de cada governo. Nosso voto dado não pode ser retirado, e esse é o maior problema: Nenhum eleito precisa fazer nada de útil, que seu emprego estará garantido. Somente se errar muito e de forma muito grave sofrerá um impeachment, que, por curiosidade, não parte do povo, mas da congregação de partidos políticos em que se transformaram as Câmaras de deputados e de senadores.
Colocando-nos na posição de eleitores em alguns países, podemos sentir o dilema de votar quando nos pedem – ou exigem – que votemos. Como veremos a seguir sob o ponto de vista do eleitor falando consigo mesmo na hora do voto.
Cuba
Não sei que democracia é esta que não posso escolher o presidente, nem o vice-presidente. Só nos permitem votar em deputados e delegados. Nossa vida é muito difícil, vivemos vigiados pelos delegados de bairro e pela polícia cubana. O “paredón” pode voltar a qualquer momento, podemos ser presos, perder o emprego, nossos familiares podem ser perseguidos. È assim desde a revolução em 1959. Um dia, quando o Fidel morrer, e o irmão dele, o Raúl, sair do governo, as coisas mudarão. Hoje é impossível fazer uma revolução. O estado é policial. Vou votar como me aconselharam a votar: Naqueles que demonstram ter mais acesso ao poder, porque assim terei mais chances de receber alguma vantagem ou não perder as que tenho. Se notarem algo contra o sistema na contagem de votos do meu bairro, sofremos intervenção para saberem quem está destoando do regime. Gostaria de emigrar, tentar a vida fora da ilha, mas não tenho dinheiro para a passagem. Até os alimentos são racionados e os salários são muito baixos. Não distribuem cupons de passagens aéreas. Se me pagassem a passagem poderia sair, mas não deixariam. Dizem que sou trabalhador “especializado”. Todos aqui querem ser “amigos” do partido para ganhar vantagens ou não perder as que têm. Se houvesse liberdade, há muito que o regime teria acabado.
Brasil
Realmente estou em dúvida em quem votar. Esse negócio de partido político não funciona mais. Todos os candidatos – indicados pelos partidos – prometem tudo quando estão em campanha. Depois que assumem dão desculpas ou não se fala mais nisso. Quando tomamos consciência, passaram-se mais quatro anos. Já mudei de partido uma porção de vezes em toda a minha vida. Alguns até já acabaram, ou existem apenas para gastar dinheiro público – e não é pouco. Podiam limitar o numero de partidos a uns quatro – já que são todos iguais e já não há ideologias. Obrigam-nos a votar, o que é um absurdo e nada democrático. O comunismo acabou, praticamente, porque só há hoje dois países no mundo que ainda são comunistas. Para quê PcdoB. PCB e afins, se nunca vão ganhar eleições, e se mesmo eleito algum político desses partidos, não poderão governar de forma comunista? Não temos a mínima tendência para sermos comunistas. Ninguém quer dividir o que é seu de mão beijada. Nem as igrejas que recebem dízimos e esmolas dividem o que é delas. Andamos todos atrás de dinheiro, e cada um quer ter a sua casa própria, seu carro. Tudo o que os partidos fazem é fazer eleger candidatos que façam o que o partido quer para ganhar dinheiro. O dinheiro para as eleições vem das empresas. São as empresas que mandam nos partidos e estes nos políticos. E políticos e partidos não são essencialmente diferentes uns dos outros. Já vimos Collor de Melo que fazia discursos como se estivesse drogado, transtornado, roubar dinheiro de cada brasileiro expropriando-o das contas bancárias em ato insano; já vimos deputados, senadores e vereadores aumentarem os próprios salários sem contestação, porque a constituição o permite; já vimos baixarem atos constitucionais e medidas provisórias que alteram a constituição; políticos e partidos comprando votos no congresso e câmaras através de pagamentos com dinheiros públicos que deixaram de fluir para o benefício público. A impressão que tenho é que fazem o povo de escravo sem voz política e que no governo fazem o que querem. Políticos saem do governo muito mais ricos do que entraram, muito para lá dos próprios salários. Sinceramente, voto porque sou obrigado, porque político confiável, não encontro nenhum. Nenhum nos representa de fato. Mas entre mortos e feridos todos escapam. Depois do jogo vou tomar um chopinho, curtir uma praia, ver umas meninas, dançar um funk, ver um jogo de futebol e descolar uma grana para pagar o almoço. Pô... O Corinthians perdeu de novo... Tem que trocar o técnico.
