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segunda-feira, 1 de outubro de 2012

12- O ser humano e a humanidade



12 – O ser humano e a humanidade


Hoje não fui à praia. Estava chovendo e resolvi ficar em casa. Pensava como é costume, no modo como as sociedades se relacionam entre si, buscando respostas para a conturbada história da humanidade. Tal como todo mundo que se preocupa com a própria existência e das sociedades em que vive. Filósofos, paleontólogos, sociólogos, escritores, poetas, parece que todos vivemos em torno destas questões. Como sempre, se Deus não me der as respostas eu mesmo não serei capaz de encontrá-las. Com o barulho da chuva no piso exterior á casa e nas folhas das árvores balançadas pelo vento, comecei a escrever.

A humanidade, conjunto de todos os seres humanos, li em vários livros de ciências e em livros religiosos, começou há milhões de anos, e segundo as mais recentes estimativas científicas, há cerca de 4,2 milhões de anos mais exatamente. Os livros sagrados dizem isso também, não com a mesma exatidão, nem com a mesma riqueza científica de detalhes, porque seus textos foram escritos há muitos séculos e nada se conhecia da verdade, no que pese a afirmação de que os livros foram escritos sob inspiração divina. A ser assim, Deus não poderia enganar-se nos detalhes. Provavelmente os que começaram a tradição oral que deu origem aos livros se equivocaram, e muito, quanto á origem da humanidade, quer na forma como se iniciou, quer nos métodos e detalhes em que evoluiu. Sintomático de que não entenderam a inspiração divina reside no fato de que cada sociedade entendeu o Criador de forma diferente, levando nações a guerras sangrentas, algumas das quais ainda não acabaram, estando apenas ligeiramente adormecidas e latentes. Cada nação afirma que seu Deus é mais poderoso e melhor do que o Deus das demais. Sendo único, ou nenhuma entendeu Deus, e então Deus será um tanto ou quanto diferente de como O imaginam, ou trata-se de algo difícil de adjetivar sem pecar pelo politicamente correto.

A ter Deus criado o homem – e a mulher – à Sua natureza, teríamos um Deus realmente muito complicado, porque é assim que se apresenta a humanidade na forma como tem agido ao longo desses milhões de anos. Parece ser mais eficiente e verdadeiro pensar que o homem, e a mulher são fruto de uma natureza criada por Deus que lhe deu um impulso inicial permitindo a vida e a evolução, de tal forma que um planeta “Gaia” como a Terra, se auto-sustenta não importando que espécie herde a sua superfície, os mares e os ares. Assim, homem e mulher, fruto de uma evolução permitida pelo Criador, são autônomos e independentes para escolherem os seus próprios caminhos.

Basicamente a humanidade vive num relativo equilíbrio dividida em nações, cada uma com suas próprias características idiossincráticas, perpetuadas por séculos de tradições, crenças, costumes, características genéticas.  Cada nação, por sua vez, pode apresentar várias etnias, ou sociedades diferenciadas em função da evolução regional. De modo geral cada nação se divide em sub-regiões com seu próprio governo mais ou menos autônomo, governado o conjunto por um governo central. As leis regionais e as gerais mantêm um nível de ordem que se destina não só a atender as exigências do governo central e regional, como a promover o bem estar social geral.
Mas de modo geral, vemos que ao longo da história têm sido muitas as divergências entre as sociedades e os governos, e entre as nações entre si mesmas. São muitas as causas de tais divergências nas particularidades, mas sempre fundamentadas na religiosidade, na economia, ou na pressão governamental sobre as populações. Uns atribuem a culpa aos governos, outros às sociedades. Aos governos porque tomam decisões equivocadas, ás sociedades porque não escolhem bem os seus governos ou a eles se submetem sem reclamar. As religiões que raramente falam da vida no planeta, preparando os fieis para a vida do além, influenciam as respectivas sociedades impelindo-as para a guerra quando acham conveniente. Fazem-no sempre em nome do seu Deus.

Qual então o papel que não é bem desempenhado pelos seres humanos de forma a tornar as sociedades e a própria humanidade numa espécie que seja auto sustentável num planeta que se auto sustenta? Vivendo em revoluções e guerras como vem acontecendo há milhões de anos sem nunca mais acabar? Deve haver um outro caminho.

E então ouvi a resposta.

