Arquivo do blog

sexta-feira, 8 de junho de 2012

O meu tio Miguel Ângelo




O meu tio Miguel ângelo - A segunda “grande” viagem da minha vida

Não posso falar da segunda sem antes fazer uma referência à primeira.

Eram assim os combóios naquele tempo.

A primeira aconteceu quando eu tinha cerca de quatro anos de idade. Lembro-me do cheiro do trem, misto de comida, de farda de soldados, de fezes de porco e de galinha, vapores de uma fábrica que me passava pela janela quando despertei. 



Foto da Estação de Peso da Régua.

Tinha embarcado á noite em Peso da Régua e ia para o Porto, para depois fazer o traslado para Lisboa. Dormi por bom tempo, porque estava nascendo o dia quando vi a tal fabrica passar pela janela bem devagar. O trem era a vapor, apitava, e nos túneis nos enchia de fumaça, a ponto de todos correrem a fechar as janelas. Olhei à minha volta e vi umas senhoras idosas no banco de trás. Uma estava levantada, ajeitando a sua bagagem na prateleira. Ela ria, todos riam, porque um porquinho que ela levava numa caixa resolveu urinar em cima das pessoas que estavam em baixo. Com o alvoroço, e os comentários, galinhas cantaram. O cheiro de fardas do exército, cinzas, com cintos e botas pretas enceradas com banha de porco provinha dessa mistura. Lembro-me a chegada à Campeã, e a chegada a Lisboa. Eu viajava com minha avó. Possivelmente com mais alguém, mas essa viagem deve ter sido traumática, porque não me lembro de mais ninguém de família ou de amigos nesse trem, a pesar de minha excelente memória. Nem do resto da viagem. Provavelmente estava muito entregue a meus pensamentos ou dormindo de cansado. lembro sim, do transbordo na estação do Porto, para pegarmos o combóio para Lisboa.


A foto é da Av. Almirante Reis junto ao Largo do Intendente onde meu tio trabalhava e morava. Eu, minha tia e minha avó, morávamos umas duas quadras acima, na Rua Francisco Sanches, 26. A dona do andar era a dona Lucília que morava com uma irmã, as duas idosas.   

Havia-me mudado definitivamente de minha terra, Fornelos, em Santa Marta de Penaguião, para Lisboa. Minha vida seria lá, a partir da chegada à estação de comboios de Santa Apolônia.Dois anos depois, meu pai foi para o Rio de Janeiro. Fiquei em Lisboa com meu tio Miguel Ângelo, minha tia Elisa e minha avó paterna, Maria de Jesus Pinto Nogueira. Deixara lá a minha mãe que viria a falecer, muito jovem, em seis anos. Morreu aos 30.

Minha escola primária no Largo do Leão.

Um ano depois eu já estava na escola do Largo do Leão, já lia, escrevia uns bons garranchos. Meu tio Miguel era um “boa pinta”, coisa de ator de cinema. Eu queria ser como ele. As namoradas eram de fechar o comércio, todas bonitas, lindas, cheirosas. Naquela época estava na moda uma canção da Carmem Miranda que cantava " chiquita bacana lá da Martinica".  



Largo de Arroios onde meu tio se encontrava com a namorada. Na parte atrás do fotógrafo fica a ponte da Rua Pascoal de Melo, onde moravam minha prima Alice e a Fernanda, com o Teófilo. Ele tinha uma voz "esquista" porque respirava mal por causa de um ataque cardíaco que tivera. 

Na brincadeira ele dizia que elas eram também minhas namoradas. Eu sabia que não, mas ele não sabia que eu sabia. Nunca contei a ninguém que na minha  infância infantil de 4 anos uma menina um pouco mais velha me convidara para ir para o caminho da estrada para passear e que debaixo das parreiras fiquei a saber a diferença entre meninos e meninas... Como esquecer aquelas calcinhas de algodão e o que estava por debaixo delas? Ora, as namoradas de meu tio, quando eu tinha sete anos, não me iriam mostras as suas calcinhas, nem mais ou menos... Em compensação, já que não as dividia realmente comigo, meu tio trazia-me quase todos os dias uns chocolates da venda, ou umas bolachas, rebuçados, pirulitos. Um dia ele tinha comprado um lenço de cabeça para a namorada como presente de aniversário. Era um lenço verde com pintas brancas, de seda muito fina. Minha tia que fuçava tudo descobriu o lenço e ficou muito feliz e acabou por ficar com ele. Dessa confusão que se seguiu, eu não me esqueço. Descobri pela primeira vez que até família unida pode ter as suas desavenças por coisas que não valem nada. 


Esse de óculos embaixo parece ser o meu tio. A foto peguei na net. Terá sido sorte, ou não é ele?

Para a escola, eu ia a pé, mais ou menos oito quarteirões. Com essa idade, minha vida era levantar, ir para a escola, assistir ás aulas, correr até suar no recreio, almoçar na escola o almoço que minha tia Elisa me levava, voltar a estudar, voltar para casa, comer um lanche, fazer os trabalhos de casa, jantar, assistir ás notícias do dia no rádio, e dormir. As sextas feiras passava um programa da Maria Manuela Patacho com histórias faladas com vários personagens. Era a minha única grande diversão! Isso e me divertir no recreio da escola. No dia seguinte, tudo nova e exatamente igual. Aquilo para mim era uma prisão, um tédio, mas gostava de estudar. Era tudo pelo futuro. 

A foto abaixo é do largo do Intendente

Imaginem quando meu tio Miguel me perguntou, uns três dias antes do grande dia, o da viagem,  se eu queria ir com ele numa excursão que passava pela barragem do Castelo do Bode... Meus pulmões não cabiam no peito, o coração acelerou, a vista ficou turva, e comecei o meu chorrilho de perguntas que nunca mais acabavam. Quanto tempo seria a viagem, aonde íamos, o que havia lá, como era o ônibus, de que cor era, como eram as estradas, se tinha rios, se tudo era parecido com Fornelos...



Não dormi durante três dias e três noites. Nem pregar olho... Quando ia dormir, o papagaio do corredor gritava: “Olá... Quem passa?... É o rei que vai pra caça... Ó papagaio looooouuuuroooo”. E lá ia eu sonâmbulo para o colégio.
Não perdi um só segundo da viagem, olhando as paisagens, casas, mosteiros, a cidade de Caldas da Rainha, o Mosteiro da Batalha a barragem do Castelo do Bode com a água represada de um lado e o rio pequeno, diminuto, lá embaixo, do outro lado.  Aquilo me impressionou. Talvez um dia viesse a ser engenheiro, porque eu ia muito bem nas matemáticas e nas ciências.   
Lembro-me vagamente do grupo (da malta) que dizia que eu era bem comportado, das fotos, dos prédios, das paisagens planas que eram tão diferentes das montanhosas de minha terra natal. Durante a viagem vinha um cheiro a feno que entrava pelas janelas, e isso me lembrava o sabonete que usávamos lá em casa: Feno de Portugal. Olhei em todo o ônibus. Não vi nenhuma mulher por quem meu tio pudesse interessar-se. Afinal, nós tínhamos o mesmo gosto para elas. Até as dividíamos... E sei que se houvesse alguma, ele ia dar aquela piscada fatal que me ensinou a dar. Na minha inocência de então, fiquei impressionado como que as mulheres se impressionavam com uma piscadela, sem saber quem o sujeito é, o que faz, o que quer. Sempre perguntavam depois, quando já estavam "amarradas". Perguntei-me, sem dar muita importância, porque razão o meu tio não tinha levado a namorada na excursão. Só meses depois descobri.Meu tio também me deixava. Ia para o Brasil, para ganhar a vida junto com o meu pai. Eram irmãos, amigos, seriam sócios.

