Estamos
em Junho, quase no final, temos que fazer frente às frentes frias.
Pode-se
construir um Reino, um Império, uma república com uma boa dose de frio, os
horizontes pra lá das ondas do mar, e o vento. Basta uma boa idéia. Saí de casa
para enfrentar estes elementos, disposto a pensar no assunto. Sou otimista. Não
que quisesse sair daqui, onde tenho minha casa, minhas coisas de frade
franciscano, meu leito de sonhos, minha fábrica de labaredas, e duas geringonças
que me põem em contato com o mundo lá de fora, muito mais bravio e inóspito do
que este em que vivo, preocupado com minhas galinhas que logo serão
acompanhadas de alegres coelhos. Do outro lado deste território do qual divido
a soberania com um grupo de vizinhos há um Motel cujo dono é um chileno mas que
não tenho visto mais desde minha ultima vistoria que fiz a um dos quartos que
estava precisando de movimento. Ele me cobrou. Tá certo. Amigos, amigos, mas negócios
à parte. Por isso estranhei quando, a caminho da praia, com cachecol, camisa de
malha de mangas comprida e um casacão por cima, vi, claramente visto, ontem e
hoje novamente, um carro branco balouçante a dois passos do começo da areia da
praia. Ontem vi um sujeito de camisa vermelha abaixando-se sobre o banco da
frente, hoje vi “algo” indefinido como se fossem roupas, mas segui em frente
para não incomodar quem estivesse no seu interior. Nunca se sabe que bofes tem
quem está lá dentro. Podem ser bons ou maus bofes, armados ou desarmados.
Fui
então pela praia, com ventos e respingos de ondas, um frio dos diabos, mas
sempre de olho na paisagem. Uma gaivota passou a meu lado, me acompanhou por
uns cinco centímetros e saiu zunindo. Pousou lá na frente. Pelos vistos não
estava com a mínima disposição de ir ao cinema naquele entardecer. Preferiu
brincar comigo, fugindo sempre que me aproximava, pousando mais à frente.
Resolvi pôr um fim á brincadeira e chegando às pedras voltei para trás. E lá
estava ela me acompanhando no caminho inverso. Agora, caminhando mais devagar,
fui vasculhando o que havia por ali, porque com o vento chegou algum material
de praias próximas, navios com tripulação descuidada, ambientalmente ignorante,
que joga pela borda o seu lixo. O IBAMA dorme o sono dos justos. Provavelmente
dirá que é função da marinha, da APA do Pau Brasil, ou da Prefeitura. Neste
jogo de empurra todos ganham menos o ambiente e as populações, porque o juiz
fica confuso. Não há jurisdição para assuntos contra os órgãos públicos, porque
são eles que nomeiam os juizes. Se reclamarmos talvez sejamos indiciados por
desacato à autoridade. Recolhi algum lixo, todo plástico, destinado a uma
grande escultura na grande parede da entrada de minha casa, mas de forma a não
deixar reentrâncias que permitam acoitamento de insetos, reservatórios de
poeira. Tudo deve ficar escorregadio, sem reentrâncias. Se jogar um balde de
água para lavar, não pode haver lugar para acúmulo de umidade. Já carregado,
voltei a passar pelo automóvel, mas devem ter me visto de longe, porque quando
passei ao lado era como se ninguém estivesse dentro dele. Ao passar em frente a
um Hotel na rua 15 que tem por aqui, vi um dos zeladores. Perguntei se conhecia
o carro. Poderia ser de alguém conhecido dele e não queria deixar má impressão.
Soube então que o carro pertencia a um casal que preferia o carro ao Motel lá
da frente, cujo dono é chileno, e meu amigo, mas que cobra entrada. Afinal o
Motel está ali para isso. A praia é que não está para isso. E na outra rua ao
lado, havia também um carro preto balouçando ao sabor que não era do vento. Como
temos câmaras para tudo que é lado ao longo das vias, tenho certeza que estará
registrado, mas o que me preocupa é que há crianças que costumam visitar o
lugar e algumas vivendo por aqui. Estas cenas, embora naturais, não são de
domínio público senão de particular, no remanso do lar ou dos motéis, hotéis ou
casas de amigos. Teremos que colocar uma placa com os dizeres: “Proibido fazer
sexo em público ou dentro de veículos”. Há gente que só traz lixo ou produz
lixo por aqui. Chamam de turistas. Eu chamo de terroristas ambientais.
® Rui
Rodrigues
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