Minha admiração pela “Ladeira abaixo 10”
Fui criado por uma década e meia num país sob influência de três outros: Portugal sob influência do reino Unido, da França e da Alemanha. Ah! Aprendi muita coisa que não posso nem quero desprezar. Depois fui conhecê-los pessoalmente, mas já tinha a experiência do convívio com americanos, austríacos, alemães, japoneses, brasileiros, colombianos, holandeses, gentes de todos os continentes. Bebi os ambientes sob a luz da minha experiência pessoal, mas, sobretudo, pela da história destes países. Não escondo minha simpatia preferencial pela Inglaterra. Porque ela foi a mais colonialista de todas as potências mundiais? Claro que não, mas reconheço que cada momento da humanidade valida e explora o que é válido. O colonialismo era válido, e a Inglaterra o utilizou, mas se fossemos analisar esta forma de exploração da humanidade, teríamos que perguntarmo-nos que sentimentos levaram a França, a Holanda, Portugal, a Alemanha, a Itália, a Bélgica, a colonizar onde puderam e como entendiam. Ninguém se pode rir de ninguém, chorar mais do que ninguém. Com o advento de novos conceitos de humanidade, o colonialismo acabou, isto é, modificou-se. Agora se exploram pessoas, países, sem a necessidade de ocupá-los, através de redes comerciais que se sobrepõem á política. Mas lá vem a minha admiração pela Inglaterra: É o único país ex-colonialista que mantém suas ex-colônias em torno de si com bases sólidas através de língua e costumes comuns, além de um certo charme de pertencerem a um aglomerado que tem uma rainha e em breve terá um rei, cheios de tradições, e que a indústria cinematográfica ajudou com filmes de espiões, de 007, e conjuntos como os “The Beatles” que lhe deram fama. Sem falar no elegante chá das cinco da tarde. A Torre de Londres, as cabines telefônicas, o Big-Ben, a guarda da rainha e o rio Tamisa dão-lhe o toque visual imprescindível. A fleuma britânica é famosa, o Whisky uma lenda. Mas é só por isto que a Inglaterra me é mais simpática? Claro que não. Afinal, Portugal tem uma aliança de mais de 800 anos com ela, e na independência do Brasil, quem foi contratada para defender o Brasil? A Inglaterra! Afinal fora ela mesma que ajudara D. João VI em sua fuga estratégica para o Brasil onde manteve unidos os Reinos de Portugal, Algarves e Brasil. Tudo interligado e unido por laços históricos. Mas só por isto ou por algo mais?
Pela sua política interna e externa. Veja-se que nem faz parte do Euro porque tem visão de macro-economia e sabe que no dia em que entrar, se entrar, será de forma segura, sem comprometer seus cidadãos nem sua monarquia. A monarquia inglesa é extraordinária, comedida, ilustrada, longe, muito longe de por exemplo a monarquia do rei de Espanha que chega a ser ridícula por suas intervenções no cenário internacional, suas caçadas a animais selvagens em África, sua falta de brilho e aparentemente de inteligência. Na minha opinião, a haver rei em Espanha melhor seria se fosse a esposa dele. É esse comedimento, essa sensibilidade para a coisa pública e para o cenário internacional, que me leva a admirar a Inglaterra. E é com certo humor que entendo onde fica a sede do governo britânico, a do primeiro ministro: Down Street 10, o que traduzido para o bom português significa “ladeira abaixo 10”. Ou seja, o primeiro ministro tem que entrar e sair de sua residência com a leve sensação de que seu posto depende da vontade popular traduzida pela Câmara dos Lordes e da Câmara dos Comuns, e que sua tendência é “descer” a ladeira do governo se não se comportar adequadamente. De notar que a sede do Governo é em plena Londres, convivendo com a população, e não é raro que os políticos atravessem a cidade usando transportes públicos, dirigindo táxis, andando pelas ruas amiúde, para saberem da população, pessoalmente “como vão as coisas”. O que é muito diferente de um Planalto, por exemplo, onde as leis protegem políticos que, mesmo roubando descaradamente, são mantidos no posto. Ora isso, não é nem nunca foi uma democracia, é uma perpetuação de políticos, nada muda, “o povo que se dane porque o presidente é comandante”. Governos do planalto não caem, e se um presidente cai, o resto fica por lá para o reconduzir ao poder mais tarde quando a população tiver esquecido os escândalos em que se meteu. Ora isto também nem sério é. É um joguinho de poder onde o comandante sempre ganha e o povo sempre perde. Até a votação é obrigatória, mas só de quatro em quatro anos e pretendem estender isso a muito mais, que se pudessem seriam eternos no poder. Embora não seja uma democracia perfeita[1], a democracia britânica é das melhores deste planeta.
Pela Down Street 10 [2]passou muita gente que ficou famosa. Uns ficaram e foram reeleitos, outros ficaram por pouco tempo, mas sempre mantendo a Commonwealth [3], constituída por 53 países, na qual até uma ex-colonia portuguesa foi admitida: Moçambique. Passaram por lá Churchill, Thatcher, e muitos outros. Agora é a casa de David Cameron. A história da Down Street 10, não é apenas a história do edifício em si, mas é a história da Porta da frente e do Hall, da Sala do Gabinete, das escadarias, da Sala de Estar, da Sala de Jantar, da grande cozinha, da pequena sala do café da manhã, do Terraço e do jardim, mas principalmente da vida atribulada de seus habitantes mais famosos, preocupados com o bem estar de seu povo, envolvidos até o pescoço em difíceis cenários de guerra. Queiram ou não, Portugal lhes deve muito pela amizade e pela ajuda em momentos críticos como nas guerras peninsulares contra Napoleão, o francês careca, barrigudo, baixinho, que andou amedrontando meia Europa e acabou preso por duas vezes, encarcerado em duas ilhas, uma delas doada por Portugal á Inglaterra como dote de casamento. A França de Napoleão e a Alemanha do Keizer Guilherme e de Hitler, deixam minhas barbas brancas de molho.
Governar na Inglaterra é coisa muito séria. Governos podem rolar ladeira abaixo a partir do número 10...
God save the Queen,
Kisses Elisabeth!
Stay alive!
© Rui Rodrigues
[1] Democracia perfeita é quando o povo vota em tudo sempre que desejar, diariamente se lhe for interessante ou possível. Ver em http://conscienciademocrata.no.comunidades.net/.
[3] Ver lista de países emhttp://pt.wikipedia.org/wiki/Anexo:Lista_de_membros_da_Commonwealth
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