A loja de meu pai e meu tio era na Rua Alexandre Mackenzie. no centro do Rio de Janeiro, na foto abaixo, no segundo prédio da direita para a esquerda. 

Depois dessa viagem, se a vida já me parecia uma prisão, passou a ter vapores de algo pior. Saudades dos bons tempos, das canções da ‘Chiquita bacana lá da Martinica “ da Carmem Miranda, dos passeios com as namoradas de meu tio, dos doces que me trazia, do óleo do fígado de bacalhau que me ajudava a tomar, dizendo-me que "um homem é um homem e um bicho é um bicho" e que os homens têm que ser fortes. Saudades do meu tio que me ensinava a ler e a escrever e que leu um livro sobre um velhinho que se tinha perdido da família e que na noite de natal, pobre e esfarrapado, batera à porta da sua própria família para pedir uma esmola e saiu sem dizer quem era... Meu tio me ensinou também os bons sentimentos.




Grande tio, por uns tempos o meu pai, sempre o meu grande amigo, um exemplo de homem forte, determinado, a quem nunca vi discutir em família.  Sei que cada um é como é. Ele é assim.Um grande abraço, tio Ângelo, cheio de saudades e como novidade, meu filho Beto é muito parecido com o senhor. Nunca o ouvi levantar a voz pra ninguém. É verdade que meu pai também era assim. 


Rui Rodrigues

quinta-feira, 7 de junho de 2012

Verônica Dúbia - a fantasminha - e Ronaldinho




Verônica Dúbia, a minha fantasminha camarada


De vez em quando passo aqui no Bar do Chopp Grátis para espairecer. É um bar mágico. Aparece de tudo, acontece de tudo. E como é virtual qualquer semelhança com a realidade é pura ficção. Ficção dos que veem como querem e não como as coisas são. De vez em quando se fala de política, outras vezes de política e até de política, porque neste mundo tudo é uma questão de política. Muito raramente se fala de outras coisas, mas tudo é realmente uma piada, visões, miragens. Contam-se piadas e ri-se muito. Fantasma para mim sempre foi fantasma e não merece o mínimo crédito. Se merecesse não seriam fantasmas.

Por vezes quando entro, e olho para a mesa que fica mais perto do bar, vejo a minha amiga, uma fantasminha muito camarada que gosta de caras mais velhos, maduros sem estarem podres, como eu. Então começo a pensar em Fantasmas de outro jeito. Ela é muita da gostosa. Nunca me disse o seu nome verdadeiro. Disse que a chamasse de Verônica Dúbia. Achei estranho o nome, pensando que havia alguma mensagem que ela me quisesse transmitir. Afinal, Verônica lembra a palavra “verdade” e Dúbia lembra dúvida, ambigüidade, e isso me deixa sempre em dúvida quando me conta alguma coisa...

Hoje ela me recebeu com esta...

- Vem... Senta aqui ao meu lado... Tenho uma pra te contar!

E lá fui eu, sem pestanejar, beijar aquela linda face. Virtualmente consistente, macia, cheirosa. E continuou sem nem me dar tempo de pedir um chopp (Aqui no Bar, chope não é grátis, chopp é).

- Sobre o Ronaldinho e o Flamengo, (Apurei os meus ouvidos virtuais), Sabe que saiu do Flamengo?
- Sei, mas isso já foi há alguns dias, mais de uma semana...
- Mas ele saiu e acionou o Flamengo na justiça... (e pousou sua mão sobre o meu braço, começando a mexer os meus cabelinhos, ao mesmo tempo em que eu me arrepiava. Não de medo, mas de pura vontade de convidá-la para irmos ver o que a Teresinha tinha perdido na horta)... E ganhou a causa! Sabe porquê?
-Não, respondi pousando minha mão sobre a dela.
- Porque o Flamengo fez uma troca: Deixava o Ronaldinho transar á vontade crendo numa  troca dos juros nos pagamentos que devia ao jogador. E era uma grana alta, daquelas de corromper qualquer vereador, deputado. Senador não sei, porque eles cobram mais caro... Uiiii. Bem mais caro. (ela tinha um agradável sotaque de francesinha ingênua, se é que na França existe alguma).

E continuou...

- Começaram dizendo que “semana que vem a gente acerta”, depois passaram para mês que vem, e Ronaldinho não parava de comer as suas mulherzinhas sempre que tinha oportunidade. Claro que de vez em quando bebia umas e outras, mas isso fazia parte do clima sexual. Havia umas com quem ele transava que eram as próprias tanajuras... Feias de cara e boas de bundas... 


Venônica Dúbia continuou - Já estive do lado dele, tocando-lhe em tudo que é peça, mas ele não sabe ver fantasmas. O negócio dele é vem cá e créu, sem muita conversa. Diz que é pra não dar na pinta, sempre correndo. Marca um gol, e sai pro abraço. Diz que aprendeu com um galinho lá do Quinteiro e que não se quer desgastar muito. Quando não dá a dele como galinho, dá como coelhinho, mostrando a dentuça. O mulherio delira com isso... He he he ..

- Mas, disse eu, se ele saía com mulher durante a concentração estava errado.
- Estava certo, Barmaninho (ela me chama carinhosamente de Barmaninho e nem sou o Barman)... Errado estava o Flamengo acreditando no advogado do clube: ele mandou vídeos mostrando Ronaldinho com as mulheres durante a concentração e caracterizou perseguição ao atleta. O Atlético mineiro percebendo que o jogador ia ganhar aquela, contratou logo o craque. Ronaldinho é um craque. Ainda marca muitos gols e dá passes certinhos para outros muitos mais...(ela entendia de futebol, e sua mão já andava vasculhando o meu corpo inteiro. Eu não sabia se a escutava ou se a arrastava para os fundos do bar. Nunca transei com fantasma).
- Quase todos os clubes fazem isso com os jogadores e alguns botam gente pra dentro do quarto e nem todos que entram são mulheres. Os clubes têm vídeos deles todos para exercer pressão na hora de negociar... (Fiquei abismado. Como seria isso possível? Era de deixar corado qualquer general das forças armadas e arredores).

Arrisquei:

- Mas dentro de campo...
- Hiii, meu filho.. hihihih ... Lembra do Roberto Carlos baixando para arrumar a meiazinha na hora do time da França bater o escanteio? Isso é lá hora pra fazer isso. Veio o Zidane e créu! Gol da França.
- E lembra do faniquito que o Ronaldão teve, que desestabilizou o time todo do Brasil na copa anterior, contra a mesma França? Ali, uns sabiam da tramóia, outros não. Por isso um treinador dizia que tinham que escalar o Ronaldo, e o outro dizia que não... Tudo armadilhado. Copas funcionam assim. Ora agora ganha um, ora depois ganha outro... Tens isto gostoso! (E me afagou o meu artilheiro de modo sensual e prazeroso. Passei-lhe a mão na cintura e comecei meu trabalho de meio campo. A coisa estava ficando boa. Ia acabar tudo ali mesmo, lá nos fundos do bar).

- Perguntei: Quem te contou isso?
- Foi o Taumaturgo Bode (disse ela. Eu fiquei lívido imediatamente, parecendo um fantasma)... E continuou - Ele se mete em tudo, até em futebol. Onde pode ganhar uns trocados ele se mete. Não foi ele que segredou no ouvido os nomes dos Ministros dos Esportes para serem nomeados? E não se encontra com eles de vez em quando para trocar impressões?
- Arrisquei outra vez: Ele que te contou? ...O Taumaturgo Bode ? Você e  ele... Ele e você...Vocês não... Sim?
- Naaada, (disse ela). O Taumaturgo é boiola. Subiu na vida política assim. O outro fantasma que costuma vir aqui, o mais esbelto, o Zeca Vamporra também, mas este é fêmea. Já foram amigos no passado. Mas isso da sexualidade não importa. Não vou falar sobre isso. Nem vou falar mais, senão teria que te contar que o valor do passe dos jogadores é subfaturado e o resto é pago por fora para não pagar imposto. Essa grana do “por fora” é que enriquece os carinhas...

