Arquivo do blog

domingo, 19 de agosto de 2012

A super-heroína da décima dimensão



A super-heroína da décima dimensão

Dizem os expert em física quântica que nosso universo tem 11 dimensões, sendo quatro delas perfeitamente definidas e as outras sete pequenas e enroladas. As quatro conhecidas são o espaço contendo três dimensões – comprimento, largura e altura - e o tempo, associado de forma inseparável das outras três, que constituem o espaço. Mas não sabemos que dimensões são essas nem as suas características, porém temos razões de sobra para acreditar que existem, porque os físicos não erram muito. Sabemos algo mais. Quem nos conta é Castrina, uma viajante do Universo. Mas para melhor entendermos como são essas “pequenas” dimensões, que assim mesmo são imensas, olhemos para uma caneca com alça. Abstraindo-nos do tempo, vemos perfeitamente as três dimensões no corpo da caneca. A alça seria uma dessas dimensões “extras”. Vemos que a alça tem dois pontos comuns ao corpo da caneca – o nosso espaço tempo que sentimos e vemos - e que também fazem parte dela. É nesses dois pontos comuns que se fazem certos tipos de troca de informação. Como “informação” podemos considerar a passagem de partículas, ondas, corpos de qualquer dimensão. A física quântica também nos diz que a probabilidade de alguma partícula passar dessa dimensão (a da alça) para o corpo da caneca é ínfima, mas que se esperarmos o tempo suficiente, acontecerá e poderemos estudar esse fenômeno. Como este Universo tem um tempo finito de existência dentro de um “universo” de universos de tempo infinito para trás no tempo, tal passagem de dimensão estaria mais do que na hora de acontecer.

E que aconteceu com Castrina. Foi numa tarde de Outono quando as folhas das árvores caem tingindo o chão de cores pastel de marrom e amarelo, o vento faz rodamoinhos levantando-as e a chuva cai intensa alagando estradas, campos, cidades. Certos fenômenos passam desapercebidos e criaturas podem passar de uma dimensão para outra sem deixar rastro. Umas esfumam-se na neblina. Outras sofrem metamorfoses e logo se juntam a nós sem qualquer diferença aparente. Uma só, tanto quanto sabemos, se materializou tal como era na outra dimensão. Quando o raio caiu perto da torre da Igreja sem fiéis, que agora era usada como museu, e a fumaça se esvaiu no nevoeiro, lá estava aquela figura, com um joelho no chão, o outro dobrado, curvada sobre si mesma, um cotovelo sobre a perna dobrada, a mão esquerda tocando o chão para se apoiar. Seu corpo ainda fumegava, brilhando por pequenos raios azulados que lhe percorriam o corpo. Primeiro pensei que fosse alguém atingido pelo raio, mas quando olhou na minha direção, percebi que era um ser estranho. Respirava normalmente. Não tinha qualquer meio de se mimetizar ou adquirir nossas formas. Tinha mãos com garras como se fossem de águia, pés e mãos com quatro dedos, cabeça um pouco grande, totalmente imberbe, pele aveludada ligeiramente azulada, veias esverdeadas. Podia considerar-se um ser agradável, embora tivesse os dentes pequenos. Ria facilmente e aprendeu nossa língua, o português em dois dias de convivência na casa onde a escondemos da mídia. Seus alimentos eram tão similares aos nossos, conforme contou, que não houve preocupação alguma quando preparamos a comida. Comeu com parcimônia. Gostou do vinho, preferindo sucos e água. Minha amiga Ivone que trabalha numa clínica tratou de analisar o sangue de Castrina. Incrivelmente semelhante ao nosso, as células reprodutivas com 48 cromossomos. Grande probabilidade de cruzar-se com homens e vir a gerar filhos. Mas Castrina tinha outras intenções; queria voltar para a sua dimensão onde estava sua Galáxia, seu sistema solar, seu planeta, seus familiares, amigos, sua vida.

Aquela dimensão extra de onde vinha tinha certas características diferentes. Tal como na corrente elétrica, onde temos a corrente alternada e a contínua, lá era o tempo que podia ser alternado ou contínuo. Ou seja, aqui na terra, o tempo parece fluir numa só direção, sempre para o futuro, tal como na corrente elétrica contínua, mas lá, na sua dimensão, Castrina podia usar o tempo, fazendo-o ir e voltar, não só rumo ao futuro mas fazê-lo voltar para trás ou mesmo congelá-lo pelo tempo que desejasse. Além disso, ela é muito inteligente. Para poder andar pelas ruas sem sermos incomodados, criamos um traje especial para ela: Um traje de médica, com luvas e máscara para que não reparassem muito em suas características. Uma boa maquilagem resolveu o problema da pele.

