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segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

Era uma vez no Oeste... A história de Jonathan Jackson

Era uma vez no Oeste...
A história de Jonathan Jackson



Bird’s-Eye é uma pequena cidade nas Montanhas Rochosas do Idaho. Tinha um salão, um Banco, uma estação de telégrafo perto da estação das diligências, bem ao lado do escritório do Xerife onde fica a prisão, lá bem nos fundos do escritório. 
O Banco não valia a pena assaltar porque o máximo de valor de transações comerciais na cidade não ultrapassava os mil dólares, ou seja, o total das retiradas dos clientes era de mais ou menos 500 dólares que correspondiam a outro tanto de depósitos. Um grande negócio porque o Banco não usava o seu próprio dinheiro nem quando emprestava. Emprestava o dinheiro dos próprios clientes. No salão três putas americanas, uma mexicana e uma francesa. 
O pianista, a esse nunca ninguém se preocupava em perguntar onde nascera, porque ninguém escutava música quando visitava o saloon, principalmente depois de ter tomado um par de garrafas de whisky. Eles tomavam facilmente duas garrafas, porque já na segunda dose era misturado com água. Assim pagavam mais e ainda se vangloriavam de aguentar muita bebida. 



Jonathan Jackson era de lá, trabalhava num rancho das redondezas, conduzia gado até Montana, não tinha conta no Banco e conhecia todas as putas. Ele e o pianista. Sonhava comprar um rancho, mas como isso iria demorar muito, ia se divertindo no saloon para passar o tempo. Só para tirar onda, uma vez por mês comprava um jornal, sentava-se numa cadeira sob o balcão de uma casa, esticava as pernas para descansarem no peitoril, puxava a aba do chapéu para trás e enquanto lia as notícias e mascava seu tabaco, deitava os olhos pelas moças que passavam. Cumprimentavam-no por cortesia, não porque o conhecessem. 


Era raro conversar com alguém. Nem mesmo no saloon. Entrava, dizia meia dúzia de palavras, escolhia a moça e levava para o quarto. Pedia uma garrafa de whisky e sempre se preocupava em deixar um par de goles para a moça. Depois voltava para o rancho. Tomava banho às sextas, no rancho, de um regador furado e dependurado do teto do galpão com sabonete comprado no armazém para tirar aquela inhaca de égua xucra no cio e de poeira cravejada de partículas de bosta de vacas de transumância.

Naquele dia não nevava embora a rua estivesse cheia de neve do dia anterior e dos telhados ainda escorresse alguma. Pés esticados sobre o peitoril lendo o jornal deteve-se numa notícia: Franklin Roosevelt tinha rancho em Idaho e andava por lá de visita. Bem ao lado uma foto de Calamity Jane e um anuncio de recompensa para quem a levasse viva ou morta a qualquer escritório de qualquer xerife. Franklin Roosevelt viria a ser o presidente dos Estados Unidos da América do Norte, mas Jonathan Jackson não sabia disso. Ninguém sabia ainda, porque corria o ano de 1899 e Franklin só seria presidente nos primeiros anos da década de 40. Jonathan esperava a diligência que traria uma nova puta para o saloon. 
Ficara sabendo da notícia lá em Three Island Crossing quando atravessava reses na semana anterior. Fora o pastor que era também o dono das reses quem avisara em tom de crítica. O pastor dissera: - O Saloon é um antro de perdição. Fujam de lá. Só serve para gastarem dinheiro e se encherem de whisky. Jonathan lhe perguntara então: - Mas pastor, se não formos lá, quais as moças da cidade que poderão nos fazer o favor, grátis, claro, e sem bebida, de nos esvaziar os sacos? O pastor tinha duas filhas. E respondeu prontamente:- Também é verdade... Também é verdade... E está para chegar uma para trabalhar no Saloon que dizem ser jovem e muito bonita. E lá estava Jonathan Jackson esperando a moça. Queria ser o primeiro, como quem deflora uma virgem. Já andava meio cansado de frequentar o Saloon, e ter que passar na drogaria e comprar remédio para prevenir gonorreias. Esperando também estava a dona do Saloon acompanhada com um jovem rapaz. Reconheceu-o da foto do jornal: Era Roosevelt, filho de ricas famílias que tinham comprado recentemente um rancho no Estado. - Coincidência desgraçada! Disse para si mesmo Jonathan. Deu uma cuspida de tabaco que esguichou a uns dois metros, levantou-se, dobrou o jornal e aproximou-se deles. A diligência estava chegando. Ouvia-se o tropel dos cavalos vindo da curva na entrada da cidade. Mas não era a diligência. 



Era uma carruagem de propaganda anunciando a inauguração de um circo com a presença de Bufallo Bill. Balançando no telhado da carroça fechada com as laterais pintadas com as imagens do circo, havia como que uma enorme tripa transparente, parecendo de intestino de boi balançando ao vento. Um sujeito com cara de dentista, vestindo uma bata branca por cima de sua roupa de dandy, saiu de dentro e começou a vender pacotes daquela coisa, dizendo que era para prevenir doenças venéreas e para evitar gravidez nas mulheres. Era a ultima novidade no setor da indústria do sexo. Juntou muita gente ao redor da carroça. Uns riam, outros se indignavam. Kate MacPerson, a dona do saloon, dizia que suas meninas não precisavam disso. Eram todas saudáveis. O pastor que ia passando disse que isso era coisa do demônio, de Satanás.
Todo mundo sabia que Bufallo Bill era muito amigo de Wild Bill Hickok, o grande xerife e marshal, que fora casado com... Não era possível... E Jonathan Jackson gritou outra imprecação surda que só ele ouviu:- Mais uma coincidência!... Wild Bill Hickok tinha sido casado com Calamity Jane!