Quando pensei que o papo iria mais longe, ela me deu um beijo impressionantemente quente nos lábios, um selão, levantou-se e já na porta disse-me:

-Tchauzinho!!!... Depois passo aí.

Senti-me como Zico perdendo o pênalti naquela copa do mundo... Pior ainda do que naquela época em que tentou empurrar jogadores do seu clube particular para o Flamengo.

O futebol está com a bola furada. Uns jogam futebol outros não. .

Estou achando que Verônica Dúbia é filha do Sobrenatural de Almeida que o Nelson Rodrigues detestava por estar sempre azarando o Fluminense. Verônica Dúbia também adora um jogo. Futebol é detalhe.

Rui Rodrigues

quarta-feira, 6 de junho de 2012

Eu sou meu próprio avô


 

Há alguns anos atrás casei com uma bela viúva. Essa viúva tinha uma filha que, com o nosso casamento passou a ser minha filha também.

Até aí nada de mais, as coisas começaram a se complicar quando meu pai se enamorou, e logo se casou com essa minha filha.

O casamento do meu pai com a minha filha, fez dele meu genro, e esse casamento mudou a história da minha vida.

Minha filha ao casar-se com meu pai tornou-se também minha mãe.

Para complicar o caso, minha esposa ficou grávida e logo me tornei pai de um garotinho.

Meu filho ficou sendo cunhado do meu pai, pois era irmão de sua esposa, e por ser irmão da esposa do meu pai, meu filho tornou-se meu tio.

A minha filha que também era minha mãe por ser esposa do meu pai, também teve um filho, e esse filho era também meu neto, por ser filho da minha filha.

Minha mulher por ser a mãe da minha mãe, era minha avó, e as coisas complicavam cada vez mais, pois.

Neste imbróglio sem fim, se eu sou neto da minha esposa e casado com a minha avó acabei sendo meu próprio avô. 

Taumaturgo Bode e Zeca Vamporra

                                                            

                                                                Zeca Vamporra

Zeca Vamporra, dizem, nunca teve mãe.  Não teve mãe, também dizem, porque se sentia rejeitado por ela. Como andam sempre dizendo, e nunca assumem quem disse, passo adiante: Ele não era filho do pai dele. Era filho de um outro pai, e a mãe não sabia quem era por razões óbvias. Nada de reprovável. O problema é que a mãe sempre o via como “o filho do desconhecido” e não como filho dela. Zeca Vamporra suportava tudo com estoicismo. Um dia provaria que tudo estava na medida certa para ele. Passaria a perna em todo mundo e ninguém notaria. Não é que a mãe dele que era mãe, nunca percebeu que ele a odiava? Se a mãe não percebia, o mundo também não!

Zeca Vamporra era um revoltado, daqueles que aprendeu a esconder a sua revolta para ter tranqüilidade em casa... Sofria mil martírios, sempre calado, desde que conseguisse atingir os seus objetivos. Na escola era medianamente aplicado. Aos 19 anos já era líder estudantil. Não porque soubesse alguma coisa das matérias, mas porque estava na moda reclamar de tudo e ser da esquerda, Tcheísta mais que Fidelista. Socialista não era mesmo. Gostava muito de ouvir o hino da “internacional socialista” e se arrepiava todo. Curtia uma boa vida, desde que paga pelos outros. Não precisava ser “expert” em qualquer matéria. Conhecia as pessoas e sabia do que era capaz.

Um dia trancafiaram o Zeca Vamporra, ao tentar fundar uma espécie de Congresso Estudantil contra a ditadura. Como tinham seqüestrado um embaixador, ele e mais um grupo foram libertados e deportados em troca do político. Chegou até Cuba e fez uma plástica lá. Nunca acreditou que um dia a ditadura acabasse. Não acreditava no seu próprio movimento, nem em Che, nem em Fidel, e tratou de mudar a cara para não ser reconhecido. Mas continuou gostando muito de dinheiro, e de não dar o corpo aos abutres em batalhas. O negócio dele, como profundo conhecedor das pessoas, era gerir. Gerir qualquer coisa.

Foi aí que se perdeu o rastro do Zeca Vamporra.

Dizem uns que morreu na Serra Maestra com o Che. Dizem outros que Zeca Vamporra é falso e que é outra pessoa, e que por isso alegaram a tal operação plástica em Cuba. Outros dizem que foi o Pitanguy que lhe fez a plástica quando visitou Cuba.

Eu não sei de nada.

O que sei é que Zeca Vamporra tinha um comparsa político em ascensão enquanto eram vivos: Taumaturgo Bode! ... O temível Taumaturgo bode. Morreram, ou sei lá, na mesma época. E passaram a agir em surdina. Cada um para um lado. Taumaturgo até lhe facilitou a vida quando por sua influencia aprovaram uns documentos que deixavam o dito por não dito, o passado enterrado sem vencidos nem vencedores, um helicóptero jazendo no fundo do mar com o sujeito que não queria deixar as coisas em banho Maria.

Zeca Vamporra funda então um Partido com um sócio. O sócio, a principio, era muito honesto de princípios, mas o Zeca destruía as bases de qualquer um e disse-lhe.

-Cara... Sem dinheiro não podemos fazer nada. A URSS está nas últimas. Vai quebrar. Cuba está com bloqueio e a China não se mete nisso. Vais apanhar dinheiro onde para levarmos o Partido adiante? Você quer um Partido quebrado?

Diante das evidências, o sócio aquiesceu. Na verdade fez um contrato com o diabo, ou um representante dele, com assinatura em branco. Nunca mais se separaram.

Então Zeca Vamporra começou a aparecer. Como fantasma. Arrecadou dinheiro para a causa usando uma conta ns Ilhas Jacaré já defloradas por tantas contas internacionais. Ajudou a empichar um alto membro do governo que mais tarde, em revanche, lhe atrapalharia a vida ajudando os inimigos que fizera a porem-no para fora do cargo que tinha. Nisso o Taumaturgo Bode ajudou um bocado, porque cada um tinha um dossiê mais grosso que a Barragem de Três Quedas e se respeitavam mutuamente. Se um dia um deles resolvesse abrir os dossiês, acabariam com a vida de ambos.

Mas afinal, estão vivos...

Eu não sei de nada. É tudo o que contam outros fantasmas que andam por aí, de menor expressão, loucos para subir no podium e assumirem a chefia da Congregação Nacional dos Fantasmas, tendo até várias ONGs que defendem tudo na propaganda, mas não fazem nada de útil para defender: O dinheiro que recebem é todo gasto em notas frias que nunca expressam nada do que foi gasto. Aliás, com as notas frias, nem gastam dinheiro. Só distribuem o que recebem do governo.

Dizem, não sei, que uma vez quando se encontraram, o Sócio, Zeca Vamporra e Taumaturgo, comentaram e assentiram que o povo era burro mesmo.  E que os empresários, em troca de uns favores, pagavam a peso de ouro. Eles eram apenas intermediários entre a burrice popular e a avareza dos empresários. Sempre tinha sido assim. A revolução afinal tinha ganho a batalha contra a ditadura, porque agora estava no poder!!!!

Riram a bandeiras despregadas, estourando as pregas anais de tanto rir. Gritavam:

- Companheiros! ... Ganhamos!... Estamos no poder, e os trouxas estão lá... O povo pastando e os empresários pagando até barato.  O idiota do Fidel está lá com a sua Revolución o muerte!... Todo bloqueado, caquético, pé na cova, o povo vivendo numa crise eterna!..  O Che está morto, o otário... Morreu pelos camponeses que continuam na merda de sempre...