Percebi seus super poderes quando um dia passamos pela rodoviária Novo Rio, no Rio de Janeiro. Íamos para S. Paulo e vimos pessoas carentes nas imediações. Eram carentes de residências, de dinheiro, de amor, de vontade de progredir, pessoas abatidas pelas forças ocultas da sociedade que não lhes permite melhor vida, e algumas derrubadas pelas drogas, mas sobretudo carentes de amor e de oportunidades. Contei-lhe o caso de um casal de mendigos que encontraram uma bolsa com bastante dinheiro dentro o haviam devolvido ao dono. Este, em reconhecimento lhes deu postos de trabalho em seu mercado, tirando-os daquela vida. O que eles precisavam era apenas de amor, compreensão e de uma oportunidade. Há muitos assim pela vida, quase todos, mas não encontram dinheiro para devolver todos os dias e sem isso a sociedade não os percebe e passam indiferentes pensando para si mesmos: Deus me ajuda porque não estou na miséria como eles.  Não entendem que Deus não cuida dos bens materiais nem recebe dízimos. Isto é coisa de quem não conhece Deus.

Castrina então se sentou ao lado de uma família de mendigos, debaixo do viaduto, perto de uns containeres de lixo, e falou com eles pondo-lhe as suas mãos sobre a cabeça. Em breves minutos, não mais do que cinco ou seis, os mendigos levantaram-se. Olharam para ela, mas sua postura era diferente. Agora já não eram mendigos. Apenas estavam vestidos de mendigos. Sua postura, seu olhar era completamente diferente. Pegaram uns trocados que tinham no bolso, talvez uns cinco reais e foram tomar banho na rodoviária. Sua vida começara a mudar naquele instante. Deixariam em breve a pobreza e a miséria. Castrina me disse que como todos sabíamos, a educação é a base das atividades de sucesso de uma sociedade. Depois se adquire a postura, o modo de falar, e se adquire a segurança de expor as necessidades e de obter sucesso. Uma sociedade educada não elegeria os governantes que tem. O mundo seria outro. O que mais se inibe neste planeta é o conhecimento e se usam os mais torpes motivos, a maioria inventados, para afastar todos aqueles que têm boas intenções e expõem suas idéias contra os que se aproveitam da ignorância para governar o mundo da sua forma. Quando voltamos de S. Paulo, uma semana depois, fomos até debaixo do viaduto e já não vimos aquela família. Ao apanharmos um táxi, o motorista era o chefe de família que ela tinha “abençoado”. Digo abençoado, porque é o adjetivo que melhor se coaduna com os fatos, em meu entendimento.

Pediu-me um dia que a levasse a uma cracolândia. Segundo ela, nosso corpo pode produzir todas as drogas neuronais que provocam a sensação de felicidade. Aquelas drogas que tomam são muito fortes e causam dependência. O segredo da felicidade está na nossa vontade de sermos felizes e na nossa educação. Levei-a numa cracolândia que ainda existe nos subúrbios do Rio. Era de dia e embora quer o governo estadual ou o federal soubessem de sua existência nada fazem para acabar com essa situação, como se fosse inquestionável a impossibilidade de resolvê-la. Então Castrina  juntou-se a um pequeno grupo e fez o mesmo que eu já havia presenciado sob o viaduto da Rodoviária Novo Rio. Enquanto falava, passava a mão pela cabeça dos dependentes químicos. Quando acabou, uns dez minutos depois, esse grupo de umas dez pessoas, levantou-se, jogou fora os cachimbos, as colheres e os isqueiros, e já não eram os mesmos. Sua postura era ereta, o olhar confiante. Saíram cada um para o seu lado. Podia adivinhar-se que daí para a frente seriam outras pessoas que não se deixariam abater pelo sistema, que dizem democrático mas que não o é, porque o povo não pode votar sua opinião. Vota como quem come um prato feito que lhe dão para comer quando estão com fome de democracia, geralmente de quatro em quatro anos. 

Não sei onde anda Castrina, porque desapareceu de nossas vidas há uns dois anos, mas encontrei alguns ex-dependentes químicos daquele grupo que ela “abençoara”. Um deles tinha sua loja de comércio de artigos importados da China, uma garota cantava em todas as rádios da cidade, um garoto era atleta num importante clube da cidade. Castrina nos contara que lá, em sua dimensão enrolada e pequena, embora grande, mas dentro deste Universo, crêem num Deus construtor deste e de outros universos, mas não conhecem Buda, Maomé, Jesus Cristo, Moisés, nem Vishnu, nem nenhum destes deuses ou profetas em que se acredita neste nosso planeta. Lá acreditam que a unidade faz a força, a educação faz a vida, o amor constrói tudo na vida.

Rui Rodrigues


Nenhum comentário:

Postar um comentário

Grato por seus comentários.