Venha viajar de balão. É grátis.
Quem nunca passou por uma
universidade não tem a mente suficientemente preparada para ter uma abrangência
ampla e global do mundo, compreender as “leis” que o regem. Destes, que
passaram pela universidade, uns usam o conhecimento adquirido de forma
extremada em seu favor, não se importando se suas ações ajudam a melhorá-lo ou
a afundá-lo ainda mais. Não têm o conceito da perenidade das civilizações, de
seus enredos. Outros olham o mundo de forma oposta e, desde organizações de
beneficência até instituições religiosas vão sofrendo a dor de se opor àqueles.
Outros ainda, desanimados, com diploma válido, catam alimentos em latas de lixo
para permanecerem vivos por mais alguns inconstantes dias, esperando a morte
verdadeira chegar, porque a social já faleceu há muito tempo.
Dos que não freqüentaram as
universidades, tendo ou não um diploma comprado, ajudado, compartido, muitos
entendem perfeitamente o mundo que os cerca, mas se podem encaixar
perfeitamente nas classificações do primeiro parágrafo, daqueles que
freqüentaram e universidades e ganharam com mérito seu válido diploma. A
diferença entre uns e outros é o conhecimento. O conhecimento geral e o de
causa própria.
Mas para entender o mundo de
forma global e ampla, é preciso subir num balão, tão alto, que se veja a Terra
girar e todos os países do mundo nos passem pelos olhos, pelos ouvidos, pelo
entendimento. Vamos lá? A viagem é completamente grátis.
- A
partida
Na partida está a família e
os amigos e ou uns ou outros. Entre frases de despedida para a viagem, ouvem-se
as mais dispares que chegam a parecer não fazer muito sentido, como por
exemplo, para se tirar fotos lá de cima, para se ter cuidado, para nos
agasalharmos. Uma tia ou uma amiga nos diz que podemos ficar descansados porque
cuidarão do cachorro, que aquela conta do Banco será paga e que depois lhe
reembolsaremos. Que o chefe do escritório mandou lembranças. Que a mídia nos
pagará uns trocados pelas fotos. Que o aeroporto mais próximo já está avisado
que o balão irá partir em seguida. É um mundo pequeno, limitado, tão ínfimo que
se não fosse pela mídia, ninguém saberia da partida do balão nem quem ia a
bordo. Nesse mundo pequeno, notícia só é divulgada, e de primeira página, se a
bordo estivessem o presidente da república, ou a presidenta do Republico, se
falássemos de “governo”. E ao dizer isto, todos em volta, assistindo à partida
ririam muito, com o melhor bom humor, das cretinices alheias.
- Subindo
em baixo nível.
Subindo a baixo nível ou em
baixo nível, podemos ver casas, cidades, campos, lavouras, reservas índias,
fábricas, estradas, barragens, postos de saúde, estabelecimentos de ensino, e
se estivermos perto, a cidade de Brasília e o Congresso, mas não os corredores
do Congresso, porque são escuros, cobertos, tapados, e lá existe uma fauna
muito especial sem qualquer representante do povo. Chamam a essa fauna de
lobistas, mas o nome verdadeiro deveria ser o de conspiradores, “maracutaios”, “conluistas”.
E sempre subindo... Lá está... Vê-se agora perfeitamente o Brasil inteiro sob
nossos olhos, do Oiapoque ao arroio do Chui. Que lindo. Sem nenhuma nuvem vê-se
tudo.
Vê-se uma seca imensa no
Nordeste que desde os tempos da Sudene nunca foi resolvida e canais e obras do
ultimo governo paradas, mal executadas, como prenuncio de que só serão
concluídas algum dia, quando derem o calote nas empresas construtoras que serão
indenizadas sobre preços de custo já por si astronômicos, por atrasos no
pagamento, projetos mal rascunhados, garatujas de criança. As estradas
esburacadas, de terra, apesar dos bilhões de moedas pagas para a sua construção
e manutenção. Escolas com merenda roubada, estragada, sem merenda, prédios ao
abandono de cuidados, e como os professores mesmo assim estão dando suas aulas,
não podem ser vistos do alto por causa dos telhados. Vêem-se fábricas fechadas
por causa da alta do dólar que dificultou a venda no exterior de seus produtos
que assim ficaram mais caros. Vêem-se cidadãos desabrigados pelas cheias e
pelas derrocadas de morros, por bueiros de água que arrebentam, pro falta de
emprego. Vêm-se idosos nas ruas pedindo que não lhes baixem seus miseráveis
pagamentos de aposentadoria, bandidos roubando á vontade, matando, invadindo a
propriedade, e assentamentos que no inicio eram povoados pelos sem terra, e que
agora estão na mão de meia dúzia deles, que os outros, os que saíram dos
assentamentos, estão em movimentos para ocupar novas propriedades das quais venderão
depois as suas partes. Vêem-se reservas índias invadidas, nenhum índio no senado,
cemitérios de ambulâncias “zero quilômetros” sem uso apodrecendo ao tempo,
equipamentos hospitalares que nem sequer foram desempacotados. Podem ver-se
grupos imensos de pessoas drogadas, consumidas pelo crack, gente morrendo em
filas de hospitais, médicos que recebem o salário, batem o ponto e vão embora.
Do balão, a esta altitude,
vê-se o que se quer ver, lê-se o que se quer ler. Muitas visões e leituras
incomodam.
- A alta
altitude.
Começam a aparecer os
contornos de África, e ao norte, revolução no Egito porque um presidente se
quis fazer rei e legislar em prol de um grupo, quando são muitos os grupos no
Egito. Vemos pobreza em África, como se África fosse uma enorme teta seca de
mãe faminta que não tem leite para dar a seus filhos. Outros lhe chuparam o
leite. E quando todo o resto parece em paz, passamos por cima da Síria onde
ainda há um rei absolutista que governa como rei tirano. Mais de cem mil mortos
na Síria, e o mundo num impasse. Quem se importa com o povo sírio?
Subindo chegamos à Europa.
Na Grécia há cerca de sessenta por cento da população desempregada. O Sul da
Europa passa fome. Seus governantes agem como reis absolutistas, que legislam
em causa própria e comprometem a economia, a saúde, os serviços públicos.
Alguns se auto-exilaram e vivem em capitais gastando por conta de um povo que
exploraram. E dizem todos que vivem numa social democracia, protegidos por
União Européia que viaja agora a quatro, cinco, dez, vinte e sete velocidades,
sendo que algumas não passam do zero. Estão paradas, seu povo emigrando para o
desconhecido, com esperanças de sobreviver. Até na China e nos EUA, numa década
apenas, cidades enormes, prósperas, ricas, se transformaram em cidades
fantasmas, com industrias falidas, fechadas.
Lá do alto, vê-se o mundo inteiro
e ficamos ansiosos para descer, buscar livros de história universal e pesquisar
para sabermos onde erramos para vermos tanta desgraça. Talvez se os cidadãos
pudessem dizer a seus governos, pelo voto, o que querem, pudessem ser ouvidos,
como numa Democracia Participativa que Sócrates descobriu há milênios e agora é
possível através de voto pelas redes sociais ou um site do governo para votação
pública.
A paisagem vista do alto a
olho nu e cérebro desligado, é soberba, divina, Mas, quando assestamos os
binóculos e ligamos os neurônios do cérebro, vemos que é necessária uma grande
obra para mudar o que nos incomoda.
© Rui Rodrigues,
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