Quando Zeca Vamporra e Taumaturgo Bode atacam as vítimas, sempre como fantasmas, o mundo de um lado treme, do outro toma champanhe, do outro fazem festas em Paris com muitos guardanapos, de outro enchem os alforjes de dinheiro, o outro, o maior, agora está convencido que é classe C e já não é pobre...

Zeca Vamporra ganhou este apelido porque era uma palavra comum na época. Se suas comunicações fossem grampeadas, tudo o que ouviriam como referencial era um “Porra” bem colocado.

Vampiro raiz do nome Vamporra é porque sempre viveu à custa do sangue dos outros. Anda sempre com uma pasta cheia de dinheiro que os outros pensam ser de documentos.

Rui Rodrigues



segunda-feira, 4 de junho de 2012

Taumaturgo Bode, o terror do Sobrenatural de Almeida





Taumaturgo Bode – O fantasma

Taumaturgo Bode assusta assombrosamente, e costuma atacar nas noites claras ou escuras, de manhã cedo, tarde ou ao meio dia. Ninguém o vê, mas sente um arrepio, um vento, uma carícia, um toque, quando ele está por perto.

Nada mais tenebroso que ver fantasmas ao meio dia e nenhum dos fantasmas conhecidos é tão fantasma quanto Taumaturgo Bode. Nos tempos de Nelson Rodrigues até o Sobrenatural de Almeida – o famoso fantasma que explicava os gols contra o fluminense - tinha medo do Taumaturgo Bode.

Quando aparece é morte certa, prejuízo irrecuperável, perda total. Quando deixa sobrar alguma coisa de aproveitável, ou um indício, fá-lo para criar a cizânia, espalhar a confusão, provocar raivas sem conforto. Uns dizem que é o próprio diabo, mas se fosse estaria no inferno. Está em Brasília de onde não sai nem que a vaca tussa, espirre, grite ou se exploda.

Taumaturgo Bode divertia-se em Brasília quando era vivo. Foi lá na primeira leva de visitas ao canteiro de obras quando Juscelino Kubitschek de Oliveira fez iniciar as obras pela “Novacap”, nos idos de 1956. Era um mero político desconhecido então, mas muito ambicioso, capaz de matar a mãe para ir ao baile do orfanato.

Iniciou um plano fazendo o maior numero de amigos. Não era propriamente amizade, mas troca de favores. Começou a construir uma imagem de patrono, alguém confiável com quem se podia sempre negociar. Começou a delegar funções e tarefas aos que lhe deviam algo, e em conseqüência, a dividir-se entre o homem que realizava o seu trabalho como político, e o homem que agia na sombra como um fantasma. Dividiu-se em dois.

Ninguém mais o reconheceu! Aquele político morrera.

Ninguém sabia que ao dividir-se em dois, ganharia super poderes, membros de polvo, cheios de ventosas. Nas horas de confusão para o seu lado, desaparecia, ficava invisível. Um dia escreveu um livro sobre os colibris bigodudos e uma academia o elegeu como membro. Ninguém relacionou esta “elegição” com o fato da Academia ganhar um prédio novo, imenso e moderno, cheio de janelas e mármores e granitos no centro da cidade, tão grande, que poderia abrigar todas as academias de garranchos do mundo. O dinheiro doado para a construção do prédio não era dele.

Taumaturgo Bode usava sempre uma capa preta, farda, fardão, camisola de dormir, tudo com muitos bordados, que lhe caiam muito bem com suas frases meio assobiadas, dignas de filhinho de papai que nem se formara na Sorbonne.


No período de maior influência no governo – ele tinha influências – causou o maior rebuliço na economia: exauriu as reservas cambiais, as exportações diminuíram quase a zero e as importações aumentaram a jato. Enquanto a população ficava pobre a cada hora do dia que passava, uma parte pequena, amigos do Taumaturgo Bode enriqueciam com a inflação cavalar...

Pensam que foi responsabilizado? Que nada!... Ainda foi eleito para cargos importantes nos anos seguintes, até hoje!

Mas então, Taumaturgo Bode está vivo ou morto e é um fantasma?

Aí que o bicho pega... Para uns morreu lá atrás e agora é só fantasma. Para outros, nunca morreu e é um bom sujeito. Para outros ainda nem sabem quem ele é nem do que é capaz. Só quando o Taumaturgo Bode fantasma lhes aparece pela frente fazendo “buuuuuuu”... As lavanderias de Brasília ficam cheias de calças sujas no dia seguinte.

Taumaturgo Bode é um fantasma capaz das mais impossíveis façanhas, deixando sempre dúvidas no ar. O apelido Bode deve-se a uma promessa de seus tempos de estudante. Se conseguisse formar-se na Universidade assistindo a tão poucas aulas por ter muito que fazer: Participar da política, ser jornalista, fazer bico na polícia. Seus amigos davam-lhe presença, faziam-lhe os trabalhos, davam-lhe cola nas provas. Já nessa época era muito admirado por fazer tanta coisa, mas ninguém sabia como “não fazia” nenhuma delas: tudo por ajuda de amigos que prometeu ajudar durante a sua vida. Lavavam-se bem as mãos entre si.

Conta-se que uma vez havia um candidato a um posto muito importante. Taumaturgo Bode fez de tudo para tornar-se seu suplente e tomar o seu lugar. Usando os favores que fizera e pedindo o pagamento desses favores, conseguiu o apoio necessário e conseguiu. O próximo passo era afastar o eleito. Uma pílula foi dissolvida no café e ele foi mandado para o hospital. Uma equipe médica competente tratou do eleito que logo se recuperou. Então recaiu. Depois de várias operações, chegou até a dar entrevista. Dois dias depois, durante a noite, entraram no quarto e fizeram o serviço. Bateu as botas, finou-se, morreu. Muitos viram Taumaturgo Bode no velório. Muitos juram que estava presente no enterro.

Dizem uns que foi o próprio Taumaturgo Bode que dissolveu as pílulas no café e pôs o eleito em contacto com os agentes biológicos. Dizem outros que apenas deu sinal com um acenar de cabeça para que alguém desse as ordens a alguém, que comunicasse essas ordens a quem executasse essas ordens. Outros disseram que foi a CIA. O certo é que o eleito morreu, e Taumaturgo ocupou o seu lugar.

Dizem até que é capaz de derrubar helicópteros sem tocar neles, só para abafar as tratativas para a aprovação de cláusulas em documentos importantissimos.

Mas nunca deixou rastro, nem mostrou o rabo preso. Tudo coisa de intrigas, dizem uns, que não é nada disso, outros e indecisos e que não sabem de nada, o resto.

Até que se descobriu que ele tem um grande competidor: Zeca Vamporra, um vampiro esfomeado, vingativo. Cada um atua do seu lado.


Rui Rodrigues


sexta-feira, 1 de junho de 2012

Minha última árvore




                                                         Minha última árvore!


Estamos em 2012, e começa a segunda metade do ano. Estamos em Junho. Olhando para os mares, vê-se que barcos japoneses continuam a caçar baleias “para estudos” e certamente não lhes jogarão fora a carne. Aqui, num lugar onde oliveiras não costumam crescer, acabo de plantar uma muda. Já plantei bastantes árvores em minha vida. Já mataram muitas baleias pelos mares deste mundo. Juan Carlos, um desses reizinhos tradicionais que ainda vivem por aí às custas da vaidade de alguns povos, sem o poder de outrora, caçou elefantes, gnus, animais selvagens, gastando o dinheiro de seus “súditos” como se ainda houvesse súditos, num momento em que a Espanha está com 50% de sua juventude desempregada, 24% de desempregados, a Cruz Vermelha Internacional pedindo ajuda para 300.000 que precisam de alimentos. Muitos e muitos espanhóis plantam árvores e não somente oliveiras.

