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sexta-feira, 3 de agosto de 2012

Sentidos com sentimento que fazem sentido



Sentidos com sentimento que fazem sentido

É muito pouco para um ser humano viver sua vida do dia a dia sem tempo para se situar num contexto de vida num meio vivo, como parte integrante deste planeta que viaja pelo espaço sem ir para lugar nenhum que não seja o de sua galáxia, sempre mantendo distâncias relativas a outros astros, voltando a trilhar os mesmos caminhos por anos, séculos, milênios, parsecs. Pelo menos neste sistema solar da Via Láctea a Terra é única e só, e nem por isso é triste.

Muitos de nós vivemos sós e tristes sem nenhuma razão para isso. Absolutamente nenhuma. Se somos tristes é porque não descobrimos o mundo em que vivemos e que nos pode dar tantas alegrias. A razão principal de nossas tristezas é a falta de mobilidade, de migração de coisas que antes nos davam alegria e que agora, por um motivo ou por outro não queremos ou não podemos ter. Nestas ocasiões, um movimento no sentido de buscarmos novas alegrias é fundamental para buscarmos novamente a felicidade.  

Para quem nunca teve um amor, buscar um pode ser uma mudança fundamental de tal ordem que ao consegui-lo e depois olhar para trás terá a sensação de que perdeu muito tempo na vida, mas que valeu a pena mudar. Para quem nunca teve o conhecimento de certas matérias que se aprendem nas escolas porque nunca as freqüentou, certamente encontrará felicidade no conhecimento. E para quem já teve tudo mas não teve tempo para olhar à sua volta porque estava muito ocupado ou ocupada, há certos momentos na vida em que o tempo disponível permitem olhar para si mesmo e para o mundo em que vive.

Carlos teve uma “parada reflexiva” certo dia em sua vida de casado. Olhou para trás e não gostou do que viu. Filhos criados e formados, um patrimônio razoável, encerrou sua carreira como “pater família”, dividiu os bens, despediu-se da mulher e dos filhos e foi viajar. Na volta, passados cerca de 4 anos, construiu uma casa á beira da praia e foi pescar. Numa ida ao supermercado comprou umas belas mangas, mamões. Passou numa floricultura e comprou duas mudas de bananeira, um limoeiro. Das sementes de manga e de mamão, plantou algumas que brotaram. Passados oito anos, que passam muito rapidamente, colhe mangas, bananas, limões, cajus, graviolas, cana de açúcar, e de vez em quando algumas mandiocas. Num cercado cria algumas galinhas, tem uma gata e um cachorro castrados. Anda pela praia colhendo conchas e pescando peixe ou siris que complementam o super mercado. Para quem conheceu quase o planeta inteiro em viagens a trabalho ou por laser, a sua felicidade está no planeta que só agora teve tempo para olhar. Há quem vá uma, dez, cem vezes a Paris, passe sempre pelas mesmas ruas e monumentos e não veja nada do que pensa ver, porque não sabe o que ver, como ver. É como ver fotos sem história, sem áudio visual. Pode passar por Notre Dame sem saber a sua história pela Torre Eiffel sem saber dos detalhes técnicos e históricos de sua construção.

Até então tinha vivido numa casa a que chamava planeta Terra e não conhecia nem a sala nem o banheiro nem a área de serviço apesar de tudo o que via e pensava conhecer. Não lhe prestava a atenção devida, sua felicidade consistia em ter coisas que se perdem todos os dias, que passam de moda todos os dias, que não valem nada amanhã, e o amanhã já é hoje, e o hoje já passou para ontem.

Ao caminhar pelas ruas, já sabe quem tem problemas, quem está feliz, quem está amando, quem busca o amor. Antes eram apenas pessoas que viviam a “sua vida” e somente conhecia mais ou menos quem convivia com ele. Hoje Carlos aprecia o cantar dos pássaros que lhe cantam sinfonias pelas manhãs; o galo cantador que o acorda de madrugada. Tem contato com seus amigos e amigas de forma esporádica. Busca nos livros de ciência o aprendizado do que desconhece. Há flores nos campos, pessoas interessantes em qualquer lugar com quem se pode conversar de acordo com o seu nível de conhecimento e todas são interessantes porque cada uma delas tem uma história diferente para contar, desejos diferentes, sonhos diferentes. Algumas se tornaram suas amigas, e o idoso ou idosa desprotegidos que encontra pelas ruas por vezes esconde um passado que já foi seu. Não raro são pessoas com profundo conhecimento da vida que se desiludiram mas não souberam ou não optaram por descobrir o planeta para a vida, mas para o esquecimento. Muitos por falta de apoio ou desilusão.   

Hoje, sim, Carlos se julga um “self made man”, aquele que se fez na vida, cozinha, lava, passa, limpa, cultiva, cria e vive em sociedade da qual depende o mínimo necessário. Ama quando há oportunidade. Quando não há, reserva o amor para quando vier.



Rui Rodrigues

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