- Cada ser humano possui uma carga genética quase imperceptível que o diferencia de outro ser humano. Este fator aliado à educação que sofre no lar e de grupos em que participa, aceitando ou rejeitando a influência, tornam-no um ser único com opinião própria, ainda que a opinião seja a de seguir a opinião de outros por falta de conhecimentos, por submissão ou por preguiça de pensar. Assim é a humanidade que escolhe os seus caminhos todos os dias, a todo o segundo que passa.

E continuou:

- Cada ser humano dá também a sua contribuição todos os dias, a todo segundo que passa, mas prevalece algo que é indefinível a cada momento: o caminho próprio da humanidade como resultante de todos os atos dos seres humanos que a compõem. É como se cada ser humano fosse um vetor, e o vetor resultante fosse o caminho da humanidade. Assim, quando aparece algum ser humano que lidere um movimento que a maioria ache importante, a humanidade começa a mover-se no sentido dessa liderança, seja ela de arte, de moda, de política, filosofia ou qualquer outra manifestação. Os seres humanos tendem a identificarem-se uns com os outros, numa clara demonstração de humanidade, mas é mais do que isso, porque inclui o receio de uma exclusão do meio se não seguir a “onda”. Por isso muitos vão aos templos mas não são religiosos. Por isso muitos dizem sim até mesmo quando não têm opinião, e muitos votam num candidato porque lhe disseram os mais próximos que nele iriam votar.  A moda das saias curtas não poderia ter aparecido antes de Mary Quant. Mary Quant lançou a moda depois da invenção da pílula que libertaria sexualmente a mulher. O movimento de libertação da mulher, vilipendiada, denegrida e ignorada nos livros bíblicos, depois da invenção da pílula nunca mais parou. Ou seja, a própria humanidade conserta o que está equivocado. A humanidade faz parte da natureza e esta é auto-suficiente: repara os próprios erros ao longo do tempo. Assim como a natureza parece não ter pressa numa escala do tempo, assim à humanidade lhe parece também não haver pressa em mudanças radicais. E não tem pressa, mesmo que algum líder lhe tente mudar os rumos. Uma parte dela pode segui-lo enquanto a outra espera os efeitos. Depois decide.

E finalizou:

- Cada um expressa a sua opinião mesmo em regimes, seitas ou grupos em que lhe proíbem a sua manifestação. O resultado da troca de informações seja qual for, não pode ser tomada como definitiva, porque em decorrência da opinião geral são tomadas ações que na prática comprovarão o interesse ou desinteresse por determinada opinião ou filosofia política, econômica ou religiosa. O tempo resolve tudo, e muitas vezes podem ver o retorno a velhas idéias, filosofias, ou a evolução das que foram seguidas. De qualquer forma, nenhuma “verdade” é perene. Tudo evolui e somente duas manifestações da humanidade se têm mostrado quase que estagnadas: as filosofias religiosas e políticas. Se a humanidade não tomar cuidados, cada ser humano de per si, o resultado poderá ser catastrófico, e certamente o desastre virá da vontade que alguns seres humanos têm de que sua opinião prevaleça. Essa vontade vem da vaidade ou da ganância, ambição. A maior “virada” na evolução da humanidade virá quando os velhos modos de governar mudarem radicalmente. Os seres humanos devem escolher o seu presente e o seu futuro vigiando os que governam e dizendo-lhes pelo voto como querem ser governados. Fica fácil entender o que digo, se pensarem que um presidente ou primeiro ministro têm o poder de declarar guerra ou lançar bombas atômicas sem consultar as suas populações. Não só para isto, mas para tudo, é a nação que deve dizer o que quer aos governos e não estes a ela. As religiões têm que evoluir para acompanhar, porque nos últimos seis mil anos ninguém se atreveu a dizer que eu falei algo para alguém ou apareci em alguma sarça ardente.

Acordei no dia seguinte. A chuva tinha parado. A partir daquele dia, comecei a entender a humanidade como algo independente que segue o seu caminho, muito mais importante do que o caminho de cada um de nós. Eu já me sentia um quase nada comparado ao tamanho do Universo. Menos até do que quase nada me sentia agora, porque por mais importância que me pudesse dar, a da humanidade é muito maior. Sete bilhões e meio de vezes maior...

Era o décimo segundo dia e a décima segunda vez que me acontecia.


Rui Rodrigues e a "voz do vento" 

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