O terreno onde plantei a muda é arenoso, mas sei que a oliveira é resistente, e com terra adequada, com bastante húmus que substitui pela areia como base, vingará. Um vizinho já teve uma. Cortou-a porque não teve paciência e nem sabia que antes dos cinco anos, não produzem fruto. Baleias também têm um período longo para atingir o estágio adulto e depois de fecundadas demoram bastante para parir.

Baleias morrem. Reis morrem. Oliveiras morrem. Tudo passa. Plantadores de árvores também morrerão, e há muito que plantar. Plantaram muitos eucaliptos, mas poucas árvores de fruto. As ruas das cidades quando têm árvores não são de fruto. São para embelezar, porque não conhecem a beleza das árvores de alimentar. Esses não são plantadores de árvores.

Em perigo de extinção, deveriam preservar as baleias que têm expectativa de vida muito menor do que as oliveiras. Estas chegam a viver milênios. Darei um nome a esta minha oliveira. Chamar-se-á Jubarte. Nós, humanos, os caçadores de baleias e os reizinhos duramos menos, mas temos algo que as oliveiras e as baleias não têm: A história. Temos a história para nos contar sobre o que fizemos e o que fazemos. Parece que, em sabendo ler, pudéssemos aprender com as histórias antigas a construir uma história cada vez mais humana e melhor, mas quem faz a história, pescadores de baleias, reizinhos e plantadores de árvores que embelezam, não estão preocupados com a história. Plantadores de árvores de fruto não fazem história. Passam a vida a reclamar.

Diziam antigamente que do caos Deus fez os universos e que estes são a sua grande Obra. Os que não acreditam em Deus, dizem que esta é uma grande Obra. Ambos estamos certos. Esta é uma obra maravilhosa que parece estar retornando ao caos como se fosse um ciclo de um circulo. Ciclo não é, que Einstein, um plantador de idéias, já descobriu que não. Este Universo está fadado a continuar com ou sem plantadores de árvores, com ou sem reizinhos assassinos de vida selvagem, com ou sem pescadores de baleias.
Seguirá sem mim. Já segue sem muitos e todos os que já passaram. A imensa maioria nem faz parte dos livros de história. Por pouco o mundo estará para seguir sem micos-leão dourados, e já ficou sem dodôs, sem preguiças gigantes, sem mamutes e sem tigres dente de sabre. Até os enormes e poderosos dinossauros se foram. Que importaria para os pescadores de baleia, os reizinhos caçadores de vida animal, ou os plantadores de árvores que só embelezam, que a vida se acabe, a cada dia mais uma espécie?

Que lhes importa se um dia esta humanidade acabar por falta de espaço, por falta das espécies que fazem parte de um ambiente sustentável, por falta de árvores que alimentem, e de baleias? Que ordem se permite neste mundo ou que desordem satisfaz aos que fazem a história e constam dos livros por fazarem a história?

Minha esperança é que a oliveira, que pode viver mais de dois mil anos, continue a viver para me contar um dia, se houver oportunidade. Mas isso depende dos senhores que fazem a história. Poderíamos ser nós a fazê-la, mas lhes delegamos a representatividade.

Chamei-a de Jubarte. Poderia chamar-se humanidade com mais razão!

A menos que participemos das decisões na história. Já!

Rui Rodrigues

quinta-feira, 31 de maio de 2012

AS CPIS DO MENSALÃO E DO CACHOEIRA,




AS CPIS DO MENSALÃO E DO CACHOEIRA,
E uma possível crise institucional.


Um amigo meu um dia me veio com esta: Eles ficam preocupados em matar formigas olhando para o chão, enquanto atrás deles passam manadas de elefantes...

Esta frase faz parte da diversidade de meus pensamentos vivos. É uma autêntica fauna, mas esta, em particular, carrega a carga genética dos pensamentos que nos despertam a atenção para o que realmente é importante, o que interessa.

É o caso das CPIS do Cachoeira e do Mensalão. Na NET assisto todos os dias a milhares de postagens de ambos os lados da polarização da moral e da ética: os da esquerda defendem o Mensalão, atacando a Cachoeira, os da direita atacam o Mensalão, defendendo a Cachoeira. Tratando-se de casos de justiça, deveriam, no meu entendimento de democrata participativo, unirem as suas forças num monopolo em torno da moral e da ética, e, portanto, ao lado da justiça.

O fato de defenderem o indefensável é preocupante, e se de um lado nos preocupamos com os conceitos que a moral e a ética possam adquirir no fogo ardente de corações partidários, preocupamo-nos também com a possibilidade de acontecer o mesmo com as CPIS, mas enquanto lá há divisões, aqui talvez não. Talvez haja acordos como aqueles da troca de espiões, do tempo da guerra fria, decidindo-se nos bastidores dos partidos, quais indiciados serão inocentados e, portanto libertos, os que serão isentos até de indiciamento, e os que serão abatidos no campo de batalha fictícia. Parece que estamos num rodamoinho social e institucional.

Não são as galinhas que sujam o pau de galinheiro, porque para elas, o pau está sempre como deve estar, e não conhecem o conceito de “limpeza”. Nós é que sujamos as mãos ao passá-las em paus de galinheiro...

Se pudéssemos atribuir nossos votos dados em confiança e, da mesma forma retirá-los, o assunto já estaria resolvido para os cidadãos, enquanto estivesse em curso a limpeza do galinheiro.

Rui Rodrigues.

quarta-feira, 30 de maio de 2012

O Brasil que gostaríamos de ter e a curva de Gauss




              O Brasil que gostaríamos de ter e a curva de Gauss 



Nunca algum governo agradou a todos os cidadãos da tribo, do reino, do império ou da república.  O grau de aprovação ou rejeição dos governos avaliava-se no passado, por informações verbais, com a intenção de coibir qualquer manifestação contrária que pudesse por em risco a manutenção da ordem ou do próprio governo. Em regimes fortes e ditaduras –todos são ditatoriais em maior ou menor grau de reconhecimento – a preocupação é esta. Em regimes democráticos fazem-se pesquisas de opinião de forma a poder determinar o mais exatamente possível como se distribuem as várias opiniões no sentido de buscar o seu atendimento e assim manter ou angariar mais cidadãos como simpatizantes do Partido que governa ou que concorre a eleições. Esses resultados são computados e traduzidos numa curva chamada “curva de distribuição de Gauss”. Basta olhar para essa curva para vermos o grau de sucesso ou do desastre de um candidato, de um partido, de um governo, ou de uma nação.

Nunca nos perguntaram que Brasil gostaríamos, nós cidadãos, de ter. Em decorrência, não podemos saber as respostas oficiais, reais. Mas podemos imaginar não só “o que queremos”, como também “o que não queremos”, independentemente de cor política, situação financeira, sexo, religião, grau de instrução, numa hipotética pesquisa realizada num universo heterogêneo representativo da população e da regionalidade brasileiras. Vejam se concordam com esta imaginação limitada a alguns aspectos tão simples como as funções do corpo humano, e imaginem se, no caso de ser feita uma pesquisa ou votação popular, não obteríamos pelo menos uma aprovação de 70% da população:

Universidades e escolas grátis para todos os cidadãos, pagas com os impostos exorbitantes que o Estado recolhe e distribui de acordo com as pressões dos políticos que representam seus partidos. A gestão será efetuada por três comissões: a dos alunos, a dos pais e a do governo, com igual peso e poder.