Jonathan conversou com Kate MacPerson e o jovem Roosevelt e ficou sabendo que a moça esperada teria como primeiro cliente o ricaço Roosevelt bem ali a seu lado. Então algo explodiu de repente em seu cérebro ansioso por uma dose forte de whisky. Nos próximos minutos teria que resolver alguns problemas. Andava cansado daquela vida de cowboy, de ser preterido por figurões. Há horas em que um homem tem que se decidir ou então não será ninguém na vida.  
Passaram-lhe uma corda à volta do pescoço dois dias depois. Jonathan Jackson viu quando o cavalo em que estava montado disparou à sua frente, logo a seguir ao barulho de um tapa forte dado no traseiro do animal e do solavanco como se quisesse escoucear. Depois sentiu-se balançar pendurado pela corda numa grossa viga da porteira. Sacudiu as pernas sem sentido, por puro instinto e lamentou ter as mãos amarradas por cordas, e em seguida tudo apagou. Deixou de ver e de ouvir, não podia falar, contar algo para eles. Teria muita coisa para lhes contar.  


Disseram as testemunhas que viram Calamity Jane chegar na carruagem que chegou logo em seguida ao carro de propaganda do circo de Bufallo Bill. 
Para espanto de todos os que tinham lido o jornal do dia anterior, o mesmo que Jonathan lera naquele dia fatídico, Calamity cumprimentou muito bem o jovem garoto Roosevelt. Ouviram perfeitamente quando fizeram menção aos encontros com Buffalo Bill e Wild Bill quando este era casado com Calamity. Todos se conheciam. Por isso não avisaram de imediato o Xerife. Deveria ser um engano dos homens da lei que pregam esses avisos de “Reward”. Lembram-se também de terem visto uma linda moça com um sotaque meio francês meio americano de N. York, cumprimentando a dona do Saloon. O próprio Buffalo Bill se apeara da carruagem de propaganda para cumprimentar Calamity Jane e o jovem Roosevelt. Isto foi numa sexta-feira 17 de fevereiro de 1899 ao entardecer. Elas se lembram de o banqueiro, o senhor Joshua Thompson, ter aberto as portas do Banco para Bufallo Bill e Calamity Jane que usava um traje feminino porque precisavam movimentar contas. Outras testemunhas se lembram de várias outras pessoas terem entrado no Banco enquanto conversavam. Estavam conversando na entrada e foram entrando no Banco para terminarem a conversa lá dentro, supuseram. Entre eles estava Jonathan Jackson também, conversando com a moça bonita que chegara na diligência.



Houve quem dissesse que Calamity Jane jamais falara com Jonathan, que Roosevelt não discutira com Jonathan, e que nem viram quando a briga começou, mas que quando o Xerife Donaghan apareceu, o banqueiro avisou que tinha sido roubado. Jonathan Jackson havia desaparecido. Procuram-no a noite toda de sexta. Finalmente, face ao roubo do Banco, alguém se lembrou de avisar que Calamity Jane fazia parte das notícias do jornal de quinta feira. Ela havia se evaporado da cidade também. Buffalo Bill só se lembrava da pancadaria no Banco, assim como o jovem Roosevelt e as demais testemunhas. Alguém levantou a hipótese de Calamity e Jonathan estarem juntos no roubo. A moça que chegara na diligência na manhã de domingo, dia em que penduraram Jonathan pelo pescoço no Saloon, estava arrumando as coisas no quarto que lhe fora destinado quando a procuraram no sábado. Kate MacPerson, a dona do Saloon, jurou em seu depoimento que Jonathan não tinha passado pelo Saloon, e que a moça nova tinha passado toda a noite em seu quarto com fortes dores de cabeça. Roosevelt garantiu que se um dia fosse eleito presidente dos EUA acabaria com o crime em todos os Estados e territórios.


Ninguém perguntou a Brenda Duncan, a faxineira, se tinha visto Jonathan por perto. Aos domingos ela não trabalhava e aos sábados estava sempre na lavanderia lavando os lençóis do prazer, as roupas íntimas das meninas cansadas de verdadeiras batalhas nas noites animadas do Saloon, preenchidas por sons de piano e risadas alegres. Se tivessem perguntado ela teria que lhes contar que Jonathan Jackson tinha passado a noite toda com a moça que chegara na diligência na sexta-feira, tendo entrado em seu quarto subindo pelas traseiras do prédio, justamente onde ela, a faxineira, costumava cochilar à noite enquanto esperava que a chamassem para algum serviço urgente de limpeza. Normalmente quando vomitavam por causa da bebida. Ela ganhara uma linda nota novinha em folha, e na segunda feira, a moça bonita que chegara na diligência disse que não gostara da cidade e voltou para Miami. Partiu na mesma diligência que a trouxera, agora a caminho de Aberdeen, mas ninguém da cidade poderia ter visto Calamity Jane esperando por ela à sua chegada na estação das diligências de Aberdeen, e passar-lhe a mão no traseiro quando se abraçaram.

Calamity Jane agora vestia calças, portava um colt 45 na cintura, uma winchester 63 (1863) na mão esquerda, coçava o saco e conseguia cuspir tabaco mascado a dois metros e meio de distância. Uma garrafa de bebida por dia era pouco. 

® Rui Rodrigues  


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