Portugal
Quando acabaram os reis absolutistas e pseudoliberais – quem manda sempre manda, e o “ser liberal” é muito restrito - veio a república. O Estado passou a dividir o poder de forma diferente, entre maior numero de políticos. A partir daí pouco conhecemos de regimes democráticos. Sucederam-se ditadores, o maior dos quais foi Salazar, quase cinco décadas no poder. Depois veio o 25 de abril, mas como comunistas não sabem lidar com dinheiro, adotaram a mesma constituição da ditadura – porque queriam mandar como os ditadores – e deu tudo errado. Políticos e presidentes se digladiarem no poder, sucederam-se os escândalos e encomendaram com sucesso a morte de políticos. Finalmente, apareceu a oportunidade de entrarmos para a União Européia e todos os políticos ficaram de olho nas verbas da União para o desenvolvimento de Portugal. Dinheiro fácil que foi desperdiçado, mal empregado, ou recolhido de novo à União Européia por falta de projetos onde gastá-lo. Quando passou o deslumbramento, as verbas se esgotaram, por estes dias, e chegou a hora de pagar a conta, reparamos que a nação está quase falida, os antigos dirigentes vivendo à tripa forra no estrangeiro, cheios de mansões que jamais teriam se não fossem políticos. Já sabemos para onde foram as verbas, e continuamos com a mesma constituição. Não há partido político que não tenha o seu “senão”, e votemos no partido que votarmos, ou no político, corremos o risco – sempre - de sermos roubados, espoliadas, sempre um dos últimos paises da Europa em tudo. Não é sina, nem menos valia de nosso povo. É uma tradição secular de deixarmos que nos governem. Nem sei se vou votar, porque não vale a pena. Talvez vá para as ruas, talvez emigre para não ver a catástrofe – mais uma – de nossa nação. Um dia se disse – Portugal para os portugueses. Esse dia passou. Qualquer dia Portugal ficará entregue aos políticos para que votem neles mesmos. O povo todo terá emigrado, o que já se faz, em menores proporções, há pelo menos quinhentos anos. Só que desta vez, não mandaremos as poupanças para bancos portugueses, porque aqui só haverá políticos. Vou tratar do meu passaporte hoje. Pátria é onde me sinto bem, e não me estou a sentir nada bem por aqui. Os políticos querem que eu seja patriota mas eles não são. As Igrejas querem que eu seja bonzinho e dê esmolas mas elas são iguais aos políticos: arrecadam e não distribuem: deixam cair migalhas. Procurei um jornal sobre política, mas só encontrei jornais sobre futebol... Ora aqui está uma boa reportagem... Porque será que o Sporting nunca ganha títulos internacionais? Será que foi construído assim? Mas vá lá... Se fosse do Belenenses ainda ia ficar mais triste. Vou jogar no totoloto para ver se ganho alguma coisa.
EUA
Temos dois partidos, e de vez em quando algum independente – sem muita chance - concorrendo às eleições: O partido democrata e o republicano. Para mim, não importa o partido, que se elege de acordo com o volume de dinheiro disponibilizado para se eleger. Quem cede esse dinheiro são as empresas deste país, e como os interesses das empresas são sempre os mesmos, não muda nada de essencial na vida desta grande nação americana. Porém, se for a industria bélica que tenha mais influência, teremos guerra. O problema é que neste ano, como em todos os outros, não sei se é a industria bélica que terá mais influencia por ter contribuído com mais verbas para as eleições. O que não quero é guerras para piorar a situação. Vou votar no político. Ou em Obama ou em Romney, e afora essa desgraça de guerra, também nada mudará de essencial. E mudar para quê? O problema é do mundo lá fora, principalmente da Europa que não aprende e nos devolve a crise que criamos aqui. Exportamos a crise para a Europa, mas ela veio de volta. Porém, como somos mais desenvolvidos, uma nação continental, temos mais condições de sair mais rapidamente da crise enquanto a Europa se afunda. Atualmente estou desempregado, mas as coisas vão melhorar. Somos uma grande nação. Se tudo der errado e eu morrer de fome, a culpa é minha que sou um incompetente para sobreviver. Nos próximos dias tenho que alternativamente arranjar um emprego, ir para debaixo do viaduto que até já escolhi qual deles, ou não sei. O que me amedronta é o “não sei”. Acho que vou até o Brasil. Parece que lá ainda há grana sobrando. Não entendo como, porque roubam muito, mas tem.
Em outros paises
Não muda essencialmente nada de Cuba ao Brasil, dos EUA a Portugal. O caso mais dramaticamente hilário é o da República Democrática Popular da Coréia do Norte, que não tem nada de republica (é um reino com um ditador) de democrática (o povo nem respira mais forte porque pode ser confundido com capitalista que quer o ar todo para si) de Popular (porque a policia do estado controla tudo). Só o termo Coréia do Norte faz algum sentido.
Não conseguimos mudar nada de essencial no mundo. Os governos, constituídos de pessoas como nós sem mais nem menos virtudes, decidem tudo. Porque votamos?
Para uma democracia diferente, verdadeira, participativa, verhttp://conscienciademocrata.no.comunidades.net/
Rui Rodrigues
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Grato por seus comentários.