Implantação de Centros de Pesquisa para alunos selecionados de forma a poder suprir a nação - com tecnologia comum e de ponta - as necessidades do mercado, da saúde e da segurança nacional. Assim se evitaria a compra de aviões de guerra que logo ficarão obsoletos se já não o são, submarinos nucleares, porta-aviões velhos e decrépitos, pagamento de taxas por uso de tecnologia de terceiros em remédios, automóveis, equipamentos cirúrgicos, rádios, televisões, computadores.

Saneamento básico em todas as localidades, com água potável, energia elétrica, rede e usinas de tratamento de esgotos, rede de águas pluviais.

Postos e hospitais de saúde pública de qualidade, dimensionados em função da população local que deve atender para evitar mortes em filas de espera, médicos que têm dois empregos e não estão disponíveis para atendimento, fiscalização para evitar desvios de materiais.

Fiscalização vigiada e adequadamente dimensionada para garantir as áreas demarcadas como de conservação ambiental e recursos hídricos.

Até mesmo com o índice de analfabetismo existente em nosso país, e com deputados ou senadores que necessitam de um exame para verificar seu grau de alfabetização teríamos certamente uma bela curva de Gauss mostrando que 80% da população, senão mais, considerariam estes aspectos como fundamentais para se considerarem cidadãos felizes, satisfeitos em contribuir com seus impostos, ainda que exorbitantes e altos.

Mas para isso têm que perguntar. A resposta pode ser obtida de imediato, em menos de 24 horas se o fizerem pela NET. Mas nunca o fizeram, e não o fazem de forma “oficial”. Talvez tenhamos que modificar nosso foco de visão, e, em vez de nos preocuparmos com o que nos fazem, nos preocuparmos com o que não nos dizem, não nos perguntam e não nos fazem.

Talvez mesmo os sistemas que já conhecemos no passado e nas democracias atuais – todos eles – devam ser substituídos por um outro, novo, em que o cidadão tenha todos os dias, sem exceção, como quem escova os dentes, uma palavra a dizer, pelo voto, na construção do Brasil que queremos.

Rui Rodrigues
Escrito especialmente para o grupo Geopolítica.-FB

segunda-feira, 28 de maio de 2012

Os típicos tipos do FB


                                                    
                                                        Os típicos tipos do FB


Antigamente, há muitos anos atrás, rapazes e meninas saíam à tardinha para fazer o “footing”, isto é, a caminhada pelas calçadas na parte mais movimentada da cidade, para se mostrarem e poderem ser notados ou notadas. Vestiam-se as melhores roupas, mesmo emprestadas, os melhores perfumes, cabelos alinhados, sorrisos discretos ou abertos. Uma mostra na vitrine da cidade, uma tentativa de arranjar novos relacionamentos, quem sabe um casamento. Normalmente não era essa a imagem de cada um, ou de cada uma, no dia a dia, mas era preciso mostrar a melhor imagem possível – ou a mais descarada – para impressionar quem passava. Naqueles tempos algumas mulheres usavam até sutiãs com enchimento para dar mais um “volume”, e algumas ainda usavam espartilhos e cintas para adelgaçar a silhueta. A falta de respiração era muitas vezes entendida como um desejo quase irreprimível de elas se lhes lançarem nos braços. Muitos namoros e casamentos acabaram justamente porque no vestibular do relacionamento, muitos e muitas não passaram. Alguns usavam enchumaço na bragueta.

Os tempos mudaram e veio a “balada”. O mundo escancarou. A filosofia de vida é mais franca. Muito mais. Na balada a imagem é “estou aqui, estou a fim, sou assim mesmo. Vai nessa?”. E veio o FB.

FB não é a sigla do FBI à qual tenha caído a letra final. Mas tem muito de FBI, se atentarmos para alguns detalhes, a começar por nos querermos meter na vida dos outros e das outras, tentando descobrir os seus íntimos, as suas preferências, as suas tendências, se mente ou não, se está a fim ou não, se é crente, mais ou menos, complacente ou curte uma devassidão.  Como representatividade de uma sociedade humana, é pasto fértil para psicólogos de carteirinha, de plantão, ou dos que se acham. Os verdadeiros, calam, apreciam, vão na certa, ou constroem teses.

É também um baile de coreto, um baile de gala, uma balada, um centro de AAA – Auto Ajuda Anônima. Uns reclamam, outros gritam, alguns gemem, suspiram, riem, meditam, amam, execram, pescam, namoram, beijam, abraçam, ou exercitam os dedos apertando um só botãozinho: o de curtir. Ainda tem os que não dizem nada, só olham, e os que garimpam o que se espalha pelas postagens.

Tudo isso é muito normal. Somos nós como somos. E existem outros tipos que, também, absolutamente normais, têm características mais diferenciadas, como, por exemplo, os que gostam de cutucar. Nunca sabemos o que significa a cutucada, mas também ninguém pergunta. Cutuca-se para cá, cutuca-se para lá, e fica-se nisso anos a fio, sentindo uma vontade danada de dar uns “amassos” a quem nos cutuca, mas mantendo a linha para não perder a amizade.

Mas há outros tipos ainda.

Os crentes extremistas que não querem saber de conversas e afirmam com toda a convicção que é assim mesmo - e pronto - só lêem o que lhes interessa e quem diz o contrário do que pensam é descrente ou burguês, ou reacionário, ou comuna. O seu mundo é o mundo que deve ser e assim tem que ser mesmo que o mundo prove que não é nada disso que lhe interessa, que o que quer é liberdade, tudo pago, tudo fácil, tudo parado, sem se mexer, orando todos os dias, pagando impostos altos mais os dízimos, aceitando a corrupção como coisa normal, corriqueira e aceita, muitas baladas, muitas promoções, notícias leves na TV, nos jornais, nada de complicações, o seu céu na terra, a sua ideologia em bandeiras pelos ares. Nada de sair para as ruas para reclamar. Como está, está bom de mais, e se ficar melhor estraga.

Há os que não têm mais nada para fazer. Continuam não fazendo nada no FB. Clica aqui, clica ali, dá um curtir, come mais um biscoito, arrota e toma um refrigerante para arrotar mais, fechando a tubulação arrotativa com mais um biscoito. Há não... Estes não molham o biscoito nem elas dão o café com leite para que o biscoito se molhe todo.

Outros e outras nem colocam fotos para não chamarem a atenção. Nunca se sabe quem está por detrás de uma imagem sem foto personalizada, nem se a foto é do – ou da -responsável pelo perfil. São os fantasmas do FB que tanto podem ser camaradas como companheiros como diabos que vestem Prada, como Jack o Extirpador, ou mesmo algum presidente disfarçado. O Jô Soares jura que não tem nenhum perfil no FB, mas todos duvidamos disso.

Os arautos são sensacionais, como todos descritos até agora. Cedo, ainda de madrugada, levantam-se “pé-antepé” para não acordar a casa, nem o papagaio nem o cachorro, e vão garimpar as notícias do dia. São os primeiros a avisar das últimas e recebem os dois ou três cliques habituais de que viram, mas não leram. Aliás, o maior número de usuários é exatamente o dos que nem clicam, seguidos dos que clicam e não lêem. Não lêem nada. Só os títulos e as duas primeiras linhas. Os comentários ficam para eles mesmos, sem som ou imagem que nos chegue.

A maioria nunca foi a coreto e está largando as baladas para féicebuquear. Como propaganda é a alma do negócio, todos nos afirmamos pelas qualidades que pensamos ter, todos ocultamos os defeitos que sabemos ter, deixamos nossas pegadas nesta estrada virtual do FB que se move ao longo do tempo, na esperança dos paleontólogos do futuro venham a escavar e nos dêem, finalmente, o crédito póstumo que merecemos.

Então vamos todos féicebuquear antes que venha um novo site de relacionamento diferente, cheio de novidades novas. Nada de velhas novidades que abalaram os coretos da balada.

Rui Rodrigues. 

sábado, 26 de maio de 2012

Pensando na vida que proibem


                                         

                                                Pensando na vida que proíbem

Estava aqui a pensar na vida de quando tinha automóvel (sempre tive automóveis, muitas vezes o carro do ano), e de como tenho que ter cuidado com o acelerador (sempre bem calibrado) para não apanhar multas. Fazem os carros para andarem a 300 km /hora e multam a partir dos 120 (só nas estradas). Se não se pode andar a mais de 120 km /hora, que façam os carros com motores mais baratos para essa velocidade. Ou seja, pagamos motores caros para transitar como se tivéssemos motores baratos. Como o planeta precisa economizar, podem começar por aí. (mas acho que não são os governos que mandam. Deve ser alguém que precisa de dinheiro das multas). Meu filho, saindo de casa de bicicleta, chegava duas horas mais cedo no escritório do que eu. Trabalhamos juntos. Ele ia de bicicleta e eu de carro. Hoje vamos a pé, porque atropelam muitos ciclistas. Nossa educação viária não é nada evoluída.   

E pensei nos cigarrinhos que eu fumava. Proibiram e me envergonharam de tal modo que passei a fumar em casa, escondido, como se fosse um drogado em último estado de “delirium tremens”. Está certo que faz mal à saúde tanto quanto o ar poluído por veículos (aqueles que andam a maior parte do tempo a 40 km /hora que nem o trânsito engarrafado permite ir a mais, e se formos, multam...) E ainda subiram o preço dos cigarros, acabaram com a economia de Cuba que vendia charutos de luxo, acabaram com as famosas tabacarias. Alguém deve ter partido para o tráfico de drogas quer como fornecedor, quer como distribuidor, quer como consumidor. Pensei em fumar um baseado, desisti. Ser preso, amassado numa cela com os piores criminosos por causa de um baseado inocente é dose. Ainda podiam me deflorar por trás. E acho que o governo não manda tanto quanto desejamos, porque alguém manda mais. Alguém que está precisando de dinheiro e aumenta o imposto sobre o tabaco e permite a venda de drogas sem pagar imposto.

Solteirão, ou arranjo logo uma namorada ou terei que apelar para uma sex-shop, porque proíbem a prostituição. Quando não proíbem, vêm com tão maus olhos que fico envergonhado e não gosto de passar envergonhado na rua. (quem sabe até comprar uma bonequinha self-service daquelas japonesas que não falam mas fazem tudo e têm tudo perfeito. Como custam o preço de um automóvel, talvez seja melhor alugar mensalmente, mas parece que bonecas japonesas não se prostituem: cada dono tem a sua, não empresta, não aluga, dá tiro se alguém a leva emprestada por um dia...).Nem pensei em ser homossexual, porque apanham tanto que desisti. (não gosto de apanhar). Acho que o governo manda pouco e os fabricantes de bonequinhas e outros apetrechos se aproveitam de sua inocência (do governo, claro).

Pensei em tomar umas cervejas, mas estava na Inglaterra e só depois das 7 da tarde, e antes das 6 da manhã. Se fosse nos EUA poderia desde que a garrafa estivesse dentro de um saco de papel, mas sou ecológico e não é justo derrubar árvores para encobrir garrafas. A lei seca nos EUA acabou Agora existe a lei úmida de papelão).
  
Pensei em reclamar uma porção de coisas do governo, mas eles (os do governo, claro) escutam, anotam, recebem reclamações mas não atendem nada. (Fingem que não escutam, que perderam as anotações que nem as receberam).Proíbem-me de ser ouvido.

Tive que entrar para a igreja aqui do bairro, mas vou pouco lá (não posso dar cinqüenta paus toda a vez que vou ao templo. Entrei por pressão da sociedade. Se não entro, o bairro todo me olha sutilmente diferente. Senti-me proibido de não aderir). Devia haver uma lei para reduzir o dízimo para digamos... O víntimo! Assim sobrava mais uma graninha pro arroz e pro feijão, e pro leite das crianças. Proíbem-me de assistir gratuitamente às prédicas do templo e para ir para o céu tenho que pagar.

Antigamente havia urinóis espalhados pela cidade, mas acabaram com eles. Então passei a usar as casas comerciais na hora do aperto. Com a clientela do mijo, que entra nos bares, não consome nada, gasta água da descarga, agora começaram a dizer que o banheiro está entupido, que acabaram de passar água sanitária, que está em obras. Com a bexiga apertada, já fiz duas vezes nas calças e duas na mochila. Ônibus municipais não têm banheiro mesmo quando a viagem dura mais de uma hora. Desconfio que querem me proibir de mijar. Isto não sei a quem interessa nem para que serve, mas proíbem talvez por sadismo. Não arrecadam nada com o sadismo, mas têm o prazer de proibir. Deve haver uma indústria do proibir. E em todos eles lá está: Proibido jogar papel no vaso. Porque não usam torneirinha?

Na NET, nem pensar em copiar imagens, baixar filmes, músicas, sem pagar – e não é barato. Proíbem tudo na NET e o sinal da Vivo, da oi, da Tim, da Claro não é sinal, é bip de Sputnik. Pagamos uma grana alta e dão-nos bips. Proíbem assim o acesso à Internet porque depois de dois minutos esperando para mandar o e-mail, a maioria levanta da cadeira e larga o computador falando sozinho. O acesso á Internet é livre, mas vai usar para ver se pode!...

Antigamente jogava-se em cassinos. Eram mais honestos e podíamos jogar. Proibiram os cassinos mas não o jogo (eles , os do governo, claro, dizem que proibiram o jogo, mas é mentira... existe uma catrefada deles com chances de um para muitos milhões, que são aprovados. Parece existir um novo conceito para o que é jogo honesto, que desconheço). Como não tenho alternativa, sou obrigado a jogar nas “raspadinhas”, nas senas mini ou mega, nos jogos de futebol em que árbitros trocam o nome da mãe. Havia um jogo de rua que era muito divertido por ter uma porção de bichos. Publicavam o resultado no poste. Acabaram com esse jogo e o transformaram em contravenção. Proíbem-me de jogar exatamente os melhores jogos de sorte e me obrigam a jogar nos jogos de azar. Alguém por aí, que desconheço (só pode ser o governo), seleciona quem lhe paga e quem não paga muito (por que todos pagamos alguma coisa para o governo), e em função disso, lavra a lei.

Outro dia fui ao Banco e esqueci a senha. Veio uma moça muito simpática para me ajudar no caixa eletrônico. Um sujeito que estava por perto ouviu a minha conversa com a moça, usou o celular e na saída me assaltaram. Não havia nenhum guarda de Banco do lado de fora para me defender. Só do lado de dentro para defender o Banco. Sinto-me proibido de acreditar em alguém e muito menos no Banco. Foi no Itaú!

Deve haver uma multinacional que vende proibições, porque é sempre o mesmo em toda a parte para onde vou. Não permitir é o mesmo que proIbir. Não disponibilizar, é o mesmo que proibir.

Rui Rodrigues

sábado, 19 de maio de 2012

A trabalho em Angola - 1990- 1993





Em 1990 trabalhava como gerente geral de uma empresa em Lisboa  a SPRI- Bralusango, que tinha interesses comerciais diversos em Angola.  Eu tinha que ir lá pelo menos 90 dias por ano. Nesse ano especificamente, a luta entre a FLNA e a UNITA de Jonas Savimbi ainda estava em plena atividade. Os soldados cubanos já não eram necessários e estavam de saída com suas máquinas de guerra pintadas, reluzindo como novas alguns diamantes nos bolsos dos soldados, armas lubrificadas como novas.  Aviação da África do Sul atacava esporadicamente e nesse ano não atacou duas vezes. Tínhamos alojamentos ao lado do de uma empresa do Brasil – Furnas - onde encontrei um primo de minha ex-mulher e um antigo colega de Universidade que assumia também como gerente geral na assessoria de construção de uma enorme Barragem: Capanda. Destinaram-me um quarto num apartamento da companhia, do qual declinei por achar que seria melhor o contato diário com o meu pessoal.

Dois dias depois de chegar a Angola, dois técnicos estavam no hospital. Um deles salvou-se, o outro faleceu num ataque relâmpago de febre amarela: tomara a vacina apenas dois dias antes de sair de Lisboa.

Como tinha que viajar à cidade do Namibe – antiga Moçâmedes – para avaliar a reforma do Grande Hotel da Huíla e a possibilidade de outras obras, marcamos o vôo  para um domingo às sete da manhã. Teria tempo suficiente para conversar com o nosso staff que residia na cidade e se possível fazer alguns contatos.  Sexta feira porém, logo pela manhã, em conversa com o dono da Empresa, resolvi viajar segunda feira. Ele tentou demover-me da alteração, mas expliquei que ainda havia trabalho para fazer no sábado. Descansaria domingo e como o vôo chegaria às 8:30 á cidade do Namibe, teria tempo para estar nas repartições públicas ao abrirem. Então me convidou para comer umas lagostas em sua casa na ilha de Luanda no domingo. E fui. Lá estava eu na praia esperando a lancha, quando a vi vindo em minha direção, o Dr. Graça Oliveira brandindo um jornal na mão e rindo.

Ainda na lancha ao aproximar-se me perguntou se eu tinha lido os jornais. Disse-lhe que não. Rindo deu-me um grande abraço e disse-me:

- Sabe, sr, engenheiro? O avião em que o sr deveria estar hoje de manhã, foi abatido por um foguete da UNITA. Não se salvou ninguém...

Comemos as lagostas, falamos sobre outras coisas e quando me levou de volta à praia, já sabia que segunda-feira iríamos de automóvel: Eu, dois engenheiros e um técnico de arquitetura. Tive que lhes explicar que entre apostar em avião e carro, preferia o carro que estava sob meu comando. Avião não. E com “salvo conduto” lá fomos nós, manhã cedo. Uns rezando entre dentes, um tremendo, e outro assobiando. Todos éramos casados, tínhamos mulher e filhos.

Chegamos à Serra da Chela pelo meio da tarde. Não vimos pelo caminho nenhum posto de guarda, nenhuma patrulha. Somente alguns autóctones, raros, que saiam da selva, onde havia, para ver aquele citroen branco, com embreagem de alavanca, passar zunindo como o vento pela estrada empoeirada.

Quando chegamos ao Hotel, o gerente olhou para nós admirado, e nos contou que na estrada em que passamos, um pouco antes da subida da serra da Chela, dois carros tinham ido pelos ares e 11 pessoas haviam morrido... Quando retornei a Luanda uma semana depois, a rota da TAAG já tinha sido alterada: os aviões iam e voltavam a Luanda por uma rota em “U” caminho do mar. Jonas Savimbi não tinha marinha. Voltamos de avião.

É evidente que pelo custo benefício, com tão alta taxa de risco eu não podia ser valente todos os dias.  Pedi demissão em meados de 1993 e estou aqui para contar a história em 2012.

Rui Rodrigues

Porque a crise mundial não termina antes de 2018.



Porque a crise mundial não termina antes de 2018.
(Oxalá não seja antes de 2028)





Há séculos, centenas deles, que se sabe que quem tem dinheiro são os Bancos. Eles que sempre tiveram dinheiro.

Quando em 2008 os banqueiros foram aos governos para lhes pedir dinheiro porque estavam passando por uma situação “difícil”, os cidadãos deste planeta pasmaram... O seu dinheiro de impostos estava sendo “emprestado” de pai para filho pelos governos, o pai, aos seus filhos banqueiros, que não sabiam lidar com o motivo principal de sua existência: o dinheiro.

Tão absurdo isto parece ao mais distraído cidadão, que aos poucos o povo começou a ganhar as ruas em protestos.

As empresas que analisam a liquidez dos bancos, vieram a público para desvalorizar a liquidez dos Bancos, e por tabela dos respectivos países onde atuam. Isto só contribuiu para o descrédito no sistema política x economia x bancos.

Sabe-se que existe corrupção em todo o planeta, mais nuns menos noutros, e certos governos têm maior ou menor capacidade de administração. A Islândia foi o primeiro país a estar à beira da falência devido à crise. Não se tratou de capacidade de administração nem de corrupção. Simplesmente pelo total reduzido de capital de giro proporcional à população e sua capacidade de gerar dinheiro, qualquer flutuação no mercado poderia gerar uma crise interna. Em 2008 não houve apenas uma flutuação, mas uma crise muito grande, com influência global. Seguiram-se Espanha, Grécia, Portugal, Irlanda, como os mais afetados: gastavam mais do que podiam. A Grécia está hoje no centro das atenções, porque não consegue formar um governo que atenda simultaneamente ao mínimo que a população pode suportar e a obrigação de pagar os empréstimos ao FMI e ao Banco Central Europeu.

Mas apenas a Grécia?

Na minha opinião, não. Com a crise instalada, o consumo interno diminui por falta de dinheiro. Os serviços públicos diminuem de eficiência por falta de verbas. Lentamente, dia a dia, a situação se agrava. Novos empréstimos serão necessários porque os Bancos, em plena crise, retêm o dinheiro que para de circular. Empresas fazem o mesmo, e os governos temem criar novos impostos. Outros países passarão pela “síndrome da Grécia”

Estamos como peixe encurralado numa armação de pesca... Falta de dinheiro gera diminuição de consumo, que gera falta de empregos, que gera diminuição das importações, que gera diminuição dos preços ao consumidor, que gera diminuição de recolha de impostos...

É um ciclo crítico.

O que hoje se passa na Grécia se estenderá a Portugal, Espanha, Irlanda e demais países da União Européia e por tabela aos países em desenvolvimento que terão de reduzir suas exportações, e vender mais barato as matérias primas que exportam.

Quanto tempo demora então para voltar à normalidade? Melhor ainda: O que fazer para voltar à normalidade?

Esta é a segunda vez na história recente que acontece uma crise deste tipo: em 1929 que só terminou com o inicio da segunda guerra mundial, em 1939. Terminou realmente em 1945, porque a guerra em si já era produto da crise de 1929. Para que uma crise termine é necessária a retomada de confiança do mercado. O mercado não pode retomar a confiança por decreto.

É necessário tempo para o mercado acalmar e a confiança ser retomada. Estamos, pelos vistos, numa primeira fase da crise que começou em 2008. Quatro anos passados, a União Européia está num processo de agravamento de crise, com governo atrás de governo caindo e sendo substituído por outros que, tal como eles, não podem resolver por si a situação, pelos problemas enunciados que dependem de “mercado”.

Quando a economia mundial regredir a níveis que permitam menores salários, menores níveis de consumo, menores lucros, então poderá voltar a crescer. O crescimento da economia global, tal como a altura média da população, tem limites. Não pode crescer indefinidamente como crêem os que apostam na bolsa...

A economia mundial estava inchada, gorda, concentrada na camada de gordura da pele bancária e das mega-empresas, que ditavam aos governos o que desejavam que fizessem. Os governos fizeram, mas exauriram a confiança de todos e deles mesmos.

Temos agora uma crise econômica e uma crise política em que o próprio sistema está em xeque...

E tudo isso não se conserta até 2018...  E 2028 parece uma data mais provável... Até lá escutaremos arautos de governos anunciando boas novas que de velhas já conhecemos como limitadas. Mentirão. Até que sintamos que falam a verdade, a crise continua por falta de confiança...

Rui Rodrigues